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FEAD

Direito
Empresarial

Belo Horizonte
2011
Aula 1 – O conceito e a história do Direito Empresarial

Objetivos

• Identificar o contexto histórico em que o Direito Empresarial nasceu e se desenvolveu.


• Detectar o objeto do Direito Empresarial em momentos históricos diversos.
• Compreender a dinâmica temporal e sua influência na criação e no desenvolvimento do
comércio.

Introdução

Olá, caro aluno!

Começaremos agora uma jornada através dos tempos para compreendermos, juntos, a
importância do Direito Empresarial para a sua profissão. Espero que a jornada seja tão
prazerosa pra você quanto para mim!

Para a compreensão legítima do Direito Empresarial precisamos entender o seu contexto


histórico original, com o nascimento do comércio. Ao longo de nosso estudo também
procuraremos compreender os vários momentos que esse ramo do direito atravessou, até
chegar aos dias de hoje.

DA HISTÓRIA

O comércio, em seus primórdios, era considerado como uma atividade degradante.


Considerado como arte dos escravos, na Grécia Antiga, era alvo de preconceito por parte dos
greco-romanos, tendo em vista a precariedade de suas operações. Com a queda do império
Romano, houve a divisão do mundo (?) em duas partes: oriente e ocidente. O Império Bizantino
promoveu, por Justiniano, o Corpus Iuris Civilis1, diploma em que foram congregadas as
principais contribuições mercantis das civilizações antigas.

William Turner
Porto de Cowes, Ilha de Wight

Com o deslocamento das pessoas para os povoados das regiões litorâneas da Europa,
desenvolveu-se o comércio marítimo no Mediterrâneo. Os navios desbravavam mares,
transportando gêneros em abundância e trazendo de outras terras produtos diversos. As
Cruzadas facilitaram o intercâmbio cultural e também mercantil.
Já o comércio terrestre caminhava mais lentamente, concretizado nas feiras medievais, que se
iniciaram com a troca de mercadorias (o chamado escambo). Com o decorrer do tempo,
surgiram algumas dificuldades nesse tipo de comércio. Nem sempre o produto que era
desnecessário para um grupo e que, por isso, estava disponível para a troca se mostrava útil a
outro grupo que, entretanto, podia dispor de bens indispensáveis aos primeiros.

Chegou-se, desse modo, à contingência de se criar uma mercadoria capaz de ser permutada
por qualquer outra e não apenas, como acontecia na troca, por um bem determinado. Surge
então a moeda.

Fonte: http://www.bcb.gov.br

Com a evolução das feiras, originaram-se as corporações que criaram suas próprias leis e
juízes particulares (chamados cônsules). As várias normas a serem aplicadas pelos cônsules
eram reunidas e transferidas para os chamados Estatutos das cidades.

Em meados do século XI apareceram as primeiras codificações estritamente comerciais,


reunidas em Estatutos: Consuetudines (Gênova, 1055), Constitutum Usus (Pisa, 1161), o Liber
Consuetudinum (Milão, 1216) e as súmulas marítimas de arbitragem.

No século XVI aparecem, na França, o Guidon de la Mer (comércio marítimo) e o Code Savary
(comércio terrestre). Ainda na Idade Média, foram reconhecidos como contratos comerciais os
de transporte, comissão, sociedade e seguro marítimo. Outro marco importante nessa época,
que você deve identificar, é a separação entre o Direito Comercial e o Direito Civil (direito
comum, direito dos cidadãos – Ius Civile), com o qual, conforme acontecia em Roma, o
primeiro era unificado. O Direito Comercial passou a ser constituído por um conjunto de normas
específicas, aplicadas por um juiz especial e reconhecidas pelo Estado como legítimas.

Foi na França que nasceu o primeiro Código Comercial, o Code de Commerce, dos juristas de
Napoleão Bonaparte, em 1807, marcando o abandono do subjetivismo corporativista e
apegando-se à implantação da objetividade dos atos comerciais.

Fonte: Jean-Auguste-Dominique Ingres. Portrait of Napoléon on the Imperial Throne


1 - Ao lado da religião, o direito romano ajudou a manter a unidade e a ordem imperial.
Justiniano percebeu a importância de salvaguardar a herança do direito romano e,
aproveitando a prosperidade econômica e comercial que lhe proporcionavam as novas
conquistas, empreendeu um importante trabalho legislativo e de recompilação jurídica. A
recompilação e reorganização das leis romanas tornou-se um dos marcos mais notáveis de sua
administração, confiado a um colégio de dez juristas dirigido por Triboniano, cujos trabalhos
duraram dez anos. Essa obra ficou conhecida como Corpus Iuris Civilis

Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Justiniano_I#O_Corpus_Iuris_Ciuilis.

Apesar de não haver inovado muito em matéria de Direito Comercial, conservando quase tudo
o que dispunham as Ordenanças de Comércio Terrestre, de 1673, e da Marina, de 1681, e não
obstante o desenvolvimento comercial que se verificava, dando lugar à criação de regras
jurídicas para aplicação nos casos concretos, o Código de Comércio francês teve grande
influência nas legislações, principalmente nas dos povos latinos. O diploma redigido por
Choptal tornou-se modelo das modernas codificações mercantis, inclusive do Código Comercial
Brasileiro de 1850.

No Brasil, a produção e o comércio são regidos, inicialmente, pelas Ordenações Portuguesas,


designadamente pelas Ordenações Filipinas, que passaram a viger no princípio do século XVII
(1603) e somente deixaram de se aplicar às atividades mercantis com a edição do Código
Comercial, em 1850, quando era Imperador D. Pedro II. Nascia, em 25 de junho de 1850, uma
das normas mais duradouras da história brasileira: sua primeira parte, dedicada ao comércio
em geral, esteve em vigor até 11 de janeiro de 2003, quando passou a ter vigência o Código
Civil de 2002. Sua segunda parte (Comércio Marítimo) ainda está em vigência, e a terceira
parte (das quebras) foi revogada pelo Decreto-lei 7.661/45. Outras legislações foram surgindo
durante esse tempo, principalmente no que diz respeito aos títulos de crédito (ex: Dec.
2044/08, Lei Uniforme de Genebra, Lei das Sociedades Anônimas – Lei 6404/76, dentre
outras).

Num mundo moderno, saturado de conceitos e informações como o nosso, a codificação


perdeu um pouco a razão de ser. Não apenas pelo grau de dificuldade que encerra, mas
sobretudo pelo trabalho enorme de avaliação do ordenamento jurídico. Muitas nações,
principalmente aquelas já inseridas no conceito de globalização já optaram por legislações
concisas e objetivas, que podem ser adaptadas utilizando-se de boas regras de hermenêutica.

Fonte: www.eurooscar.com
Cabe aqui relembrá-lo de que, apesar de todo esse contexto histórico que aparentemente
legitima o comércio, não se pode ignorar a natureza especulativa dessa arte. O comerciante ou
determinado empresário sempre visa vender por mais o que adquiriu por menos, muito embora,
às vezes, em face de circunstâncias especiais, não obtenha lucros e sim sofra prejuízos com a
venda.

Daí buscar-se nesse ramo profissional a aderência natural ou o chamado “dom” de


comerciante. Sim, porque efetivamente o agente mercantil deve estar preparado para entrar em
um mundo bem diferente daquele com o qual está acostumado. Um mundo imbuído de uma
ética bem diferente da que é utilizada em atividades comuns do dia-a-dia, o que implica um
comportamento que exige vivacidade, esperteza e traquejo mercantil.

OBJETO DO DIREITO COMERCIAL

Nesta nossa trajetória que se inicia hoje, é necessário e demasiadamente importante


compreendermos que o Direito Comercial não é o mesmo de 100 anos atrás. Na verdade, nem
o mesmo de 10 anos atrás. É um ramo do direito muito especial que é bastante influenciado
pelo fator tempo. Em cada tempo, as relações mercantis ganham cores e nuances bem
diferentes.

A trajetória histórica do Direito Comercial pode ser concebida como um retrato dinâmico de
diversos referenciais utilizados para diagnosticar o que é ou o que não é mercantil. Essa noção
é efetivamente um “conceito viajante”. Isso significa dizer que é diretamente afetada pelas
circunstâncias históricas, devendo ser compreendida em uma perspectiva histórica.

É importante ressaltar a existência clara de três fases bem nítidas em que nós poderemos
enxergar a evolução normativa e a vivência do objeto comércio ou mercancia. Veja-as.

1) Fase subjetivista

Conforme já foi dito nesta aula, o homem, inicialmente, satisfazia-se com o que produzia. Mas,
com o passar do tempo, foram surgindo novas necessidades que não podiam ser satisfeitas
pelos grupos sociais isolados. Nasceu aí a troca de mercadorias e, com a criação da moeda,
instalou-se o processo de compra e venda.

Dessa forma, cresceu o número de pessoas especializadas na intermediação entre produtores


e consumidores. Num momento seguinte, com a evolução das relações comerciais, essa
intermediação ganhou o caráter de permanente, de prática repetida, que é o elemento
essencial para o exercício de qualquer profissão.

Como houve efetivamente o surgimento de uma classe, o Direito Comercial, nesse momento,
buscou amparar o comerciante.

A relação jurídica mercantil era definida pela qualidade do sujeito (o direito comercial como
direito de uma corporação profissional, a dos comerciantes).

Nesse momento, o direito comercial, conforme já mencionei,era um ramo jurídico iniciado e


desenvolvido por e para mercadores. Só aqueles matriculados nas corporações eram
comerciantes com acesso aos tribunais consulares (formados pelos cônsules, juízes
especializados em causas comerciais) e tinham aptidão para falência (insolvência comercial)2.

Os teóricos, nessa fase, encararam o Direito Comercial apenas como o ramo do Direito que
regulava as atividades dos chamados mercadores. Essa concepção do Direito Comercial não
existe mais. Poderíamos entender que o Direito do Comércio está efetivamente contido dentro
do Direito Comercial ou Empresarial, mas este compreende, igualmente, atos e operações que
não são realizados exclusivamente pelos comerciantes, podendo ser praticados por pessoas
não-comerciantes e com finalidade não-comercial.

2) Fase objetivista

O que você achou desse conceito de Direito Comercial exposto logo acima? Parece até um
pouco preconceituoso, não? Apenas os operadores do comércio poderiam usufruir das leis
mercatórias?

Até a Revolução Francesa, os comerciantes constituíam uma classe poderosa, que tinha
privilégios especiais em virtude de a ela serem aplicadas as regras jurídicas que não se
estendiam à coletividade. Ocorre que, sob os ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade,
esses conceitos classistas não poderiam mais prevalecer.

Com as transformações políticas, sociais e econômicas, frutos da organização da burguesia


(sob os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade), passou-se a perceber a inviabilidade de
um direito tão restrito. O jus mercatorum diferenciado, de raiz medieval, foi substituído pelo
direito igualitário, abstrato e unitário, calcado na prática de determinados atos classificados
como comerciais.

Vitoriosa a Revolução3, foram exterminados um a um os privilégios de classe. Nasceu então o


Código de Comércio, de 1807, que, além de definir o que é comerciante, estabeleceu uma lista
de atividades que seriam, a partir daquele momento, elencadas como comerciais, denominadas
“atos de comércio”.

O Direito Comercial passa a depender de um catálogo legal de atividades classificadas como


mercantis ou comerciais. O mais interessante é perceber que não houve qualquer pesquisa ou
estudo que justificasse a existência dessa lista, fruto de casuísmo4 e inflada de inconsistências,
o que revela pouca visão de futuro quanto à possibilidade de evolução de um ramo jurídico tão
dinâmico.

Apenas para nos identificarmos melhor com o tema, podemos trazer o exemplo do Brasil para
externamos o comportamento desta segunda fase.

Embora o Código Comercial de 1850 não tenha enunciado os atos de comércio, fazendo
menção apenas ao instituto da mercancia (sem conceituar tal instituto), seu coadjuvante legal,
o Regulamento 737, do mesmo ano, mencionou esses atos, com o intuito de fixar qual
efetivamente era o ato que deveria usufruir da proteção do Código.

Considera-se mercancia:

a) a compra, venda ou troca de bens móveis ou semoventes5, para vender por grosso6 ou
retalho7, na mesma espécie ou manufaturados, ou para alugar o seu uso;

b) as operações de câmbio, banco e corretagem, expedição, consignação e transporte de


mercadorias, de espetáculos públicos;

c) as empresas de fábricas, de comissões de depósito, de expedição, consignação e transporte


de mercadorias, de espetáculos públicos;

d) os seguros, fretamentos, riscos e quaisquer contratos relativos ao comércio marítimo;

e) a armação e expedição de navios.

O grande problema aqui foi determinar se o ato de comércio poderia efetivamente definir se
alguém é merecedor ou não de ser considerado comerciante. O ato de comércio não confere a
quem o pratica a qualidade de comerciante. Não imprime o caráter mercantil à atividade
profissional dirigida que dá aos atos praticados pelo empresário sua real especificidade.

2 - Por incrível que pareça, nem todos aqueles que atuam no mercado empresarial podem ser
tratados pela lei de falência. Quem tem uma sociedade simples, registrada em cartório, por
exemplo, não sofrerá a falência, mas sim o procedimento de insolvência civil do código de
processo civil.

3 - Revolução Francesa é o nome dado ao conjunto de acontecimentos que, entre 5 de Maio de


1789 e 9 de Novembro de 1799, alteraram o quadro político e social da França. Em causa
estavam o Antigo Regime (Ancien Régime) e a autoridade do clero e da nobreza. Foi
influenciada pelos ideais do Iluminismo e da Independência Americana (1776). A Revolução é
considerada como o acontecimento que deu início à Idade Contemporânea. Aboliu a servidão e
os direitos feudais na França e proclamou os princípios universais de “Liberdade, Igualdade e
Fraternidade” (Liberté, Egalité, Fraternité), frase de autoria de Jean Nicolas Pache.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%A3o_francesa

4 - “Casuísmo” aqui significa uma escolha aleatória, sem critérios, com base no calor do
momento vivido pelos revolucionários.

5 - Bens móveis são aqueles que podem ser removidos de um lugar para outro sem destruição.
As coisas de movimento próprio também são consideradas bens móveis. O cavalo, que é um
semovente, é um bem móvel.

6 - Venda por atacado.

7 - Venda no varejo.

3) Fase subjetivista moderna

Esta fase representa o momento atual do Direito Comercial, como fruto da evolução histórica.
Primeiro detalhe: ele ganhou um novo nome, Direito Empresarial. No nosso próximo tópico
entenderemos o porquê dessa mudança.

Na verdade, se você observar essas mudanças históricas, perceberá que foram sendo
construídas com base na expansão da atividade empresarial. Se, num primeiro momento,
proteger a classe mercatória era importante e também necessário, no segundo momento
histórico, sob o emblema de promoção de igualdade, houve efetivamente a expansão da
legislação, que já não escolhia o seu objeto, mas que já o tinha previamente definido.

Só que essa estrutura jurídica mostrou-se excessivamente obsoleta ao longo do século XX,
com o desenvolvimento da economia brasileira. Ficou claro que a velha compreensão do ato de
comércio, engessada pela listagem elaborada foi se tornando pouco operacional, pois não
contemplava várias atividades e negócios econômicos.

Fonte: www.morguefile.com
Neste terceiro momento, curiosamente, o grau de expansão desse ramo do Direito é máximo.,
O Direito de Empresa busca abranger todas as atividades organizadas economicamente para a
produção ou circulação de bens e serviços.

Hoje a crítica mais habitual a essa nova orientação é que, embora a empresa, em seu sentido
econômico, esteja definida, não se chegou ainda a um conceito jurídico da mesma. Ou ainda
poderíamos dizer que nem toda empresa é efetivamente comercial ou tem objeto comercial.

No Brasil, o legislador não ser preocupou muito em conceituar a empresa, resumindo-se a


ponderar que empresários e sociedades empresárias são aqueles que exercem
profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou
de serviços.

Nesta fase, a figura central é a do empresário em parceria com o elemento “empresa”.

CONCEITO DE EMPRESA

Devido à oscilação de uma economia mutante e a um direito saturado de positivismo,


chegamos a um estágio em que é fácil, mas incômodo, explicar por que o Direito Comercial
passou tanto tempo atrelado aos atos de comércio, já que, há muito, a realidade econômica se
adaptou à empresa e a seus desmembramentos.

A teoria que introduziu o conceito de empresa é a denominada teoria da empresa,


desenvolvida na Itália, em 1942. O contraste é tão grande que, em 1945, o Brasil adotava como
diploma para tratamento da falência empresarial o Dec. Lei 7661/45, que tinha como foco
principal a figura do comerciante individual. Na verdade, a insolvência comercial só veio ser
tratada com o foco na atividade ou empresa na Lei 11.101/05. O novo diploma, apesar de
deficiente, foca efetivamente seus dispositivos na atividade, tanto nas recuperações (judicial e
extrajudicial) como na própria falência. O empresário e sua atividade empresa são hoje o foco
do Direito Empresarial.

Daí também compreender que os grandes doutrinadores elaboraram conceitos de Direito


Comercial baseados no Direito daquele momento histórico em que viveram. Trouxe para vocês
a visão desses teóricos sobre “o que é direito comercial”, mas estejam cientes de que não
existem conceitos ultrapassados. Eles apenas remontam a um momento histórico do Direito
Empresarial, ok?

Vivante8 reconhece o Direito Comercial como “a parte do Direito Privado que tem
principalmente por objeto regular as relações jurídicas que surgem do exercício do comércio.”

De acordo com Rocco9, “...o Direito do Comércio, ou seja, o complexo das normas jurídicas
que regulam as relações derivadas da indústria comercial.”

Na visão de Ferreira10, “é o conjunto sistemático de normas jurídicas disciplinadoras do


comerciante e seus auxiliares e do ato de comércio e das relações dele oriundas.”

Mendonça11 aponta que “Direito Comercial é a disciplina jurídica reguladora dos atos de
comércio e, ao mesmo tempo, dos direitos e das obrigações das pessoas que as exercem
profissionalmente e dos seus auxiliares.”

Para Martins12, é “o conjunto de regras jurídicas que regulam as atividades das empresas e
dos empresários comerciais, bem como os atos considerados comerciais, mesmo que esses
atos não se relacionem com as atividades das empresas.”

O Código Civil brasileiro de 2002 concentra na empresa o foco do Direito Comercial, em que
pese o fato de ainda restarem resquícios da insistente personalização13 herdada do soterrado
conceito imperial de comerciante.
Um doutrinador mais moderno expõe essa mudança de eixo no Direito Empresarial. De acordo
com Fazzio Júnior14,

o Direito Comercial, ao menos no Brasil, como complexo normativo positivo, focaliza as


relações jurídicas derivadas do exercício da atividade empresarial. Disciplina a solução de
pendências entre empresários, bem como os institutos conexos à atividade econômica
organizada de produção e circulação de bens (contratos, títulos de crédito, insolvência, etc...).
Tem por objeto a empresa, como unidade serviçal do mercado cuja existência está amarrada
ao intuito de lucro.

Cabe ainda frisar que a empresa é um fenômeno dotado de muitas faces. Conforme já
estudamos, não existe ainda um conceito jurídico de empresa, mesmo porque seria um
conceito bem complexo, tendo em vista a multiplicidade de institutos que são envolvidos pela
empresa. Não seria possível considerá-la unitariamente, abrangendo todos os seus perfis
(subjetivo, funcional, objetivo e corporativo).

O Direito Comercial, portanto, apossou-se do conceito econômico de empresa e, com o Código


Civil de 2002, passa a regular a empresa por meio do empresário, a exemplo de seu modelo, o
Código Civil Italiano de 1942. A organização dos fatores de produção é realizada pelo
empresário ou pela sociedade empresária, na direção de uma atividade empreendedora, com o
escopo de lucro e a assunção dos respectivos riscos.

A instituição empresa não se faz presente em todos os institutos do Direito Comercial, mas,
com certeza, é um dos pilares dessa cadeira do Direito.

Bom, acredito que essa pequena excursão histórica pelo Direito Empresarial tenha, ao menos,
reforçado o seu interesse em compreender melhor este riquíssimo ramo do Direito...Vamos lá?
Mal posso esperar por nossa segunda aula!

Resumo

Nesta aula tivemos a oportunidade de fazer uma pequena viagem pela evolução do Direito
Empresarial. Em um primeiro momento visualizamos o tratamento dado pelos romanos àquele
que exerce atividade mercantil – atividade desprezada pelos grandes cidadãos romanos. Com
a queda de Roma, o escambo, prática já comum no mundo, transformou-se em meio de
sobrevivência.

Em seguida nos deparamos com a fase subjetivista do Direito Empresarial, momento em que
só poderia usufruir do regime legal o empresário, que na época era conhecido como mercador.
Era reconhecido como tal com base em características subjetivas.

Com a Revolução Francesa, em 1789, Napoleão aprovou o Code de Commerce, ícone no


tratamento do Direito Comercial, baseado em atos que diferenciavam os comerciantes dos
outros cidadãos franceses.

Hoje, vivenciamos a fase subjetivista moderna, na qual o empresário é aquele que realiza,
como profissão, atividade econômica organizada para produção e circulação de bens e
serviços.

Ufaaaaaaaa! Quanta história, não? Bom... Acho que ficou clara a importância da atividade
empresarial no contexto mundial!

Atividades

1) Qual era o conceito do cidadão romano da atividade hoje tida como empresarial?

2) Como você descreveria a fase subjetivista do direito empresarial?


3) O que eram os atos de comércio? Quem os inventou? Qual a importância destes no contexto
do desenvolvimento da atividade empresária?

4) O que é a teoria da empresa? Qual a sua importância para o Direito Empresarial? Quando
ela foi assimilada pelo Brasil?

5) Quem é, hoje, o sujeito do Direito Empresarial?


Aula 2 – As fontes do Direito Empresarial e sua autonomia

Objetivos

• Detectar as fontes do Direito Comercial no ordenamento jurídico brasileiro.


• Avaliar a existência efetiva da autonomia do Direito Empresarial em relação ao Direito Civil.
• Conhecer a efetiva base da teoria da empresa que forneceu os elementos para a parte
referente ao direito empresarial no Código Civil de 2002.

Introdução

Gostou de conhecer um pouco da história do Direito Empresarial? Agora fica mais fácil
compreender por que a mudança de Direito Comercial para Direito Empresarial, não? Podemos
então passar para o nosso próximo passo juntos: descobrir, em todo o ordenamento jurídico
brasileiro, onde podemos encontrar normas emanadas da empresa. Parece fácil? Com o seu
empenho ficará ainda mais fácil!

