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A ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO E AS NEGOCIAÇÕES

DO SETOR AGRÍCOLA

Waldecy Rodrigues1

Resumo - Este artigo realiza uma análise econômica e institucional do comércio internacional
agrícola. Foi realizada uma abordagem histórica do comércio mundial, destacando o contexto
econômico e político do surgimento da estrutura institucional reguladora e a evolução
específica das negociações multilaterais no comércio agrícola no âmbito da Organização
Mundial do Comércio (OMC). Entre 1930-2000 as tarifas médias de importação tiveram
uma queda de 93,4%, entretanto há ainda um grande protecionismo no setor agrícola
evidenciado pelos grandes picos tarifários praticados pelos EUA (350%), União
Européia (800%) e Japão (900%). Os países em desenvolvimento devem formular
suas políticas comerciais, a partir do principio de defesa comercial, dado os elevados
níveis de proteção dos países desenvolvidos. Mas no caso brasileiro, foi adotado, no
início da década de 90, uma política comercial liberalizante em todos os setores da
economia com o objetivo de desfrutar dos benefícios da abertura comercial, porém foi
inviabilizada uma estratégia posterior mais agressiva no contexto multilateral visando
a quebra das barreiras ao comércio internacional de produtos agrícolas.
Palavras-chave: comércio internacional agrícola, OMC, protecionismo agrícola.

1. Introdução
Este artigo tem o objetivo de realizar uma análise econômica e institucional do
comércio internacional agrícola. Assim, a comparação entre a liberalização no comércio
internacional entre produtos manufaturados e primários contribuí para compreender a
distância entre os estágios de riqueza dos países, de acordo com os produtos que orientam
suas economias. O problema central é compreender as razões que levam os países
desenvolvidos protegerem o setor agrícola, impondo pesadas perdas no bem-estar dos países
em desenvolvimento.
A liberalização do comércio internacional agrícola sempre enfrentou dificuldades em
termos históricos. Existem alguns casos recorrentes de tal fato. Por exemplo, o berço do
liberalismo econômico – a Inglaterra – protegeu sua agricultura através da Corn Laws desde o
fim das Guerras Napoleônicas até o final do século XIX. Sua abolição deveu-se ao fato do
governo inglês entender que as mesmas oneravam os consumidores ingleses.
Um outro exemplo histórico foi dado pelos Estados Unidos, que em 1930 adotaram a
tarifa Smoot-Hawley, que elevou mais de 800 alíquotas de importações agrícolas e
industriais. É de se notar que desde 1927, sob os auspícios da Liga das Nações, estavam se
realizando negociações visando à redução generalizada de tarifas. O aumento das barreiras
protecionistas pelos EUA pôs um ponto final neste esforço e suscitou respostas no mesmo
sentido de outras nações, dentre as quais inclui-se o Brasil. Cada país tratou de elevar o seu
nível de atividade e de emprego substituindo importações, obviamente a custas das
exportações dos outros países.
Até a Rodada do Uruguai, finalizada em 1994, praticamente não havia apoio para a
inclusão da agricultura de forma efetiva na agenda de liberalização, porque os Estados
Unidos e as principais nações desenvolvidas da Europa eram geralmente sujeitas a fortes

1
Professor Doutor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Tocantins. E-mail:
waldecy@terra.com.br
2

lobbies protecionistas que haviam construído mecanismos elaborados de apoio à renda


agrícola. Ao mesmo tempo, as principais nações em desenvolvimento estavam protegendo
seu setor industrial e, portanto, não estavam interessadas em defender a liberalização para a
agricultura.
Para melhor compreender a dinâmica política e econômica do comércio internacional
agrícola, no trabalho será feita uma abordagem histórica do comércio mundial, destacando o
contexto econômico e político do surgimento de sua estrutura institucional reguladora e a
evolução específica das negociações multilaterais no comércio agrícola no âmbito da
Organização Mundial do Comércio (OMC). Também são discutidos os níveis de proteção no
comércio agrícola por produtos, ressaltando quais seriam as possíveis estratégias que
deveriam ser seguidas pelos países em desenvolvimento, particularmente o Brasil, no contexto
das negociações multilaterais.

2 – Evolução histórica do comércio mundial


Segundo SINGER (1998) os fluxos comerciais durante a história da humanidade vem
aumentando constantemente, salvo em períodos de grandes crises econômicas e conflitos
bélicos. Mesmo, diante de práticas livre – cambistas ou protecionistas o intercâmbio
comercial internacional manteve taxas de crescimento ao longo da história da humanidade, e
neste sentido que este autor afirma que o livre-comércio não pode ser confundido com a
ampliação do comércio exterior. Esta persiste historicamente, principalmente associada com
o desenvolvimento de novas tecnologias que encurtam distâncias, enquanto o livre –
comércio é uma postura de política comercial dos Estados utilizada em apenas alguns
momentos da história.
BHAGWATI (1990) faz uma análise histórica sobre a política comercial desde o final
da 2ª Guerra Mundial até o início da década de 1980. Apesar da visão do autor ser
extremamente liberal, sua abordagem percorre com uma boa clareza dos fatos históricos
ocorridos no período em questão. Para este autor um olhar retrospectivo para os anos de
liberalização comercial de pós-guerra por parte dos países industrializados, e para o
ressurgimento do protecionismo a partir da década de 70, fornece informações valiosas sobre
a histórica ação recíproca dos interesses, da ideologia e da estrutura institucional que deram
forma às políticas comerciais no período.
A conferência de Bretton Woods, realizada em 1944, concebera uma infra-estrutura
institucional que incorporava os princípios de ordem econômica liberal. A adesão às regras
do Fundo Monetário Internacional (FMI) iria gerar um equilíbrio macroeconômico, sem o
qual a manutenção de um sistema comercial liberal é economicamente menos obrigatório e
politicamente mais difícil. O Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT) criou regras –
refletindo multilateralismo e não-discriminação - que permitiriam às partes contratantes
obterem ganhos do comércio segundo os princípios da teoria das vantagens comparativas. A
estrutura institucional da nova ordem econômica internacional, também incluía o Banco
Mundial, que foi criado para canalizar recursos para a reconstrução dos países destruídos na
guerra e para as nações em desenvolvimento a fim de fortalecer a infra-estrutura liberal.
O GATT não eliminou as restrições comerciais de uma só vez; ele foi um guarda-
chuva sob o qual uma série de exercícios de cortes tarifários foi realizada. Na visão de
BHAGWATI (1990) o aprofundamento da liberalização comercial obtido ao longo das
rodadas de negociação contribuiu de forma significativa para o aumento da renda nos países,
apesar de reconhecer que o crescimento econômico depende de várias outras variáveis que
não apenas o nível de abertura comercial.
Ainda, BHAGWATI (1990) notou exceções importantes à tendência para a
liberalização: a agricultura, os têxteis e os países em desenvolvimento. Até a Rodada do
Uruguai, finalizada em 1994, praticamente não havia apoio para a inclusão da agricultura de
3

