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A AUTORIDADE POLICIAL, O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO E O

DIREITO CONSTITUCIONALMENTE ASSEGURADO AO PRESO DE SER


ASSISTIDO (DEFENDIDO) POR ADVOGADO.

José Pedro Zaccariotto, Delegado de Polícia em Sorocaba,


professor de Ética Policial e de Direitos Humanos da Academia
de Polícia. Pós-graduado em Direito Constitucional, leciona
Ciência Política, Direito Administrativo e Direitos Humanos da
UNIP/Sorocaba.

A abordagem que adiante se seguirá tende suscitar no leitor uma positiva


reflexão acerca do sentido de uma dentre as várias providências que cotidianamente
se repetem em nossas Delegacias de Polícia, e que, como quase todas as demais
que nesse âmbito tem vez, pode ser adotada de duas formas distintas, a saber : 1ª)
burocraticamente, apenas em homenagem à letra da lei, sem nenhuma preocupação
com o alcance do efeito almejado pela norma; ou, 2ª) em diapasão fidedignamente
jurídico, finalisticamente, em obediência ao espírito do comando legal invocado,
assim colimando a eficaz e justa aplicação do Direito.1

A meditação que temos por alvo, como certamente já pode ser entrevisto,
atine à legitimidade e ao seu entranhamento no exercício das atividades policiais
judiciárias, as quais, a confirmarem sua compatibilidade constitucional, ao menos
neste Brasil de início de terceiro milênio, deverão projetar-se muito além do mero
legalismo. José Afonso da Silva bem procede à devida distinção : “O princípio da
legalidade, num Estado Democrático de Direito, funda-se no princípio da
legitimidade, senão o Estado não será tal”. Depois, citando D’Entrève, ainda
esclarece :

“’Legalidade e legitimidade cessam de identificar-se no


momento em que se admite que uma ordem pode ser legal
mas injusta’. Propõe, por isso a recuperação do liame entre
legalidade e legitimidade, sob bases diferentes, a partir do
abandono da noção puramente formal da legalidade, definindo-
a como ‘a realização das condições necessárias para o
desenvolvimento da dignidade humana’, como quer nossa
Constituição (art. 1°, III), pois o ‘princípio da legalidade não
exige que somente as regras e as decisões que compõe o
sistema sejam formalmente corretas’. Ele exige que elas sejam
conforme a certos valores, a valores necessários ‘à existência

1
Como proclamavam os romanos, “Scire legis nos est verba earum tenere, sed vim ac potestatem”
(conhecer a lei não é compreender suas palavras, mas seu alcance e força).
de uma sociedade livre’, tarefa exigida expressamente do
Estado brasileiro (art. 3°, I)”. 2

E a somar com esse propósito, dando um melhor norte à busca


empreendida, elegemos como a principal premissa deste trabalho uma já antiga
ponderação de Bobbio, que advertia que o grande e grave problema enfrentado em
relação aos direitos humanos já não mais aludia à sua defesa e correspondente
fundamentação – mesmo porque, lembramos, encontram-se estes profusa e
magnanimamente positivados na maioria das Constituições contemporâneas -, mas
reportava-se sim à necessidade e à emergência de se lhes garantir respeito e
proteção e promoção efetivos. 3

Nessa esteira chamamos a atenção para uma questão que, como


procuraremos demonstrar, persiste a reclamar adequada solução concreta,
porquanto no plano teórico pouco ou mesmo quase nada resta a ser discutido ao
seu respeito. Atentemos, pois, para o disposto no art. 5°, LXIII, da Constituição da
República : “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de
permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de
advogado;” (grifamos e negritamos).

Como se vê, trata-se de texto claro, direto e peremptório, cujo teor deveria
ser incapaz de semear dúvidas razoáveis ou de levantar plausíveis incertezas, ao
menos aos operadores do Direito. Trata-se, na verdade, de um comando de fácil
entendimento (o que não quer dizer, saliente-se desde já, simples atendimento), o
qual tem por destinatários aqueles detentores do dever-poder de proceder à prisão
de alguém, donde avulta familiar a figura do delegado de Polícia.

Desse cânone tem-se, pois, e de forma transparente, que exsurge impositivo


à autoridade policial dispensar atendimento ao mirado mandamento da Lei Magna,
assegurando, como textualmente empregado, a vertente assistência jurídica àquele
que se encontra na iminência de se ver recolhido na prisão. Observe-se que
estamos cuidando de uma situação absolutamente corriqueira em nossas
Delegacias, onde se sucedem, diuturnamente, autuações flagranciais que, na sua
quase totalidade, redundam no encarceramento do preso.
2
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª rev. e atual.. São Paulo :
Malheiros, 2005, p. 242.
3
BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro:
Campus, 1992, p. 25 e ss.
Assentado tal fato, de todo inelutável, devemos então, para o correto
equacionamento da questão posta, contemplar uma dentre as três veredas possíveis
de serem trilhadas a partir da peculiar deixa da autoridade policial, a qual dando
cumprimento à versada ordem constitucional informa o preso sobre o seu direito de
se ver assistido por um advogado durante a lavratura em apreço, daí havendo de
colher, como lógicas respostas : 1ª) não, o preso não pretende exercer tal direito; 2ª)
sim, deseja receber essa assistência, indicando advogado para essa finalidade; e,
3ª) sim, aspira com sofreguidão ao exercício desse direito, porém desconhece algum
causídico, não sabendo declinar quem possa assisti-lo durante a correspondente
lavratura.