O que são fontes? São matrizes geradoras da ordem jurídica, como as respostas instrumentais
que a concretizam. Podemos ainda imaginar que nem sempre elas estarão dispostas no
mesmo nível. Guardam efetivamente um escalonamento de precedência, que lhes oferece
denominações diferentes, conforme o critério adotado.

FONTES PRIMÁRIAS

As fontes primárias, como o próprio nome diz, são as fontes originárias ou principais. A partir
delas chegaremos às fontes secundárias e outras. É o princípio legislativo do Direito
Empresarial.

Vejamos a mais importante delas.

LEI

A lei é a principal fonte de Direito Empresarial. Cabe aqui uma observação importante. A lei não
se resume exclusivamente ao seu texto. A arte da interpretação é o que concede à lei a
longanimidade e adaptação necessárias para que ela seja efetivamente útil.

Respeitando-se a hierarquia das leis, podemos perceber na Constituição Federal o núcleo


reitor programático da ordem jurídica, além de ela proclamar a supremacia da legalidade. Na
geografia constitucional, encontramos princípios de observância compulsória, tais como a livre-
concorrência, a defesa do consumidor, a função social da propriedade, o tratamento
privilegiado da empresa nacional, o predomínio da iniciativa privada na atividade econômica, a
proteção à microempresa, a vedação aos abusos do poder econômico e o aumento arbitrário
de lucros e regras disciplinadoras da competência legislativa para cada matéria. Aproveite o
momento e dê uma conferida no Art. 170 da Constituição Federal brasileira. Vale a pena
conhecer os Princípios Gerais da Atividade Econômica. Eles o ajudarão a compreender todo o
sistema em seguida, que está absolutamente calcado nesses princípios.

Outras fontes importantes:


- o Código Comercial de 1850, na parte não revogada, referente ao Comércio Marítimo;

- o Código Civil de 2002, no que tange a disciplina do Direito Empresarial;

- as Leis Extravagantes (títulos de crédito, falência, dentre outros temas);

- as normas pertinentes ao Direito Comercial dispostas em diplomas de outros ramos da ordem


jurídica. (Podemos tomar como exemplo a tributação do ato empresarial que está prevista na
CF/88 e também no Código Tributário Nacional. Outro exemplo: a relação entre empregador e
empregado dentro da empresa: Consolidação das Leis Trabalhistas.);

- a normatização regulamentar derivada do Estado;

- tratados e convenções internacionais.

FONTES SECUNDÁRIAS

As fontes secundárias, por sua vez, são alternativas para quando as fontes primárias não
existirem ou não forem suficientemente úteis. Vejamos algumas.

- Analogia: São fatos de natureza idêntica que devem observar disciplina idêntica. Tem como
fundamento a aplicação da eqüidade. É a busca do equilíbrio no julgamento. Se numa situação
X houve a aplicação da norma Y, em outra situação próxima, mas descoberta de legislação,
poderemos nos utilizar dessa mesma norma, sob o argumento de que situações iguais deverão
ser tratadas de forma idêntica.

- Usos e Costumes: Apesar da forte tendência na minimização de sua utilidade, fruto do


processo de globalização e da massificação de procedimentos, em termos de ordem jurídica
local não há como menosprezar os usos e costumes. São praxes adotadas no comércio de
maneira permanente. Para que sejam efetivamente considerados como fontes de Direito
Empresarial, devem ser assentados ou atestados em livros nas Juntas Comerciais.

Fonte: imagenswiki.blogspot.com

Vamos relembrar? Para que os usos e costumes sejam aceitos como fonte de Direito
Empresarial, eles deverão estar registrados nos Registros de Comércio (Juntas Comerciais) do
Estado em que haverá sua utilização. Mais à frente estudaremos mais profundamente esses
órgãos para entendermos melhor sua função. Estudaremos também os procedimentos para os
registros nos livros de assentos de usos e costumes.

Vamos agora falar um pouco dos Princípios Gerais de Direito. Fique atento!
Princípios Gerais de Direito: não geram normas, apenas revelam normatização implícita,
mediante inovação de idéias superiores reitoras do ordenamento.

São critérios maiores, que por vezes não serão nem escritos, existentes em cada ramo do
Direito e percebidos por indução. Por exemplo: existe o princípio, no Direito do Trabalho, de
que a lei deve proteger o trabalhador, logo o juiz, ao analisar a situação no processo, deve
estar atento ao fato de que o empregado é protegido pela lei porque a mesma presume que ele
não tenha condições de se defender sozinho, ou que, pelo menos, o empregador está mais
bem assessorado do que o empregado.

PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

Conforme alusão feita, nesta mesma aula, já sabemos que a Constituição Federal do Brasil,
legislação máxima existente em nosso país, é de grande importância para o Direito
Empresarial.

Já se perguntou por quê? Qual é a razão de o legislador ter se importado tanto com o
empresário ou com a sociedade empresarial? Ou com o sistema capitalista em que estamos
inseridos?

Para tudo existe uma explicação racional no Direito. O legislador encarou a situação da
seguinte forma: a produção de bens e serviços necessários à vida das pessoas em sociedade
será de competência da iniciativa privada, cabendo aos particulares o papel primordial e
ficando reservado ao Estado apenas uma função supletiva (Art. 170 da CF/88).

Interior de uma de uma fábrica


Fonte: http://commons.wikimedia.org

A interferência do Estado só será possível em hipóteses excepcionais – Art. 173 da CF/88:


quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo,
conforme definido em lei.

O Estado é responsável pelo suporte ao empresário, para que este possa realizar bem sua
função na sociedade. Ao atribuir à iniciativa privada papel de tal monta, a Constituição torna
possível, sob o ponto de visa jurídico, a previsão de um regime específico pertinente às
obrigações do empreendedor privado.

Se a ordem constitucional reserva ao empresário a primazia na produção, deve cuidar para que
ele possa se desincumbir plenamente dessa tarefa.
LEGISLAÇÃO ORDINÁRIA

Outra fonte riquíssima de estudos, que achei interessante desfrutarmos juntos é a legislação
ordinária empresarial.

Existe aqui a complementação de dispositivos constitucionais com caráter principiológico,


sempre coerente com a orientação liberalista no regramento da ordem econômica.

No âmbito da legislação ordinária, o direito complementa tais pressupostos constitucionais,


procurando garantir a livre iniciativa e a livre competição através da repressão ao abuso do
poder econômico e à concorrência desleal.

Acredite, esse regramento está disperso em várias leis, decretos, medida provisórias e
regulamentos. Por isso, antes de dar entrada no Código Civil de 2002, principal ícone do Direito
Privado, hoje, no Brasil, pensei em darmos uma passeada por duas regulamentações
importantes.

São elas:

- Lei 8.884, de 11 de Junho de 1994, que transforma o Conselho Administrativo de Defesa


Econômica – CADE – em autarquia, dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações
contra a ordem econômica e dá outras providências. Neste diploma legal estão definidas as
hipóteses que ensejam a caracterização de uma conduta de abuso do poder econômico (Arts.
20 e 21 da Lei 8.884/94). Aproveite o momento de dê uma olhadela nesses artigos da
legislação.

Para que se configure a conduta do Art. 21 da Lei 8.884/94, deverão também estar presentes
algum dos pressupostos do Art. 20 da mesma lei. O contrário não é verdadeiro: caso haja
ofensa ao princípio do Art. 20, mesmo que a conduta não esteja presente no Art. 21, também
será considerada ilícita. Logo, as hipóteses do Art. 21 são exemplificativas.

Você pode não acreditar, mas, para aplicar a punição por uma dessas condutas, o legislador
não está interessado na culpa e nem dolo de quem as pratica.

A culpa, como já deve ser de seu conhecimento, caracteriza-se pela presença de negligência,
imperícia ou imprudência. Na verdade, para simplificar, pense em culpa como tudo o que foge
ao comportamento natural do indivíduo.

Não ajudou muito, não é mesmo?

Isso é por que esses conceitos guardam certa subjetividade, mesmo que pequena. É preciso
conhecer o indivíduo pelo menos um pouco, para denunciar, em sua vida, em, seus atos e
expressões a presença de culpa.

O dolo já é efetivamente a vontade de lesar outrem. Uma lesão física, patrimonial ou mesmo
moral caracteriza a conduta afirmativa do indivíduo.

No caso dos delitos ligados ao abuso do poder econômico, não haverá necessidade de se
averiguar a presença de dolo ou culpa. Independentemente da vontade do indivíduo, ou da
falta dela, a objetividade de comportamento já enseja responsabilidade.

Vamos a um exemplo para simplificar um pouco: suponhamos que uma empresa X, para
prejudicar a concorrência ou livre iniciativa, fixa ou pratica, de acordo com seu concorrente
(empresa Y), sob qualquer forma, preços de venda de bens ou prestação de serviços. Isso, no
mercado, normalmente, recebe o nome de “dumping” comercial.

Ao analisarmos essa conduta, podemos abstrair que, independentemente da vontade ou da


inocência de X e Y, a conduta já é criminosa e está configurada nos termos dos artigos 20 e 21
da Lei 8.884/94.

E a punição? É eficiente mesmo? Claro, como sempre, isso dependerá do caso concreto.
Passe o olho pelo Art. 23 e 24 da mesma lei. O que você acha dessas penas? Como será a
melhor forma de aplicá-las?

Como eu, um profissional da área, poderia melhor assessorar um empresário ou uma


sociedade empresarial nessas situações? Na verdade, o melhor conselho de um profissional
deve sempre atentar para a prevenção. O Art. 54 da Lei 8.884/94 oferece algumas sugestões
para aqueles que resolveram adotar posturas empresariais que irão ter impacto no mercado de
negócios.

Os órgãos estatais responsáveis pela fiscalização e pela aplicação das penalidades é o


Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), autarquia federal vinculada ao
Ministério da Justiça. Na sua atuação, o CADE será auxiliado pela Secretaria de Direito
Econômico (SDE) daquele Ministério, com competência para a realização das averiguações
preliminares e instrução do processo administrativo.

CONCORRÊNCIA DESLEAL

A concorrência desleal no Brasil é coibida, hoje, pela Lei 9.279, de 14 de maio de 1996 – regula
direitos e obrigações relativos à propriedade industrial.

O Art. 195 dessa lei determina as hipóteses em que será definida a concorrência desleal, de
acordo com a visão do legislador.

Como exemplo, poderíamos pensar na hipótese em que um empresário divulga uma falsa
informação contra seu concorrente. Nos termos do Art. 195, II, da Lei 9279/96, essa conduta é
criminosa e enseja responsabilidade. No aspecto penal, a Lei 9279/96 tipifica como criminosa a
conduta contida no Art. 195 da Lei de Propriedade Industrial. A pena será de detenção de 3
(três) meses a 1 (um) ano ou multa.

No campo do direito civil, o concorrente desleal deve indenizar o empresário prejudicado, por
ter descumprido a obrigação decorrente de contrato entre eles.

Na omissão do contrato, desde a entrada em vigor do Código Civil de 2002, o alienante do


estabelecimento comercial não pode restabelecer-se na mesma praça, concorrendo com o
adquirente, no prazo de 5 (cinco) anos seguintes ao negócio, sob pena de ser obrigado a
cessar suas atividades e indenizar este último pelos danos provenientes de desvio eficaz de
clientela, sobrevindos durante o período do restabelecimento (Art. 1.147 CC/02).

Acho interessante, neste exato momento, pararmos e pensarmos sobre um aspecto.


Considerando uma sociedade, quem seria o responsável (aquele que cumpriria a pena), em
caso de esta ser penalizada com detenção? Caso o contrato social identifique o sócio-
administrador ou gerente (como já nos acostumamos a falar) ou mesmo a própria situação
delate o infrator, fica mais fácil determinar esse responsável. Mas e se não conseguirmos
apurar quem foi o responsável exclusivo pela conduta? Acredito ser interessante também
pensarmos no que efetivamente fará com que o empresário repense sua conduta e mude de
comportamento nessas circunstâncias.

A pena, seja ela de indenização cível, seja de caráter penitenciário, não tem apenas a função
de punir. Ela também deve buscar a reeducação ou reabilitação (termo mais moderno). E,
convenhamos, sabemos perfeitamente onde o empresário é mais afetado, não é mesmo?

Outra observação interessante: o que é concorrência desleal? Qualquer empresário em regime


de competição está com a deliberada intenção de atrair clientela alheia ao seu
estabelecimento, provocando, com isso, dano aos demais empresários do mesmo setor. A
diferença entre concorrência desleal e a simples é bastante imprecisa e depende sempre de
uma apreciação especial e subjetiva das relações locais comuns entre os empresários.

AUTONOMIA DO DIREITO EMPRESARIAL

Por que estudar o Direito Empresarial como cadeira autônoma? O que legitima a separação do
Direito Empresarial de outras áreas, principalmente do Direito Civil?

Se você der uma paradinha no seu estudo agora e recorrer ao seu Código Comercial, verá que
pouca coisa sobre Direito Comercial está ali disposta. Se, por outro lado, for até seu Código
Civil, verá que pelo menos 2 (dois) capítulos tratam exclusivamente de matérias empresariais:
Direito de Empresa e Títulos de Crédito. Por que não estudar o Direito Empresarial
conjuntamente com o Direito Civil se estão ambos confinados no mesmo diploma legal?

O Direito Comercial é área especializada do conhecimento jurídico. Sua autonomia como


disciplina curricular ou campo de atuação profissional específico decorre dos conhecimentos
extrajurídicos que professores e advogados devem buscar, quando o elegem como ramo
jurídico de atuação.

O profissional que resolver se especializar nessa área deve estar disposto a contribuir para que
o empresário alcance o objetivo fundamental que o motiva na empresa: o lucro.

Para compreendermos a especificidade desta cadeira, passearemos por alguns argumentos


lógicos que dão suporte a ela.

a) No Brasil, a Constituição Federal menciona, ao listar as matérias de competência


legislativa privativa da União, Direito Civil em separado do Direito Comercial. Abra sua
Constituição Federal e confira: Art. 22, I.

b) Não houve comprometimento da autonomia do Direito Empresarial pelo fato de o


legislador ter incluído alguns tópicos do Direito Comercial no Código Civil de 2002. O
Direito Comercial não se resume ao Código Comercial, nem o Direito Civil ao Código
Civil. Conforme já vimos, a lei não se resume ao seu texto, mas pode ser melhorada ou
mesmo atualizada através da interpretação e complementação com outras legislações.
A autonomia didática e profissional não é minimamente determinada pela autonomia
legislativa.

c) A teoria da empresa, em momento algum pregou a efetiva unificação do Direito


Privado, muito menos há o comprometimento da autonomia do ramo.

d) Mesmo na Itália, onde houve a unificação legislativa e a adoção da teoria da


empresa, o Direito Comercial continua sendo tratado como disciplina autônoma, com
professores e conteúdos próprios. Isso mesmo após as reformas curriculares de 1996
e 1997, da Faculdade de Direito de Bolonha.

ANÁLISE DO CÓDIGO CIVIL DE 2002

O Código Civil de 2002 inaugurou, legislativamente, no Brasil, uma nova era do Direito
Comercial. Sim, porque, até então, o Código Comercial de 1850 era basicamente alicerçado na
“teoria dos atos de comércio”.

O mesmo sistema adotado na fase objetivista do Direito Comercial foi aqui implantado pelo
Código Comercial de 1850. Existia uma lista (Regulamento 737/50) que definia a atividade de
mercancia:

a) compra e venda de bens móveis ou semoventes, no atacado ou varejo, para revenda ou


aluguel;
b) indústria;

c) bancos;

d) logística;

e) espetáculos públicos;

f) seguros;

g) armação e expedição de navios.

Acontece que a teoria dos atos de comércio acabou se afastando da realidade do Direito
Comercial, brasileiro e mundial, devido principalmente à rapidez da evolução deste ramo do
Direito. Essa discrepância cresceu ainda mais com a incorporação, através de lições da
doutrina, jurisprudência e em leis esparsas, da “teoria da empresa”.

A teoria da empresa, curiosamente elaborada durante a ideologia fascista1, que pressupunha a


organização da luta do proletariado e da burguesia, tinha, como seu principal assento, o
corporativismo, expressado pela comunhão dos propósitos de empresários e dos
trabalhadores.

A teoria da empresa sobreviveu ao regime fascista e à redemocratização italiana e permanece


norteando o direito comercial da Itália até hoje. Inspirou ainda a reformulação de diplomas
comerciais no mundo todo.

Com a adoção, pelo Brasil, da teoria da empresa, mais propriamente no Código Civil de 2002,
a regulação de atividades econômicas dos particulares alarga-se; o âmbito de incidência do
Direito Comercial engloba atividades ligadas a terra e de prestação de serviços.

O Direito Comercial deixa de cuidar de determinadas atividades (as de mercancia) e passa a


disciplinar uma forma específica de produção e circulação de bens: a empresarial.

A teoria da empresa não acarreta a superação da bipartição do direito privado, que o legado de
Napoleão tornou clássica nos países de tradição romana, mas altera o critério de delimitação
do objeto do Direito Comercial – que deixa de ser os atos de comércio e passa a ser a
empresarialidade – mas não extermina a dicotomia entre o regime jurídico civil e o empresarial.

Isso porque a ética e os comportamentos são completamente diferentes. Enquanto no regime


cível de prestação de serviços temos como foco a prestação de serviço e a boa prestação de
serviço, diga-se de passagem, no Direito Empresarial o foco do prestador de serviço ou do
produtor é o lucro. O lucro é o objetivo principal do Empresário e se, para alcançá-lo, for
necessário mudar de ramo ou mesmo de objeto, o empresário muda sem qualquer resistência
ou indignação.

O empreendedorismo, a agilidade e a abertura às mudanças são efetivamente parte do dia-a-


dia do empresário. Saber reconhecer esse fator e aceitá-lo sem quaisquer restrições também é
importante para o profissional que dará o apoio operacional a esse autor do comércio. Então
quebre seus paradigmas! Abra sua mente para tentar compreender o comportamento e as
necessidades do empresariado.

E não é que o nosso estudo está tomando uma direção muito interessante? Até a próxima aula!

1- Mussolini fundou o movimento fascista em 23 de março de 1919, numa reunião feita na


cidade de Milão. Entre os membros fundadores estavam os líderes revolucionários sindicalistas
Agostino Lanzillo e Michele Bianchi. Em 1921, os fascistas passaram a desenvolver um
programa que exigia a república, a separação da igreja do estado, um exército nacional, um
imposto progressivo para heranças e o desenvolvimento de coperativas. O estado fascista de
Mussolini foi estabelecido aproximadamente uma década antes da chegada de Hitler ao poder.
Tanto um movimentos como um fenômeno histórico, o fascismo italiano foi, em muitos
aspectos, uma reação à falha aparente do laissez-faire e ao medo dos movimentos de
esquerda, apesar de que as circustâncias na história intelectual devem ser consideradas, como
o abalo do positivismo e o fatalismo generalizado do pós-guerra na Europa. O fascismo foi de
certa forma o resultado de um sentimento geral de ansiedade e medo dentro da classe média
na Itália do pós-guerra, que surgiu no seguimento da convergência de pressões
interrelacionadas de ordem económica, política e cultural. Sob o estandarte desta ideologia
autoritária e nacionalista, Mussolini foi capaz de explorar os medos perante o capitalismo numa
era de depressão pós-guerra, o ascendente de uma esquerda mais militante, e um sentimento
de vergonha nacional e de humilhação que resultaram da “vitória mutilada” da Itália nos
tratados de paz pós Primeira Guerra Mundial. Tais aspirações nacionalistas não realizadas (ou
frustradas) manchavam a reputação do liberalismo e do constitutionalismo entre muitos
sectores da população italiana. Adicionalmente, tais instituições democráticas nunca cresceram
ao ponto de se tornarem firmemente enraizadas na nova nação-estado.

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Fascismo

Resumo

Nesta aula estudamos primeiramente a fonte do Direito Empresarial, ou melhor, as fontes. Em


primeiro lugar, as leis, que obedecem a uma ordem hierárquica, a começar pela Carta Magna –
nossa Constituição de 1988. Em seguida encontramos as leis ordinárias e também os tratados
e convenções internacionais, que hoje são muito comuns em um mundo tão globalizado. Além
das fontes primárias, temos as fontes secundárias: usos e costumes, analogia e princípios
gerais do Direito.

Em seguida começamos a enxergar os padrões estipulados pelo legislador constitucional para


o desenvolvimento da atividade econômica, ou seja, a atividade profissional do empresário.
Dentre eles temos: a soberania nacional, a propriedade privada, a proteção à livre
concorrência, a busca do pleno emprego.

Já na legislação ordinária temos a implementação destes conceitos. Primeiramente nos


deparamos com os crimes contra a ordem econômica e em seguida com a proteção à livre
concorrência, no combate à concorrência desleal.

Por último, mas não menos importante, passamos pela autonomia do Direito Empresarial, que
apesar de alguns tópicos desta cadeira estarem no Código Civil isto não significa uma
unificação do direito privado, ou seja, a junção do Direito Civil e o Empresarial. Estudando a
teoria da empresa, de 1942, nascida na Itália, compreendemos o sentido do conceito, tendo em
vista a ampliação do campo de atuação do Direito Empresarial.

Atividades

1) Quais as fontes primárias do Direito Empresarial? E as secundárias?

2) Os modos e costumes serão sempre fonte do Direito Empresarial?

3) De acordo com a Lei 8.884/90, o fato de o empresário não ter a intenção de cometer a
conduta ofensora à ordem econômica o exime de sua responsabilidade?

4) Cite 2 (dois) exemplos de condutas tidas como “concorrência desleal”.


5) Qual a origem história da teoria da empresa? Qual a sua importância para o Direito
Empresarial?
Aula 3 – Quem é o empresário?

Objetivos

• Identificar os atributos caracterizadores do empresário.


• Distinguir o empresário individual.
• Reconhecer a importância da regularização da atividade.

Introdução

Já fizemos o nosso trajeto histórico para reconhecermos a sistemática empresarial, já


passamos também por todo o arcabouço doutrinário e teórico que nos ajudará no nosso
trabalho de apoio ao empresário. Só falta uma coisinha: quem é o empresário? A pergunta
pode parecer óbvia, mas, na verdade, não o é. Provavelmente você reestruturará seus
conceitos quando der uma olhada nas próximas páginas!

Quem é o empresário?

1 – Não, o empresário não é o gerente da empresa.

2 – Não, o empresário não é o diretor da companhia.

3 – Não, a empresa não é sujeito de direito no Direito Empresarial.

E agora?

Quem é o empresário?

Existem, por uma formação doutrinária, alguns requisitos que podem nos ajudar a descobrir
quem é o empresário. Acho que depois deste estudo seremos capazes de identificá-lo com
mais precisão.