forma efetiva na agenda de liberalização, porque os Estados Unidos e as principais nações


desenvolvidas da Europa eram geralmente sujeitas a fortes lobbies protecionistas que haviam
construído mecanismos elaborados de apoio à renda agrícola. Ao mesmo tempo, as
principais nações em desenvolvimento estavam protegendo seu setor industrial e, portanto,
não estavam interessadas em defender a liberalização para a agricultura.
A tendência de queda nas restrições comerciais resultante dos declínios das tarifas foi
abruptamente interrompida em meados da década de 70. As reduções negociadas de tarifas
foram acompanhadas, e seu efeito diferencial no afrouxamento das restrições ao sistema
mundial de comércio, seriamente comprometido pelo crescimento das barreiras não tarifárias
(NTBs). Entretanto, mesmo com a expansão destas barreiras, o crescimento do comércio
mundial superou ao da renda entre 1973 e 1983 (BHAGWATI, 1990).
As forças protecionistas desencadeadas pelas dificuldades macroeconômicas no final
de década de 70 e a recessão dos anos 80 foram reforçadas por mudanças estruturais na
economia mundial. Entre os quais cita-se o crescimento das exportações do Japão e dos
Tigres Asiáticos (Cingapura, Honk Kong, Coréia do Sul, Malásia e Formosa), seguido
também pela menor expansão de economias latino-americanas emergentes criaram problemas
para indústrias específicas dos países da OCDE, forçando-as a se ajustarem a essas
mudanças. Ressalta-se que a pressão sobre a indústria dos países europeus e EUA, não são
apenas nas velhas indústrias intensivas em mão-de-obra, mas também nas indústrias de alta
tecnologia, principalmente às japonesas.
Estas mudanças estruturais da economia mundial, principalmente realizadas em
alguma medida pelo modelo de substituição de importações dos países latino-americanos ou
pelos modelos “protegidos” de estímulo às exportações dos Tigres Asiáticos, levaram a
sérias preocupações com o processo de desindustrialização norte-americana. Esse fenômeno
da economia norte-americana BHAGWATI (1990) chamou de “síndrome do gigante
diminuído”, onde o paralelo como a Inglaterra do final do século XIX é praticamente
inevitável2.
BHAGWATI (1990) cita que os fatores estruturais citados contribuíram para as
pressões protecionistas dos anos 1970 até meados dos anos 1980, entretanto o autor no
começou a perceber acertadamente tendências favoráveis ao comércio mais livre. Essas
variáveis seriam o aumento do processo de globalização e interdependência da economia
mundial, através do comércio e dos investimentos diretos. Fundamentalmente, os
investimentos estrangeiros diretos (IED´s) podem mudar o jogo interno de interesses entre
forças liberalizantes e protecionistas, principalmente nos países em desenvolvimento.
CHESNAIS (1996), um crítico contumaz do processo de globalização da economia3,
argumenta que o papel de liberalização do comércio é importante, mas não aquele celebrado
pelos economistas liberais. O comércio teve um papel integrador, à escala de certas partes do
sistema internacional, e precisamente nos pólos da Tríade (EUA, Alemanha e Japão). Mas
quando se examina a economia mundial como um todo, constata-se, ao contrário, que a
liberalização levou a uma notável acentuação de sua polarização, bem como a crescente
marginalização de muitos países.
Por outro lado, onde o comércio liberado aparentemente teve efeito integrador, os
verdadeiros agentes do processo são sobretudo as multinacionais, às quais a liberalização
permitiu organizar como desejavam o trabalho de suas filiais e suas relações de terceirização.
Na época das fronteiras nacionais parcialmente protegidas e dos mercados domésticos

2
Segundo dados da UNCTAD (1983), citado por BHAGWATI (1990) , os EUA detinham em 1950 e 1980,
respectivamente 40,3% e 21,8% do PIB mundial .
3
O autor não utiliza o termo “globalização da economia”, pois acredita que o mesmo dá uma falsa impressão de
inserção de todos os países processo de forma eqüitativa. Prefere utilizar o termo “mundialização do capital” do
capital em suas abordagens.
4

regulamentados o capital já gozava de mobilidade, mas ainda estava, em certa medida,