Pois bem, nos fixemos nesta terceira hipótese: o que restará a ser então
providenciado pela autoridade policial? Cremos que possa ser tranquilamente
percebido o delineamento de uma conjuntura verdadeiramente preocupante,
concernente a real dificuldade de se assegurar assistência jurídica, mediante o
concurso de advogado, àqueles que, nos termos constitucionais, a ela fazem jus na
esfera dos procedimentos de polícia judiciária.

Em casos da espécie, que infelizmente não são poucos, assoma a


dificuldade da autoridade policial em fazer cumprir a telada garantia constitucional,
havendo de recorrer, no mais das vezes, e por falta de absoluta opção, àqueles
profissionais integrantes de seu circulo de amizade, porquanto os únicos sempre ou
quase sempre dispostos a prestar-“lhe” o necessário “auxílio”, e de forma
indefectivelmente graciosa (sem onerar o preso), notadamente nas madrugadas e
nos finais de semana (quando o vertente problema induvidosamente se maximiza).

É de se notar que quando caracterizamos, como acima, a episódica


presença do advogado na Delegacia como um ato de auxílio à autoridade policial –
deixando por vezes sua família, sua casa, por vezes o sono ou compromissos
sociais para assistir um “estranho” (não um cliente ou um conhecido) durante uma
lavratura flagrancial - decididamente divisamos duas inexoráveis circunstâncias,
sendo a primeira concernente ao fato de que nada, senão sua boa vontade, poderia
obriga-lo ao atendimento do “convite” formulado, enquanto a segunda diz respeito à
uma possível impropriedade funcional, cujo cometimento se dá com a ultimação da
autuação prisional à margem do atendimento daquele que manifestou seu desejo de
exercer o direito focado. 4

Sem embargo da valia dessa “colaboração”, alavancada sempre pela boa


vontade e pela liberalidade, certamente impende-nos convir que a tutela da
liberdade e da legalidade não pode, à sua eficaz promoção, permanecer na
dependência de amadorismos, gentilezas, pessoalidades ou de quaisquer outras
razões destituídas de caráter eminentemente cidadão.

E não bastasse isso, cabe ainda não olvidar das múltiplas implicações que
podem decorrer dessa espécie de “auxílio”, que talvez possa e venha a ser até mal
interpretado – de forma leviana, mediante a sugestão, por exemplo, de alguma
espécie de favorecimento pela autoridade ao amigo advogado, aliciando potenciais
clientes – e identificado como expediente violador da impessoalidade5 e/ou da

4
É de se assinalar que a jurisprudência parece orientar-se no sentido de que o desrespeito ao direito
do preso em se ver assistido por advogado não conduz à nulidade da prisão, porquanto, como já
aduzido, o atendimento desse comando constitucional não pode ser confundido com “condição de
validade do flagrante” (TACRIM-SP. 9ª C. – HC – j. 5.5.93 – Rel. Marrey Neto – RT 703/294). Vide a
respeito julgados colecionados por Maurício Zanóide de Moraes na obra Código de Processo Penal
e sua Interpretação Jurisprudencial (coordenação de Alberto Silva Franco e Rui Stocco. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 1999, vol. 1, p. 295-296). Interessante, contudo, ponderar que da
Súmula 523 do Supremo Tribunal Federal - No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade
absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu“- pode-se
depreender uma possibilidade de anulação até mesmo do processo cuja origem remonta à prisão em
vista da qual teria ocorrido a telada omissão, desde que uma vez comprovado que dela
indefectivelmente teria ocorrido a vulnerabilidade da atividade defensiva como um todo (vide a
respeito Ada Pellegrini Grinover, Antonio Scarance Fernandes e Antonio Magalhães Gomes Filho no
clássico As Nulidades no Processo Penal, editora Revista dos Tribunais). Retornando ao plano
prático, merece ser transcrita recente decisão que traz um novo prisma para a visualização da
questão posta : “Processual penal - furto qualificado - nulidade - prisão em flagrante - flagrante
impróprio - ausência de advogado – requisição do paciente. Inexiste nulidade na prisão em flagrante
de acusado que se escondeu em um matagal, sendo localizado horas depois do delito. De outro lado,
a ausência de advogado por ocasião da lavratura do flagrante não nulifica o ato quando o paciente é
informado de seus direitos constitucionais e expressamente declara que se reserva no direito de só
falar em juízo. Ordem denegada. STJ - HC 24510/MG ; Habeas Corpus 2002/0120613-3 – Rel. Min
Jorge Scartezzini- 5ª. T. - 6/3/2003 – unânime - DJ 02.06.2003 p. 310.”. Por derradeiro, e de qualquer
forma, não se pode duvidar que a vertente desatenção, ao menos hipoteticamente, possa levar à
responsabilização ao menos disciplinar do seu autor.
5
Como explicado por Paulo Magalhães da Costa Coelho, “o princípio da impessoalidade não veda
que a Administração faça discriminações. A vedação incide sobre a possibilidade de descrímens
fundados em razões pessoais” (Manual de Direito Administrativo. São Paulo : Saraiva, 2004, p.
50).
moralidade6, princípios diretivos das atividades administrativas7 cuja inobservância
teoricamente reverbera em preceitos proibitivos da legislação penal e nos cânones
conformadores de improbidade, consoante Lei n° 8.429/92, que em seu art. 11
afirma constituir “ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios
da Administração Pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de
honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições”.