Comecemos com alguns atributos básicos importantes para se chegar ao conceito de


empresário.

a) Profissionalismo: aquele que realiza o comércio ou mesmo a atividade de produção ou


circulação de bens ou serviços como atividade voluntária, amadora não poderá ser considerado
empresário. Essa atividade deverá ser realizada habitualmente, sendo que o empresário obterá
dela as condições necessárias para se estabelecer e se desenvolver.

b) Atividade econômica visando lucro: de acordo com Borges, é o “animus lucrandi”. O lucro
não é essencial, o que é essencial é a intenção de obtê-lo. Se o lucro fosse essencial, não
haveria a atividade negativa: a falência.

c) Organização: nesse ponto, a doutrina brasileira ainda não chegou a um denominador


comum. Alguns, como Coelho, argumentam no sentido de haver necessidade da presença de
empregados; outro doutrinandores, entretanto, alegam que a fórmula da organização é a
junção dos elementos CAPITAL + TRABALHO (sem haver necessidade de este ser de terceiro,
ou seja, que não o do próprio empresário ou sócio). Na verdade, poderíamos aqui sugerir, para
definir organização, uma fórmula mais completa, mas menos complexa: escrituração + registro
+ nome empresarial + capital + trabalho.
d) Produção e circulação de bens ou serviços: aqui identificamos o objeto do empresário.
Este deve estar voltado para o mercado. Com o Código Civil de 2002, vários serviços, que
antes eram exclusivamente considerados cíveis, foram incorporados ao Direito Empresarial,
quando imbuídos da ética empresarial. Falaremos mais sobre o assunto em momento mais
oportuno.

Para a maior parte da doutrina, a empresa não é um sujeito de direitos e obrigações, mas uma
atividade que pode ser desenvolvida pelo empresário individual, ou pela pessoa jurídica
contratual ou estatutária da sociedade empresária.

Dessas informações, podemos tirar duas conclusões importantes:

1 – ou temos o empresário individual, que sozinho explora a atividade empresarial;

2 – ou temos a sociedade empresarial, formada através do registro, em Órgão especial, de


uma pessoa jurídica distinta dos sócios.

Para encerrarmos o assunto, trouxe o conceito de empresário dado pelo Código Civil de 2002,
que contém, em si, todos os atributos que já estudamos:

Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica


organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.

EMPRESÁRIO INDIVIDUAL

De acordo com Mamede, empresário individual é aquele que, individualmente, se registra na


junta comercial para o exercício de uma empresa.

Para identificarmos um dos sujeitos do Direito Empresarial, trataremos, a seguir, de algumas


características comuns a todos eles.

1) Capacidade

Via de regra, o empresário individual deverá contar com a maioridade civil, definida no Art. 5°
do Código Civil de 2002.

A exceção ocorrerá por conta do emancipado, nos termos do inciso V deste mesmo artigo. A
legislação pressupõe a existência da economia própria. A doutrina muito discute sobre esse
assunto. Seria bastante oportuno, apenas, realçar que a economia própria é muito mais
explícita e considerada pelo legislador quando adquirida pelo menor com suas próprias forças.

Isso porque, quando o legislador concede ao menor de 18 (dezoito) e maior de 16 (dezesseis)


a faculdade de exercer a atividade empresária, espera que esse menor já esteja acostumado
ao ritmo do comércio ou do regime empresarial. Não seria nem um pouco cabível conceder tal
capacidade a um menor que herdou dos pais uma fortuna e nunca soube o que era
efetivamente exercer a atividade empresária.

E o incapaz? Nos artigos 974 a 976 do Código Civil de 2002, temos o tratamento para essa
hipótese. O incapaz só poderá dar continuidade à atividade, ou seja, ele não poderá iniciar
nenhuma atividade empresarial, mas apenas continuá-la, na hipótese de se tornar incapaz (ser
acometido de deficiência mental, por exemplo) ou a título de herança (menor que herda
atividade empresarial antes exercida pelos pais). Isso se dará através de um pedido judicial
(alvará) que nomeará o responsável (responsável legal, curador, tutor).

Tanto o documento que concedeu a emancipação quanto o da autorização deverão ser


arquivados no Registro competente.
2) Elemento de empresa

Nos termos do Art. 966, mais propriamente em seu parágrafo único, encontramos uma
observação bem interessante do legislador:

Art. 966

Parágrafo Único. Não se considera empresário quem exerce a profissão intelectual, de


natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores,
salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.

Fica claro, portanto, que existem várias formas pelas quais o homem pode atuar
profissionalmente, realizando seus objetivos. Ele pode trabalhar sozinho ou em grupo, em
atividades autônomas, como os profissionais liberais e artesãos, que têm a atividade como
principal objetivo. Também é possível trabalhar para alguém, estabelecendo uma relação de
emprego e sendo remunerado por meio de um salário. Pode ainda estruturar uma empresa
para otimizar as relações com o mercado, potencializando e focando o lucro. O objeto
“atividade” até existe, mas o objeto primeiro do empresário, seja ele individual ou na forma de
sociedade, será sempre o LUCRO.

3) Profissionalismo

A pessoa natural só será considerada empresária se exercer profissionalmente a empresa em


nome próprio, com o intuito de obter lucro. Além disso, responderá pessoalmente por todas as
obrigações oriundas da atividade, com seu próprio patrimônio.

Qualquer um pode praticar eventualmente atos empresariais, como passar um cheque ou


comprar um brinquedo para um colega dar para o filho (intermediação), e isso não
caracterizará a empresarialidade do ato.

4) Regime peculiar de insolvência

A pessoa natural submete-se ao concurso de credores, no instituto da insolvência civil previsto


no Código de Processo Civil Brasileiro (Art. 748 e sgs).

Já o empresário submete-se ao sistema falimentar (Lei 11.101/05 – Lei de Recuperação de


Empresas e Falências), regime que concede algumas condições mais vantajosas ao
empresário do que as proporcionadas ao devedor civil.

5) Registro

O direito tem uma estreita ligação com a publicidade e oficialização. Isso, por causa da
solenidade dos atos ainda exigida e com razão. Aqui, lida-se com nascimentos, mortes,
encerramentos e outros procedimentos que precisam estar documentados e regularizados, nos
termos legais.

O registro é um dos principais requisitos impostos aos empresários (tanto que é considerado
como atributo também).

Apesar de vivermos uma realidade bem diferente da que está sendo requisitada neste trabalho,
as conseqüências da falta de registro são muito mais desastrosas do que as aparentes
vantagens de não se usar esse procedimento. Isso você será capaz de assegurar ao seu
cliente ou mesmo aplicar em sua vida, em seu próprio negócio.

Infelizmente a realidade brasileira não estimula muito a regularização, não é verdade? O


excesso de impostos e a dificuldade do empresário em compreender a lei, sem qualquer
auxílio, tornam ainda mais difícil a tarefa da regularização.
Fonte: www.contee.org.br Fonte: www.1cartorio.com.br

O registro do empresário é realizado no Registro Público de Empresas Mercantis (as juntas


Comerciais). Na nossa próxima aula, estudaremos mais profundamente os órgãos de registro e
também a hierarquia brasileira que deverá ser sempre respeitada.

Cabe ainda ressaltar algumas das conseqüências da ausência de registro, apenas para
ficarmos atentos a isso. São elas:

- na hipótese de decretação de falência, a conduta será considerada ilícita, nos termos do Art.
178 da Lei 11.101/05;

- o empresário não poderá utilizar-se das recuperações judicial e extra judicial, benefícios
previstos em lei para os empresários regularizados (estudaremos esse assunto mais
profundamente em momento oportuno);

- não poderá participar de licitação, na qualidade de empresário;

- não poderá ter registro nas Receitas (Federal, Estadual e Municipal) e também no INSS
(Instituto Nacional de Seguridade Social);

- não poderá ser considerado microempresário.

6) Impedimento

A Constituição Federal do Brasil, em seu Art. 5°, XIII, estabelece que o exercício da profissão
de empresário estará sujeito ao atendimento dos requisitos previstos em lei ordinária, o que
fundamenta a validade das proibições ao exercício da empresa.

Nos termos do Art. 972 do CC/02, só poderão ser empresários aqueles que não forem
legalmente impedidos.

Enquanto na hipótese de incapacidade jurídica o Estado busca a proteção do menor contra a


chamada “ética empresarial” (egoísta, capitalista, competitiva), nos casos de impedimento legal
busca-se a proteção da comunidade contra a mesma ética.
Ora, se eu tenho um magistrado empresário, este dificilmente conseguirá, mesmo vestido de
sua toga, deixar de lado a visão empresarial e julgar o caso com imparcialidade. O mesmo
ocorre com um funcionário público. Como ele conseguirá realizar sua função, por vezes lenta,
mas necessária, se está acostumado com a velocidade do mercado? Compreende? Os ritmos,
as funções não são compatíveis. Logo, o legislador não permite que se coadunem.

Caso os impedidos insistam em praticar as condutas, apesar do impedimento, os atos serão


válidos, porém sujeitos a algumas sanções. Veja-as.

- No Direito Penal: praticam contravenção de exercício ilegal da profissão, nos termos do Art.
47 da Lei de Contravenções Penais. Pena: prisão simples ou multa. Em se tratando de agentes
públicos, estes poderão, nos termos de seus estatutos, sofrer a pena mais grave: a demissão.

- No âmbito empresarial: responderão pessoalmente pelas obrigações contraídas.

São alguns exemplos de impedidos:

- magistrados e membros do Ministério Público;

- agentes públicos;

- militares;

- falidos não reabilitados;

- deputados e senadores;

- estrangeiros com visto provisório;

- leiloeiros;

- despachantes aduaneiros;

- corretores de seguro;

- prepostos;

- médicos.

Cabe ainda ressaltar que a maioria desses impedidos citados não poderá exercer diretamente
a função de empresário individual ou mesmo de sócio administrador ou controlador, mas pode,
sim, ter participação em empresas, desde que não exerça de forma direta ou indireta a
atividade empresarial.

Infelizmente nossa aula termina aqui... Até a próxima!

Resumo

Nesta aula tratamos sobre o empresário. Quem é ele? Na verdade, o termo empresário, para
nós, pode ser desdobrado em dois sujeitos da atividade econômica organizada: o empresário
individual e a sociedade empresária.

Através do Art. 966 do Código Civil, podemos elaborar um conceito de empresário, analisando
seus vários elementos: profissionalismo, habitualidade, intuito lucrativo, organização... Cada
um destes elementos envolve uma característica particular do empresário.

Além dos elementos trazidos pelo Art. 966 do Código Civil de 2002, podemos ressaltar algumas
peculiaridades daquele que realiza atividade empresarial: capacidade, regime peculiar de
insolvência, registro, dentre outros.

Nem sempre, principalmente numa realidade como a nossa, poderemos nos deparar com um
empresário regular, mas, neste trabalho, busco ressaltar as desvantagens da irregularidade e
muito mais do que isso... o imenso prejuízo da falta de informação. Como profissional
conhecedor dessas regras e exigência legais, é sua função alertar o empresário dos perigos do
não registro ou mesmo do não comprometimento com a lei.

Atividades

1) O gerente ou diretor de uma sociedade empresarial é um empresário?

2) Nos termos do art. 966 quais são os requisitos para alguém ser considerado empresário?

3) Qual a importância do registro empresarial?

4) Em que situações o menor poderá exercer a atividade empresarial?

5) O quer significa o fato de o empresário estar submetido a um regime peculiar de


insolvência?
Aula 4 – Requisitos legais da atividade empresarial

Objetivos

• Compreender a importância do Registro no Direito Empresarial.


• Identificar a escrituração necessária para que o empresário se mantenha regular.
• Entender o que é o nome empresarial.

Introdução

Depois da nossa última aula, achei que seria bom nos determos alguns assuntos bem
interessantes que tivemos que abordar superficialmente. O que você acha de estudarmos mais
a fundo a escrituração e o registro do empresário?

Afinal, como um competente consultor, administrador ou um outro profissional que dará apoio
ao empresário, é bom que você tenha essas noções, que são um valioso complemento para
que você possa assessorá-lo de uma forma ainda mais ampla e abrangente..

Vamos lá?

REGISTRO

O ordenamento jurídico trata deste assunto nos seguintes diplomas legais: Lei 8.934, de 18 de
Novembro de 1994 – Dispõe sobre o Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades
Afins e dá outras providências e o próprio Código Civil de 2002.

Além dos encargos de natureza fiscal, trabalhista e previdenciária, o registro é uma das
obrigações do empresário exercente de atividade econômica organizada para a produção ou
circulação de bens ou serviços, Quando o empresário começa suas atividades, deve estar
atento a algumas medidas importantes: registrar, na Junta Comercial, todos os documentos
reclamados pela legislação, manter a escrituração atualizada e levantar balanço geral anual do
ativo e do passivo do seu estabelecimento.

Já o órgão de registro tem a obrigação de examinar objetivamente a compatibilidade dos


documentos que arquiva, no tocante às formalidades legais, bem como verificar se neles
constam cláusulas adversas à ordem pública e aos bons costumes.

Quais são os órgãos de registro no Brasil?

DEPARTAMENTO NACIONAL DE REGISTRO DE COMÉRCIO – órgão central, com funções


técnicas de supervisão, orientação, coordenação e normação, além de assistência supletiva no
plano administrativo. Tem competência de fiscalizar e normatizar, mas não de executar o
registro.

REGISTRO PÚBLICO DE EMPRESAS MERCANTIS (Juntas Comerciais) – órgãos estaduais


responsáveis pela execução e administração dos serviços de registro, subordinados
legislativamente à Unidade Federativa à qual pertencem e administrativamente ao DNRC.

Quando se tratar do empresário individual, o ato de registro inicial é chamado INSCRIÇÃO.


Confira os documentos necessários para tal ato no Art. 968, do CC/02.
Na hipótese de sociedade, ocorrerá o ARQUIVAMENTO do ato constitutivo. Todo contrato de
sociedade empresária (com exceção da microempresa) só poderá ser arquivado se visado por
advogado, com a indicação de sua inscrição na OAB.

Caso haja necessidade de se realizar a modificação de atos constitutivos arquivados na Junta


Comercial, isso dependerá de instrumento específico de alteração contratual (alteração
contratual ou ata de assembléia ou reunião).

Quanto à publicidade dos órgãos, sua prova, quando exigida, será feita mediante anotação nos
registros da Junta Comercial, mediante apresentação da folha do Diário Oficial, ou do jornal
onde foi feita a publicação, dispensada a juntada de mencionada folha.

DA ESCRITURAÇÃO EMPRESARIAL

Tanto o empresário quanto a sociedade empresária são obrigados a manter sua escrituração
formalizada e principalmente atualizada. Poderíamos até concluir que ela é a “radiografia” da
empresa, na medida em que, através dela, podemos obedecer ao previsto em lei, propiciar a
fiscalização tributária e ainda fazer a prova em juízo, caso haja demanda judicial.

Ferreira traça um panorama interessante sobre a importância da escrituração:

Não se compreende, portanto, comerciante sem contabilidade. Esta é essencial. Dela é que lhe
advém o pleno conhecimento de sua situação patrimonial. É por via das contas, como observou
o criador da contabilidade, que o comerciante perviene alla notizia di tutte le sue faccende;
conosce facilmente per quello se le sue vanno bene o male; perchè il proverbio dice: chi fa la
mercanzia e non la conosca i suori denari diventan mosca. Se o que a não tem em forma
mercantil e ordem cronológica se desguarnece de provas, que ela em seu benefício produz,
também perde o governo de seus negócios, tanto vale desconhecê-los pronta e seguramente.
Riscos corre ele, ademais, em caso de infortúnio falimentar, pela possibilidade de incorrer na
pena de falência culposa ou fraudulenta.

Existem duas espécies de livros empresariais:

a) Livros obrigatórios: o comum (que é o Diário), que todos os empresários devem manter e
os especiais, escrituração oposta apenas a determinada classe de empresários (Ex: corretores
de navios, armazéns-gerais, tradutores públicos).

b) Livros facultativos: são aqueles que os empresários não precisam necessariamente


escriturar, mas, às vezes, por opção ou mesmo por organização optam por fazê-lo. Alguns
exemplos são o livro-caixa e o de contracorrente.

Observe bem o seguinte: todos os livros escriturados pelo empresário ou pela sociedade
empresarial devem ser devidamente regulares, ou seja, se você optou por fazer um livro-caixa,
saiba que, para sua validade, ele deverá obedecer a todos os requisitos legais.

Que requisitos seriam esses?

Os artigos 1.179 e seguintes do Código de Civil de 2002 oferecem um elenco de formalidades


que devem ser respeitadas em caso de criação de um livro empresarial. Gostaria de ressaltar
alguns fatores internos e externos do livro que podem ser importantes na sua vida profissional.

Nos termos do Art. 1.183 do mesmo diploma, a escrituração será feita em idioma e moeda
nacionais e em forma contábil, por ordem cronológica de dia, mês e ano, sem intervalos em
branco, nem entrelinhas, borrões, rasuras, emendas ou transportes para as margens.

Os códigos numéricos e abreviações deverão ser assentados em livro separado próprio. A


correção de erratas deverá ocorrer através de estornos.
Já com relação aos aspectos exteriores dos livros, poderíamos detectar a importância em
mantê-los seguros e também a preocupação com os termos de abertura e encerramento, além
da devida autenticação no Registro Público de Empresas Mercantis (Art. 1.181 do CC/02).

Caso haja perda ou extravio da documentação, o órgão responsável pelo registro deverá ser
comunicado no menor prazo possível além de haver publicação de tal fato em jornal de grande
circulação ou oficial.

Em hipótese de falsificação dos livros, o empresário e o responsável (Art. 1.182 CC/02)


responderão penalmente pelo ocorrido (Art. 297, III do Código Penal), além de não gozar da
eficácia probatória que lhe é própria.

Por concentrar informações de grande importância para o empresário ou ainda até mesmo
sigilosas, os únicos que poderão requisitar a abertura dos livros, mesmo contra a vontade de
seu proprietário, são as autoridades administrativas (fiscais da fazenda, INSS, nos termos da
Súmula 439 do STF) e a autoridade judicial, personificada na pessoa do Juiz de Direito em
meio a um procedimento judicial (Art. 1.190 do CC/02).

Junto com a obrigação de escrituração, o empresário tem ainda a obrigação de lançar pelo
menos anualmente os balanços.

Esses balanços deverão conter a descrição de todos os bens, mercadorias, dinheiro, papéis de
crédito e outra qualquer espécie de bens e valores, deverão conter também as dívidas e o
passivo empresarial. É um diagnóstico preciso do andamento dos negócios e condição
elementar para a obtenção de favores legais, entre os quais o da recuperação judicial e
extrajudicial.

O Balanço Patrimonial é a demonstração do ativo e do passivo, compreendendo todos os bens,


créditos e débitos.

O Balanço de Resultado Econômico é a demonstração da conta dos lucros e perdas – imposta


a todos os empresários, pessoas físicas ou jurídicas.

NOME EMPRESARIAL

Enquanto o nome civil representa a pessoa natural, como símbolo singularizador, o nome
empresarial significa o empresário.

Enquanto o nome civil está ligado à personalidade de seu titular, sendo discutível seu caráter
patrimonial, em relação ao nome empresarial, a sua natureza de elemento formador do
estabelecimento empresarial, a sua natureza de elemento integrativo do estabelecimento
empresarial afasta quaisquer dúvidas quanto a sua natureza patrimonial.

O tratamento jurídico do nome empresarial encontra-se no Código Civil de 2002, nos Artigos
1.155 a 1.168.

Mais interessante do que conceituá-lo seria fazer um paralelo entre o instituto e o nome
fantasia, o nome de domínio e a marca.

Enquanto o nome empresarial identifica o sujeito que exerce a empresa – o empresário –, a


marca identifica, direta ou indiretamente, produtos ou serviços; o nome de domínio identifica a
página na rede mundial de computadores, e o título do estabelecimento (também denominado
nome fantasia) identifica o ponto. É claro que, por conveniência, o próprio empresário pode
clamar por uma coincidência, mas isso não é obrigatório.

Para obter a proteção do direito para o nome empresarial, o seu titular deve registrá-lo na Junta
Comercial (Lei 8.934/94 – lembra-se da lei de Registro Mercantil da qual já falamos? Pois é...
ela também trata do nome empresarial e sua proteção mais especificamente em seu Art. 33).

Existem duas espécies de nome empresarial: a firma e a denominação.

Você provavelmente já se pegou até falando: “Você já foi à firma de Fulano?” “Nossa... a firma
nova de Cicrano é bem organizada.” Mas essa não é a forma mais adequada de se referir a um
estabelecimento ou mesmo a uma sociedade empresarial.

A firma é um tipo de nome empresarial. A firma individual é o nome usado pelo empresário
individual. A firma social ou razão social designa a sociedade contratual (sociedade em nome
coletivo, sociedade em comandita simples e a limitada, se assim optar). Calma! Falaremos
sobre os nomes empresarias nas sociedades daqui a pouco, não ser preocupe.

Esse estilo de nome empresarial é composto pelo nome civil do empresário, nada impedindo
que seja abreviado ou, ainda, acrescido de elemento distintivo. Ex: Eu resolvi mudar de
profissão. Deixar de ser professora e advogada e tornar-me uma livreira. E ainda gostaria de
exercer minha atividade sozinha, sem sócios que, na verdade, só me causariam algum
aborrecimento. Ao pensar em meu nome empresarial, só pude optar pela firma individual,
conforme já estudamos aqui. Logo pensei na seguinte opção: Thais Lacerda Livreira.

O que você acha? Eu ia fazer sucesso? Hum... Acho melhor continuar a aula e também na
minha profissão!

A denominação é o nome da sociedade anônima ou companhia e, também em caráter


opcional, da sociedade limitada e da comandita por ações. Lembre-se: a denominação só será
utilizada para dar nome empresarial a sociedades, nunca ao empresário individual.

Vamos deixar os exemplos de sociedades sob denominação ou firma para depois? Acredito
que assim que adentrarmos o Direito Societário tudo ficará mais compreensível.

Os nomes empresariais de empresas estão entre aqueles direitos amparados na nossa


Constituição Federal, em seu Art. 5°, inciso XXIX. A norma infraconstitucional que
complementa o texto magno é o da Lei 9.279/96 (a mesma Lei que trata da Concorrência
Desleal, lembra-se? Até agora não chegamos a um conceito de concorrência desleal, não é
mesmo?), mais especificamente em seu Art. 195, V.

E quando ocorrerem conflitos? E se você quiser o mesmo nome que eu? De acordo com o
princípio da novidade, não poderão coexistir, na mesma unidade federativa (Estado-membro),
dois nomes empresariais idênticos. Se a firma ou a razão social que se pretende adotar for
idêntica ou semelhante a outra já registrada, deverá ser modificada e aditada de designação
distintiva.