enquadrado, delimitado. A liberalização, com a desregulamentação que protege e acentua
seus efeitos, devolveram ao capital uma liberdade de escolha quase total, no momento em
que as novas tecnologias ampliam as opções com em nenhuma época anterior da história do
capitalismo.
Merece destaque a grande importância relativa que as empresas multinacionais
desempenham nos fluxos comerciais internacionais. Recentemente, uma parte crescente do
comércio internacional realiza-se dentro uma mesma estrutura empresarial, este é chamado
de comércio intrafirma. Sendo que nestas transações, não se utiliza com freqüência o
mecanismo de mercados competitivos internacionais. ARCAL e MAETZ(2000) lembram que
freqüentemente os preços utilizados nestas transações diferem consideravelmente dos preços
de mercado e podem servir como meio para transferir rendas a países com normas fiscais mais
favoráveis. Especificamente, este mecanismo pode ser utilizado para absorver exportações
subsidiadas na origem, como é o caso do leite em pó e queijo europeus.
A EFTA (1998:8)4 trás algumas informações relevantes a respeito da participação das
empresas multinacionais no comércio internacional:
“Calcula-se que existem cerca de 40.000 empresas transnacionais. As
primeiras 500 são grandes companhias e controlam 70% do comércio
mundial (intrafirma) e 80% dos investimentos estrangeiros diretos. Estima-
se que cerca de 40% do comércio mundial total está nas mãos de empresas
transnacionais. [...] Em 1995, cerca de 29% do PIB mundial correspondia
as 200 empresas transnacionais mais importantes. [...] Estas empresas
ocupam uma posição hegemônica em vários produtos agrícolas: 20 delas
controlam o comércio do café, 6 dominam 70% do comércio de trigo e 1
controla 98% da produção do chá industrializado”.
CHESNAIS (1996) acredita que o aprofundamento do comércio multilateral não
atenua às desigualdades econômicas e sociais, pelo contrário as agrava. Para este autor os
países cuja integração ao intercâmbio mundial deu-se na época da dominação colonial ou
semicolonial aberta, como exportadores de produtos primários, agrícolas ou minerais, foram
particularmente atingidos pelas crises cíclicas do capitalismo global. Esses países são os
exemplos típicos, e também as vítimas preferenciais, da forma de divisão do trabalho
enaltecida pela teoria do comércio internacional, ricardiana e depois neoclássica. Uma vez
que o lugar que lhes foi atribuído depende de evoluções decididas de fora, e que resulta
também de investimentos estrangeiros potencialmente de grande mobilidade, a dotação
fatorial pretensamente natural desses países pode desaparecer rapidamente. Tudo converge
para que esses países permaneçam prisioneiros de especializações tornadas obsoletas pela
evolução dos conhecimentos científicos e das tecnologias acumuladas pelos países avançados,
especialmente dentro dos grandes grupos.
CHESNAIS (1996) reforça a tese de que a nova configuração do comércio
internacional agrava ainda mais as disparidades existentes entre os países ricos e pobres.
Particularmente, a evolução de novos materiais atenua a vantagem competitiva dos países
exportadores de minérios e a evolução da biotecnologia muda toda estrutura produtiva do
setor agropecuário. O autor francês de alguma forma retoma o argumento das trocas
desiguais de PREBRISH, com um agravante: sem o receituário da substituição das
importações. Quer dizer, os países não desenvolvidos estão fadados a permanecerem sempre
no mesmo estado, pois estarão cada vez mais excluídos das cadeias produtivas globais com
alto teor tecnológico.

4
EFTA (Asociación Europea de Comercio Justo). Anuario de Comercio Justo 1998-2000. Madrid, 1998.
5

3 – Evolução histórica da estrutura institucional reguladora do comércio internacional


Antes de aprofundar na discussão sobre os benefícios e malefícios das políticas
liberalizantes, é importante conhecer particularmente a evolução institucional do comércio
internacional, a partir da 2ª Guerra Mundial., destacando o surgimento do GATT até sua
transformação na OMC.
Em 1947, para sair do impasse da não criação da OIC, em virtude dos interesses
norte-americano e europeu, foi negociado um Acordo Provisório, entre 23 países
denominado General Agreement on Tariffs and Trade (Acordo Geral sobre Tarifas e
Comércio) ou GATT. De simples acordo, o GATT se transformou, na prática, embora não
legalmente em um órgão internacional, com sede em Genebra, passando a fornecer a base
institucional para diversas rodadas de negociações sobre comércio, e a funcionar como
coordenador e supervisor das regras do comércio até o final da Rodada Uruguai e a criação da
atual OMC. (JACKSON, DAVEY, SYKES, 1995; TREBILCOCK, HOWSE, 1995)5.
Particularmente, é importante verificar a evolução institucional do comércio
internacional. O sistema de regras do comércio internacional, como é hoje concebido, foi
estabelecido ao longo dos anos, através de oito rodadas de negociações multilaterais.
Observam-se dois fatos marcantes, primeiro o número crescente de países que vêm
participando das rodadas de negociação multilateral, no nascimento do GATT em 1947
assinou o acordo 23 países, já na Rodada Uruguai em 1994 assinaram o acordo 125 países.
Um outro ponto a ser observado, é praticamente a ausência do setor agrícola da cerca de 50
anos de funcionamento do GATT, onde o mesmo era considerado como um setor especial,
quanto à segurança alimentar, e não devia ser regulado por normas rígidas da regulação do
comércio internacional.
Na Tabela 1 observam-se de forma mais nítida os resultados econômicos e políticos do
avanço do processo de regulação do comércio internacional através das rodadas de
negociações. Entre 1947-1994 houve um aumento da participação do número de países na
ordem de 434% nas rodadas de negociações e o comércio afetado aumentou em US$ 3.690
bilhões.
Tabela 1 – Rodadas do GATT: número de participantes e volume do comércio
internacional afetado.
Data Local Nº de Participantes Comércio Afetado US$
1 – 1947 Genebra – Suíça 23 10 bilhões
2 – 1949 Annecy – França 13 n.d.
3 – 1951 Torquay – Reino Unido 38 n.d.
4 – 1956 Genebra 26 2,5 bilhões
5 – 1960-61 Rodada Dillon – Genebra 26 4,9 bilhões
6 – 1964-67 Rodada Kennedy – Genebra 62 40 bilhões
7 – 1973-79 Rodada Tóquio – Genebra 102 155 bilhões
8 – 1986-94 Rodada Uruguai – Genebra 123 3.700 bilhões
Obs.: n.d. – não disponível
Fonte: OMC, 1998.
Para THORSTENSEN (1999), as seis primeiras rodadas visaram basicamente à
diminuição dos direitos aduaneiros, através de negociações de concessões tarifárias
recíprocas. As duas últimas rodadas foram mais amplas, mas também incluíram reduções
tarifárias. O sucesso dessas rodadas pode ser atestado quando se tem em conta que, em 1947,
a média das tarifas aplicadas para bens era de 40%, e, que, em 1994, com a Rodada Uruguai,
essa média caiu para menos de 5%.

5
Citados por THORSTENSEN, V. Organização Mundial do Comércio: as regras do comércio
internacional e a rodada do milênio. São Paulo: Aduaneiras, 1999.
6