Como é de fácil inferência, suspeita dessa natureza poderia decorrer da


recorrência exclusiva, pela autoridade policial, a um advogado determinado ou a
reduzido grupo dentre os muitos profissionais dessa classe, em vezo alimentado
justamente por relação de amizade.

Essa possibilidade, mesmo se remota, em nada milita em favor da boa


imagem e da credibilidade institucionais, nos parecendo de bom alvitre aqui recordar
da parêmia da mulher de César, à qual não bastava ser honesta, devendo, para
muito além, sempre demonstrar ser possuidora dessa virtude. O mesmo há de ser
dito daqueles responsáveis pela justiça e segurança públicas, os quais
necessariamente - ao resguardo da respeitabilidade da autoridade da qual foram
investidos e a bem da confiabilidade que se faz fundamental ao êxito das atividades
que se lhes incumbem desempenhar - devem se apresentar, sempre e em quaisquer
circunstâncias, honrados, acima de qualquer suspeita.

É certo, contudo, que esse não é o único ponto que deve ser focalizado,
cabendo ainda lançar luzes – jamais apriorísticas dúvidas, frise-se bem - sobre a
qualidade e/ou a efetividade da assistência prestada por aqueles que se movem sob
a propulsão única – quando o caso – de um sentimento de estima e/ou de
consideração pessoal voltado ao ser humano pois, ao fulano ou sicrano titular de
um cargo público. Não percamos de vista, uma vez mais, que estamos nos referindo

6
Celso Antonio Bandeira de Mello, deslindando o âmbito e o conteúdo da moralidade administrativa,
pontifica : “Segundo os cânones da lealdade e da boa fé, a Administração haverá de proceder em
relação aos administrados com sinceridade e lhaneza, sendo-lhe interdito qualquer comportamento
astucioso, eivado de malícia, produzido de maneira a confundir, dificultar ou minimizar os direitos por
parte dos cidadãos” (Curso de Direito Administrativo. 17ª ed. rev. e atual.. São Paulo : Malheiros,
2004, p. 109).
7
Consoante ensinava Sérgio Marcos de Moraes Pitombo, “a polícia, enquanto judiciária, e o inquérito
que ela faz, exsurgem administrativos, por sua atuação e forma, mas judiciários, nos seus fins”
(Arquivamento do Inquérito Policial – Sua Força e Efeito. Inquérito Policial : Novas Tendências.
Belém : CEJUP, 1986, p. 22). Daí depreende-se que as autoridades policiais, no exercício da
focalizada função, acham-se absolutamente presos à força cogente dos princípios dirigentes da
Administração Pública.
a chamamentos, por assim dizer, que ao menos em boa parte das vezes são
formulados no período noturno, nas madrugadas, em finais de semana e feriados,
ou seja, em momentos próprios tão-somente ao recesso e ao descanso
profissionais.

Neste caso, poderíamos até chegar a cogitar da funcionalização da


assistência que nessa esteira seria prestada, porquanto não lastreada
precipuamente no profissionalismo, mas sim num ato de cordialidade. Embora
tratando-se de possibilidade remota, correr-se-ia assim o risco de uma prestação
desinteressada, superficial, como que em cumprimento apenas de uma formalidade.
E como certamente ninguém há de discrepar, no que tange à possibilidade de
violação a um direito individual não se pode e nem se deve correr risco de espécie
alguma.

Devemos convir, ademais, que o quadro posto retrata uma situação


insolitamente profissional, qual mais se evidencia se verificarmos que são os presos
de menor ou sem nenhuma capacidade econômica que, ao menos em regra, deixam
de identificar, a guisa de indicação, o seu pretenso patrono, e assim em face do
simples fato de não possuírem, por força de seu natural circulo de relações – como
igualmente ocorre com seus familiares, que por vezes levam dias até concluir uma
contratação – o conhecimento de algum advogado.

Obviamente não é nossa intenção – longe disso ! – deslustrar ou subestimar


a virtuosa classe dos advogados, com a qual sempre mantivemos as mais elevadas
e cordiais relações possíveis. De outra parte, é sim nosso intento ensejar, por meio
destas modestas reflexões, um debate acerca do tanto que se afigura possível ser
feito com vista a otimização desta anômala conjuntura, que em face de tantas
facetas desfavoráveis indiscutivelmente não faz justiça aos abnegados profissionais
envolvidos, ainda podendo eventualmente ressumar, ante a dinâmica que se lhe
apresenta natural, em insuficiente, insatisfatória ou até mesmo prejudicial
assistência prestada ao indivíduo preso (o que equivalerá à falta de assistência e,
por essa via, ao descumprimento do imperativo constitucional pela autoridade
policial, à qual recai o dever de assegura-la8).