Não existe possibilidade de um registro nacional. Infelizmente, nosso sistema ainda não está
preparado para tal possibilidade. Esperamos, num futuro próximo, já ser possível a unificação,
já que hoje é de responsabilidade do empresário proceder ao registro em outros Estados de
seu interesse. Cabe apenas ao empresário requerer no DNRC (Departamento Nacional de
Registro de Comércio) a extensão da proteção.

Na verdade, o critério a ser usado para saber quem tem direito à preservação do nome é a
anterioridade. Quem registrou primeiro tem o direito de manutenção do nome, dentro, claro, de
sua unidade federativa.

O Art. 1.164 do Código Civil de 2002 tratava da inalienabilidade do nome empresarial.


Acontece que um enunciado proferido pelo Conselho da Justiça Federal desconsiderou tal
artigo sob o argumento de que o nome empresarial faz parte do estabelecimento, tendo
absorvido todos os aspectos patrimoniais oriundos dessa absorção.
ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL

De acordo com Fazzio Jr. “O estabelecimento do empresário (fundo de comércio, azienda,


goodwill of trade) é o conjunto de bens (materiais ou imateriais) e serviços, organizados pelo
empresário, para a atividade empresarial.”

Em sua composição, poderemos encontrar os seguintes bens:

a) bens materiais:

- móveis;
- imóveis.

b) bens imateriais:

- sinais distintivos (nome empresarial, marcas, nomes de domínio, nome fantasia);

- privilégios industriais: patentes, modelos de utilidade, desenhos industriais (estudaremos


esses assuntos em um futuro bem próximo);
- obras artísticas;

- ponto empresarial (efetivamente o local físico aonde o empresário se estabelece, lugar que
geralmente confundimos com todo o estabelecimento);

- serviços e pessoal;

- clientela.

Bom, provavelmente o estabelecimento empresarial representa bem mais do que


imaginávamos... daí a importância desse instituto, que deve ser preservado mesmo que em
parte. A nova Lei de Recuperação de Empresas efetivamente preocupou-se com a manutenção
da unidade do estabelecimento.

Ao tratar das hipóteses de recuperação, ela deu prioridade à manutenção da empresa intacta,
já que assim ela estaria mais apta a dar o retorno esperado pelo investidor que resolve apostas
mais uma vez naquela empresa. O mais interessante é perceber que existe aqui uma
universalidade de fato, e é de responsabilidade de seu titular fazer com que esses elementos,
engrenados, efetivamente constituam uma empresa, obtenham um objeto e alcancem o
objetivo primordial: o lucro.

Essa é a arte de ser empresário hoje, no Brasil e no mundo. Saber ser organizar, saber
repensar, buscar alternativas para fazer com que tudo funcione, respeitando as regras locais e
também todos os envolvidos no processo.

O tratamento jurídico pra o estabelecimento empresarial primordialmente encontra-se nos


artigos 1.142 e seguintes.

Nos artigos 1.143 e seguintes o legislador procurou tratar do trespasse, ou seja, a venda do
estabelecimento empresarial. Como parte integrante do patrimônio do empresário, é garantia
de seus credores. Por conseguinte, sua alienação está sujeita à observância de cautelas
específicas que a lei criou com vistas à tutela dos interesses dos credores de seu titular.

O contrato de alienação (ou venda) deve ser celebrado por escrito para que possa ser
arquivado na Junta Comercial e publicado pela imprensa oficial. Enquanto não providenciadas
estas formalidades, a alienação não produzirá efeitos perante terceiros.

Cabe ainda ao empresário buscar com seus credores a autorização para a operação. A
concordância poderá ser dada por escrito. Só estará dispensado dessa obrigatoriedade aquele
que ainda mantiver, apesar da alienação, em seu patrimônio, bens suficientes para solvência
do passivo.

Caso o empresário não observe tais deliberações, poderá ter sua falência decretada, nos
termos do Art. 94, inciso III da Lei 11.101/05, podendo o estabelecimento empresarial ser
reivindicado das mãos de seu adquirente.

Aquele que comprar ou adquirir o estabelecimento empresarial usufruirá do benefício de dividir


suas responsabilidades com o antigo proprietário. Na hipótese de transferência do
estabelecimento, portanto, o adquirente será sucessor do alienante, podendo os credores deste
demandar aquele para cobrança de seus créditos.

As partes poderão, através de contrato, combinar que o alienante ressarcirá o adquirente pelas
obrigações que ainda não estiverem decididas em um processo judicial. A cláusula de não-
transferência de passivo, por certo, não libera o adquirente, que poderá ser demandado pelo
credor, cabendo-lhe, então, o direito de regresso contra o alienante. O credor somente perderá
o direito de cobrar o crédito do adquirente do estabelecimento se expressamente renunciou ao
direito quando anuiu com o contrato.

Acredito ter sido esta uma aula bem produtiva, não é mesmo? Então... vamos pra próxima!

Não se esqueça de dar uma olhada no resumo para refrescar as idéias e fazer os exercícios de
fixação que preparei especialmente para você.

Resumo

Nesta aula observamos que, ao se escolher o status de empresário, não serão acrescentadas
apenas vantagens à vida de um indivíduo. Existem obrigações importantes no que tange ao
desenvolvimento da atividade econômica organizada, conhecida pelo termo “empresa”.

Em primeiro lugar, encontramos o registro, que é reconhecido pelo Código Civil de 2002, como
um requisito de regularidade da atividade empresarial. Isso significa que, mesmo sem o
registro, alguém pode ser empresário, mas será um empresário irregular, e nós já estudamos
as conseqüências do desenvolvimento da empresa de forma irregular.

Bom, mas, ao estudarmos o registro, percebemos claramente que a obrigação do empresário


não termina com esse registro, mas permanece com a escrituração empresarial. Os livros, tão
importantes para o dia-a-dia do empresário, também ganham relevância probatória quando se
tratar de autoridades fiscais e judiciais.

O empresário recebe, ainda, quando de sua regularização, um nome específico para ser
utilizado na sua rotina empresarial. O nome poderá ser na forma de firma ou denominação,
dependendo do tipo do empreendimento.

ATIVIDADES

1) Qual a natureza do registro empresarial? Quais os diplomas reitores dessa obrigação


empresarial?

2) Quais os órgãos de registro empresarial no Brasil?

3) O que são livros empresariais? Quais os tipos de livros empresariais?

4) O que é uma firma individual? E a social?

5) Como será composto o nome empresarial na forma de denominação social?


Aula 5 – Da propriedade industrial e o empresário

Objetivos

• Compreender o conceito de propriedade intelectual.


• Perceber a presença dos conceitos de propriedade industrial no cotidiano da empresa, ou
seja, verificar a importância que os institutos ligados a essa propriedade podem ter na vida do
empresário.
• Distinguir: patente de invenção, patente de modelo de utilidade, registro de marca, registro de
desenho industrial e software.

Introdução

Oi, tudo bem? Após nossa rápida passagem pelos institutos básicos do Direito Empresarial,
como você está se sentindo?

Hum... Imagino que possa estar passando pela sua mente: são tanto detalhes, tantos institutos
para que o empresário possa exercer sua função na sociedade.... Quais seriam os incentivos
que o Estado, como fornecedor da estrutura básica para o empreendedor, concede ao
comerciante?

Agora vamos atravessar um caminho bem interessante neste ramo do Direito: a propriedade
industrial. Aqui, perceberemos juntos que o Estado quer, sim, investir na criatividade do
indivíduo. Aquele que inova, que se distingue por trazer modernidade, avanços tecnológicos e
negociais será premiado pelo Poder Público.

A Lei 9.279/96 (aquela que falava sobre a concorrência desleal lá no seu finzinho, lembra-se?)
trata dos institutos da patente de invenção e de modelo de utilidade, registro de desenho
industrial e marca. Além desses institutos, temos também o software, que recebe tratamento
legal especial, na Lei 9.609/98.

A propriedade intelectual é o gênero do qual decorrem a propriedade industrial e o direito


autoral.

O direito autoral é a espécie de propriedade intelectual que tutela a proteção da criação e


utilização e utilização de obras intelectuais. É um ramo do Direito Civil com várias
particularidades e características próprias que, infelizmente, não estudaremos desta vez.

O termo “propriedade intelectual” designa o complexo de direitos intelectuais que se projetam


no segmento empresarial, reconhecidos pelo Estado, mediante a concessão de patentes de
invenção e registro de marcas e desenhos.

O Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), autarquia federal, criada em 1970,


vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, tem por finalidade
principal, nos termos da Lei 9.279/96, executar, em âmbito nacional (com postos espalhados
por todo o Brasil), as normas que regulam a propriedade industrial, tendo em vista sua função
social, econômica, jurídica e técnica. É, ainda, sua atribuição pronunciar-se quanto à
conveniência de assinatura, ratificação e denúncia de convenções, tratados, convênios e
acordos sobre propriedade industrial.

O empresário que adquirir os registros ou patentes dos institutos acima citados (marca, modelo
de utilidade, desenho industrial e invenção) tem o direito de explorar economicamente o objeto
de sua criação nos termos legais, com inteira exclusividade. Para que outrem possa fazer uso
de tal registro deverá obter licença do titular do bem resguardado.
PATENTE

A pesquisa e o desenvolvimento de novos produtos demandam, geralmente, investimentos.


Proteger esses produtos através de uma patente significa prevenir-se de que competidores os
copiem e vendam a um preço mais baixo, uma vez que eles não foram onerados com os custos
da pesquisa e desenvolvimento dos produtos.

A patente assegurará a propriedade de uma invenção ou de um modelo de utilidade a seu


autor. É um título atributivo de propriedade, quer dizer, é o reconhecimento, pelo sistema
jurídico, de sua titularidade e efeitos decorrentes. Em contrapartida, o inventor se obriga a
revelar detalhadamente todo o conteúdo técnico da matéria protegida pela patente.

A patente é um nome específico do registro de invenção ou de modelo de utilidade. Durante o


prazo de vigência da patente, o titular tem o direito de excluir de terceiros, sem sua prévia
autorização, de atos relativos à matéria protegida, tais como fabricação, comercialização,
importação, uso e venda.

Você saberia conceituar invenção? Parece fácil... mas não é. Na verdade, existe um conceito
quase “jurídico” para esse termo. Vamos estudá-lo mais a fundo?

A invenção é uma concepção resultante do exercício da capacidade de criação do homem, que


represente uma solução para um problema técnico específico, dentro de um determinado
campo tecnológico e que possa ser fabricada ou utilizada industrialmente. Você percebeu a
importância desse conceito? Aqui não se pensa apenas na obra original do cérebro humano.
Busca-se mais. Além de original, a obra também deverá ser nova, ou seja, desconhecida das
demais pessoas. Também deverá contribuir, de alguma forma, para o desenvolvimento
científico e tecnológico da comunidade. (Art. 8°da Lei 9.279/9609)

MODELO DE UTILIDADE

E o modelo de utilidade? Você imagina o que seja? Nesse caso, a hipótese é contrária... O
conceito é bem mais simples do que aparenta ser.

O modelo de utilidade é o objeto de uso prático suscetível de aplicação industrial, com novo
formato de que resultam melhores condições de uso ou fabricação. Não há, necessariamente,
uma invenção, mas acresce-se a utilidade de alguma ferramenta, instrumento de trabalho ou
utensílio, pela ação da novidade que se lhe agrega (Art. 9° da Lei 9.279/96).

REQUISITOS TÉCNICOS

Existem, portanto, alguns requisitos necessários para que seja obtida uma patente.
Dependendo do objeto (invenção ou modelo de utilidade), teremos que dosar a necessidade de
tais atributos:

a) Novidade: não basta que a invenção ou o modelo de utilidade sejam originais. O que a
originalidade significa? Que é efetivamente algo surpreendente para quem criou o objeto, o que
é uma característica de natureza subjetiva. Para que seja nova, a obra deverá ser
desconhecida pela comunidade científica, técnica ou industrial ligada a ela. Passe seus olhos
pela Lei 9.279/96 e dê uma paradinha no Art. 11 – nesse caso, a novidade consta na legislação
como “não poderá estar compreendida no estado da técnica”.

b) Atividade inventiva: a invenção ou o modelo de utilidade devem despertar um sentido de


progresso real nos técnicos da área do experimento. Têm que efetivamente gerar um destaque
especial para os técnicos relacionados à área. Mas atenção! O modelo de utilidade atende ao
requisito, se não decorrer de maneira comum ou vulgar do estado da técnica, segundo o
parecer dos especialistas na área.

c) Aplicação industrial: somente a invenção ou o modelo de utilidade que trouxerem algum


avanço industrial serão patenteados. Deverá, efetivamente, haver um aproveitamento industrial
das obras de criação. (Art. 15 da Lei 9.279/96)

d) Não-impedimento: no Direito Privado trabalha-se o brocado (essa palavra significa


“máxima”, “axioma”, “sentença”) de que se pode fazer tudo que a lei não nos proíbe, em
paralelo com os publicistas (Direito Constitucional, Administrativo, Tributário) que estão
condicionados ao que a lei expressamente autoriza. Dessa forma, devemos sempre observar
as limitações legais a nossa atuação. Existem algumas proibições legais expressas com
relação a patentes. Deveremos estar atentos a esse detalhe que não tem nada de pequeno,
não é mesmo? Qual a razão de a lei tentar diminuir a área de criação do inventor? Razões de
ordem técnica ou de atendimento ao interesse público. O Art. 18 da Lei 9.279/96 trata de
algumas proibições expressas. (Como exemplo poderia citar o inciso I do Art. 18 – Não é
patenteável o que for contrário à moral, aos bons costumes, à segurança, à ordem e à saúde
pública – caso de invenção relacionada ao beneficiamento de produtos com fim exclusivamente
alucinógeno).

Com relação à titularidade, a legislação entende como sendo autor aquele que requerer o
registro ou a patente (Art. 6°, § 1° e 2° da Lei 9.279/96).

Devemos, entretanto, observar que hoje a maioria das invenções e criações é oriunda de
equipes de criação mantidas ou contratadas por pessoas jurídicas (em geral empresas de
grande porte).

O Código de Propriedade Industrial (outro nome dado comumente à Lei 9.279/96) preocupa-se
com a chamada criação ou invenção coletiva. Quando se tratar de invenção ou de modelo de
utilidade realizados por duas ou mais pessoas, há que se distinguirem algumas situações.

Se a criação for conjunta, a patente poderá ser requerida por todas ou qualquer uma delas,
mediante nomeação e qualificação das demais, para ressalva dos respectivos direitos (Art. 6°,
§ 3° da Lei de Propriedade Industrial).

A prova da titularidade ou da autoria da invenção ou do modelo de utilidade está embasada no


registro de tal obra. A prova será realizada através da verificação do registro mais antigo,
independentemente das datas de invenção ou criação. A prioridade funda-se na anterioridade
do depósito (Art. 7° da Lei 9.279/96).

E na hipótese de uma invenção ou de um modelo de utilidade criados dentro do ambiente do


trabalho? Serão sempre do empregador? Pertencerão ao empregado?

Existem 3 situações diversas:

a) Propriedade exclusiva do empregador: nesse caso, existem dois fatores que


preponderam. O contrato de trabalho estipulava expressamente que o empregado havia sido
contratado para tal desenvolvimento e este o fez dentro de seu ambiente de trabalho, ou seja, o
seu ambiente de trabalho foi essencial para que aquela invenção ou aquele modelo de utilidade
tivesse sido alcançado. A junção desses dois requisitos na relação empregatícia geral
efetivamente a propriedade da invenção por parte do empregador.

b) Propriedade exclusiva do empregado: nesse caso, os dois requisitos citados no item


anterior devem ser revertidos em favor do empregado, ou seja, o contrato de trabalho não
estipularia a invenção nem o modelo de utilidade como objeto da prestação de trabalho. Além
disso, o empregado conseguiria ou conseguiu, tranqüilamente, desenvolver o sistema
independentemente do ambiente de trabalho apresentado pelo Empregador.

c) Propriedade comum: quando um dos requisitos já citados (contrato de trabalho/ambiente


de trabalho) não caminharem no mesmo sentido, teremos a propriedade em comum, ou até
mesmo a decisão judicial como arbítrio entre as partes. Por exemplo, vamos imaginar que um
trabalhador de determinada fábrica não tenha sido contratado para criar uma nova máquina de
fazer bolos, mas, se dentro do estabelecimento tiver o equipamento necessário para tal criação
(ou seja, o ambiente de trabalho foi fundamental para a obra), essa obra será de ambos.

O procedimento de registro de patente é administrativo e vinculado, ou seja, só se procederá


da forma abaixo descrita:

1 – Pedido (Art. 19 da Lei de Propriedade Industrial)

O pedido deverá conter os dados necessários alusivos ao objeto, ao depositante e ao inventor.


O pedido que não se apresentar formalmente completo tem o prazo de 30 (trinta) dias para ser
complementado, sob pena de devolução ou arquivamento dos documentos (Art. 21 da Lei de
Propriedade Industrial). Esta fase é normalmente denominada como a fase de exame formal,
ou seja, o funcionário do INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) deverá observar se
existe ali a documentação necessária, sem averiguar, de fato, a viabilidade do projeto, seja de
invenção, seja de modelo de utilidade.

Nesse momento, o autor deverá apontar a reivindicação, ou seja, em que área a sua patente
deverá ser registrada. (Ex: caso esteja desenvolvendo uma nova coloração de tinta para
cabelo, deverá pedir o enquadramento de sua invenção na área de cosméticos.)

2 – Publicação

Nos termos do Art. 30 da Lei de Propriedade Industrial, o pedido será mantido em sigilo por 18
(dezoito) meses, contados da data do depósito, após o que será publicado, com exceção do
pedido de patente que tenha por objeto o interesse da defesa nacional.

Nesse caso específico, o pedido será processado em caráter sigiloso e incumbirá ao órgão
competente do Poder Executivo determinar a quem o INPI (Instituto Nacional de Propriedade
Industrial) encaminhará o pedido, de imediato.

Excetuando-se o caso acima, deve-se salientar que o pedido de patente regularmente instruído
e formalmente recebido ficará à disposição do público no INPI, pelo prazo de 60 (sessenta)
dias, nos termos do Art. 31 da Lei de Propriedade Industrial.

Após a publicação, de acordo com o Art. 33 da Lei de Propriedade Industrial, o interessado


estará ainda sujeito à apresentação de documentos e à realização de diligências, cuja
inobservância poderá acarretar o arquivamento do pedido.

3 – Exame técnico

Este é efetivamente o momento crucial no que tange a patentes (tanto de invenção como de
modelo de utilidade). Aqui, os técnicos do Instituto Nacional de Propriedade Industrial vão
tentar fazer, de acordo com o que foi apresentado pelo autor, exatamente o que ele fez e nas
mesmas condições.

O órgão certificador, portanto, tentará reproduzir a invenção ou o modelo de utilidade obtido


pelo autor do pedido.

O parecer técnico poderá apresentar uma destas situações:

- aceita o pedido e concede a patente como reivindicada;

- indefere o pedido de plano com esteio na não-patenteabilidade;

- denega o pedido por não enquadrar-se na natureza reivindicada (estou desenvolvendo uma
nova modalidade de tinta de cabelo – lembra-se do pedido? - e peço a patente na área de
tapeçaria).
Ressalvada a hipótese de parecer positivo, nas demais situações, o depositante devidamente
intimado poderá manifestar-se no prazo de 90 (noventa) dias, sob pena de arquivamento do
pedido.

A patente será concedida depois de deferido o pedido e comprovado o pagamento da


retribuição (nome específico da taxa que deve ser entregue ao INPI para a retirada da patente)
correspondente, expedindo-se a respectiva carta-patente (Art. 38 da Lei de Propriedade
Industrial).

Assegura-se ao detentor da patente o direito de obter indenização pela exploração indevida de


seu objeto, inclusive em relação à exploração ocorrida entre a data da publicação do pedido e
da concessão da patente (Art. 44 da Lei de Propriedade Industrial).

Caso o proprietário da invenção ou do modelo de utilidade resolva disponibilizar sua criação,


deverá fazê-lo através de um contrato de licença, nos termos do Art. 61 da Lei de Propriedade
Industrial, para que tal recurso tenha oponibilidade erga omnes (o contrato poderá ser oposto
contra terceiros que tentarem de forma irregular fazer uso da criação).

A patente tem prazo de duração determinado, sendo de 20 (vinte) anos para a invenção e de
15 (quinze) anos para o modelo de utilidade, contados do depósito do pedido de patente (data
de protocolo do pedido no INPI).

Para garantir ao inventor um tempo razoável de utilização de seus direitos, a lei estabeleceu
que o prazo de duração do direito industrial não poderá ser inferior a 10 (dez) anos, para as
invenções, ou de 7 (sete) para os modelos, contados da expedição da patente (Art. 40 da Lei
9.279/96), a não ser em situações específicas. Atendidas essas regras, não haverá
prorrogação, em nenhuma hipótese, do prazo de duração da patente.

Você percebeu que a duração de um procedimento administrativo para patentear uma invenção
ou um modelo de utilidade pode chegar a até 10 (dez anos)? Pode parecer até muito para nós.
Mas existem procedimentos tão complexos que podem efetivamente necessitar desse prazo
para serem analisados a fundo.

A propriedade no Brasil, hoje, é exercida de acordo com os padrões de função social (Art. 5°,
XXIII da Constituição Federal Brasileira). Ou seja, só será legitimado para exercer a função de
proprietário de uma propriedade, tangível ou não, aquele que fizer bom uso desta. Esse
conceito também foi trazido para a propriedade industrial.

Caso o direito de propriedade de uma patente, mesmo que temporário, seja exercido de forma
abusiva, ou se, através dele, pratica-se abuso do poder econômico, caberá a licença, se o
titular da patente, tendo já transcorrido 3 (três) anos de sua expedição, não a explora por
completo, ou se verifica o caso de insatisfatória comercialização (Art. 68, § 1°e 5° da Lei de
Propriedade Industrial).

A patente poderá ser extinta nas hipóteses de expiração do prazo de vigência, renúncia de seu
titular, ressalvado o direito de terceiros, caducidade, falta de pagamento da retribuição anual,
entre outros.

Resumo

Neste capítulo compreendemos o sistema de proteção da propriedade industrial, principal


artifício do empresário ao realizar sua principal atividade: perseguir incansavelmente o lucro.

Em primeiro lugar analisamos a patente, que nada mais é do que um nome específico do
registro de invenções e modelo de utilidade.