A sétima rodada chamada Rodada Tóquio, negociou, além de redução de tarifas, uma
série de acordos para reduzir a incidência de barreiras ditas não tarifárias e que passaram a ser
adotadas por diversos países como forma de proteção à produção nacional. Esta rodada, além
de esclarecer regras anteriores já negociadas, também introduziu novas regras ao GATT. Um
dos problemas da rodada foi que os acordos negociados só valiam para as partes que os
assinavam. Os acordos da Rodada Tóquio foram nove: barreiras técnicas, subsídios,
antidumping, valoração aduaneira, licenças de importação, compras governamentais,
comercio de aeronaves, acordo sobre carne bovina e acordo sobre produtos lácteos.
O GATT, além de um foro de negociações, também era o árbitro das regras de
liberalização do comércio negociadas entre as partes. Casos de conflitos eram levados a
painéis criados pelo próprio GATT, que podiam autorizar medidas de retaliação. Mas no
antigo GATT as partes que perdiam o painel podiam bloquear a sua adoção, uma vez que a
prática era adotar decisões por consenso. Porém, apesar de não ter força de um tribunal o
GATT exercia forte pressão política para que as partes do acordo cumprissem as regras
preestabelecidas.
A oitava rodada, a Rodada Uruguai (RU), foi a mais ambiciosa e complexa das
negociações estabelecidas no âmbito do GATT. Foi iniciada em 1986 na cidade de Punta del
Este e terminou formalmente em 1994. O objetivo da RU além da diminuição das tarifas foi o
de integrar às regras do GATT setores antes excluídos, como agricultura e têxteis, além de
introduzir tais regras a novos setores como serviços, medidas de investimentos e de
propriedade intelectual. Cerca de cento e vinte e cinco países participaram da Rodada
Uruguai, o que demonstra o interesse dos diversos países em negociações sobre o sistema
multilateral do comércio.
A história do GATT, e agora da OMC, permite visualizar a formação de grupos de
interesses variados que agrupam, na maioria das vezes, países desenvolvidos contra países em
desenvolvimento, mas também de grupos que agregam membros de diversos níveis de
desenvolvimento, porém que são exportadores de certos produtos em comum, como é o caso
de produtos agrícolas. O dia-a-dia da instituição não é regido por uma geometria fixa de
defesa de interesses entre membros desenvolvidos e em desenvolvimento, nem de
exportadores e importadores de determinados produtos, mas através de tinia geometria
variável, que é ditada por interesses comuns sobre pontos específicos da agenda (LAFER,
1998).

4 – Evolução histórica do comércio internacional agrícola


Atualmente, as proteções tarifárias médias, apenas alcançam aproximadamente uma
décima parte do que foram ao momento em que o GATT entrou em vigência. Na Tabela 2
observa-se uma tendência histórica declinante das tarifas de importação nos países
desenvolvidos, principalmente nos EUA, demonstrando claramente o aumento da abertura
comercial destes países.
Tabela 2 – Tarifas de importações nas rodadas de negociações comerciais nos EUA e
outros países desenvolvidos
Ano Rodada / Legislação Tarifa Média (%)¹
1930 Lei de Comércio Smoot Hawley 53.0
1956 As quatro primeiras rodadas do GATT 25.0
1961 Rodada Dillon (concluída) 22.5
1967 Rodada Kennedy (concluída) 12.0
1979 Rodada Tóquio (concluída) 8.3
1987 Rodada Tóquio (implementada) 5.8
2000 Rodada Uruguai (consolidada) 3.5²
Fonte: WHALLEY (1985); WINHAM (1985) e OYE (1992). ¹ Média nos EUA ² Média dos países industrializados.
7

Entre 1930-2000 às tarifas médias de importação tiveram uma queda de 93,3%, ou


seja, atualmente as tarifas equivalem 6,6% dos anos 1930. São medidas que
indubitavelmente demonstram o avanço do processo de liberalização comercial. Entretanto,
segundo CEPAL (1999) as oito rodadas de negociações comerciais multilaterais reduziram
progressivamente as tarifas dos produtos industriais dos países desenvolvidos em níveis muito
baixos. Enquanto os produtos agrícolas eram praticamente ignorados das negociações
multilaterais até a chegada da Rodada Uruguai. Todo esse processo histórico das negociações
comerciais multilaterais levam a uma indagação: Quais seriam as razões objetivas que
marcam a exclusão do setor agrícola das negociações multilaterais?
O setor agrícola passou a ser efetivamente considerado nas negociações multilaterais do
GATT, apenas com o início da Rodada Uruguai, já no final dos anos 1980. Entretanto, mesmo
com as reduções propostas pela Rodada Uruguai, verifica-se de acordo com a tabela 3 que nos
EUA, União Européia e Japão as tarifas médias aplicadas no setor agrícola industrial são
respectivamente, duas, quatro e seis vezes maior que as tarifa médias no aplicadas no setor
industrial. O grande protecionismo dos países desenvolvidos ao setor agrícola, mesmo com a
Rodada Uruguai, fica mais evidenciado quando se observam os picos tarifários praticados nestes
países, nos EUA chegam a 350%, na União Européia a 800% enquanto no Japão chega a 900%!
Tabela 3 – Nível geral de proteção tarifária dos países desenvolvidos
EUA (1999) União Européia (1997) Japão (1997)
Tarifa média aplicada 5,7% 10% 9,4%
Tarifa média das manufaturas 4,7% 4,9% 4,9%
Tarifa média aplicada para produtos agrícolas 10,7% 20,8% 26,0%
Tarifa máxima aplicada para produtos agrícolas 350% 800% 900%
Fonte: OMC (1998, 1998 e 1999).

O fato do comércio agrícola ser efetivamente excluído do GATT durante


aproximadamente cinqüenta anos, causa indagações sobre realmente da existência ou não de
especificidades deste setor, que o faz ter necessariamente um tratamento privilegiado no
contexto das negociações multilaterais.
KONANDREAS (1999) justifica esta exclusão do setor agrícola das negociações
comerciais multilaterais alegando que havia uma concepção, principalmente na maior parte
dos países desenvolvidos, de que a agricultura era o único setor da economia que, por razões
de segurança alimentar nacional, não podia ser tratado como outros setores. De outro lado,
as pressões políticas e sociais na maior parte dos países desenvolvidos exigiam que este setor
permanecesse protegido do mercado internacional.
Com isso, desde sua implantação no GATT foi dado um tratamento especial ao
comércio agrícola, permitindo uma séries de exceções aos princípios básicos do acordo. Por
exemplo, restrições quantitativas a importação, proibidas para outros produtos, poderiam ser
utilizadas para os produtos agrícolas. Eram permitidos explicitamente subsídios,
condicionados a observância de uma eqüitativa participação no mercado. Outros mecanismos,
tais como taxas variáveis de importação e apoios locais, proporcionaram meios adicionais
para proteção do setor agrícola.
Se alguns produtos agrícolas foram anteriormente tratados nas negociações como
produtos individuais, é com a chegada da Rodada Uruguai que a agricultura, como setor, foi
paulatinamente colocada com firmeza sobre a mesa de negociações do GATT. A Rodada
Dillon, por exemplo, logrou rebaixar as tarifas de alguns produtos agrícolas selecionados e o
Acordo Internacional do Trigo e o de Carne e Produtos Lácteos foram negociados de forma
paralela com a Rodada Kennedy. Entretanto, de uma forma geral, os produtos agrícolas
permaneceram fora da agenda das negociações desde a implantação do GATT.
8

