Sunteți pe pagina 1din 8

A evocação do fantasiar adulto através da literatura fantástica

Sofia Dionizio Santos *

A Literatura enquanto forma de apresentação da realidade humana tem sido


exaustivamente investigada pela psicanálise, desde Freud, seu idealizador. Unido à teoria da
recepção estética, o método psicanalítico explora os meandros do texto literário, em busca da
compreensão sobre as relações entre o referido texto e as emoções que este é capaz de
despertar em seu leitor. A obra literária, apresentando-se enquanto produção deliberada de
um autor visando o leitor, ou enquanto eco das vivências psíquicas deste mesmo autor,
garante a complexidade da tarefa de psicanalistas e críticos literários que empreendam a
investigação de seus enigmas. O presente texto é mais uma tentativa de se insinuar nos
estudos deste campo.
Atualmente percebemos um interesse em diversos âmbitos da sociedade no que se refere
às histórias chamadas fantástico-maravilhosas. Revestidas de uma ambientação épica ou
cômica, por exemplo, estas narrativas enfrentam muitos questionamentos quanto às suas
qualidades literárias.
Ancorado na lógica consumista de mercado, esse tipo de literatura domina listas de mais
vendidos e expande-se do formato de texto escrito. Assim, confirma o percurso das obras
consideradas de sucesso: a transposição para o cinema, e a criação de uma linha infinita de
produtos comerciais.
Sendo as narrativas fantásticas tradicionalmente consideradas um domínio das crianças,
é curioso que adultos também façam parte do público atingido por essas produções. Seu
público é mais ou menos indefinido, podendo ser caracterizado de forma mais contundente
como aquele formado pelos indivíduos que buscam uma adequação ao ideal de juventude
eterna, mas isso ainda diz pouco do envolvimento de uma faixa etária mais avançada.
As narrativas fantástico-maravilhosas também têm sido empregadas em outros campos
além do entretenimento. Na educação e na saúde, por exemplo, são utilizadas com diferentes
objetivos. Na educação é aplicada como introdução e exercício de leitura, embora os
educadores destaquem a relativa inferioridade desta literatura. Torna-se um contra-senso, por
si só, o fato de iniciar jovens leitores através de leituras julgadas insatisfatórias. Na saúde, têm

*
Mestranda da Pós-Graduação de Psicologia na área de concentração Psicologia e Sociedade da UNESP –
Universidade Estadual Paulista, Campus de Assis.
ganhado relevância projetos em que a literatura oral e escrita aparecem como auxiliares no
processo de internação de pacientes.
A percepção deste movimento em torno das produções do âmbito fantástico-
maravilhoso faz ressaltar a importância de maiores estudos sobre estas narrativas. Enquanto
alicerce de práticas sociais, estas histórias devem receber maior atenção, evitando sua
disseminação descompromissada, inclusive nos espaços privilegiados de aquisição de cultura.
Deixamos aos críticos a responsabilidade sobre o julgamento dos méritos literários das
narrativas fantástico-maravilhosas. Neste estudo, buscamos investigar os processos
psicológicos por trás do interesse dos adultos por estas narrativas.

Chamamos fantástico-maravilhosas, neste trabalho, as obras que apresentam o chamado


sobrenatural em seu enredo. Muito popularizadas atualmente, reconhecemos como exemplos
as obras de J. K. Rowling (com a série “Harry Potter”), Tolkien (“O Senhor dos Anéis”), C. S.
Lewis (“As Crônicas de Nárnia”), entre os mais famosos.
Embora os exemplos dados sugiram uma equivalência entre literatura fantástico-
maravilhosa e literatura de massa, deixaremos para um outro espaço a discussão dessa
classificação. E lembramos que os exemplos citados são apenas os mais conhecidos na
atualidade, mas diversas outras obras trazem à luz as questões de que trataremos aqui.
Abdicamos de definições mais restritivas do gênero literário, como a de Todorov (1975),
por considerar que trazem discussões que extrapolam os objetivos deste trabalho.
A discussão realizada por Jacqueline Held sobre a definição de fantástico encontra-se
em ampla concordância com a forma como o compreendemos. Sendo assim, nos utilizaremos
de suas colocações para especificar nosso objeto:

Digamos apenas, em primeira abordagem, que pertencerá à literatura


fantástica toda obra na qual temática, situação, atmosfera, mesmo
linguagem, ou tudo isso junto, nos introduzirão num outro mundo que não o
da percepção comum, diferente, estrangeiro, estranho, que nos permite
voltar, pouco a pouco, ao longo da reflexão, a esses diferentes componentes.
(HELD, 1980, p. 30)