Para retirar a patente deverão ser observados vários requisitos: novidade, atividade inventiva,
aplicação industrial, não impedimento e não proibição.
Em se tratando de invenção ou de modelo de utilidade obtidos no ambiente de trabalho,
deverão ser observados dois requisitos importantes: o contrato de trabalho e o ambiente de
trabalho. Desta combinação poderão surgir várias situações: a patente do empregador, do
empregado e aquela que só será determinada em juízo.

Existe, ainda, um período de avaliação que determinará se o objeto é passível de registro ou


não. Caso haja aprovação, a patente de invenção será deferida pelo prazo de 20 (vinte) anos e
a de modelo de utilidade pelo prazo de 10 (anos).

ATIVIDADES

1) O que é propriedade intelectual? E a propriedade industrial?

2) Quais os requisitos da patente?

3) O que é uma invenção? E modelo de utilidade?

4) Qual o prazo de proteção das patentes?

5) Em se tratando de invenção ou de modelo de utilidade obtidos no ambiente de trabalho,


determine de quem será a propriedade da patente: do empregado ou do empregador?
Aula 6 – Código de Defesa do Consumidor e a atividade empresária

Objetivos

• Identificar a importância da proteção ao consumidor explicitada nos princípios constitucionais


que regem a ordem econômica e financeira.
• Conhecer a história de desenvolvimento do Direito do Consumidor no Brasil e no mundo.
• Reconhecer as implicações decorrentes das disposições trazidas na Lei nº. 8.078/90 para o
empresário.

Introdução

Olá! Como vai você? Bem informado em matéria de direito empresarial?

Imagino... Espero que você esteja gostando desta trajetória.

Agora iremos compreender a legislação consumeirista e seu efeito no dia-a-dia do empresário.


Não é preciso nem dizer sobre a sociedade de consumo em que estamos inseridos. Todos os
dias, recebemos um enxurrada de possibilidades que transformam o “ter” em mais do que o
“ser”.

Todos os meios de comunicação têm reforçado em nossa mente a idéia de que o excesso, o
consumo desenfreado – por vezes até desnecessário – é fundamental e absolutamente
imprescindível para nós.

Como parte da sociedade, o empresário não poderia ficar de fora dessa realidade. Seja na
qualidade de consumidor, quando reconhecidamente se portar como parte hipossuficiente
(parte mais fraca) na relação de consumo, seja como fornecedor, quando, nesta qualidade,
encontra várias demandas e exigências legais e do mercado.

O sistema constitucional que trata da “Ordem Econômica Financeira”, a partir do Art. 170 da
Constituição Federal de 1988, traz, em seu bojo, os princípios que regem a exploração da
atividade econômica organizada.

Isso porque, ao não realizar a atividade econômica, via de regra, o Estado guarda para si as
funções de fiscalização e monitoramento dela. Nesses termos, encontramos no Art. 170 da
CF/88 uma série de determinações quanto ao desempenho da atividade empresarial. Esse
assunto foi abordado em nossa aula de nº. 2.

Uma dessas disposições é a proteção ao consumidor, ou defesa do consumidor. Em se


tratando de um princípio constitucional, percebe-se claramente que a realização efetiva da
vontade do legislador vem mesmo com a lei infraconstitucional, neste caso, a Lei 8.078 de
1990, popularmente conhecida como Código de Defesa do Consumidor.

Poderíamos considerar o Código de Defesa do Consumidor como um microssistema legislativo.


O que é microssistema legislativo?

Por muito tempo, o direito estava fixado no conceito de legislações monotemáticas. O Código
Civil tratava de todas as relações civis, o penal de todas as relações penais, código comercial
de todas as relações comerciais. Com o passar do tempo, algumas leis esparsas foram
ganhando espaço e importância, mesmo que fora dos tão importantes “códigos”. A Lei 8.078/90
é um exemplo desse fenômeno. Apesar de tratar de relações eminentemente civis, procurou na
relação entre consumidor e fornecedor um tratamento mais igualitário e justo. Aparentemente,
ela vem cumprindo seu papel.
PRINCÍPIOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

São muito freqüentes no Código de Defesa do Consumidor as denominadas “normas


constitucionais”, aquelas que expõem valores e fins a serem conquistados.

O Art. 4º da Lei nº. 8.078/90, também conhecida como Código de Defesa do Consumidor,
enumera uma série de princípios que deverão ser respeitados para que a relação entre o
consumidor e o fornecedor seja considerada juridicamente lícita.

Tratarei de alguns princípios para elucidar o meu raciocínio e para que você perceba o quanto
essa legislação é importante no nosso viver diário.

O primeiro desses princípios fala sobre a vulnerabilidade do consumidor. Acredito que você
saiba o que é isso e que até já tenha realizado operações comerciais em que se sentiu
absolutamente vulnerável. Eu, por exemplo, entendo “patavina” de computador. Ao chegar a
um fornecedor desse produto, tenho uma imensa dificuldade em identificar qual equipamento
atenderia meus anseios e necessidades. Posso entender um pouco de direito, um pouco mais
do direito empresarial, mas, no que tange a computadores, só sei operar... O que o funcionário
disser, para mim será uma verdade absoluta!

Esta situação casuística faz parte, hoje, do quotidiano de muitos... daí a preocupação do
legislador em buscar o reequilíbrio da relação desproporcional.

A transparência nas relações também é um fator de suma importância. Continuemos


estudando o exemplo acima citado.

Vamos imaginar que o fornecedor não esclareça que aquele computador tem uma placa de
vídeo limitada. Sendo meu monitor de 19 (dezenove) polegadas (bom, para quem não sabe
nada estou até bem! Afinal, é vivendo que se aprende...), possivelmente não ficarei satisfeita
com o resultado. Na ânsia em esvaziar seu estoque, o fornecedor se esquece de dar as
principais informações sobre o produto! Daí abstrai-se ainda outro princípio do CDC (Código de
Defesa do Consumidor): o da informação.

Outro princípio relevante é o da segurança. O legislador exige do fornecedor que este apenas
insira no mercado produtos que não prejudiquem a saúde, a vida ou a segurança do
consumidor. Caso isso aconteça, a responsabilidade do dano será objetiva, ou seja, do
fornecedor, independentemente da presença de culpa (negligência, imperícia ou imprudência).

Outro aspecto valioso do Código de Defesa do Consumidor é a preocupação com as


prestações desproporcionais. Serão consideradas inválidas as disposições que ponham em
desequilíbrio a equivalência entre as partes. Caso essa situação se efetive, na prática, a Lei
8.078/90 ainda traz em seu corpo o princípio da reparação integral.

Isso significa que, se você, por exemplo, ao assinar um contrato com uma determinada
operadora de telefonia móvel, sentir-se lesado, na medida em que o aparelho recebido não é
aquele previsto no contrato realizado, poderá buscar a reparação pelos transtornos sofridos.

A solidariedade entre os fornecedores consagra-se também como um das grandes aliadas


do consumidor no Código de Defesa do Consumidor. O que significa solidariedade? A
responsabilidade solidária poderia ser definida como um fenômeno jurídico em que, por força
da lei, os vários envolvidos em uma relação consumeirista como fornecedores irão, juntos,
responder por todo o prejuízo causado ao consumidor.

Como exemplo, vamos supor que você, ao comprar no supermercado um iogurte impróprio
para consumo, ficou alguns dias sem trabalhar por conta de um mal-estar. Em função disso,
além de problemas financeiros (vamos supor que você é um profissional liberal) passou por
constrangimentos morais. Quando resolver cobrar o prejuízo sofrido, poderá escolher cobrar do
produtor do iogurte, assim como do supermercado fornecedor.
O Código de Defesa do Consumidor fala em boa-fé objetiva. O que significa isso? Esse
princípio cuida da intenção do fornecedor, exigindo deste que mantenha os padrões de
segurança, transparência e qualidade de produto ou serviço antes, durante e depois da relação
consumeirista.

Vamos supor que eu tenha resolvido comprar um aparelho novo de som e que, ao chegar à
loja, tenha me encantado com um excelente modelo. O vendedor do estabelecimento se
esmerou ao me apresentar todas as qualidades do som, mas esqueceu-se de dizer que, ao
ficar em ambiente úmido, o equipamento poderia sofrer danos que inviabilizariam seu
funcionamento. Ao levar o aparelho para casa, resolvi deixá-lo na cozinha para o
entretenimento da família na hora das refeições. Ocorre que, uma semana depois de
comprado, o aparelho de som começou a apresentar sinais de depreciação, por conta da
umidade.

Bom... Fica fácil perceber a preocupação do legislador com o consumidor. Mas agora talvez
fosse interessante compreendermos as figuras mais importantes desta relação tão fundamental
hoje. Quem é o consumidor? E quem é o fornecedor?

CONSUMIDOR X FORNECEDOR

Normalmente, as relações de consumo em que se aplicam as normas do Código de Defesa do


Consumidor, Lei n° 8.078/90, têm sua origem intimamente relacionada com as operações de
natureza comercial e com o comércio propriamente dito, no que tange à produção e à
circulação de bens ou serviços.

Nos termos do Código de Defesa do Consumidor – Lei nº. 8.078/90, Art. 3º (...) §1º – “produto é
qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.” No Art. 3º. (...), §2º, “serviço é qualquer
atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza
bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter
trabalhista.”

As definições dessa lei trazem em seu corpo um aspecto de amplitude, ou seja, a clara
intenção de não deixar de fora nenhum produto ou serviço ofertado no mercado de consumo.

Mas, para que compreendamos o conceito verdadeiro desta relação, precisaremos conhecer as
principais figuras dela: o consumidor e o fornecedor.

Nos termos do Art. 2º do Código de Defesa do Consumidor, temos que: “Consumidor é toda
pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”.

Quando você vai até o supermercado perto de sua casa, para fazer a tão temida “compra de
mês”, você está, naquele momento, se colocando na condição de consumidor.

Em contrapartida, o legislador excluiu da classe de consumidores aqueles que adquirem o


produto como etapa na cadeia de produção, como a empresa que compra cola para utilizar em
sapatos de sua produção.

O legislador define ainda o fornecedor, que é considerado, nos termos do Art. 3º do Código de
Defesa do Consumidor, como toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou
estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção,
montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou
comercialização de produtos ou prestação de serviços.

Nesse conceito, devemos refletir sobre a habitualidade. Sem a habitualidade no desempenho


da atividade de fornecimento, dificilmente teremos a figura do fornecedor. Não será
considerada uma unidade de fornecimento a família que, para se mudar de cidade, monta, em
frente a sua casa, um bazar para se desfazer de seus pertences menos importantes.
Você ainda não me perguntou, mas já imagino uma grande interrogação em sua mente... O
que seria então o “destinatário final”? Se o fornecedor deve ser aquele que exerce a sua função
habitualmente, existe também um requisito para que alguém seja considerado consumidor: ser
o destinatário final do produto ou serviço.

Acredito que essa expressão não seja composta de um conceito físico, mas sua apreciação
será feita em um caso concreto. Em linhas gerais, apenas para efeito de esclarecimento, eu
poderia dizer a você que o consumidor é aquele que adquire o produto ou usa do serviço sem
fins profissionais, ou seja, não busca lucro com a aquisição ou uso do produto ou serviço.

Cabe ressaltar que isso não é uma regra. Existem inúmeras exceções nos julgamentos
brasileiros, que aplicam o Código de Defesa do Consumidor em relações estritamente
profissionais em que o produto ou serviço será revendido ou negociado com um terceiro.

Gostaria de ressaltar, como último ponto desta parte do nosso estudo, que não há nenhuma
dificuldade em conceder o título de “consumidor” a uma pessoa jurídica, ok?

QUALIDADE DO PRODUTO E SERVIÇO

Antes de falarmos sobre os defeitos nos produtos ou mesmo na prestação de serviços, gostaria
de chamar sua atenção para um detalhe: a responsabilidade, na sistemática do Código de
Defesa do Consumidor, será objetiva.

Vamos primeiro ao texto desse Código para que, em seguida, eu ilustre esse conceito para
você na forma de um exemplo.

O Art. 14 do Código de Defesa do Consumidor traz o seguinte texto: “O fornecedor de serviços


responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos
consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações
insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.”

A Lei nº 8078/90 traz ainda um gravame: caso existam vários fornecedores envolvidos, todos
responderão solidariamente. Isso vem disposto no Art. 7º do Código de Defesa do Consumidor:
“Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos
danos previstos nas normas de consumo.”

Isso significa que, se você comprar um iogurte na padaria pertinho da sua casa e, ao consumi-
lo, sentir-se mal, o fornecedor (veremos que aqui, equiparadamente, encontramos o dono da
padaria e também o produtor do iogurte nesse papel), independentemente de ter agido com
culpa, isto é, com imperícia, imprudência ou negligência, deverá ser responsabilizado pelos
danos causados ao consumidor, ou seja, a você!

Existe apenas uma exceção dessa grande responsabilidade do fornecedor, que vem prevista
no § 4º do artigo citado acima: “A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será
apurada mediante a verificação de culpa”.

Mas quais são as condutas dos fornecedores que serão consideradas puníveis, pelo texto da
Lei 8.078/90?

a) Vício do produto: nos termos do Art. 18 do Código de Defesa do Consumidor, temos que o
vício do produto é todo aquele que impede ou reduz a realização da função ou do fim a que se
destina o produto.

Nesse caso, poderíamos imaginar a seguinte situação: você compra um relógio com função de
despertador, para não perder a hora de seus estudos do EAD todos os dias. Ao programar o
relógio, percebe que a função de despertador não está funcionando, tendo em vista que nos
últimos dois dias você perdeu o horário de despertar. Se a função do relógio era a de despertar
você, efetivamente o aparelho não conseguiu cumprir sua principal função.

b) Vício de serviço: o Art. 20 do Código de Defesa do Consumidor traz em seu corpo o conceito
de vício de serviço. Poderíamos dizer que o serviço encontra-se viciado quando houver
rompimento entre a expectativa legítima do consumidor e o desempenho do serviço adquirido.

Vamos supor que, depois de anos sem férias, você resolve, juntamente com sua família,
adquirir um pacote turístico para Porto Seguro. A agência de viagens informa que o hotel está
localizado em uma das melhores áreas da cidade, a poucos metros da praia. Ao chegar ao
local, você se depara com um estabelecimento sem qualquer estrutura para recepção e, ainda,
a quilômetros e quilômetros da praia... Assim não dá, não é mesmo? Garanto que suas férias
terminariam nesse momento! Haja coração!

c) Fato do produto: quando você compra algum produto em um estabelecimento comercial,


espera que ele dê a você, no mínimo, condições de segurança. É disso que trata o fato do
produto. O Art. 12 do Código de Defesa do Consumidor vem tratando exatamente desse defeito
consumeirista.

Vamos supor que você vá até o supermercado para adquirir uma panela de pressão. Bom, ao
que me parece a panela de pressão serve para o cozimento mais rápido dos produtos. Ocorre
que a válvula da panela vem entupida e causa um grande acidente dentro de sua casa, além
de expor a sua vida e a de seus familiares a um grande perigo. O fornecedor não poderá
passar impune diante de um fato de grande perigo como esse.

Outro exemplo clássico de fato do produto é o chamado “recall”, situação em que as


montadoras de automóveis (mais comumente) chamam os consumidores para repararem
defeitos em peças dos veículos, para que não ocorra um problema maior no futuro.

d) Fato do serviço: enquanto o Art. 12 fala sobre os produtos que possam causar dano aos
consumidores, o Art. 14 do Código de Defesa do Consumidor trata sobre os serviços que
causem os mesmos transtornos.

O Superior Tribunal de Justiça decidiu, em 19/10/04, no Recurso Especial de nº. 419.059 que,
na existência de assalto a cliente de hipermercado em seu estacionamento, o hipermercado,
prestador de serviço, deverá indenizar o consumidor pelos transtornos advindos da má
prestação de serviço, entendendo que ele, ao fornecer estacionamento, será também
responsável pela prestação de segurança dos bens e da integridade física do consumidor,
tendo em vista se tratar de serviço inerente ao negócio.

Existem, entretanto, situações que excluem a responsabilidade do fornecedor. O Art. 12, §2º do
Código de Defesa do Consumidor traz as hipóteses excludentes dessa responsabilidade:

a) a prova de que não houve fornecimento ( na hipótese do exemplo acima, teremos que o
estacionamento utilizado pelo cliente não era o fornecido pelo hipermercado.);

b) inexistência do defeito (na hipótese anterior, do iogurte comprado na padaria, por análise
técnica do produto, chega-se à conclusão de que não havia qualquer imperfeição em seu
conteúdo, mas que a consumidora passara mal em conseqüência de uma gravidez que ela
desconhecia.);

c) culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (na hipótese do pacote turístico para Porto
Seguro, chega-se à conclusão de que o consumidor, não leu as condições corretas do pacote,
e que confundiu aquele com outro passeio que não adquiriu.).

Existe, ainda, um prazo específico para a responsabilização do fornecedor. Em se tratando de


vício de produto ou serviço, o prazo para reclamação é decadencial, sendo de 30 (trinta) dias
para os produtos não duráveis e de 90 (noventa) dias para os duráveis.

Em se tratando de vício oculto, ou seja, aquele de difícil constatação, o prazo decadencial se


inicia apenas a contar do momento em que ficar evidenciado o defeito. A reclamação formulada
perante o fornecedor obsta a decadência, nos termos do Art. 18, §1º da Lei 8.078/90 – Código
de Defesa do Consumidor.

Prescreve, entretanto, em cinco anos a pretensão para reparação dos danos causados por fato
do produto ou serviço, de acordo com o teor do prescrito no art. 27 do Código de Defesa do
Consumidor.

E o empresário? Será que o Código de Defesa do Consumidor fala algo especificamente para
ele?

Acredito ser óbvia a adequação do empresário ao conceito de fornecedor, já que, para ambos,
exige-se legalmente o requisito da habitualidade ou profissionalidade. O Código Civil, em seu
Art. 966, e o Art. 3º do Código de Defesa do Consumidor, de forma indireta, falam sobre a
questão de aquela atividade ser a profissão do empresário ou consumidor.

O Art. 13 do Código de Defesa do Consumidor estabelece a responsabilidade do comerciante:

O comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando: I – o


fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados; II – o
produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou
importador; III – não conservar adequadamente os produtos perecíveis.

A doutrina, ao observar essa disposição do legislador, costuma qualificar a responsabilidade do


consumidor como subsidiária, ou seja, quando houver dificuldade de acesso ao fornecedor
principal.

PROTEÇÃO CONTRATUAL

O legislador, ao perceber que nem sempre o consumidor, para contratar, está efetivamente em
condições de igualdade com os fornecedores, optou por um sistema protetivo especial em se
tratando de relações contratuais entre o consumidor e o fornecedor.

O Código de Defesa do Consumidor oferece a este a possibilidade de utilizar meios jurídicos


para atenuar as distorções derivadas da vulnerabilidade social, cultural e econômica em que se
encontra perante o fornecedor.

Em primeiro lugar, falemos sobre a irrenunciabilidade dos direitos. Nos termos do Art. 51, I da
Lei 8.078/90, são nulas de pleno direito as cláusulas que impliquem a renúncia, tácita ou
expressa, pelo consumidor, de direitos que lhe são assegurados pela lei. Se não fosse assim,
seria absolutamente fácil burlar o Código de Defesa do Consumidor. Por exemplo, em um
instrumento contratual que o consumidor se visse pressionado a aceitar, tendo em vista a
urgência e necessidade, todo o esforço da sociedade em protegê-lo iria “por água abaixo”.

A segunda preocupação do legislador é o estabelecimento do equilíbrio contratual. Nos termos


dos Arts. 51, XI e XII do Código de Defesa do Consumidor, não poderá ser imposto ônus
excessivo aos consumidores, para que estes não se achem em condição de desvantagem em
relação aos fornecedores.

Mais uma vez, em meio às cláusulas contratuais, devemos relembrar a transparência. O


consumidor deverá ter pleno conhecimento do que adquire ou usa e exigir todas as
informações para que compreenda a exata extensão das obrigações assumidas com o
fornecedor. As cláusulas que tratem das obrigações dos consumidores deverão ser claras e
precisas, nos termos do Art. 46 do Código de Defesa do Consumidor.

Por último – e não menos importante – encontra-se a interpretação favorável ao consumidor. Já


que o instrumento contratual é elaborado pelo fornecedor de forma unilateral, a interpretação
dele deverá ser feita favoravelmente ao consumidor, para que ocorra uma compensação nos
termos. O Art. 47 do Código de Defesa do Consumidor é expresso ao tratar desse princípio da
relação contratual consumeirista.

O EMPRESÁRIO E SUA PUBLICIDADE

O legislador consumeirista não tem qualquer resistência ao uso da publicidade. Reconhece-a


como forma de expansão das relações do fornecedor e, conseqüentemente, enxerga uma
melhora de fornecimento também de informações para o consumidor.

Existem apenas 3 (três) formas de publicidade ilícitas que o Código do Consumidor proíbe:

a) Publicidade simulada: nos termos do Art. 36 do Código de Defesa do Consumidor – Lei


8.078/90, o legislador exige que a propaganda seja feita de forma explícita, ou seja, que o
consumidor possa percebê-la fácil e imediatamente, adotando cautelas próprias diante da
natureza necessariamente parcial da mensagem transmitida. Quando a publicidade é feita de
forma simulada, deixa o consumidor indefeso perante as investidas dos fornecedores.

b) Publicidade enganosa: o artigo 37, § 1° do Código de Defesa do Consumidor, diz que a


publicidade enganosa é aquela que induz o consumidor em erro. Um exemplo mais comum
disso é a venda de medicamentos que prometem milagres, seja na diminuição de peso, seja na
prevenção de envelhecimento. Quantas pessoas são iludidas todos os dias ao perceber que o
anúncio efetivamente oferece todos os seus sonhos: o corpo perfeito, a juventude eterna...
Cabe ressaltar que não se exige o dolo do fornecedor, para se caracterizar o engano fruto de
publicidade, ou seja, a responsabilidade é objetiva, independentemente da conduta do
fornecedor.

c) Publicidade abusiva: De acordo com o Art. 37, § 2° da Lei 8.078/90 – Código de Defesa do
Consumidor – é aquela que agride os valores sociais. Poderia ser considerada abusiva a
publicidade que promovesse valores como o racismo, que fosse lesiva ao meio ambiente e
imprópria para menores em horário diurno. O palavrão, a nudez, o erotismo não são
necessariamente abusivos, dependendo do contexto de sua apresentação pelo anúncio.

Se o fornecedor fizer uso de alguma destas modalidades de publicidade proibidas pelo Código
de Defesa do Consumidor, sua conduta gerará responsabilidade civil, penal e administrativa.
Nos termos do Art. 6° desse Código, o consumidor terá direito à indenização pelos danos
materiais e morais. Nos termos do Art. 67 da Lei 8.078/90, o fornecedor responderá pela
prática de crime e deverá veicular contrapropaganda que desfaça os efeitos do engano ou do
abuso.