A limitada importância que o GATT dava a agricultura levou a uma crescente tensão
internacional no seu comércio, particularmente entre os países desenvolvidos. O comércio
esteve freqüentemente em estado de fricção, com muitos países desenvolvidos aplicando
protecionismo abertamente em prejuízo a outros países.
Para KONANDREAS (1999) a situação que existia nos mercados mundiais agrícolas
antes da Rodada Uruguai era marcado por um forte protecionismo e constantes conflitos
comerciais internacionais. Predominavam barreiras não tarifárias no comércio agrícola e havia
grandes subsídios praticados no setor. Por exemplo, as transferências aos produtores dos
países da OCDE, medida segundo a Estimativa de Apoio ao Produtor, alcançavam os 292
bilhões de dólares americanos em 1991-93 (em alguns países entre 60 e o 80% do renda dos
fazendeiros advinha do apoio governamental).
Como resultado dos subsídios eram produzidos excedentes com vultosos gastos em
exportações subsidiadas. Também, em virtude desta política adotada disto, caiam os preços no
mercado mundial dos principais produtos agrícolas. Os países que não subsidiavam estavam
cada vez menos em condições de competir em um mercado mundial com preços deprimidos,
diminuindo assim a participação no mercado de muitos exportadores tradicionais, incluindo
países desenvolvidos. Ademais da depressão dos preços, os subsídios à exportação e a falta
de concorrência internacional em mercados protegidos, contribuíram para a falta de
estabilidade no mercado mundial em vários momentos.
Com isto os conflitos sobre o comércio agrícola eram produzidos com crescente
freqüência e, por várias ocasiões, se utilizava o GATT para tentar resolver esses conflitos.
Segundo KONANDREAS (1999) cerca de 60% de todas as controvérsias remitidas aos
procedimentos de solução do GATT entre 1980 e 1990 estavam relacionados com a
agricultura. O desejo de reduzir as continuas fricções sobre comércio internacional de
produtos agrícolas foi uma das razões principais pelas que se chegou a um consenso para
incluí-lo no marco regulatório do GATT.
Assim, na Rodada Uruguai, pretendeu-se antes de tudo reduzir ás fricções no
comércio internacional agrícola, bem como disciplinar às políticas que distorcem esta
atividade. Esta rodada significou uma melhora fundamental nas condições da competência que
rege o comércio agrícola. As novas normas e disciplina aplicam-se a todos os membros da OMC
e estão respaldadas por os novos acordos para solução de controvérsias e uma efetiva
implementação das decisões dos acordos. A tabela 4 demonstra que na Rodada Uruguai o
comércio agrícola de fato começou a ser liberalizado, com a proposta de corte das tarifas, no
apoio doméstico e nos subsídios à exportação.
Tabela 4 - Reduções requeridas no Acordo sobre Agricultura da Rodada Uruguai
Itens de redução Países desenvolvidos (%) Países em desenvolvimento (%)
Corte tarifário médio para todos os produtos 36 24
agrícolas
Corte tarifário mínimo por produto 15 10
Corte total no apoio doméstico a agricultura 20 13
(período base 1986-88)
Valor dos subsídios à exportação 36 24
Quantidades exportadas subsidiadas 21 14

Fonte – OMC (1998)6


Entretanto, mesmo com as reduções propostas pela Rodada Uruguai, ressalta-se que os
países desenvolvidos aplicam tarifas muito maiores no setor agrícola do que no setor industrial.

6
Citado por OCDE em “Agriculture in the Uruguay Round in Workshop on Emerging Trade Issues in
Agriculture, Paris, 1998.
9

Por isso é extremamente necessário que se prossiga às negociações multilaterias no comércio


agricola, pois além das tarifas para produtos agrícolas serem comparativamente elevadas,
existem outros problemas relacionados com a implementação dos acordos existentes na
administração do sistema de cotas tarifárias, no acesso mínimo aos mercados e no
cumprimento de compromissos de redução de apoios e subsídios a exportação.
Segundo ELAMIN (2000), tradicionalmente, o GATT ocupava-se das medidas
comerciais e não realizava intervenção direta nas políticas de produção eminentemente
internas, salvo quando estás tinham efeitos explícitos no comércio. Entretanto, com a
Rodada Uruguai, as disposições específicas relativas à ajuda interna aos produtos agrícolas
foram disciplinadas. A idéia básica é que todas as proteções dadas ao setor agrícola sejam
catalogadas e convertidas em barreiras tarifárias, para estarem sujeitas aos compromissos de
redução firmados.
Entretanto, várias medidas de ajuda interna não estão sujeitas aos compromissos de
redução. Destacam-se as medidas de ajuda contempladas na Caixa Verde e na Caixa Azul.
A lista de exceções da Caixa Verde contempla as seguintes medidas:
• Serviços de apoio, tais como pesquisa, luta contra pragas e enfermidades, formação,
divulgação, inspeção, serviços de comercialização e promoção rural, e serviços de
infra-estrutura no campo;
• Constituição de fundos públicos com a fins de seguridade alimentar;
• Ajuda alimentar interna;
• Pagamentos diretos a produtores em caso de desastres naturais, bem como ajudas
destinadas a programas ambientais e programas de assistência regional.
A Caixa Azul contempla pagamentos diretos aos produtores para reduzir a oferta
interna de algum produto específico, com a finalidade de não deprimir o preço internacional,
bem, como, não utilizar a política de subsídios às exportações. A Caixa Amarela refere-se a
todas as políticas “proibidas” incluídas no cálculo das ajudas internas que têm efeitos
distorcivos sobre o comércio internacional, a exemplo dos preços mínimos, das políticas de
crédito subsidiadas, entre outras.
O que ocorre na prática, em termos de comércio internacional agrícola, é que os
países desenvolvidos, principalmente da União Européia, usam as medidas contempladas nas
Caixas Verde e Azul de forma indiscriminada, aumentando em várias circunstâncias o nível
de proteção do seu setor agrícola. Nesta direção, é que os países em desenvolvimento,
principalmente, os exportadores agrícolas, devem pleitear nas próximas rodadas de
negociação da OMC, limites quantitativos para estas caixas, bem, como, maior clareza,
critério e transparência na Caixa Verde, onde às vezes programas ambientais são apenas
formas disfarçadas de protecionismo.
Em relação às negociações a posição defendida pelo Brasil é centrada na não
discriminação do setor agropecuário em relação aos outros setores da economia. Para tanto,
foi elaborada proposta visando um mercado mais livre e concorrencial. As reivindicações que
o Brasil defende e pretende barganhar nas negociações posteriores está contida nos seguintes
conceitos:
1. Acesso a mercados: redução forte e rápida dos picos tarifários, através da aplicação de
fórmula apropriada que permita atacar também o problema da escalada tarifária, evitando
que permaneça a grande diferença entre os produtos pouco processados e os de maior
processamento.
2. Cotas: eliminação das cotas existentes até o fim do período de implementação dos
compromissos da nova rodada, prevalecendo para todas as importações uma tarifa não
superior à vigente para as cotas tarifárias.
3. Salvaguardas especiais: eliminação da cláusula de salvaguardas especiais para a
agricultura, incorporando o setor às salvaguardas gerais da OMC.
10