8
Com esse sentido assegurar significa, conforme se depreende do Dicionário Eletrônico Houaiss da
Língua Portuguesa, “tornar (algo) infalível, garantido, seguro; dotar (ação ou evento) de garantias”.
O que, destarte, pretendemos remete à dotação, à autoridade policial, de
condições concretas e eficientes para bem atender ao comando constitucional em
tela, assegurando - em letra e espírito – a assistência jurídica instituída à garantia
dos direitos individuais do preso. Confiamos, nesse sentido, no coincidente interesse
da digna classe dos advogados, que induvidosamente tenciona garantir a efetiva,
pronta e profissional participação de seus membros – ao largo de alguma conotação
de quebra-galho – também na administração da fase primária da justiça criminal.
Outro, aliás, não é o entendimento possível ante as previsões contidas na Lei nº
8.906/94, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do
Brasil – OAB, e em especial em seus artigos:

“2º. O advogado é indispensável à administração da justiça.”; e,


“44. A Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, serviço
público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa,
tem por finalidade:
I - defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado
democrático de direito, os direitos humanos, a justiça
social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida
administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e
das instituições jurídicas;” (negritamos).
Ora, o exercício advocatício não se constitui numa função estóica, cuidando-
se de atividade profissional que, como tal, exige condigna remuneração. De efeito,
não aludimos a mercenarismo, mas sim a profissionalismo, onde os honorários
configuram a justa contraprestação pelos serviços prestados9. Não é de hoje que no
Estado de São Paulo os advogados que militam na chamada Assistência Judiciária,
defendendo graciosamente os interesses daqueles que não podem arcar com os
custos de um processo judicial, são recompensados pelo erário, assim graças a
convênio nesse sentido celebrado pela Procuradoria Geral do Estado e pela Ordem
dos Advogados do Brasil – Secção de São Paulo.10

Salienta-se que a cláusula primeira dessa avença prevê a prestação de


“assistência jurídica integral” (textual) e gratuita à população carente do Estado.
Todavia, um plano de trabalho que integra o ajuste parece ter limitado essa atuação,

9
Manifestamos nossa concordância com o douto asserto de Euro Bento Maciel, que reportando-se às
prerrogativas do advogado cita “a percepção de justa remuneração por sua relevante e indispensável
atuação profissional, o que parece óbvio, posto terem os honorários, além de sua nobreza, inclusive,
nítida feição alimentar” (apud Rogério Lauria Tucci. Direitos e Garantias Individuais no Processo
Penal. 2ª ed. rev. e atual.. São Paulo : RT, 2004, p.92).
10
Vide os termos desse ajuste no sítio da Procuradoria Geral do Estado:
www.pge.sp.gov.br/convenios.
pois a tabela de honorários fixada através do parágrafo segundo da cláusula quinta
remete apenas aos serviços prestados junto ao Poder Judiciário.

Bem se vê, dessa forma, que a nossa discorrida pretensão poderia ser
celeremente satisfeita com a inclusão, no visado convênio e em seu correspondente
anexo, de dispositivo jungido ao pleno atendimento do contido no art. 5°, inciso
LXXIV, da Lei Fundamental, “in verbis”: “o Estado prestará assistência jurídica
integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”.

Imaginemos a situação em que se encontrará aquela autoridade policial que,


após informar ao preso em flagrante delito o seu direito de ser assistido por
advogado, a teor do inciso LXIII do art. 5° do Estatuto Político, vier a colher a
seguinte resposta : “eu desejo ter o acompanhamento de um advogado, mas não
conheço nenhum profissional desse ramo e sequer tenho dinheiro para pagar pelos
seus serviços”. Hoje, que opção restará, em caso tal, ao delegado de Polícia,
senão contar com o generoso e desapegado concurso de algum advogado
conhecido ou amigo, ou ainda recorrer àqueles causídicos – se porventura
existentes – cuja atuação fazem por amoldá-lo aos contornos do conhecido epíteto
“de porta de cadeia” ?

E não caminhar nessa direção parece equivaler à pura e simples


desconsideração da vigente Constituição, mediante o desprezo de seus valores
primaciais, com destaque à dignidade da pessoa humana, à liberdade e à igualdade,
pilares do Estado Democrático de Direito fundado em 1988.