Muito interessante, não é mesmo? Fica cada vez mais claro aqui que o empresário deverá
apenas prestar atividade econômica organizada, mas esta deve estar regida pelos princípios
constitucionais que regem a ordem econômico-financeira (Art. 170 da CF/88) e um deles é a
proteção ao consumidor nos termos da Lei 8.078/90 - Código de Defesa do Consumidor.

Resumo

Nesta aula tivemos a oportunidade de vislumbrar a importância do Código de Defesa do


Consumidor para aquele que pratica a atividade empresarial. Cabe ressaltar que este aspecto
é demasiadamente relevante, tendo em vista que muitas vezes quem realiza a atividade sequer
tem conhecimento de áreas como responsabilidade, publicidade, regras na confecção dos
contratos, conduta com o consumidor, etc.

Cabe ao profissional que orienta este sujeito da atividade empresarial chamar atenção para
elementos fundamentais da prática empresarial que por vezes podem colidir com o interesse
da prática empresarial, ou seja, o lucro.

Atividades

Responda às seguintes perguntas:

1) De que forma o Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078/90, pode limitar o empresário
em sua atividade?

2) Quais as regras apresentadas no CDC para responsabilização do comerciante, hoje


conhecido por empresário?

3) Do que se trata a publicidade enganosa? E a abusiva?

4) Você crê, por sua observação, que hoje o consumidor está muito mais preparado para lidar
com os problemas do dia a dia, ou seja, o CDC conseguiu cumprir sua principal função?
Aula 7 – Desenho industrial, marcas e software

Objetivos

• Detectar onde se encaixam o desenho industrial e o software na propriedade industrial.


• Reconhecer a possibilidade de registro de um desenho industrial e as condições e requisitos
para tanto, nos termos da Lei 9.279/96.
• Conhecer o conceito de marcas, bem como os requisitos e procedimentos para o seu registro
de acordo com a Lei 9.279/96.
• Entender a metodologia especial de proteção do software.

Introdução

Parece dar muito trabalho este negócio de patente, não é mesmo?

Pois é... Não sei se você notou, mas, raciocinando sobre a lei, acabei chegando a uma
conclusão bem interessante. Quando você resolve dar início a um procedimento administrativo,
perante o INPI, para retirar a patente de um invento ou de um modelo de utilidade, o Estado
não confere direito sobre seu invento ao cidadão.

Na verdade, ocorre uma troca. Sim, uma troca. Você transfere a fórmula para o Poder Público,
e ele permite a sua exploração exclusiva por um determinado espaço de tempo. Parece injusto,
mas, na verdade, o mais importante é compreender que o monopólio adquirido pelo registro da
patente pelo empresário por 20 (vinte) anos ou prazo semelhante, em um mercado capitalista e
competitivo como o empresarial, é um tempo considerável. Muitas coisas acontecem em tanto
tempo. Empresas aparecem, outras findam...

Outra conclusão interessante que podemos tirar é que o direito brasileiro, desde o Código de
Propriedade Industrial de 1969 (legislação que veio antes da Lei 9.279/96), conferiu ao registro
industrial o caráter de ato administrativo constitutivo. Ou seja, o direito de utilização exclusiva
da propriedade industrial não nasce da anterioridade de sua utilização, mas sim da
anterioridade do registro.

Após o estudo analítico das patentes, podemos passar agora para uma outra fase: o estudo do
desenho industrial (que não guarda muita novidade) e das marcas. Depois abordaremos a
questão do software, que tem um tratamento jurídico bem especial, próximo do que estamos
vendo. Você me acompanha?

DESENHO INDUSTRIAL

Primeiro gostaria de estudar com você o conceito do desenho industrial. Ele está descrito no
Art. 95 da Lei 9.279/96 (a mesma que trata das patentes de invenção e modelo de utilidade).

Para ser registrado como tal, o desenho deve conter alguns requisitos:

- Novidade: o desenho industrial é considerado novo quando não compreendido no estado da


técnica.

- Originalidade: o desenho industrial é original quando apresenta uma configuração própria


não encontrada, nos termos da Lei de Propriedade Industrial, em seu Art. 97. Enquanto a
novidade é uma questão técnica, a originalidade é estética.
- Desimpedimento: existem algumas restrições também com relação ao desenho industrial.
Você se lembra das limitações da patente, no Art. 18 da Lei 9.279/96? Pois é. Aqui também
encontramos limitações públicas à autonomia privada.

Não será registrável como desenho industrial o que for contrário à moral e aos bons costumes
ou que ofenda a honra ou imagem de pessoas, ou atente contra a liberdade de consciência,
crença, culto religioso ou idéia e sentimentos dignos de respeito e veneração ou a forma
necessária, comum ou vulgar do objeto ou, ainda, aquela determinada essencialmente por
considerações técnicas ou funcionais.

O desenho industrial também contará com um procedimento administrativo vinculado


específico que está contido nos Arts. de 101 a 111. Conforme já estudamos, o procedimento é
formal e deverá ser cumprido estritamente.

O pedido de registro de desenho industrial terá que se referir a um único objeto, permitida uma
pluralidade de variações, desde que se destinem ao mesmo propósito e guardem entre si a
mesma característica distintiva preponderante.

Após o exame técnico e a aprovação do INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial),


será emitido um certificado de propriedade do desenho industrial que deverá conter o número e
o título, nome do autor, o nome, a nacionalidade e o domicílio do titular, o prazo de vigência, os
desenhos, os dados relativos à prioridade estrangeira, e, quando houver, o relatório descritivo e
reivindicações.
O prazo de vigência do registro será de 10 (dez) anos, contados da data do depósito. Esse
prazo é prorrogável por três períodos sucessivos de cinco anos cada.

Ainda parece estranho pra você que algo de sua imaginação, fruto de sua criação seja seu
apenas por determinado espaço de tempo, não é mesmo? Isso porque vivemos em um Estado
em que se busca um contrapeso com o interesse público. É exatamente por causa dessa
busca pelo ideal para todos que o Estado impõe limites ao lucro advindo da criação humana.

O registro do desenho industrial poderá extinguir-se: pela expiração do prazo de vigência; pela
renúncia, ressalvados os direitos de terceiros; pelo não-pagamento da retribuição prevista ou,
se o titular é domiciliado no exterior, pela ausência de procurador devidamente qualificado e
domiciliado no país, com poderes de representação administrativa e judicial, inclusive para
receber citações.

MARCAS

Garanto que você conhece algumas marcas famosas, não? Sim, elas são protegidas por força
de lei. Assim que é realizado o registro, o Estado cuida para que cada marca seja o máximo
possível protegida. Ela liga o produtor ao produto. Muitas vezes até nos esquecemos do
produto e nos lembramos exclusivamente da sua marca. Veja, por exemplo, o caso da palha de
aço. Existe uma marca muito famosa que já ganhou aceitação popular e quase dá nome ao
produto.

Você seria capaz de identificar outras marcas que também foram assimiladas por sua
comunidade?

As marcas são sinais visualmente perceptíveis (símbolos, figuras, nomes, emblemas, etc...)
utilizados para fins distintivos. Destinam-se a individualizar os produtos ou serviços de uma
empresa. Além da função identificadora, as marcas dão proteção contra a concorrência desleal,
compondo o aviamento do empresário, ou seja, sua habilidade e capacidade de obter lucro.

A Lei 9.296/96 introduziu no ordenamento jurídico brasileiro, além da marca de produtos e


serviços, duas outras: a marca de certificação e a marca coletiva (Vide Art. 123, II e III da citada
lei).
A marca de certificação atesta que determinado produto ou serviço atende a certas normas
de qualidade, fixadas por organismo oficial ou particular.

A marca coletiva informa que o fornecedor do produto ou serviço é filiado a uma entidade,
geralmente a associações de produtores ou importadores do setor. Essa criação vem conferir a
marca uma maior credibilidade e aceitabilidade no mercado.

Alguns requisitos são necessários para que a marca possa ser registrada:

- Novidade: para as marcas, a legislação não é tão rígida. Não se exige da marca que
represente uma novidade absoluta. O que deverá ser novo é a utilização daquele signo na
identificação de produtos industrializados ou comercializados ou de serviços prestados. Por
essa razão, inclusive, a marca é protegida, em princípio, apenas no interior de uma classe, de
um conjunto de atividades econômicas afins.

- Não-colidência com marca notória ou de renome: com relação a marcas deverá ser
observada a colidência, isto é, a coincidência com marca notória ou de renome.

- Não-impedimento: em matéria de marcas existem várias hipóteses em que não poderá


ocorrer o registro das mesmas. Neste momento, seria interessante irmos até o Art. 124 da Lei
9.279/96.

Alguns exemplos interessantes: não será permitido qualquer registro de marca que reproduza
ou imite título, apólice, moeda e cédula da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Territórios, dos Municípios, ou de outro país.

Outra modalidade de impedimento é aquela que veda o registro de marca de forma necessária,
comum ou vulgar do produto ou de acondicionamento, ou, ainda, aquela que não possa ser
dissociada de efeito técnico.

Existe ainda a classificação das marcas em categorias. São elas:

- Marcas de fantasia: essas marcas se caracterizam pelo fato de não terem nenhum
significado que não a própria marca. São palavras que não existiam na língua e que foram
criadas para dar nome a um produto, ou seja, só ser referem àquele produto específico. Um
exemplo clássico é a Kodak – o termo não existe, é apenas a marca de um produto específico.
Neste caso, a proteção da marca é a maior possível, já que existe o grau máximo de novidade.

- Marcas arbitrárias: essas marcas são compostas por palavras que não guardam qualquer
relação com o produto. Um exemplo interessante é a Gravadora Apple, cujo nome - maçã, em
português - nada tem a ver com música. A gravadora Apple, inclusive, está em uma batalha
judicial com a Apple Computadores, em função de alguns conflitos de marcas. Neste caso,
como a palavra já existe e não há criação completa, a proteção da marca não é tão abrangente
como no caso das marcas de fantasia.

- Marcas sugestivas: a marca sugestiva é composta de uma palavra que sugere, lembra o
produto ou serviço a ser comercializado. Um bom exemplo seria a Embeleze, marca de
produtos de beleza. A palavra já existe e tem uma ligação forte com o produto a ela vinculado.
O âmbito de proteção da marca, nesse caso, fica ainda menor, já que o grau de novidade é um
pouco menor do que existe na marca arbitrária. Fixar uma marca de um produto no mercado
em que não existe qualquer relacionamento do nome com o produto é mais difícil do que
quando se usa um termo que, pelo seu significado, já faz referência direta ao produto ou
serviço oferecido.

- Marcas descritivas: essas são, conforme você mesmo pode imaginar, as marcas menos
protegidas no mercado. São constituídas por expressões que descrevem o produto, serviço ou
características do serviço. Como exemplo, produtos da Floricultura Flor-de-Lis.
Aquele que conseguir registrar a marca no INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial)
através de um procedimento formal terá direito à sua exploração exclusiva nos limites fixados
por esta classificação. Não poderá, por conseguinte, opor-se à utilização de marca idêntica ou
semelhante por outro empresário em atividade enquadrada fora da classe em que obteve o
registro, excetuando-se a hipótese de marca de alto renome.

A proteção será concedida pelo prazo de 5 (cinco) anos e será renovável sempre que o titular o
fizer em prazo determinado e com o comprovante de pagamento de taxa de retribuição (nome
da taxa que é paga ao INPI para a proteção dos registros), nos termos do Art. 123 da Lei de
Propriedade Industrial.

No conflito entre a anterioridade na solicitação do nome de domínio (endereço em que se pode


localizar o indivíduo na Internet. Poderíamos citar como exemplo o da FEAD: www.fead.br –
neste site você encontrará a instituição FEAD na internet) e o registro da marca no INPI
(Instituto Nacional de Propriedade Industrial), prevalece este último.

O titular da marca registrada tem o direito de reivindicar o endereço eletrônico concedido pela
FAPESP a outra pessoa, sempre que o domínio reproduzir sua marca.

O registro do nome de domínio só será feito pelo critério de “ordem de chegada” quando ambos
os detentores das marcas as tiverem registrado cada um em sua classe.

SOFTWARE

Diferentemente do que ocorre com as patentes, os registros de desenho industrial e as marcas,


o software tem um tratamento jurídico especial. O diploma que dispõe sobre o assunto é a
Lei9.609/98.

Cabe aqui uma pequena intervenção. Não é por acaso que o software, de maneira genérica,
ficou fora da Lei 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial). Ocorre aí uma mudança de
paradigmas. No caso de patente e de registro industrial (Lei 9.279/96), o legislador foca o
mercado empresarial e também a ética desse ramo. Ou seja, aquele que inova e cuja inovação
efetivamente contribui, de alguma forma, para o avanço da tecnologia ou ciência ou mesmo
para o fomento de novos produtos e circulação de dinheiro terá um prazo específico para
usufruir da proteção estatal.

Em matéria de software, a ética é bem diferente. Aqui o legislador fomenta apenas um aspecto:
a criação. Crie, invente, inove... e usufrua dessa sua criação. Talvez por isso haja tamanha
dificuldade em se proteger os softwares da chamada “pirataria”. Infelizmente, num meio tão
concorrido e veloz, a legislação protetora não se aprofunda nem aperfeiçoa a capacidade de
persecução de criminosos.

Outra observação importante é a de que o software embutido, ou seja, aquele que faz parte do
equipamento (do maquinário do computador – hardware) será patenteável como invenção. Os
softwares de prateleira, como gostamos de chamá-los, é que serão protegidos pela legislação
específica de software.

O programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções, em


linguagem natural ou codificada, em suporte físico de qualquer natureza, de emprego
necessário em máquinas automáticas de tratamento de informações, dispositivos, instrumentos
ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga para fazê-los funcionar de
modo determinado e para fins específicos.

O prazo de duração da proteção de software é de 50 (cinqüenta) anos, contados a partir de 1°


de janeiro do ano subseqüente ao da sua publicação ou, na ausência desta, da sua criação.

Quando se trata de direitos autorais ou de proteção do software, o registro perde grande parte
de sua importância. Deixa de ser constitutivo e passa a ser declaratório. Nos termos do Art. 2°,
§ 3° da proteção dos direitos de proteção do autor do software independe de qualquer registro.
Caso o autor opte pelo registro, poderá fazê-lo no INPI.

Caso o autor do software resolva comercializar seu produto, o legislador cria a alternativa para
aqueles que não escolheram a hipótese de registro. Nos termos do Art. 9° da Lei 9.609/98, o
uso de programa de computador no país será objeto de contrato de licença que deverá ser
registrado no INPI para ter efeitos perante terceiros. É a forma mais segura de se disponibilizar
um software.

A qualidade de autor de software poderá ser usufruída por:

- quem lançar o programa indicando seu nome;


- aquele que não se identificou como autor, mas que o faz na utilização da ferramenta;
- todos os colaboradores;

Obs. Na hipótese de empregador x empregado: as mesmas regras que prevaleceram, quando


do estudo das patentes, prevalecerão também aqui, ou seja, deverão ser analisados os
elementos contrato de trabalho e ambiente de trabalho. Dessa análise sairão algumas
possibilidades: o software é do empregador, o software é do empregado ou pertence a ambos
(Art. 4° da Lei 9.609/96).

Interessante, não? Acredito que você nem tinha idéia de quantos recursos o Estado
disponibiliza para que o empresário tenha sucesso em seu empreendimento.

Resumo

Nesta aula, procuramos nos aprofundar em outros elementos colaboradores da atividade


empresarial. Como já estudamos patentes de invenção e modelo de utilidade, com uma maior
facilidade passamos ao estudo do desenho industrial, das marcas e do software.

O desenho industrial poderia ser definido como a forma plástica ornamental de um objeto ou
conjunto ornamental de linhas e cores que possa ser aplicado a um produto, proporcionando
resultado visual novo e original em sua configuração externa e que possa servir de tipo de
fabricação industrial. Os requisitos para obtenção deste registro (que também será realizado no
INPI – Instituto Nacional de Propriedade Industrial) são: novidade, originalidade e
desimpedimento. O prazo de vigência deste registro será de 10 (dez) anos, renovável pelo
período de 3 (três) períodos sucessivos de cinco anos cada.

As marcas, talvez mais conhecidas para você, guardam uma relação profunda com o produto
ou serviço prestado pelo empresário. As marcas são sinais visualmente perceptíveis utilizados
para fins distintivos. Buscam individualizar os produtos e serviços de uma empresa a ponto, por
vezes, de torná-los inconfundíveis e, com isso, dificultar a chamada “concorrência desleal” que
nós já estudamos neste curso, você se lembra disso?

Nós temos os seguintes tipos de marcas: as mais comuns, marcas de produtos ou serviços, as
de certificação (que qualificam determinado produto ou serviço) e as coletivas (que fazem
transparecer a idéia de um produto ou serviço vinculado a um grupo empresarial).
Considerando a amplitude de proteção, temos: as marcas de fantasia (mais protegidas, por
serem mais originais), as arbitrárias, as sugestivas e as descritivas. O prazo de proteção
dispensado pela Lei 9279/96 é de 5 (cinco) anos, sempre renovável mediante pagamento de
taxa de retribuição.

Já o software recebe um tratamento todo especial. Tem uma lei própria que trata de sua
proteção, a Lei 9609/98, em que o legislador fomenta apenas um aspecto: a criação. A ligação
entre o software e seu autor é o ponto mais importante desta relação. Mas, afinal, o que é um
software? O software é um programa de computador – definido como conjunto organizado de
instruções, em linguagem natural ou codificada em suporte físico de qualquer natureza, de
emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento de informações, dispositivos,
instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-
los funcionar de modo determinado e para fins específicos. Também tem um prazo de proteção
especial: 50 (cinqüenta) anos contados a partir de 1º de janeiro do ano subseqüente ao de sua
publicação ou, na ausência desta, de sua criação. Além de tudo, o registro é considerado não
obrigatório.

ATIVIDADES

1) Quais os requisitos para o registro do desenho industrial? Qual a importância deste elemento
para o empresário?

2) Quais os tipos de marcas? E as categorias?

3) Qual o prazo de proteção das marcas? O prazo é renovável?

4) Quem poderá ser considerado o autor do software?

5) Qual a importância, em sua opinião, destes institutos complementares à atividade


empresarial, para o empresário?
Aula 8 – Teoria Geral do Direito Societário

Objetivos

• Identificar a Sociedade Empresária como sujeito de direito empresarial.


• Conceituar sociedade empresarial.
• Compreender os elementos básicos da teoria geral do direito societário.

Introdução

Agora que já exploramos o que diz respeito ao empresário individual e a alguns institutos do
direito empresarial, estamos prontos para estudar juntos a teoria geral do direito empresarial. A
metodologia do trabalho, nesse caso, faz toda a diferença, já que começamos com institutos
menos complexos que, com o desenvolvimento de uma sociedade empresarial, ganham uma
nuance muito especial.

Repassaremos vários dos conceitos estudados até então, mas numa outra ótica: a de uma
sociedade empresarial.

Como sempre, começaremos apenas com um pequeno esboço histórico legislativo, porque
você, provavelmente, já conhece a história do direito empresarial de cor e salteado.

A sociedade empresarial, até o advento do Código Civil de 2002, era regulada pelo Código
Comercial (no que tange à sociedade de pessoas), pelo Decreto 3.708/19 (sociedades por
quotas de responsabilidade limitada), também pela Lei 6.404/76 (Sociedades Anônimas) e
ainda pelo Código Civil de 1916 (sociedades civis de fins econômicos).

CONCEITO

O art. 981 do Código Civil de 2002 traz, em seu caput, o conceito de sociedade
empresarial:

Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se


obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade
econômica e partilham, entre si, dos resultados.

Para nos ajudar, coloquei em negrito os elementos-chave desse conceito que deverão
obrigatoriamente fazer parte do nosso estudo.

Uma primeira observação importante é a de que nem todas as sociedades empresariais são
formadas através de um contrato. Logo o conceito é falho. Na verdade, a sociedade pode ser
formada tanto por um contrato como por um estatuto (ou convenção). Pode não parecer para
você agora, mas existe uma brutal diferença entre essas duas categorias de sociedade.

Existem princípios básicos de regulação do direito empresarial. São eles:

- a sociedade empresária é fruto de um contrato plurilateral ou de um estatuto;

- a sociedade empresária é uma pessoa jurídica de direito privado;

- a conservação da empresa deve ser objeto de zelo;


- a minoria societária será sempre respeitada;

- a tutela da pequena e média empresa deverá ser alvo de uma maior preocupação;

- a liberdade de contratar e a autonomia da vontade, dentre outros, sempre prevalecerão, como


fruto da aplicação do direito privado.

CONTRATO SOCIAL X ESTATUTO SOCIAL

A sociedade empresarial formada por um contrato é denominada sociedade contratual (por


exemplo, a sociedade limitada). Já aquela constituída através de um estatuto é uma sociedade
estatutária (por exemplo, a sociedade anônima).

Quando tratamos da sociedade contratual, devemos ter em mente que o contrato social não é
um contrato comum. No contrato comum encontramos um encontro de vontades opostas, em
um momento específico (por exemplo, num contrato de compra e venda de um automóvel, o
comprador quer adquirir, e o vendedor quer dispor do bem). Existe aqui a divergência de
pretensões.

No contrato societário existe a chamada plurilateralidade, ou seja, um paralelismo de intenções


(todos os sócios desejam que a sociedade dê certo, e que haja efetivamente o resultado
esperado). Existe, portanto, um objetivo comum que é buscado por todos os sócios que
compõem a sociedade.

No estatuto existe uma grande semelhança com as proposições acima apresentadas. Todos os
sócios também lutam pelo desenvolvimento do objeto social e esperam por ele para conseguir
alcançar o objetivo de qualquer um que se envolve no meio empresarial: o lucro. A diferença
está na autonomia do estatuto. Primeiramente, ele tem forma pré-estabelecida. A Lei 6.404/76
(Lei das Sociedades Anônimas) é, em si, um estatuto completo. Por escritura pública ou
assembléia, duas ou mais pessoas contribuem para a formação do capital social, adquirindo o
direito de auferir lucros derivados da prática empresarial desempenhada pela entidade.

PERSONIFICAÇÃO JURÍDICA

A personificação jurídica só existe no universo jurídico. Resulta de uma ficção pragmática


necessária que atribui personalidade e regime jurídico próprios a entes coletivos, tendo em
vista a persecução de determinados fins.