4. Subsídio às exportações: incorporação do tema às regras e disciplinas gerais da OMC a


que estão sujeitos os demais setores do comércio internacional.
5. Crédito às exportações: definir critérios para disciplinar estas operações no comércio
agrícola, tal como já existe para os demais setores, impedindo que sejam usadas para
distorcer a eficiência e a competitividade (GLEBA, 2000).
Com relação às medidas de apoio interno, as propostas brasileiras estão centradas nos
seguintes pontos:
1. Caixa amarela: reduzir o nível dos apoios internos concedidos aos limite previsto na
cláusula de mínimis, ou seja, 5% do valor da produção para os países desenvolvidos e
10% para os países em desenvolvimento;
2. Caixa verde: como o Brasil notifica a OMC políticas classificadas como tal e tem
interesse em preservá-las, propõe-se a continuidade destas políticas. Todavia, devido ao
elevado montante de gastos notificados ao amparo da caixa verde, é imprescindível rever
os critérios de enquadramento destas políticas, avaliando-se até que ponto não provocam
realmente distorções no mercado (efeito riqueza);
3. Caixa azul: devido aos seus efeitos distorcivos sobre o mercado, propõe-se a incorporação
destas políticas no cálculo da Medida Global de Ajuda, ficando sujeitas a compromissos
de redução.
Historicamente, os países desenvolvidos vêm obtendo muitas conquistas nas
negociações multilaterais pela sua maior capacidade negociadora e estrutura institucional.
Por isso, houve um avanço substancial em temas do seu direto interesse, como: i) direitos de
propriedade intelectual; ii) normatização de inversões estrangeiras; iii) liberalização dos
serviços financeiros e telecomunicações; iv) comércio eletrônico; v) produtos de tecnologia
da informação. Por outro lado, os compromissos assumidos para a liberalização dos
mercados agrícola e têxtil e do vestuário asseguraram as economias mais avançadas um tempo
considerável para sua reestruturação interna, maior do que o conquistado pelos países em
desenvolvimento para introduzir as mudanças legislativas, normativas e institucionais para
cumprir seus compromissos assumidos na Rodada Uruguai.
Por outro lado, há um aspecto que permanece praticamente inalterado no cenário
econômico internacional: a divisão internacional do trabalho. Além dos países desenvolvidos
se especializarem em produtos de alta tecnologia, e dominarem os serviços financeiros e de
telecomunicações no mundo, entre outros, exigem e conseguem nas negociações
multilaterais a liberalização destes setores; o país em desenvolvimento, particularmente, os
latino americanos, tem sua especialização exportadora em bens e serviços intensivos em
recursos naturais, trabalho e agronegócio, que competem com setores sensíveis nos países
industrializados, que por sua vez conquistam largos períodos para ajustamento e
reestruturação produtiva.
Basicamente, os países em desenvolvimento enfrentam duas espécies de problemas,
uma de ordem estrutural onde com sua especialização em produtos intensivos em recursos
naturais limita sua capacidade de competição ampliada e de geração de novas tecnologias. Por
outro lado, nos setores que demonstra vantagens comparativas explícitas, no caso dos
produtos agropecuários, tem grandes barreiras na sua inserção internacional.
Os países mais ricos do mundo que integram a Organização Para a Cooperação e o
Desenvolvimento Econômico (OCDE) estão mantendo níveis muito elevados de subsídios
para proteger sua agricultura interna. Na Tabela 5, fica bastante evidente que os países
desenvolvidos, principalmente União Européia e Japão concedem elevados níveis de
subsídios para seus agricultores, causando assim uma séria distorção no comércio
internacional agrícola.
11

Tabela .5 - Países da OCDE: Subsídio equivalente ao produtor (PSE) por hectare (em
dólares)
Países 1997 1998 1999
União Européia 815 890 831
Estados Unidos 73 116 129
Japão 10.211 10.005 11.792
Austrália 3 3 3
Nova Zelândia 10 6 7
Fonte: OCDE (2000)

O relatório de avaliação das políticas agrícolas adotadas nestes países, em 1999,