Importa lembrar que a prisão em flagrante delito não se consubstancia a


míngua de devida autuação, exigindo elaboração procedimental - hodiernamente
assentada como relevante instrumento de garantia dos direitos individuais11 -, em
11
José Alfredo de Oliveira Baracho enfatiza a importância procedimental, destacando : “a) o
procedimento juridifica a atuação administrativa, submetendo-a a regras ou pautas formais; b) o
procedimento permite aos cidadãos conhecer, anteriormente, o desenvolvimento da atuação
administrativa, garantindo assim a defesa dos seus direitos e interesses frente a ela”. Depois
arremata: “A implantação do procedimento, assentado na predeterminação do devido processo, foi
grande conquista do Estado de Direito, com sujeição da Administração à lei e ao direito. Ocorre,
paradigmaticamente, a efetivação das exigências da democracia, de conformidade de procedimentos
que garantem os direitos inerentes à cidadania. Visa-se servir de garantia dos direitos dos
administrados e a obtenção da maior eficácia das decisões administrativas, propiciando a
democratização dos mecanismos da administração. As garantias visam excluir a vontade arbitrária da
atuação despótica do poder.” (Teoria geral dos procedimentos de exercício da cidadania perante a
administração pública. Revista dos Tribunais. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, n. 743, p.
38-39, XX.XX).
contexto destinado a patentear a existência ou não de fundadas razões
autorizadoras da privação da liberdade de locomoção. Como cediço, a restrição a
esse direito, máxime como medida de ordem cautelar, sempre deverá estar jungida,
num Estado realmente democrático, a uma excepcionalidade, eis que aí a regra a
ser considerada é o ser e permanecer livre12. Segue daí, pois, absolutamente claro
que negligenciar, de qualquer forma, o cumprimento dos cânones constitucionais
instituídos à defesa desse direito – tal como descuidar da prestação de assistência
jurídica integral ao preso - corresponderá a um atentado contra a essência
procedimental e, nessa linha, contra a própria ordem democrática que a inspira e
patrocina, assim por solapar, como acima registrado, seus instrumentos e valores
fulcrais.

Outra não é a óptica de Rogério Lauria Tucci, que a respeito da assistência


prestada ao preso pelo advogado aduz, com a propriedade que se ostenta peculiar :
“Esta (...) não deve ser concebida ‘como assistência passiva, de mero espectador
dos atos praticados pela autoridade policial e de seus agentes, mas, sim,
assistência técnica, na acepção jurídica do termo, qual seja a atuação profissional
de advogado’, legalmente habilitado.” 13

E ampliando ainda mais esse panorama, pronuncia-se também com


exatidão Carlos Henrique Borlido Haddad:

“O indiciado pode ser atingido nos seus direitos pessoais e


reais logo que o inquérito instaura-se. A presença do defensor
é necessária, pois a defesa não começa com a acusação
formal. É do conhecimento geral que entre o início do inquérito
policial e o começo da instrução criminal medeiam dias,
semanas ou meses. Se o defensor não atuar na fase
12
“Sendo a proteção dos direitos individuais naturais a fonte de toda ordem jurídica, o seu fim
teleológico, uma condição, inclusive, para a possibilidade de convivência social harmônica, livre de
repressões gratuitas ou preconceituosas, o processo penal se consubstancia, dentro de sua esfera,
sobretudo em um instrumento de tutela da liberdade, impondo limites ao Estado, e não simplesmente
em um mecanismo que vise, tão-só, assegurar aos órgãos e agentes Estatais meios para a
descoberta da verdade e para viabilizar a punição ou a imposição de medida de segurança àqueles
que tenham violado a lei penal” (DELMANTO JUNIOR, Roberto; DELMANTO, Fábio Machado de
Almeida. A Dignidade da Pessoa Humana e o Tratamento Dispensado aos Acusados no Processo
Penal. Revista dos Tribunais. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, n. 835, p. 446-447,
05.2005).
13
LAURIA TUCCI, Rogério. Op. cit., p. 350. Interessante, ademais, aprofundar-se nos aspectos mais
inovadores dessa propugnada assistência técnica, sendo que aqui, como mero estímulo,
consignamos tese absolutamente reveladora: “Por outras palavras, essa atuação, como
constitucionalmente delineada, deve ser ‘efetiva’, balizada na contraditoriedade indispositiva, ínsita ao
processo penal na integralidade da persecutio criminis, com o exercício da defesa técnica, na sua
maior amplitude, liberalmente preconizada no inc. LV do art. 5°” (ibidem, p. 350).
inquisitória, muitos elementos de interesse para a defesa não
chegarão à fase contraditória e, mesmo confiando na
autoridade policial, cujos atos presumem-se revestir de
legalidade, não seria exagero imaginar, ao menos, o uso de
critério seletivo de provas. Se é certo que o indiciado sofre
limitações nos seus direitos e liberdades durante o inquérito
policial, a defesa técnica põe-se como entrave aos abusos e
excessos, ao garantir a autenticidade dos atos praticados e a
lisura do procedimento administrativo. O indiciado ao ser
interrogado em sede extrajudicial, deve estar acompanhado por
defensor, pois se trata de irrecusável direito que lhe socorre : a
ampla defesa não se confunde com o contraditório e se este é
excluído da fase inquisitória, o mesmo não ocorre com
aquela”.14

Pois é com precisão que afiança Winfried Hassemer que se “o direito


processual penal não é outra coisa senão direito constitucional aplicado”, como já
dito e reiterado por tantos publicistas, “isto vale com mais ênfase no tocante às
medidas de força do inquérito policial”. 15

Indispensável aqui assinalar que a Delegacia Seccional de Polícia de


Sorocaba já fez conhecer à Subsecção local da Ordem dos Advogados do Brasil seu
posicionamento e suas preocupações acerca do tema aqui ventilado, em
oportunidade da qual se serviu também para o endereçamento de rogo concernente
à solução, mesmo doméstica e provisória - mediante a organização de um rol oficial
de membros dispostos à prestação impessoal e profissional da assistência discorrida
-, às questões nessa vaza suscitadas. Antes que uma resposta, recebemos a notícia
que nossa missiva fora encaminhada à consideração da Procuradoria de Assistência
Judiciária.