A partir do momento em que a sociedade empresarial é registrada, seja através do registro de


um contrato ou de um estatuto, ela recebe, pelo direito, o status de pessoa jurídica. Como
pessoa jurídica, ela é sujeito de direito e poderá, em virtude dessa atribuição legal, praticar atos
jurídicos não vedados por lei. Seus sócios manterão relações jurídicas entre si e com a nova
pessoa que produziram.

Logo, não existe aqui uma associação de empresários que se utilizam de uma coletividade
para exercer a atividade empresária, mas, perante terceiros, é a sociedade que, com
capacidade própria, negociará.

Reconhecida pelo direito como ente diverso dos sócios e com autonomia, essa sociedade
recebe uma tríplice capacidade:

- autonomia jurídica: a sociedade é capacitada, pelo direito, para titularizar, ativa e


passivamente, ações em juízo, poder ser parte em um processo e eleger seus próprios
representantes (que não precisam ser, necessariamente, os procuradores dos sócios);
- autonomia negocial: realmente, não existem condições de uma pessoa jurídica, uma
sociedade empresarial, neste caso, entrar em uma loja e fazer uma compra. Mas, quando um
sócio atua no mundo empresarial, na qualidade de administrador ou representante de uma
sociedade empresária, isso é possível.

- autonomia patrimonial: a sociedade tem seu próprio patrimônio inconfundível com o dos
sócios.Desta forma, a sociedade responde com esse patrimônio pelas obrigações que assumir
ou que os sócios assumirem em nome dela.

Como você deve ter notado, eu falei que só terá personalidade jurídica própria aquela empresa
registrada com tal.

Já estudamos o registro empresarial. Você sabe que uma sociedade empresarial precisa para
ser registrada? Vá até seu Código Civil de 2002 e faça a leitura do artigo 45 do texto legal.

Em se tratando de uma sociedade empresarial contratual (como a Sociedade Limitada), o


contrato deverá ser elaborado e, em seguida, levado ao Registro Público de Empresas
Mercantis (as Juntas Comerciais) para que o mesmo ganhe respaldo jurídico e seja
reconhecido publicamente como o instrumento de regência dessa sociedade empresarial.

Caso seja uma sociedade empresarial estatutária (como a Sociedade Anônima), o estatuto,
elaborado através de uma Assembléia de Fundação ou mesmo de uma escritura pública,
deverá ser levado também ao Registro Público de Empresas Mercantis (Juntas Comerciais).

Gostaria que ficasse claro que há necessidade expressa da ocorrência do registro para que
haja efetivamente a transformação da sociedade empresária em uma sociedade com
personalidade jurídica diversa da dos sócios. Caso a sociedade insista em existir sem o devido
registro, sofrerá algumas conseqüências (Arts.986 e seguintes do Código Civil de 2002):

- não poderá requerer a falência (o empresário tem uma espécie legal especial para quando se
encontrar em situação de dificuldades econômicas – a falência – que é a liquidação na
qualidade de todo o ativo do empresário para o pagamento do passivo) de outro empresário;

- não poderá requerer a sua própria recuperação judicial;

- sua escrituração não desfrutará de eficácia probatória –os livros empresariais, que já
estudamos, sem o devido registro não terão efeito nenhum;

- caso se encontre em situação financeira irregular, sofrerá a falência e também será


enquadrada na hipótese de crime falimentar;

- os sócios respondem, sempre, ilimitada e solidariamente, pelos encargos sociais, excluído do


benefício de ordem aquele que se obrigou pela sociedade. Nesse caso, o legislador, no Art.
990 do Código Civil de 2002, estipula que os sócios que não participaram do negócio na
sociedade irregular (sem registro) respondem após ser afetado o patrimônio da sociedade. Já
aquele que efetivamente participou do negócio responderá junto com a sociedade (relação de
solidariedade) pelas dívidas sociais;

- os bens e dívidas sociais constituem patrimônio especial, do qual os sócios são titulares em
comum;

- os sócios, nas relações entre si ou com terceiros, somente por escrito podem provar a
existência da sociedade, mas os terceiros podem prová-la de qualquer modo;

- não existindo perante os órgãos tributários não pode contratar com o poder público;

- não existindo perante os órgãos fiscais, não poderá emitir nota fiscal;

- caso realize venda sem emitir nota fiscal, praticará crime de sonegação fiscal.
Assim como o início da sociedade é regido por legislação própria, a personalização da
sociedade empresária termina após um procedimento dissolutório, que pode ser judicial ou
extrajudicial. A inatividade não põe fim à personalidade jurídica.

Outro assunto que não poderíamos deixar de estudar é a questão dos limites da pessoa
jurídica. O princípio da autonomia da pessoa jurídica da sociedade não estava devidamente
tratado no Código Comercial de 1850. Na verdade, nesse regramento, a sociedade era um
mero instrumento para que os sócios, esses sim reconhecidos como comerciantes, realizassem
a atividade comercial, ou os atos de comércio, conforme já dissemos.

Com a chegada do Código Civil de 1916, houve o verdadeiro estabelecimento da dissociação


entre a sociedade (seja ela comercial ou civil) e os seus sócios.

No decorrer do século XX, o direito brasileiro assimilou normas e desenvolveu jurisprudência


que excepcionam a aplicação do princípio da autonomia da pessoa jurídica relativamente às
sociedades empresárias.

No campo do direito tributário (pagamento de impostos, taxas e contribuições), as garantias do


crédito fiscal estendem, em determinadas hipóteses, a responsabilidade pela falta de
recolhimento do tributo aos administradores ou sócios controladores.

No direito trabalhista é comum a arrecadação (penhora) de bens particulares dos sócios em


conseqüência dos débitos trabalhistas da sociedade.

A legislação previdenciária autoriza o INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) a cobrar


dos sócios da sociedade limitada o passivo social com a instituição.

A Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) e a lei de tutela das estruturas do livre
mercado e da repressão dos atos danosos ao meio ambiente autorizam a superação da
autonomia patrimonial e a responsabilização direta de sócios por atos da sociedade.

Nesses casos, reconhecemos a “quebra” da autonomia da sociedade, como pessoa jurídica


autônoma dos sócios, em função do instituto da responsabilização.

A desconsideração da personalidade jurídica da sociedade empresarial, prevista no Art. 50 do


Código Civil de 2002, restringe-se ao âmbito de relações e obrigações de fundo empresarial

Segundo o Art. 50, em caso de abuso de personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de
finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do
Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e
determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos
administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Logo, percebe-se que a razão de ser do desprestígio da autonomia da pessoa jurídica poderá
ocorrer por dois fatores: pela utilização fraudulenta do expediente, como meio de se furtar ao
cumprimento de deveres legais ou contratuais e pela natureza da obrigação imputada à pessoa
jurídica.

SÓCIOS

Normalmente, todos aqueles que desejarem ser sócios poderão fazer parte da sociedade
empresarial, contato que contribuam com capital ou bens para a formação do patrimônio da
sociedade.

E o menor de idade? Já estudamos que, quando ele for emancipado, poderá ser empresário. E
na qualidade de sócio?

O incapaz poderá participar da sociedade empresária, se esta for de responsabilidade limitada


e quando ele não praticar atos de gestão; além disso, o capital da sociedade deverá ter sido
completamente integralizado.

Nos termos do Art. 977 do Código Civil, encontramos uma nova limitação para os sócios:

Art. 977. Faculta-se aos cônjuges contratar sociedade, entre si ou com terceiros, desde que
não tenham se casado no regime de comunhão universal de bens, ou no da separação
obrigatória.

O presente artigo foi declarado inconstitucional (ou seja, vai de encontro aos princípios da livre
associação, dispostos no Art. 5°, XVII) pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. O
Supremo Tribunal Federal ainda não analisou a questão, mas, pelo menos em Minas Gerais, o
entendimento que predomina é o de que efetivamente não será permitido o contrato de
sociedade para esse tipo de relação conjugal. Mas, por quê?

Porque, na hipótese de encontrarmos marido e mulher, casados no regime de comunhão total


de bens, poderá haver a confusão patrimonial tão temida pelo legislador: os sócios têm
convívio dentro e fora da sociedade; logo a chance de ocorrer uma mistura do patrimônio
pessoal com o empresarial é muito grande.

Já no caso da separação obrigatória de bens, o legislador buscou a proteção do próprio regime


que poderia ser burlado, caso fosse permitida a existência de sociedade entre os cônjuges sob
a regência desse regime de bens no casamento.

Mas e aquelas sociedades constituídas antes da vigência do CC/02? Nos termos do Código
Civil de 2002, artigo 2031, elas teriam prazo para se adequar à nova legislação. Ocorre que o
DNRC (Departamento Nacional de Registro de Comércio), a JUCEMG (Junta Comercial do
Estado de Minas Gerais) e JUCESP (Junta Comercial do Estado de São Paulo) têm um
posicionamento diverso. Entendem que as sociedades anteriores são ato jurídico perfeito e não
precisam se atualizar. Os enunciados 204 e 205 do Conselho da Justiça Federal também
entendem a questão nesse sentido. Isso não significa que seja efetivamente o entendimento
mais acertado. Com a criação da pessoa jurídica, não há o aperfeiçoamento do ato jurídico
perfeito, por que esta continua persistindo no tempo. Não é um estado permanente; é um ato
continuado, sucessivo.

Você achou interessante? Acredito que muitas coisas sobre as quais falei nesta aula você já
sabia, mas não conhecia o fundamento técnico. Assim fica mais gostoso de entender as
coisas... Vivo falando que o Direito não é um curso de formação, mas um curso de vida!

Resumo

Continuando nosso estudo, verificamos que o Código Civil de 2002, em seu Art. 966, não diz
apenas sobre o empresário individual. Esse conceito de “empresário” também é perfeitamente
cabível para uma sociedade empresarial, já que esta realiza de forma organizada e com
profissionalismo atividade econômica para fins de produção e circulação de bens ou serviços.

Tendo em vista esse fato, agora passaremos a estudar o comportamento do legislador com
relação à sociedade empresarial. Existem outros tipos de sociedades, mas para nós bastará o
estudos destas.

Para tanto, buscamos em primeiro lugar conceituá-las. O conceito de sociedade encontra-se no


Art. 981 do CC/02. Ocorre que precisamos adaptá-lo para que este seja o conceito de uma
sociedade empresarial. Isso porque, em se tratando de sociedade empresarial, não poderá o
sócio contribuir apenas com sua força de trabalho (antiga sociedade de capital e indústria –
sociedade onde um sócio contribuía com o capital e o outro apenas com o trabalho).

Um outro elemento importante neste estudo é o instrumento de constituição da pessoa jurídica


empresária. Esta nasce com o seu registro. O instrumento poderá ser na forma de contrato
social ou estatuto social, dependendo do tipo de sociedade escolhido pelo empresário.

Com o registro, dá-se o surgimento de uma pessoa jurídica, ficção criada pelo direito para
regularizar instituições e sociedades. Essa pessoa jurídica se dissocia da figura dos sócios, um
ponto por vezes complicado de imaginar. Apesar de não existir na vida real (não anda na rua,
não come, não assina), a sociedade personalizada fará quase tudo o que uma pessoa natural
faz e será responsável por seus atos, e não os sócios.

Essa última observação é muito importante. A figura da sociedade não se confunde com a dos
sócios. Em se tratando de problemas financeiros, administrativos e outros, a sociedade será
demandada em juízo, ser for o caso, e não os sócios. Cabe, por último, ressaltar que, em casos
excepcionais, os sócios serão também chamados ao processo, e nesses casos deverá ser
flagrante o uso abusivo da pessoa jurídica.

ATIVIDADES

1) Qual a diferença entre o empresário individual e a sociedade empresária?

2) Diferencie contrato social e estatuto social.

3) Quais os requisitos necessários para que uma sociedade seja personalizada?

4) O menor poderá ser sócio de uma sociedade empresária?

5) Você considera a sociedade empresária um elemento importante na economia brasileira?


Aula 9 - As sociedades empresariais – Parte I

Objetivos

• Compreender a principal classificação das sociedades empresariais.


• Identificar a sociedade empresarial nacional.
• Entender a metodologia de criação de um contrato social.
• Identificar o administrador societário, seus poderes e limitações.
• Conhecer os processos de resolução e dissolução social.

Introdução

A idéia de estar em sociedade parece ser até interessante, não é mesmo? Compartilham-se
responsabilidades, incentiva-se a criação de um ente jurídico especificamente criado para as
relações empresariais... E quais são essas sociedades empresariais? Como posso criar uma
sociedade, quais são as regras que as regem?

Agora passaremos a analisar mais friamente a estruturação de uma sociedade empresarial.


Sobre ela já vimos a personificação, a responsabilização, a desconsideração... Agora vamos
ver quais são os tipos societários empresariais existentes e como estruturá-los de forma a
atender o objetivo de quem quer estar em sociedade.

São cinco os tipos de sociedade empresarial:

- sociedade em nome coletivo;


- sociedade em comandita simples;
- sociedade em comandita por ações;
- sociedade limitada;
- sociedade anônima.

Nos moldes do direito brasileiro, o empreendedor que estiver disposto a se reunir em


sociedade não poderá fazê-lo, a não ser por meio de um desses tipos descritos em lei.

Conforme você já deve inclusive presumir, as sociedades anônima e limitada são as de maior
importância econômica. As demais, em razão de sua disciplina inadequada às características
da economia da atualidade, são utilizadas apenas em atividades mais periféricas e marginais.
Na verdade, no modelo empresarial brasileiro, quase nula será a participação dos outros tipos
societários. Mesmo aquelas já existentes estão migrando ou se transformando nos tipos mais
aceitos pelo mercado e pela sociedade em geral.

A sociedade em conta de participação, em razão das peculiaridades apresentadas por seu


perfil jurídico (contrato de investimento que ganhou status de sociedade), não é considerada
sociedade mercantil.

NACIONALIDADE DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA

De acordo com o ordenamento jurídico nacional, considera-se sociedade empresarial nacional


aquela que atende a dois requisitos: ter sede no Brasil e estar organizada de acordo com a
nossa legislação (Art. 1.026 do Código Civil de 2002). Podemos dizer, portanto, que são
irrelevantes a nacionalidade dos sócios e a origem do capital aplicado na constituição da
sociedade.
Quando a sociedade empresarial não atender a tais requisitos, será estrangeira para fins
legais, e seu funcionamento, no Brasil, dependerá de autorização do Governo Federal. (Art.
1.134 do Código Civil de 2002).

Caso o empreendedor estrangeiro resolva efetivamente explorar a atividade empresarial no


Brasil, deverá procurar o Ministério ou agência estatal com competência para a fiscalização da
atividade que ele exerce. Se não houver órgão específico para tanto, a autorização de
funcionamento deve ser protocolada no DNRC (Departamento Nacional de Registro de
Comércio).

O instrumento jurídico próprio para a autorização de funcionamento é o decreto do Presidente


da República. A sociedade estrangeira será fiscalizada pelo governo e poderá ter a sua
autorização cassada se infringir norma de ordem pública ou praticar atos contrários às suas
finalidades estatutárias (Art. 1.125 do Código Civil de 2002).

Logo, restam ao investidor ou empreendedor estrangeiro duas alternativas para o exercício da


atividade empresarial no Brasil:

- constituir sociedade empresária brasileira, da qual se torne quotista ou acionista;

- requerer pedido de autorização para funcionamento no Brasil. Não há nova pessoa jurídica
formada, mas é uma licença para extensão, no Brasil, das operações negociais exploradas
pelo investidor estrangeiro.

CONTRATO SOCIAL

O contrato social tem o poder de traduzir um ato de concepção. Os sócios concebem uma
sociedade empresarial quando celebram o contrato de sociedade. Com apenas o contrato
social, a sociedade empresária passa a existir realmente, mas, juridicamente, a sociedade só
existirá após o registro do instrumento contratual.

Considerando a pessoa natural, o ser humano não é criado pelo registro. Ele existe, realmente,
antes de se registrar. Todavia, para se tornar um ser do mundo jurídico, necessita de um
registro.

Nós já vimos os efeitos (graves!) do não registro da sociedade empresarial. O direito resolveu
reconhecê-la, mesmo irregular, para que terceiros não fossem lesados por esse “descuido” do
empresário. Entretanto, a sociedade não desfrutará dos direitos e privilégios das sociedades
que realmente o são. Além do que os sócios, pelas obrigações irregularmente assumidas
respondem pessoalmente, já que a personalidade jurídica não está presente.

Caso uma sociedade empresarial resolva atuar no meio sem o registro, ela “faz de conta” que é
pessoa jurídica e, nesse caso, efetivamente contrai obrigações. Claro que não poderá deixar de
responder por elas a pretexto de não existir. Responderá como se existisse, porque
aparentemente existe e não pode abafar a boa-fé de terceiros que acreditaram tratar-se
efetivamente de uma sociedade devidamente registrada e que, por isso, realizaram negócios
com esse ente despersonalizado.

O legislador não deu tanta importância ao registro do contrato ou do estatuto por nada. O
contrato define, em seu corpo, a sociedade. Estabelece uma verdadeira programação da vida
social.

Para criá-lo, deve-se estar atento, primeiramente, aos requisitos do Art. 104 do Código Civil de
2002, que são requisitos gerais e necessários para qualquer ato jurídico: capacidade do
agente, licitude e possibilidade do objeto, além de tratar-se de forma prescrita ou não defesa
em lei.
Outra boa orientação seria no sentido de se pesquisarem os elementos contidos no Art. 997 do
Código Civil de 2002. Esse artigo está alocado em meio ao tratamento da sociedade simples,
que veio substituir a “sociedade civil” que se rege pela ética civil. Você se lembra de quando
falamos sobre a diferenciação entre o empresário e o não empresário e abordamos a questão
da ética? Aqueles que não estiverem coadunando com a ética empresarial e não se revestirem
das formas societárias empresariais poderão fazer uso da legislação específica (Arts. 997 a
1.038 do Código Civil de 2002).

Nos termos desse artigo, cito alguns requisitos que não podem faltar num contrato societário:

- nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos sócios, se pessoas naturais, e a
firma e denominação, nacionalidade e sede dos sócios, se pessoas jurídicas;

- denominação, objeto, sede e prazo da sociedade;

- capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie


de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária;

- a quota de cada sócio no capital social e o modo de realizá-la;

- as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, seus poderes e atribuições;

- participação de cada sócio nos lucros e perdas;

- responsabilidade dos sócios.

Essas são algumas das disposições importantes que devem constar em um contrato social.

Com relação aos elementos específicos, vislumbramos, no contrato social, um conteúdo misto,
que envolve duas espécies de cláusulas:

- cogentes;

- dispositivas.

As cláusulas elaboradas de livre vontade dos sócios (cláusulas dispositivas) não serão objeto
de nosso estudo, já que seria quase impossível abranger os tantos tipos de cláusulas que
podem constar em um contrato social.

Outros elementos fundamentais (cláusulas cogentes) deverão ser analisados com mais
profundidade para que você, ao assessorar um empresário, possa ajudá-lo a desenvolver
melhor seu trabalho.

A primeira cláusula de suma importância é a de que uma sociedade empresarial só resultará de


um acordo de vontades; logo fruto da combinação de duas pessoas naturais ou jurídicas, a não
ser em situações excepcionais (na legislação ligada à sociedade anônima, por exemplo, existe
a possibilidade de uma sociedade empresária formada por uma só pessoa – a subsidiária
integral. Ocorre que essa pessoa única deverá ser uma outra pessoa jurídica). Caso um ou
mais sócios resolvam deixar a sociedade, a legislação estipula prazo (Art. 1.033, inciso IV do
Código Civil – 180 dias) para recomposição do quadro social. Caso isso não ocorra, a
sociedade deverá ser extinta através do procedimento de dissolução.

Os sócios, para participarem da sociedade empresarial, deverão contribuir com seus esforços
ou com capital. Cabe aqui reafirmar que, em se tratando de sociedade limitada ou sociedade
anônima, hoje, está proibida por lei a participação com prestação de serviços (Art. 1.055, §2°
do Código Civil de 2002 e Lei 6.404/76, Art. 7°).

Essa contribuição dos sócios constituirá o chamado “capital social”, que é o primeiro patrimônio
da sociedade comercial. Segundo Coelho, “É a soma representativa das participações (em
dinheiro ou bens) dos sócios.”
Outra cláusula importante é a que discrimina a divisão de lucros e perdas. O próprio conceito
de sociedade empresarial já tange essa informação: “Art. 981. Celebram contrato de sociedade
as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício
de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.”

A distribuição dos lucros pode não ser pactuada de modo absolutamente igualitário. Atenderá à
medida da participação de cada sócio, ou seja, é calcada na proporcionalidade.

ADMINISTRAÇÃO SOCIETÁRIA

Normalmente, em um contrato social, há uma cláusula que trata especificamente da


administração da sociedade. Escolhe-se o responsável, dispõe-se sobre seus poderes e
limitações. Mas isso pode não ocorrer. E como iremos resolver esse problema?

A própria legislação nos dá a saída: nos termos do Art. 1010 e seus parágrafos, caso o contrato
social não estipule nada sobre a administração, esta caberá a cada um dos sócios
separadamente. Essa é a chamada de “administração disjuntiva”. Nesse caso, surgindo
problemas, as decisões serão tomadas pela maioria social. Ocorre que também aí aumentam
as responsabilidades de todos os sócios, que antes eram considerados apenas participantes
da sociedade e que agora assumem a qualidade de sócios administradores.

Os administradores da sociedade têm responsabilidade solidária perante a sociedade e


terceiros prejudicados, quando agirem com culpa funcional, nos termos do Art. 1.016 do Código
Civil de 2002.

O administrador que, sem anuência escrita dos sócios, aplicar créditos ou bens sociais com
desvio de poder, beneficiando-se ou favorecendo terceiros, deverá reparar o dano social
causado, seja pela restituição, seja pelo pagamento de valor equivalente, com os lucros
resultantes. No caso do prejuízo, responderá pelo valor correspondente, nos termos do Art.
1.017 do Código Civil de 2002.

Caso o administrador seja nomeado por instrumento em separado e não averbá-lo à margem
da inscrição da sociedade, responderá pessoal e solidariamente perante a sociedade pelos
atos que praticar, nos termos do Art. 1.012 do Código Civil de 2002.

Você deve estar estranhando o fato de eu utilizar, durante quase o tempo todo desta nossa
aula sobre sociedades empresariais, a legislação pertinente à sociedade simples que, como já
vimos, não se trata de uma sociedade empresarial, não é mesmo? Ocorre que ela é o diploma
subsidiário, que deve ser utilizado na ausência de disposições concretas e específicas sobre
aquele tema.