confirma o recrudescimento do protecionismo agrícola mundial, ao contrário do que era de se
esperar com a implementação do Acordo Agrícola da Organização Mundial do Comércio
(OMC). O conjunto das políticas de apoio à agricultura dos países da OCDE atingiram o
valor de US$ 361,5 bilhões, em 1999, registrando aumento de 2,7% sobre os US$ 352,1
bilhões apurados no ano anterior. Nos últimos três anos, os subsídios cresceram quase 10%,
demonstrando o avanço do protecionismo agrícola dos países ricos no período. O valor
apurado em 1998 representa cerca de 40% da receita agrícola total, contra 31% em 1997,
retornando aos elevados subsídios praticados em meados da década de 1980, antes da
implementação do Acordo Agrícola da OMC (GLEBA, 2000A).
Portanto, a agricultura do mundo desenvolvido é atualmente subsidiada em quase US$
1 bilhão por dia, sendo que cada produtor recebe anualmente, em média, subsídio equivalente
a US$ 11 mil. Este aumento do protecionismo ocorreu em função da queda generalizada dos
preços internacionais das commodities. Devido às políticas internas de suporte de preços, a
mesma redução não ocorreu redução nos preços domésticos nos países da OCDE. Conforme
a média da OCDE, o total da receita bruta foi 66% mais alto do que se a produção tivesse sido
vendida aos preços do mercado mundial e sem apoio orçamentário (GLEBA, 2000A).
Diante a este cenário muitos países interessados em expandir suas exportações
agrícolas encontram grandes dificuldades, por isso almejam regras do comércio agrícola
internacional ainda mais eficazes e transparentes. Conforme os dados descritos
anteriormente, verifica-se que a agricultura segue estando altamente protegida em muitos
países, notadamente nos países europeus, com todos os custos que isto implica para governos
e consumidores. O Grupo Cairns, formado por países com competitividade internacional nos
produtos agrícolas, entre os quais Brasil e Argentina, tem pressionado sistematicamente nas
negociações multilaterais que envolvem o setor agrícola para promover oportumidades de
acesso ao mercado para suas exportações.
Há uma questão intrigante no contexto das negociações comerciais multilaterais que
precisa ser mais bem esclarecida. Se a maior parte dos países ricos gastam muitos recursos
públicos para manter seu setor agrícola “sobrevivendo” diante da concorrência internacional
e, em várias circunstâncias, até mesmo exportando para os próprios países que demonstram
vantagem comparativa no setor, onerando o contribuinte e até mesmo promovendo a
alocação ineficiente dos recursos escassos, por que insistem em manter elevados níveis de
proteção e relutam no nível multilateral realizar ajustes rápidos para uma maior abertura ao
comércio internacional? Em outros termos porque os países desenvolvidos protegem o setor
agrícola de forma intensa? Guardaria o setor agrícola algumas características especiais que
justificaria estes elevados níveis de proteção?
O principal argumento dos países desenvolvidos, principalmente União Européia e
Japão, no contexto das negociações multilaterais estão relacionados com os problemas
12

alheios ao comércio, especificamente a necessidade de proteger o meio ambiente e a


segurança alimentar. Estes temas têm sido debatido cada vez mais no contexto do comércio
internacional em diferentes foros, onde se destaca a viabilidade das comunidades rurais e seus
modos de vida, ou seja, a multifuncionalidade da agricultura. Os defensores desta tese
afirmam que esses atributos da agricultura constituem externalidades positivas e bens
públicos, produzidos conjuntamente com alimentos e fibra, derivando-se o argumento de que
a agricultura merece maior apoio e proteção como pago adicional por esses serviços.

5 – Análise do protecionismo agrícola dos países desenvolvidos com ênfase nos produtos
Existem distinções no subsídio e na proteção tarifária por produto agrícola de forma
específica? Particularmente, verifica-se que os níveis de proteção tarifária dadas aos
produtos agrícolas de forma individualizada também é bastante elevada, tanto nos EUA
quanto na União Européia. Entretanto, é importante observar que os níveis proteção
tarifária pela União Européia ainda são muito mais significativos do que no caso norte-
americano (Tabelas 6 e 7).
Tabela 6 – Estados Unidos: Proteção de determinados setores agropecuários em 1999
(percentagens)
Descrição Tarifa média Pico tarifário
Produtos lácteos 22,3 42,2
Açúcares e artigos para 15,7 168,7
confeitaria
Cacau e suas preparações 14,7 191,5
Preparados a base de cereais 19,0 151,7
Preparações alimentícias 14,9 109,8
diversas
Tabaco 53,3 350,0
Fonte: OMC (1999)

Tabela 7 – União Européia: Proteção de determinados setores agropecuários em 1999


(percentagens)
Descrição Tarifa média Pico tarifário
Leite e nata 59,3 116,6
(creme)
Queijo e 60,2 97,6
requeijão
Banana 64,2 143,0
Trigo 76,8 106,1
Milho 48,7 97,5
Arroz 92,3 136,3
Açúcar 61,8 90,6
Carne de animais 107,5 119,0
Fonte: OMC (1999)
Verifica-se que às importações dos produtos agrícolas são muito protegidas.
Enquanto os níveis de proteção média da economia norte-americana é 5,7% e da européia
10%7, as tarifas cobradas pelos produtos agropecuários são bastante superiores. Por
exemplo, na importação de produtos lácteos os europeus tem uma tarifa média de 59,3%,
enquanto cobra um pico tarifário que chega a 116,6%. Ressalta-se que nos países

7
Ver dados da Tabela 3.
13

desenvolvidos, a cobrança de picos tarifários nas importações de produtos agrícolas e muito


mais regra do que exceção.
Verifica-se na tabela 8 que os produtos lácteos desde 1986 são os mais subsidiados no
mundo. Estes produtos são responsáveis no ano de 1998 por US$ 53,4 bilhões do apoio
global, seguido pela carne bovina (US$ 28,9 bilhões), arroz (US$ 22,5 bilhões) e o trigo
(US$ 22,1 bilhões).
Tabela 8 - Estimativa de apoio ao produtor em países da OCDE por produto (em US$
milhões)
1986-88 1991-93 1996-98 1997P 1998P

US$mn 18 425 20 963 18 950 17 126 22 108


Ecu mn 16 799 17 048 16 252 15 105 19 769
Trigo
Porcentagem 48 46 36 34 45
PSE¹ 1.96 1.86 1.57 1.51 1.80

US$mn 12 406 10 605 8 030 7 796 10 599


Ecu mn 11 372 8 588 6 947 6 876 9 478
Milho
Porcentagem 40 30 20 20 28
PSE 1.68 1.43 1.26 1.24 1.39

US$mn 27 072 28 250 28 446 28 015 22 452


Ecu mn 24 606 22 903 24 088 24 709 20 076
Arroz
Porcentagem 81 81 74 73 74
PSE 15.46 5.21 3.91 3.72 3.81

US$mn 6 653 7 654 5 300 5 216 6 148


Sementes Ecu mn 5 941 6 178 4 557 4 601 5 498
oleaginosas Porcentagem 31 31 18 17 22
PSE 1.45 1.47 1.23 1.21 1.28

US$mn 5 122 6 327 5 025 4 959 5 275


Açúcar Ecu mn 4 662 5 125 4 302 4 374 4 717
(Ref. Equiv.) Porcentagem 50 50 39 38 43
PSE 2.02 1.99 1.64 1.60 1.75

US$mn 43 977 49 261 48 949 44 919 53 344


Ecu mn 40 217 39 977 41 867 39 619 47 700
Leite
Porcentagem 59 56 52 49 58
PSE 2.51 2.29 2.08 1.96 2.35