No entanto, não muito depois, no âmbito das IV Jornadas Brasileiras de


Direito Processual Penal - evento promovido pelo Instituto Brasileiro de Direito
Processual, em Guarujá/SP, entre os dias 6 e 9 de novembro de 2004 -, fazendo
parte da assistência, tivemos a oportunidade de assistir a professora Ada Pellegrini
Grinover concitar as autoridades policiais a cumprirem correta e denodadamente as
normas constitucionais realizadoras das garantias individuais. Quando nos foi
concedido um aparte - tão-logo possível solicitado -, pudemos expender à insigne

14
HADDAD, Carlos Henrique Borlido. O novo interrogatório. Revista Brasileira de Ciências
Criminais. São Paulo : RT; n. 55, p. 246-247.
15
HASSEMER, Winfried. Segurança pública no estado de direito. Tradução de Carlos Eduardo
Vasconcelos. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: RT : Instituto Brasileiro de
Ciências Criminais, n. 5, p 62.
mestra sobre a encimada iniciativa, dando-lhe a conhecer, de um lado, as
dificuldades do exercício policial judiciário, notadamente quando executado aos
finais de semana e no período noturno, e de outro o empenho com que os
delegados de Polícia majoritária e normalmente se hão com o escopo de executar
suas funções dentro dos adequados parâmetros técnicos e jurídicos.

Nessa oportunidade foram estabelecidas tratativas a fim de que, de posse


de cópia da referida proposição sorocabana, procedesse a nossa ilustre interlocutora
ao seu encaminhamento aos superiores órgãos da OAB/SP, colimando providência
no sentido de se oferecer consentâneo equacionamento ao grave problema
detectado. Assim certamente aconteceu, uma vez que meses depois logramos
receber participação daquela direção profissional dando conta da transmissão da
nossa proposta à Procuradoria Geral do Estado.

E agora, diante do todo exposto, perguntamos: o que se esperar da


Procuradoria de Assistência Judiciária? Do ponto de vista legal, cremos que a
resposta à discutida vindicação deva ser positiva, mesmo porque a Lei
Complementar n° 478/86, em seu art. 29, III, dispõe que esse órgão deve prestar
orientação jurídica aos legalmente necessitados também no âmbito extrajudicial. 16

Contudo, como perceptível, para depois da decisão técnica ainda restaria a


implementação das rotinas decorrentes, o que, de qualquer maneira, demandaria
um bom tempo até a devida concretização da prestação em pauta, sendo que para
hoje e para amanhã, malgrado a urgência do requesto, nenhum avanço poderá ser
aguardado.

Embora inegavelmente frustrante, parece-nos que essa constatação, antes


de provocar ou de servir como desculpa para alguma espécie de apatia, vem a
impor, em sentido bastante diverso, o despertar das autoridades policiais para o
problema posto, que envolve, ademais, uma série de outras questões tocantes ao
exercício policial judiciário, especialmente remetendo ao imprescindível debate, em

16
É de se ter em vista que o projeto de lei complementar n° 18/2005, que objetiva organizar a
Defensoria Pública paulista, prevê, em seu art. 5°, VII, como uma dentre as várias atribuições desse
órgão, o dever de “atuar nos estabelecimentos policiais, penais e de internação, inclusive de
adolescentes, visando assegurar à pessoa, sob quaisquer circunstâncias, o exercício dos direitos e
garantias individuais”.
contexto amplificado, sobre as dimensões e as oportunidades da defesa no inquérito
policial.

Com esse sentido, e fazendo uma necessária intersecção temática,


consignamos trechos de duas decisões do Pretório Excelso que poderiam levar o
leitor, num primeiro momento, através de abordagem meramente literal, a concluir
que a encimada perquirição já se acha respondida, pois vejamos:

“O Estado não tem o dever de manter advogados nas


repartições policiais para assistir interrogatórios de presos; a
Constituição assegura, apenas, o direito do preso ser assistido
por advogado na fase policial” (HC 73.898-2 – Rel. Min.
Maurício Correa – DJU 16.8.1996, p. 28.108).

