PUBLICIDADE, BEBIDAS ALCOÓLICAS E RESPONSABILIDADE SOCIAL
Por Álvarez Dantas, psicólogo.
A Associação Brasileira das Agências de Publicidade – ABAP – veiculou, em 2008,
propaganda visando minimizar a pressão social sobre a publicidade de cervejas no Brasil, afirmando que esta não é “a culpada pelos irresponsáveis que dirigem embriagados, pelos criminosos que vendem bebidas a menores, pelos covardes que praticam violências de qualquer espécie”. Não se pode, de fato, dizer que a publicidade de cervejas é a culpada pelos problemas sociais expostos na propaganda da ABAP; não é a única responsável por todos os danos causados pela ingestão abusiva de álcool. Há diversos outros fatores que necessitam ser elencados, e igualmente citados como co-responsáveis, por exemplo estes: o baixo nível (ou mesmo a falta) de autocontrole por parte de quem consome bebidas alcoólicas; a ausência de escrúpulos dos próprios fabricantes deste tipo de produto, os quais, interessados em ampliar seu mercado consumidor, lançam mão de estratégias e ações visando o aumento das vendas; a conivência da sociedade, que em muitos casos, inclusive, estimula o consumo (como no caso dos pais que incentivam seus filhos a beber, antes até destes chegarem à adolescência). Apesar de não ser a única responsável, a publicidade tem, para este autor, peso considerável no agravamento dos problemas relacionados ao consumo abusivo de bebidas alcoólicas, uma vez que é em grande parte através dos apelos publicitários que um determinado produto consegue se inserir no mercado consumidor e abrir margem frente aos concorrentes, conquistando um determinado público-alvo. Eis alguns exemplos de apelos utilizados pelas agências de publicidade para a indução da compra de bebidas alcoólicas: virilidade (o mais comum, bastando o(a) expectador(a) crítico(a) observar a quantidade de propagandas com mulheres bonitas atraídas por homens bebendo essa ou aquela marca de cerveja); bem-estar (diversos reclames associando o consumo de destilados ao relaxamento, requinte e/ou sucesso); diversão (anúncios fazendo menção de que, bebendo, a festa estará completa, será melhor aproveitada). Os apelos publicitários relacionados às bebidas alcoólicas (e a outros produtos também) visam principalmente manipular as emoções (desejos) dos consumidores, transformando-as em “necessidades” urgentes, em aditivos imprescindíveis; promovem lavagens cerebrais sutis e grosseiras, tolhendo a liberdade de escolha e de manifestação dos(as) incautos(as). Eis um exemplo: este autor já ouviu, por diversas vezes, conhecidos afirmarem que não conseguem ir a determinados eventos sociais e não ingerirem bebidas alcoólicas. Sentem como se algo estivesse faltando para tornar a balada atrativa. As conseqüências mais evidentes do investimento em publicidade de bebidas alcoólicas estão fartamente descritas nas estatísticas nacionais e mundiais, por exemplo: o consumo atingindo faixas cada vez maiores da população, notadamente os adolescentes e, não raro, crianças (em parte em função do lançamento das bebidas destiladas do tipo ice, adocicadas e de gosto mais palatável); a ampliação do consumo per capta de cerveja no mercado brasileiro; o número descabido de mortes no trânsito causadas por motoristas embriagados; o aumento na quantidade de casos de alcoolismo ou outras patologias relacionadas ao uso contínuo e abusivo de álcool; o aumento significativo do número de casos de violência doméstica tendo como atores principais pessoas alcoolizadas. As agências de publicidade e os publicitários são tão responsáveis pelos problemas causados pelo consumo abusivo de álcool quanto as indústrias de bebidas alcoólicas, pois aqueles formulam ideias e ações visando atender às demandas destas de ampliação do mercado consumidor e dos lucros. E esta ampliação se traduz em mais consumidores, e em estes consumindo mais bebidas. Este autor não pretende eximir, porém, a responsabilidade das pessoas que consomem bebidas alcoólicas e cometem os mais diversos atos contra si próprios ou contra os outros. São estas pessoas que, em virtude da frequente ausência de discernimento e de reflexão quanto ao que compram e aos atos que cometem, se deixam manipular pelos anúncios publicitários e/ou pelas companhias. O álcool etílico é uma substância psicoativa, um tipo de droga, cuja comercialização e consumo são legalizados no Brasil. Em sua volta surgem consideravelmente mais pesquisas comprovando os danos que causa do que as que especulam benefícios. E os prejuízos causados são uma das extremidades de um longo processo, que se inicia com a fabricação das bebidas alcoólicas. Conclui-se, deste modo, que a responsabilidade em relação aos problemas advindos do consumo de bebidas alcoólicas é de todos os que, direta ou indiretamente, fazem parte desta cadeia: os que produzem, divulgam e comercializam este produto, e, principalmente, os que o consomem (e financiam todo o processo). Para finalizar, gostaríamos de deixar aqui, caro(a) leitor(a), uma sugestão: se for dirigir, não beba; e se for beber, reflita.