US$mn 255 371 168 170 138


Ecu mn 231 301 142 150 124
Cana
Porcentagem 6 14 7 7 8
PSE 1.06 1.16 1.08 1.07 1.08

US$mn 246 561 292 055 258 984 245 546 273 649
Ecu mn 224 178 236 922 221 460 216 572 244 697
Todos os produtos
Porcentagem 41 39 33 32 37
PSE 1.69 1.65 1.50 1.47 1.59

Fonte: OCDE - Base de dados8. ¹ PSE (por hectare)

O setor agrícola é altamente protegido nos países desenvolvidos, principalmente


8
Citado por KONANDREAS (1999: 27)
14

pela União Européia. Os principais mecanismos de proteção estão associados à cobrança


de tarifas elevadas, subsídios a produtores locais e subsídios às exportações. Assim, os
países em desenvolvimento, que não têm condições de oferecer subsídios aos seus
produtores, restam duas alternativas: 1) negociar multilateralmente, nas rodadas da OMC,
a redução sistemática dos mecanismos protecionistas dos países desenvolvidos, ampliando
o conceito de multifuncionalidade da agricultura considerando às diferenças entre países
ricos e pobres ou 2) abrir processo antidumping, com o aval da OMC, para aplicação de
tarifas compensatórias.
Segundo BERNARDES, NOGUEIRA NETTO E MUSTEFAGA (2000) o Brasil e
os demais países que constituem o Grupo de Cairns9, estão buscando uma completa e
rápida eliminação de todas as formas de subsídios às exportações no âmbito da
Organização Mundial do Comércio. De acordo com as regras atuais da OMC, apenas para
os produtos agrícolas ainda é permitido subsidiar exportações.
Os pontos que estão sendo defendidos pelos países interessados em um comércio
internacional agrícola menos distorcido e mais justo, entre eles o Brasil, são os seguintes:
1. Tornar ilegal todos os subsídios referentes à exportação.
2. Reduzir os níveis de suporte doméstico permitido pelas leis da OMC, especialmente
naqueles países com alto nível de suporte.
3. Aumentar e melhorar o acesso ao mercado.
4. Eliminar barreiras técnicas ao comércio exterior, incluindo medidas sanitárias que não
tiverem base científica. Os países estão fazendo uso crescente dessas medidas para
bloquear importações.
5. Evitar que programas de crédito para exportação sejam usados como subsídios
disfarçados.
6. Impedir a utilização indiscriminada das regras da cláusula de salvaguarda para a
importação.
Os subsídios às exportações agrícolas desestabilizam os mercados, deprimem os
preços internacionais e deslocam da produção eficientes fornecedores não-subsidiados. O
uso crescente de subsídios e dumping nas exportações impede a maior evolução do
agronegócio nos países em desenvolvimento. Assim, devido a ampla proteção que os
países desenvolvidos impõe aos produtos agrícolas, resta aos países pobres e exportadores
de produtos agrícolas uma árdua negociação no contexto multilateral. Infelizmente, a
diplomacia econômica brasileira está enfraquecida nas negociações multilaterais, devido a
extensa abertura comercial feita no país no início da década de 90.

6. Conclusões
Durante o último século o mundo viveu, com algumas curtas interrupções, um
processo de forte abertura comercial. Este processo é retratado historicamente pelo fato
das tarifas de importação terem uma queda de 93,4% entre 1930-2000. Enquanto em 2000
os níveis de proteção média da economia norte-americana foi 5,7% e da européia 10%, as
tarifas cobradas pelos produtos agropecuários são bastante superiores. Nos EUA, União
Européia e Japão as tarifas médias aplicadas no setor agrícola industrial são
respectivamente, duas, quatro e seis vezes maior que as tarifa médias no aplicadas no
setor industrial. O grande protecionismo dos países desenvolvidos ao setor agrícola,
mesmo com todo o processo de negociação realizado através das rodadas do GATT e
OMC , fica mais evidenciado quando se observam os picos tarifários praticados nestes

9
Grupo de países exportadores agrícolas que têm interesses de liberalização do comércio internacional de
produtos agrícolas.
15

países, nos EUA chegam a 350%, na União Européia a 800% enquanto no Japão
chega a 900%.
O setor agrícola passou a ser efetivamente considerado nas negociações multilaterais
do GATT, apenas com o início da Rodada Uruguai, já no final dos anos 1980. Entretanto,
mesmo com as reduções propostas pela Rodada Uruguai, ressalta-se que os países
desenvolvidos aplicam tarifas muito maiores no setor agrícola do que no setor industrial. Por
isso é extremamente necessário que se prossiga às negociações multilaterias no comércio
agricola, pois além das tarifas para produtos agrícolas serem comparativamente elevadas,
existem outros problemas relacionados com a implementação dos acordos existentes na
administração do sistema de cotas tarifárias, no acesso mínimo aos mercados e no
cumprimento de compromissos de redução de apoios e subsídios a exportação.
Historicamente, os países desenvolvidos vêm obtendo muitas conquistas nas
negociações multilaterais pela sua maior capacidade negociadora e estrutura institucional.
Por isso, houve um avanço substancial em temas do seu direto interesse, como os direitos
de propriedade intelectual e a liberalização dos serviços financeiros e telecomunicações.
Por outro lado, os compromissos assumidos para a liberalização dos mercados agrícola e
têxtil e do vestuário asseguraram as economias mais avançadas um tempo considerável
para sua reestruturação interna, maior do que o conquistado pelos países em
desenvolvimento para introduzir as mudanças legislativas, normativas e institucionais para
cumprir seus compromissos assumidos na Rodada Uruguai.
Os países em desenvolvimento devem formular suas políticas comerciais, a partir
do principio de defesa comercial, dado os elevados níveis de proteção dos países
desenvolvidos. Mas no caso brasileiro , a partir do início da década de 90, foi adotada
uma política comercial liberalizante em todos os setores da economia com o objetivo de
desfrutar dos benefícios da abertura comercial. Particularmente, esta política não atentou
que os custos deste processo poderia desequilibrar suas contas externas e, particularmente,
que liberalizar o comércio agrícola per si não é promover a eficiência alocativa, uma vez
que o setor agrícola é altamente protegido pelos países desenvolvidos.

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mal do século na atividade leiteira. Brasília, CNA, 2000.
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