“A nova Constituição do Brasil não impõe a autoridade policial


o dever de nomear defensor técnico ao indiciado,
especialmente quando da realização de seu interrogatório na
fase inquisitiva do procedimento de investigação. A lei
fundamental da República simplesmente assegurou ao
indiciado a possibilidade de fazer-se assistir, especialmente
quando preso, por defensor técnico. A Constituição não
determinou, em conseqüência, que a autoridade policial
providenciasse assistência profissional, ministrada por
advogado legalmente habilitado, ao indiciado preso. Nada
justifica a assertiva de que a realização de interrogatório
policial, sem que ao ato esteja presente o defensor técnico do
indiciado, caracterize comportamento ilícito do órgão
incumbido, na fase pré-processual, da persecução e da
investigação penais.” (1ª T. – RE 166239/SP, j. 7.4.92 – Rel.
Celso de Mello – RT 689/439).

Agora, a par dessas decisões, nem tão abrangentes nem mesmo recentes,
lancemo-nos à consideração ainda dos seguintes posicionamentos doutrinários, não
apenas convergentes mas também complementares, cujos irrefutáveis argumentos
bem se fazem úteis, em seu emprego dialético, a alimentar a reflexão colimada.

Vejamos, nesta senda, as conclusões de Marta Saad acerca do direito de


defesa na primeira fase da persecução criminal :

“Em razão dos inúmeros atos que acarretam restrição a


direitos constitucionalmente assegurados, tais como a prisão
preventiva, a prisão temporária, a própria prisão em flagrante
delito, a busca pessoal ou domiciliar, a apreensão, o arresto e
o seqüestro de bens, a quebra do sigilo fiscal, bancário e das
comunicações, o indiciamento, bem como diante da prática de
atos de instrução de caráter definitivo, que não mais se
repetem, deve-se reconhecer a possibilidade de exercício do
direito de defesa no inquérito policial.
O indiciado, ou formalmente acusado, deve ser reconhecido
como sujeito de direitos no curso do procedimento, e não ser
tratado como objeto, alheio ao inquérito.
A defesa pode ser encarada ora como direito ora como
garantia, pouca diferença, em termos substanciais, guardando
tal diferenciação. A defesa é direito individual, garantida por
institutos tais como o hábeas corpus e o mandado de
segurança. Mas é também garantia do exercício de outros
direitos, principalmente da liberdade jurídica.
O direito de defesa não se confunde com o contraditório.
Este exige partes e um sujeito imparcial e pressupõe o
exercício do direito de defesa. Mas o direito de defesa, para
seu exercício, independe da instauração do contraditório. A
defesa, que se exerce no inquérito policial, deve ser entendida
no seu sentido lato, como resistência, oposição de forças,
podendo o acusado se contrapor a todas as acusações que
pesem contra si, com a assistência de advogado, a
possibilidade de guardar silêncio e a admissibilidade de
produção de provas, indispensáveis à demonstração de sua
inocência ou de sua culpabilidade diminuída.” 17

Acerca das atividades cabíveis à defesa na fase do inquérito policial


preleciona Rogério Lauria Tucci :

“Como bem intuiu NAGIB SLAIBI FILHO, a esse respeito, a


assistência de advogado ’não significa a presença fiscalizadora
do profissional habilitado aos atos processuais, mas, sim, sua
interveniência no processo, pois senão não seria a advocacia
essencial à função jurisdicional. Ainda no inquérito policial ou
no auto de prisão em flagrante delito, tem o advogado poder
de reperguntar, requerer diligências e providências que achar
convenientes ao ato, sem prejuízo, é claro, da autoridade
processante deferir, ou indeferir, sempre com fundamentação,
o que lhe foi requerido.’
E concedida, induvidosamente – permitimo-nos
complementar -, ao defensor técnico do investigado, ou
indiciado, a utilização dos meios em lei previstos para
impugnar qualquer ato arbitrário da autoridade policial. “18
17
SAAD, Marta. O Direito de Defesa no Inquérito Policial. São Paulo : Editora Revista dos
Tribunais, 2004, p. 366. Vale ainda recordar a sempre lúcida lição de Sérgio Marcos de Moraes
Pitombo : “O inquérito policial civil ganharia, em eficiência, com a regular cooperação do exercício do
direito de defesa. A idéia não surge nova. Durante o ano de 1957, Joaquim Canuto Mendes de
Almeida, grande mestre processualista, lançou-a. Tanto que difundida recebeu severo combate na
doutrina e quase nenhuma repercussão nos julgados. O pensamento vencedor persistiu em assentar
que o inquérito policial desponta, em essência inquisitivo; contém, tão-só, investigação e se exibe
qual peça meramente informativa. O equívoco perdura desde há quarenta e dois anos. A Constituição
da República abriu o debate, a partir da afirmação: "aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os
meios e recursos a ela inerentes" (art. 5º, Inc. LV). Importa, pois, reexaminar o conceito de instrução
criminal, com os olhos postos na realidade sensível. Entender que, entre nós e não obstante a pouca
importância dada, não desapareceu a formação da culpa, como maneira de proteger a liberdade e a
honra dos indivíduos. Perceber a evidência de que, no inquérito policial, o suspeito e o indiciado não
se podem ver tratar como estranhos, excluindo-se o exercício do direito de defesa” (Inquérito policial:
exercício do direito de defesa. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.7, n.83, p. 14, out.1999.
18
Op. cit., p. 105.
Por derradeiro, mirando o devido processo penal, conclui Maria Tereza
Rocha de Assis Moura :