A discussão, como vemos, acaba por enveredar pelos caminhos do real e irreal,
conhecido e desconhecido, subjetivo e objetivo. Todas essas dicotomias são colocadas em
xeque pelo conhecimento psicanalítico. O próprio Freud (1919) já afirmava, em sua discussão
sobre o “Estranho” na literatura, que, pelo tempo em que nos colocamos nas mãos do escritor,
devemos considerar “real” o cenário escolhido para a narrativa.
Podemos dizer, a respeito do fantástico que estudamos aqui, que ele encerra aquilo que
faz parte da criação subjetiva de outrem ou de nós mesmos, contendo elementos
desconhecidos em diversos níveis (consciente, inconsciente), mas que nos despertam um
encanto fruto do reconhecimento. Esse reconhecimento pode se referir, por exemplo, à
natureza dos sentimentos humanos presentes tanto em nós como nos seres desconhecidos das
histórias, mas estará sempre presente, pois é preciso um mínimo de dosagem de conhecido, de
cotidiano, para dar vida e encanto às narrativas, sejam quais forem (HELD, 1980).
Percebemos que as narrativas fantástico-maravilhosas estão ganhando destaque num
momento em que se consolida a compreensão de estudiosos sobre a fase em que se encontra a
nossa sociedade.
Designada pelos mais diversos termos, a chamada pós-modernidade impõe uma forma
diferenciada de viver a realidade prática do dia-a-dia, que, como não poderia deixar de ser,
interfere na vivência psíquica de nossa existência.
David Harvey coloca as bases do surgimento da pós-modernidade na nova fase de
acumulação do capitalismo, e nas novas experiências de âmbito cultural. A pós-modernidade
caracterizaria uma forma esquizóide de experimentar, interpretar e ser no mundo. Fazendo
uma contraposição com o modernismo, ele diz:

O modernismo dedicava-se muito à busca de futuros melhores, mesmo que


a frustração perpétua desse alvo levasse à paranóia. Mas o pós-modernismo
tipicamente descarta essa possibilidade ao concentrar-se nas circunstâncias
esquizofrênicas induzidas pela fragmentação e todas as instabilidades
(inclusive as lingüísticas) que nos impedem até mesmo de representar
coerentemente, para não falar de conceber estratégias para produzir algum
futuro radicalmente diferente. (HARVEY, 2001, p. 57)

A ênfase da nova organização econômica é na instantaneidade e na descartabilidade.


Essa ênfase, ainda segundo Harvey,

...significa mais do que jogar fora bens produzidos (criando um monumental


problema sobre o que fazer com o lixo); significa também ser capaz de
atirar fora valores, estilos de vida, relacionamentos estáveis, apego a coisas,
edifícios, lugares, pessoas e modos adquiridos de ser e agir. (idem, p.258)

As novas imposições de vida, novas formas de ser e viver, implicam uma série de
mudanças na psicologia humana, segundo o autor:
...bloqueio dos estímulos sensoriais, a negação e o cultivo da atitude blasé, a
especialização míope, a reversão a imagens de um passado perdido (daí
decorrendo a importância de memoriais, museus, ruínas) e a excessiva
simplificação (na apresentação de si mesmo ou na interpretação dos
eventos). (idem, p. 259)

Quando estão em jogo movimentos de descontinuidade, fragmentação, ruptura e


deslocamento, a própria concepção de identidade do sujeito é abalada. A modificação dos
processos humanos atuais é tão intensa que Stuart Hall (2001, p. 12) descreve bem a situação,
explicando que o processo de identificação, através do qual forjamos nossas identidades
culturais, tornou-se provisório, variável e problemático, produzindo o sujeito pós-moderno.
Este sujeito passa a ser reconhecido por não ter uma identidade fixa, essencial ou permanente.
As idéias de Bauman, um dos mais reconhecidos estudiosos da pós-modernidade, fazem
eco às asserções acima. Ele destaca a agonia da insegurança vivida atualmente, pelo medo de
errar, de ser negligente ou incompetente. A ânsia consumista é uma forma de, ao menos uma
vez, encontrar uma segurança nos objetos. Sobre a busca da identidade, que acaba por ser
também uma busca consumista, ele diz que: “... é a busca incessante de deter ou tornar mais
lento o fluxo, de solidificar o fluido, de dar forma ao disforme.” (BAUMAN, 2001, p. 97). A
noção de liberdade que muitos consideram inerente à pós-modernidade é desconstruída
quando percebemos que somente alguns podem “comprar” suas “identidades”, sua
“segurança”, e sua “liberdade”. E, ainda para os que podem comprá-las, resta saber que
liberdade poderia existir numa vida presa à busca/consumo incessantes de algo que nunca é
obtido permanentemente.
Os caminhos do desejo também modificam-se. Num tempo em que tudo é consumo e
prazer imediato, o esforço não é mais por adiar o prazer, mas encurtar o adiamento ou aboli-lo
de todo. A incompletude das experiências, no entanto, também leva a um encurtamento do
prazer, ou seja, ele nunca é usufruído até o fim, pois é sempre gerada uma nova necessidade,
que leva à busca de outra satisfação (BAUMAN, 2001).
A psicanálise, enquanto forma de construção e compreensão da subjetividade humana,
também encontra-se inserida no contexto pós-moderno. Sua manifestação enquanto
movimento é afetada pelas novas estruturações pós-modernas, sendo necessária uma
constante reflexão sobre si mesma.
Enquanto teoria, entretanto, os psicanalistas buscam problematizar a questão da pós-
modernidade e do lugar do desejo nela. Joel Birmam afirma que: “Tal como enunciado no
aforismo fundamental da psicanálise, o desejo seria a condição de reinvenção do sujeito. Foi
justamente essa crença que se perdeu na pós-modernidade.” (BIRMAN, 2001, p. 84)
O sujeito, para a psicanálise, se constrói através do encontro com o outro. Nas palavras
de Herrmann:

Nascendo da cultura e da comunidade humanas, meu desejo objetiva o


desejo alheio, ao mesmo tempo que espera ser desejado por ele; este diálogo
com o real é originário, cria o corpo inconsciente da psique, bem como
permite o entrejogo de representações que a vestem e tornam-na apreensível
como identidade pessoal. (HERRMANN, 2001, p.93)

Essas reflexões nos levam a perguntar como seria possível a constituição do homem
enquanto sujeito dadas as condições e contradições da vida pós-moderna.
A pós-modernidade é considerada por Bauman (1997, p. 43) uma era heterofílica.
Podemos constatar, no entanto, que a percepção da alteridade aparece distorcida, o outro é
visto enquanto objeto do gozo. A interdição do gozo dá lugar ao “mercado do gozo”:
infinitude de orgasmos, multiplicidade infindável de parceiros. A predação do corpo do outro
é descrita por Birman:

Nessa perspectiva, a inexistência de signos que revelem a presença efetiva


de uma experiência intersubjetiva e alteritária seria a marca inconfundível
do estilo perverso de ser, em que o outro como singularidade insubstituível
e inconfundível não pode ser reconhecido como tal. O outro se reduz à
condição de um corpo para ser usufruído e devastado pela apropriação
perversa. (BIRMAN, 2001, p. 261-262)

A percepção do outro como objeto, a inexistência de uma identidade pessoal


minimamente estruturada, a busca da satisfação nunca alcançada, são características das novas
formas das relações humanas. Elas também se manifestam na produção cultural dos homens,
dado que estamos todos intimamente envolvidos neste processo. Resta saber de que forma as
narrativas fantástico-maravilhosas, tão visadas atualmente, se inserem nesse contexto.
Segundo Bauman, o romance de cada época responde aos anseios dos homens de seu
tempo. Portanto, numa geração mais rígida, o romance seria mais libertário; numa geração
como a pós-moderna, livre de quaisquer restrições, o romance seria mais “seguro”. A situação
do romance pós-moderno é assim descrita por Bauman:

Dificilmente o romance pode acrescentar liberdade a um mundo já aturdido


pela infinidade de possibilidades em que oscila. Mas pode, ao contrário,
oferecer um ponto de apoio para pernas que procuram, em vão, amparo na
areia movediça dos estilos mutáveis, das identidades que não sobrevivem à
própria construção e das histórias sem passado e sem conseqüência.
(BAUMAN, 1997, p. 152)
Na pós-modernidade, o mundo “real” é o cenário dos embates entre “verdadeiro” e
“falso”, é nele que se constroem os “simulacros”. É função da arte, agora, colocar-se em
oposição à “realidade” difusa do mundo pós-moderno. (BAUMAN, 1997)
Apesar do reconhecimento de que esta seria a função da arte, não podemos esquecer sua
inserção nos processos sociais pós-modernos. Assim, a arte pós-moderna pode aparecer como
criação para o mercado de consumo, destinada à obsolência imediata. Ela estaria baseada no
simulacro, e não na representação.
Apresentam-se, portanto, dois pólos de compreensão sobre o envolvimento com as
narrativas fantástico-maravilhosas na pós-modernidade. Por um lado, podemos pensar que
elas são absorvidas pela lógica consumista pós-moderna, tanto em seus níveis de criação
como de distribuição. O fantástico presente nas narrativas fantástico-maravilhosas, na forma
de mundos e seres desconhecidos, seria o correspondente literário da instabilidade pós-
moderna, e participaria das construções de simulacros da realidade.
Por outro lado, poderíamos compreender o aparecimento da literatura fantástico-
maravilhosa como uma forma de atender às demandas do sujeito pós-moderno, e atenuar a
insegurança que permeia suas vivências. Assim, a semelhança com a estrutura estável dos
contos de fadas, por exemplo, fariam as narrativas fantástico-maravilhosas remeterem a uma
experiência mais palpável, em que o leitor poderia se refugiar da vida descontínua que está
habituado a levar.
Como já discutimos acima, o prazer, na pós-modernidade, encontra-se distorcido.
Usufruir da arte, portanto, também torna-se um prazer consumista. Pensando no gozo
predatório, chegamos à conclusão de que tanto uma como outra forma de compreender as
narrativas fantástico-maravilhosas na pós-modernidade, pode levar a uma apropriação das
histórias que não considera o valor da obra enquanto arte, resultado da criação humana, mas
apenas enquanto objeto para consumo, na trajetória desgastante da busca por um prazer que
nunca é alcançado.
O fantástico, portanto, vivenciado na literatura como criação, e não como produção em
série, auxilia o homem em sua busca pela “realidade” além do simulacro pós-moderno. Seu
poder reflexivo reside justamente na possibilidade de confrontar o leitor com possibilidades já
imaginadas e com outras nunca antes pensadas. Seu poder de encantamento é fruto do
reconhecimento do leitor. Como diz Held:
Pelo fato de nos desgrudar do real e de nos trazer de volta a ele pelo aspecto
do imaginário, certo tipo de conto nos torna o homem, seu meio ambiente, a
sociedade na qual vive, “externos”, “estranhos”, e por isso nos abre os
olhos, nos faz refletir sobre absurdos, taras, problemas até então não
percebidos. (HELD, 1980, p.148)

E, logo adiante, ela enfatiza que:

Para ocasionar a adesão do leitor, para ser ratificada, a história ⎯ por mais
estranha, louca ou fantástica que seja ⎯ deve sempre ser de tal maneira que
cada um possa, como num espelho, encontrar nela certa essência do ser
humano, de qualquer ser humano, de si mesmo: tradução de necessidades,
de angústias, de desejos, conscientes ou não. (idem, p. 151)

Podemos concluir, portanto, que as fantasias dos adultos que vivem a pós-modernidade
podem e devem ser despertadas pela literatura fantástico-maravilhosa. Embora nos
defrontemos, muitas vezes, com o rótulo da literatura infantil, percebemos que as facetas do
ser humano tocadas pela literatura fantástico-maravilhosa ultrapassam as delimitações etárias.
Se repensarmos o conceito de “infantil” à luz da teoria psicanalítica, concordaremos com
Tanis (1995, p. 169-170), que o coloca enquanto território a ser explorado em cada um de nós,
como campo dos possíveis e dos limites, fonte de inspiração e desilusão, mas sempre
referência.
E, quando o sujeito puder se reconhecer na obra, estará construindo a segurança de uma
identidade, através do encontro com a obra na forma de um outro consistente, que lhe serve de
espelho. Dessa forma, os caminhos do desejo enquanto constituição do sujeito são retomados,
através do poder crítico-reflexivo da literatura fantástico-maravilhosa.
Bibliografia
BAUMAN, Z. Mal-estar da pós-modernidade. Tradução de Mauro Gama e Cláudia
Martinelli Gama. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997.
___________. Modernidade Líquida. Tradução de Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 2001.
BIRMAN, J. Mal-estar na atualidade: A psicanálise e as novas formas de subjetivação. 3a.
edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
FREUD, S. (1919) O “Estranho”. In: Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Vol.
XVII (Edição Eletrônica da Imago Editora)
HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução de Tomaz Tadeu da Silva e
Guacira Lopes Louro. 5a. edição. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.
HARVEY, D. Condição Pós-moderna. Uma pesquisa sobre as Origens da Mudança
Cultural. Tradução de Adail Ubirajara Sobral e Maria Stela Gonçalves. 10a. edição. São
Paulo: Edições Loyola, 2001.
HELD, J. O imaginário no poder: as crianças e a literatura fantástica. 3a. edição. Tradução
de Carlos Rizzi. São Paulo: Summus editorial, 1980. (Novas buscas em educação, vol. 7)
HERRMANN, F. O Divã a Passeio: à procura da psicanálise onde não parece estar. 2a.
edição. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2001. (Teoria dos Campos, Coleção Psicanalítica)
TANIS, B. Memória e Temporalidade: sobre o infantil em Psicanálise. São Paulo: Casa do
Psicólogo, 1995.
TODOROV, T. Introdução à literatura fantástica. Tradução de Maria Clara Correa
Castello. São Paulo: Perspectiva, 1975. (Coleção debates – 98)

S-ar putea să vă placă și