“A justa causa para a ação penal de natureza condenatória,


no Direito brasileiro, não sobressai apenas dos elementos
formais da acusação, mas, também e de modo principal, de
sua fidelidade para com a prova que demonstre a legitimidade
da acusação.
Desta conclusão emana que não basta que a peça
acusatória impute ao acusado conduta típica, ilícita e culpável.
A denúncia ou queixa deve guardar ressonância e estrita
fidelidade aos elementos que lhe dão arrimo, sem o que não
passará de ato arbitrário, autoritário, que a ordem jurídica não
pode tolerar.
Segue-se, ainda, que a necessidade da existência de justa
causa para a acusação serve como mecanismo para impedir,
em hipótese, a ocorrência de imputação formal infundada,
temerária, caluniosa e profundamente imoral.” 19

Destas últimas conclusões extrai-se a cristalina e inequívoca importância do


inquérito policial, cujo teor, na esmagadora maioria das vezes, exclusivamente tem o
condão de revelar a existência ou não de legitimidade para a deflagração do
processo criminal. Quanto a este, não esqueçamos, já foi sobejamente tido e
reconhecido, quer pela doutrina, quer por seleta jurisprudência, como uma
verdadeira fonte de sofrimentos e de variegadas dificuldades para o réu (e
inegavelmente também para seus familiares), o que, por si só, deveria gerar ao
indivíduo o direito de defesa com vista a não ser injustamente denunciado.

Posto isso, e mirando a dinâmica própria ao Direito, cabe-nos por fim


ressaltar que a legislação processual penal também tem evoluído, qual bem atestam
as inovações trazidas pela Lei n° 10.792/03, pertinentes à reforma do interrogatório.
Dentre tais novidades, segundo identificaram alguns doutos juristas - vide Carlos
Henrique Borlido Haddad, retro citado – encontrar-se-ia aquela que determina a
presença do defensor em todo e qualquer interrogatório, inclusive o policial
(assegurando-lhe, ademais, entrevista prévia e reservada com o acusado).

Nesse sentido, em especial, o magistério de Ada Pellegrini Grinover, que


afirma que a nova lei “ampliou a garantia constitucional do inciso LXIII do art. 5° da
Constituição, em que a presença do defensor era tratada como mera faculdade”. E
completa : “Militam a favor desse entendimento não só o art. 6°, V, do CPP, como

19
MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a Ação Penal. São Paulo : Editora
Revista dos Tribunais, 2001, p. 292.
também o enfoque do processo administrativo do inquérito policial à luz do disposto
no art. 5°, LV da Constituição”. 20

Parece-nos providencial, neste momento, trazer a claro que o direito do


preso contar com a assistência de advogado constitui uma das garantias básicas do
“fair trail” norte americano, ditada, ainda no ano de 1966, pela Suprema Corte no
famoso caso Miranda vs. Arizona. Maria Garcia, fazendo referência ao vertente
“case”, informou que “a Suprema Corte decidiu que um suspeito não pode ser
interrogado pela polícia a não ser que queira e que ele tem o direito de ter um
advogado presente todo o tempo e ter informações.”21

Destarte, aquilo que foi acima tratado como uma novidade não aflora, na
verdade, ao menos no cenário jurídico internacional, como algo original ou
extraordinário. Não nos parece, até por esse motivo, que os comentados avanços
possam se cuidar de mudanças tão difíceis de se aceitar como juridicamente
razoáveis, mormente quando nos encontramos num Estado constitucionalmente
definido como Democrático de Direito, comprometido com a dignidade da pessoa
humana, que nos direitos fundamentais encontra o seu ponto mais alto e de
convergência.

Com essa colocação, convite último ao questionamento, chegamos ao fim


de instigante vereda adrede trilhada, renovando nossa proposta, dirigida de modo
especial às autoridades policiais, para que se ponham à meditação acerca da
temática abordada, a fim de buscarem, de forma acendrada e inteligente, um sentido
cada vez mais meritório e dignificante para as funções que se lhe são inerentes,
mediante a atual e benfazeja perspectiva democrática, que oferece aos homens,
como pensa Bernard Edelman, “’pólvora e balas jurídicas para os dissuadir de
empregar fuzis”. 22

20
GRINOVER, Ada Pellegrini. O Interrogatório como Meio de Defesa. Revista Brasileira de Ciências
Criminais. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, n. 53, 2005, p. 191-192. Vide, também, com
esse entendimento, Fernando Augusto Henrique Fernandes, em Interrogatório Contraditório no
Inquérito Policial, Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.12, n.138, p. 6, mai.2005.
21
GARCIA, Maria. O Devido Processo Legal e o Direito de Permanecer Calado. A Tortura. Cadernos
de Direito Constitucional e Ciência Política. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, n. 20, p.
104, jul.set.1998.
22
EDELMAN, Bernard. Universalidade e Direitos do Homem.Processo Penal e Direitos do Homem.
Rumo à concientização européia. Organização de Mirelle Delmas-Marty. Barueri : Manole, 2004, p.
128.

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