RESOLUÇÃO E DISSOLUÇÃO SOCIAL

A resolução social, que também pode ser denominada dissolução parcial, consiste em um
processo societário em que haverá a saída de um ou mais componentes da sociedade. Isso
pode até parecer estranho para você, já que está acostumado a ouvir: “Se alguém quiser sair
da sociedade, apenas venda suas quotas ou ações!” Mas existem alguns tipos societários, que
inclusive dispõem acerca disto em contrato, em que esse tipo de retirada não poderá se
efetivar dessa forma.

Naquelas sociedades em que as qualidades do sócio foram extremamente importantes para


que ele viesse a fazer parte do contrato social, por exemplo, a saída do mesmo não poderá ser
imprudente, ensejando a entrada de qualquer um em seu lugar.
A dissolução parcial não extingue a sociedade. Esta continua com os sócios remanescentes,
sua personalidade jurídica permanece intacta, a empresa preservada. Daí pra frente, os sócios
que permaneceram no quadro social deverão decidir como proceder: comprarão as quotas
daquele que deixou a sociedade? Extinguirão essa sociedade? Autorizarão a entrada de um
terceiro? Sob quais condições?

Ficou claro para você que tal resolução só será possível em uma sociedade com mais de dois
componentes, não é? Porque, se em uma sociedade de duas pessoas, um resolve sair, aquele
que permaneceu em sociedade deverá, dentro do prazo legal, recompor a estrutura social.
Caso contrário, a sociedade caminhará para sua dissolução e, por conseqüência, para a
extinção.

São possíveis causas de resolução (ou dissolução parcial): vontade do sócio (Art. 1.029 do
CC/02); exclusão do sócio que não deu sua contribuição para a formação do capital social –
chamado, no direito empresarial, de sócio remisso (Art. 1.004 do CC/02); exclusão judicial do
sócio (Art. 1.030 do CC/02); falência do sócio (Art. 1.030 do CC/02); liquidação de sua conta
por execução de credor (Art. 1.026 do CC/02); morte do sócio (Art. 1.028 do CC/02).

Efetuado o procedimento resolutório, os administradores deverão levantar um balanço


patrimonial (lembra-se das demonstrações sociais? Vimos que o balanço patrimonial deverá
ser levantado uma vez ao ano. Nesse caso, deverá ser elaborado um balanço especial para
apurar o valor que deve ser pago ao(s) sócio(s) que deixa a sociedade).

O crédito a ser recebido pelo sócio que deixa a sociedade tem valor patrimonial correspondente
ao das quotas que titulava.

Já a dissolução total inaugura o processo de extinção da sociedade empresarial.

O processo extintivo social se desdobra em três fases: dissolução total, liquidação e partilha do
acervo social.

A dissolução total da sociedade poderá se dar extrajudicial ou judicialmente. Algumas


hipóteses de dissolução extrajudicial: deliberação unânime dos sócios, fim do prazo de
duração, inexistência de pluralidade de sócios, no prazo de 180 (cento e oitenta dias), ou
mesmo uma disposição contratual lícita.

A dissolução judicial será realizada através de uma sentença judicial. Podem dar ensejo a tal
hipótese, nos termos do Art. 1.034 do Código Civil de 2002: anulação do contrato ou estatuto
social, impossibilidade de preencher o fim social e o exaurimento do objeto social.

Após a documentação do fim social, ocorrerá a liquidação. Nessa fase, deverá ser realizado
todo a ativo e solucionado o passivo social, podendo isso processar-se judicialmente ou não.

Logo após a dissolução, os administradores ou o juiz (em se tratando de dissolução judicial)


deverão eleger um liquidante e limitar a gestão própria aos negócios inadiáveis, vedadas novas
operações que, se realizadas, levarão à sua responsabilização solidária e ilimitada.

Nos termos do Art. 1.103 do CC/02, encontramos alguns exemplos de deveres de um


liquidante: arquivar e publicar a ata da assembléia geral, sentença ou instrumento que tiver
deliberado ou decidido a liquidação; arrecadar bens, livros e documentos da sociedade, onde
quer que estejam; levantar o balanço patrimonial; confessar a falência ou pedir concordata nos
prazos previstos na lei.

O liquidante só poderá gravar bens e contrair empréstimos com expressa autorização da


assembléia geral. A exceção fica por conta dos recursos indispensáveis ao pagamento de
obrigações inadiáveis.

De acordo com o Art. 1.106 do Código Civil de 2002, o liquidante deverá, ainda, respeitados os
direitos dos credores preferenciais, pagar as dívidas sociais, proporcionalmente e sem
distinção entre dívidas vencidas ou vincendas (que ainda estão para vencer), mas, em relação
a estas, com desconto.

A ordem preferencial é a mesma do procedimento falimentar (Lei 11.101/05, Art. 83):

- acidente de trabalho;

- empregados e representantes comerciais;

- dívida ativa (tributos, taxas e contribuições);

- créditos fiscais;

- créditos com garantia real (garantidos por um bem, móvel ou imóvel);

- créditos com privilégio especial;

- créditos com privilégio geral;

- créditos quirografários.

A partilha, dentro do processo extintivo de uma sociedade empresarial, não é uma fase
obrigatória. Na verdade, ela ocorrerá quando o fim da sociedade se der em um momento
favorável para a sociedade, em termos financeiros.

Os sócios podem deliberar que, antes de terminada a liquidação e depois de pagos todos os
credores, se façam rateios entre os sócios, à proporção que se forem apurando os haveres
sociais (Art. 1.107 do Código Civil de 2002).

Encerrada a liquidação e partilhado o acervo societário restante entre os sócios, o liquidante


deverá prestar contas de todas as operações sociais. Caso sejam aprovadas as contas,
encerra-se a liquidação e a sociedade se extingue. O sócio dissidente (aquele que não
concordar com a deliberação) terá o prazo de trinta dias, a contar da publicação da ata, para
promover a ação que lhe couber (Art. 1.008 do Código Civil de 2002).

Caso algum credor societário não concorde ou se sinta prejudicado com a forma de extinção da
sociedade (desconfie de irregularidades, preferências...), pode cobrar dos acionistas ou sócios,
individualmente, o pagamento de seus créditos, até o limite da soma por eles recebida.
Também pode propor contra o liquidante, se for o caso, ação de perdas e danos. O sócio
executado poder cobrar dos demais a parcela que lhe couber no crédito pago.

Os documentos referentes a todo esse processo de encerramento da atividade social deverão


ser devidamente organizados e arquivados no Registro de Empresas Mercantis, bem como
publicados. Caso esse procedimento não seja realizado com total lisura e transparência, os
sócios serão responsáveis pelas obrigações assumidas perante terceiros.

Arquivado o ato de dissolução no Registro Público de Empresas Mercantis, extingue-se a


pessoa jurídica. A extinção formal, seguindo o processo descrito acima, configura o fim da
sociedade empresária e o desfazimento de todos os acordos e contratos pactuados, bem como
o fim da conjugação paralela de intenções em torno do objeto social. É a morte da sociedade.

Diferentemente do que, com certeza, grande parte dos cidadãos pensa, o simples abandono do
local ou da atividade não configuram o fim da personalidade jurídica social. Hoje, você, como
aluno de Direito Empresarial, entende que tanto a criação como o fim da personalidade jurídica
da sociedade são aspectos sérios da atividade e, portanto, devem ser tratados com a
seriedade e formalidade que a lei exige.
ALTERAÇÕES NA ESTRUTURA SOCIETÁRIA

Muitas vezes, ao invés de extinguir a sociedade empresarial, talvez o melhor caminho seja
mesmo alterar sua estrutura societária. Essa mudança poderá ocorrer através de quatro
operações societárias básicas: transformação, fusão, incorporação e cisão.

Se a operação não abranger nenhuma sociedade anônima ou se não se tratar de operação na


própria companhia, o diploma legal a ser utilizado será o Código Civil de 2002, em seus artigos
1.113 a 1.132. Em se tratando de transformação, fusão, incorporação e cisão envolvendo uma
sociedade anônima o diploma legal será a Lei 6.404/76.

A transformação consiste na mudança de tipo societário. Não acarreta a dissolução, nem


mesmo a liquidação do ente societário. O quórum para aprovação de tal medida deverá ser o
de unanimidade, a não ser que o contrato disponha de forma diversa. Os credores da
sociedade continuam titularizando as mesmas garantias dadas pelo tipo societário anterior.

A incorporação é a operação societária na qual uma sociedade absorve outra ou outras, que
imediatamente deixam de existir. A lei faculta a saída daqueles que não concordaram com a
deliberação – os dissidentes.

A fusão é a união de duas ou mais sociedades, dando nascimento a uma nova. Segue o
mesmo procedimento de incorporação. Os acionistas dissidentes têm direito de retirada. Tanto
na incorporação como na fusão, os credores prejudicados podem pleitear a anulação da
operação.

Caso haja falência da sociedade que é fruto da incorporação ou fusão, poderá ser pleiteada a
separação das massas.

Ambas as operações precisam de AUTORIZAÇÃO do CADE (Conselho Administrativo de


Defesa Econômica), caso a operação envolva sociedades que, juntas, representem 20% (vinte
por cento) do mercado relevante ou que tenham faturamento bruto relevante. (Lei 8.884/84)

A cisão é a transferência de parcelas de patrimônio social para uma ou mais sociedades pré-
existentes ou constituídas na oportunidade. Só haverá o direito de retirada quando (a cisão?)
acarretar a participação do acionista em sociedade com objeto essencial diferente ou
dividendos obrigatórios menores que os da cindida, ou ainda integrante de grupo a que não
pertencia a cindida.

Existirá, entre as sociedades resultantes da cisão, solidariedade quanto às obrigações da


cindida.

Você realmente imaginava que existiam tantas regras para uma sociedade empresária? Bom, e
não acaba por aí...

Resumo

As sociedades têm um tratamento específico no ordenamento jurídico. Para tanto, será


necessário estudar uma teoria geral de sociedades para depois partir para o estudo
singularizado de cada uma delas.

São sociedades empresariais: a sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples


e por ações, sociedade em conta de participação, sociedade limitada e sociedade anônima. Na
próxima aula estudaremos os tipos societários um a um.

Em se tratando de teoria geral, primeiramente devemos analisar a nacionalidade da sociedade.


Diferentemente do que muita gente pensa, a sociedade nacional é aquela cuja sede encontra-
se em território brasileiro e ela segue a legislação nacional. A nacionalidade do capital ou dos
sócios não é relevante para esta classificação.
O contrato social, assunto já abordado superficialmente na aula passada, será um grande
aliado da sociedade, se ela assim desejar. Caso contrário, poderá este ser também um grande
empecilho para o desenvolvimento regular do contexto societário. O contrato deverá ser
formado de cláusulas cogentes (necessárias) e dispositivas (facultativas). Dessa forma, todo
este complexo de normas irá disciplinar o comportamento da sociedade interna e
externamente.

A administração societária será realizada por aqueles eleitos no contrato ou estatuto social. O
administrador ou gerente (dependendo do tipo societário deverá ser sócio ou não) tem grandes
vantagens, já que ele estará na condução dos negócios, tomando decisões, dispondo sobre os
padrões da empresa (atividade). Mas, em contrapartida, gera também grandes
responsabilidades.

A sociedade pode ser desmembrada, contanto que restem pelo menos 2 (dois) sócios. Esse
processo é denominado resolução ou dissolução parcial. Nesse caso, deverá ser observado o
disposto em contrato social. Em não havendo nenhuma disposição sobre a resolução no
contrato social, parte-se para o disposto em lei. Dependendo do tipo societário, recorreremos
ao Código Civil ou à Lei 6404/76, das Sociedade Anônimas.

Quando do fim da sociedade, teremos a dissolução total, que não importa em apenas um ato.
Temos a dissolução, a liquidação do ativo (pagamento de credores) e, no fim, a partilha, que é
a distribuição dos resíduos societários (se existirem!) aos sócios.

Ao invés de colocar fim em sua sociedade, por conta de contratempos, poderão os sócios optar
ainda pela alteração na estrutura societária. Poderão transformar sua sociedade em um tipo
diferente, fundi-la com outras, dando origem a uma nova sociedade, incorporar-se a uma outra
empresa ou mesmo cindir-se, ou seja, partir-se em duas ou mais sociedades.

Recursos não faltam, não é mesmo? Mãos à obra!

Atividades

1) Quais os tipos societários empresariais existentes no ordenamento jurídico brasileiro?

2) O que diferencia as sociedades empresariais das outras sociedades (cooperativas,


sociedade simples...)?

3) Dê dois exemplos de cláusulas cogentes no contrato social.

4) Quando a sociedade será considerada nacional? Quem poderá administrar a sociedade


empresarial?

5) Diferencie a resolução da dissolução social. Quais são as outras possibilidades, expostas


em lei, de alterações na estrutura societária?
Aula 10 – As sociedade empresariais – Parte II

Objetivos

• Identificar os tipos sociais existentes na legislação brasileira.


• Reconhecer os principais pontos de diferenciação entre as sociedades empresariais
contratuais e as estatutárias.
• Compreender a importância das modalidades: sociedade limitada e sociedade anônima.

Introdução

Depois de conhecermos os valores e disposições comuns a todas as sociedades empresarias,


agora estamos prontos para encerrarmos o direito societário. De que forma? Estudando os
vários tipos empresariais existentes, compreendendo sua importância e validade em
determinado momento histórico.

A escolha do tipo societário é de fundamental importância, pois, além das normas específicas a
que se sujeitarão a sociedade empresária ou a simples, em razão do tipo societário adotado, a
sua escolha também importará em relevantes conseqüências no que tange ao grau de
responsabilidade pessoal dos sócios pelas obrigações sociais.

Mas, antes de entrarmos diretamente nos tipos societários personalizados, ou seja, naqueles
dotados de personalidade jurídica para tal atividade, acho interessante “darmos uma
pesquisada” nos tipos despersonalizados.

Se você for até seu Código Civil, pode conferir comigo: o Art. 981 está inserido em um título, na
verdade o Título II – Da sociedade, em seu capítulo único – Disposições gerais. O subtítulo I,
que vem bem acima do Art. 986, trata, especificamente, da sociedade não personificada.

Em primeiro lugar, temos a sociedade em comum, que já estudamos. Sim, já estudamos


quando do tratamento da sociedade irregular, aquela que não tem ou não registrou seu
contrato social, lembra-se?

Os Arts. 986 a 990 do CC/02 referem-se justamente ao tratamento dado à sociedade


empresarial que não optou pelo registro, ou seja, que não recebeu a sua personalidade jurídica
própria, existindo, por isso, todo um comprometimento de sua autonomia negocial, patrimonial
e jurídica, de que já tratamos na nossa AULA 8. Essa é a sociedade em comum.

No capítulo II deste mesmo título, temos a sociedade em conta de participação. Ela pode ser
conceituada como um contrato de investimento ao qual o legislador deu o título de sociedade
empresária.

Nessa sociedade existem duas modalidades de sócios: o sócio oculto, ou participante, que não
aparece perante terceiros, e um sócio ostensivo, em nome do qual são realizadas todas as
atividades (Art. 991 do CC/02).

Nesse tipo de sociedade, só assume, efetivamente, obrigações perante terceiros o sócio


ostensivo. Os demais sócios, participantes, obrigam-se exclusivamente perante o sócio
ostensivo, nos termos estabelecidos pelo contrato social. Se algum credor se sentir lesado por
uma sociedade em conta de participação, deverá cobrar do sócio ostensivo. Este deverá se
prontificar a resolver o passivo, já que essa função é de sua exclusiva responsabilidade.

Caso exista alguma cláusula determinando responsabilidades do sócio participante, ou oculto,


perante o sócio ostensivo, posteriormente aquele deverá ser acionado.
A sociedade é tão despersonalizada que o arquivamento dos atos constitutivos da sociedade
em conta de participação, no órgão de registro competente, é dispensável. E, mesmo que esse
arquivamento seja realizado, tal ato não conferirá personalidade jurídica a essa sociedade (Art.
993 do CC/02).

Agora podemos passar à análise dos tipos societários empresariais.

SOCIEDADE EM NOME COLETIVO

A sociedade em nome coletivo tem seu tratamento legal nos Arts. 1.039 a 1.044 do Código Civil
de 2002.

É uma sociedade que deverá ser formada por sócios que devem ser obrigatoriamente pessoas
naturais (físicas), já que têm responsabilidade solidária e ilimitada pelas obrigações sociais.

Isso significa que, esgotado o patrimônio social, o credor poderá ainda persistir em sua
cobrança, através do patrimônio dos sócios. Daí a responsabilidade solidária e ilimitada entre
os sócios desse tipo empresarial.

A administração dessa sociedade também só poderá ser realizada por sócios.

O nome empresarial utilizado nesse caso será a firma ou razão social, e qualquer dos sócios
poderá ter seu nome na composição da razão social.

Caso um dos sócios venha a falecer, se o contrato social não dispuser em contrário, opera-se a
liquidação das quotas do falecido (Art. 1.028 do CC/02).

SOCIEDADE EM COMANDITA SIMPLES

É a chamada sociedade mista, em que um ou alguns sócios, denominados “comanditados”,


têm responsabilidade ilimitada pelas obrigações sociais, e outros, os sócios “comanditários”,
respondem limitadamente por essas obrigações.

Somente os sócios comanditados (responsabilidade ilimitada) podem ser administradores. Os


sócios comanditários não poderão praticar atos de gestão da sociedade, evitando-se, assim, a
possibilidade de que, ao agirem em nome dela, sejam tomados por administradores e sócios de
responsabilidade ilimitada. Poderão, apenas, através de procuração, exercer atos especiais
para benefício da sociedade.

SOCIEDADE EM COMANDITA POR AÇÕES

A sociedade em comandita por ações está regulamentada no Código Civil, nos Art. 1.090 a
1.092. Nesses artigos, existe a referência legal de que o diploma supletivo de tratamento
(observando que só existem 3 artigos que tratam do tema) é o das sociedades anônimas ( Lei
6.404/76).

A administração exclusiva da sociedade será exercida pelos seus acionistas que, ao


assumirem tal função, serão considerados diretores. Estes respondem subsidiária e
ilimitadamente pelas obrigações sociais. Nos termos do art. 1.091 do CC/02, o diretor destituído
ou exonerado permanece, pelo prazo de 2 (dois) anos responsável pelas obrigações sociais
contraídas sob sua administração.
SOCIEDADE LIMITADA

A sociedade limitada (que talvez seja o único tipo societário que você pelo menos já tenha
ouvido falar, mas com outro nome – sociedade por quotas de responsabilidade limitada) é o
tipo empresarial mais comum e de maior presença na economia brasileira.

Representa, hoje, mais de 90% (noventa por cento) das sociedades registradas nas Juntas
Comerciais. Por quê? Por que tanta popularidade no Brasil? Dois fatores são de grande
relevância para tal fato: a limitação da responsabilidade dos sócios e a sua contratualidade.

Com relação à limitação de responsabilidade dos sócios temos que neste tipo societário, cada
quotista ou sócio é responsável por uma parcela do capital social, ou seja, é diretamente
responsável pela integralização (pagamento) de sua(s) quota(s). Mas não termina aí! Fica
também indiretamente responsável pela integralização de todas as outras quotas –
integralização do capital social.

Vamos ao Art. 1.052 do Código Civil de 2002 para compreendermos melhor:

Art. 1.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas
quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social.

Antes de falarmos sobre o tema com mais profundidade, acho interessante tratamos das
figuras subscrição, realização e integralização de capital social. A subscrição ocorrerá
quando o sócio se comprometer em contribuir com uma quantia para a sociedade. À medida
que vai fazendo o pagamento (caso não o faça à vista) ele está realizando o capital social
(tornando-o real) e ainda, quando o capital já estiver todo pago e inteiro à disposição da
sociedade, teremos aí a integralização de capital social.

Imaginemos uma sociedade limitada compostas por FULANO e BELTRANO. Cada um deles é
responsável pela integralização de 50% (cinqüenta por cento) do capital social, já que eles
compraram 50 (cinqüenta) quotas cada um. FULANO integraliza, isto é, entrega efetivamente o
dinheiro necessário para pagar pelas 50 (cinqüenta) quotas. BELTRANO, entretanto, embora
tenha se comprometido em fazer o pagamento, não o fez. Em caso de insolvência (sociedade
que não tem recursos suficientes para honrar seu passivo), FULANO terá que responder com
os seus bens particulares pelo valor correspondente às 50 (cinqüenta) quotas de BELTRANO.

O capital social, formado da contribuição dos sócios ou quotistas, divide-se em quotas iguais ou
desiguais. A contribuição só poderá ser feita em dinheiro ou bens. Não existe mais, na
sociedade limitada, a possibilidade da sociedade de capital e indústria, em que um dos sócios
contribuía com o capital e outro com o trabalho.

Não há qualquer tipo de exigência legal com relação à integralização e um valor mínimo no ato
da subscrição das quotas, ou mesmo de um prazo para tanto.

O nome da sociedade por quotas pode ser composto por firma/razão social ou denominação.
Ambos devem ser procedidos da palavra “limitada” ou da expressão “Ltda.”. Caso haja omissão
de tal termo, na razão social ou na denominação, serão havidos como ilimitadamente
responsáveis os sócios-gerentes e os que fizerem uso da firma social, criando-se, sem querer,
uma sociedade simples ou em nome coletivo.

Hoje o seu tratamento legal é feito pelo Código Civil de 2002 (Arts. 1.052 a 1.087), e não mais
pelo Decreto 3.708/19.

O Código Civil expõe, em seus Arts. 1.045 a 1.051, o tratamento jurídico para tal tipo
empresarial.

O nome empresarial da sociedade em comandita simples, quando firma ou razão social, deve
ser composto apenas pelo nome civil dos sócios comanditados, sendo expressamente vedada
a utilização do nome civil dos sócios comanditários.
Pelo Código Civil podem ser administradores, hoje, na sociedade limitada, tanto o sócio como o
não sócio. Para tanto, haverá quoruns diferenciados e especiais. Em relação ao quorum de
eleição de sócio para administrador, ¾ (três quartos) do capital social deverão ser necessários
para eleição do mesmo. Caso haja a proposta de um não sócio, e o capital social esteja
completamente integralizado, temos um quorum de 2/3 (dois terços) do capital social. Se o
capital ainda estiver sendo realizado, o quorum para eleição de não sócio será o da
unanimidade do capital social (Art. 1.061 do Código Civil de 2002).

O Código Civil também inovou ao trazer a figura do Conselho Fiscal para a Ltda. Esse órgão
será facultativo, mas caso exista deverá ser composto por, no mínimo 3 (três) membros, sócios
ou não, residentes no país, eleitos na assembléia anual da sociedade, ocasião em que serão
fixadas as suas respectivas remunerações.

As limitações ao exercício da atividade empresária deverão ser transportadas para os sócios


administradores, por estarem diretamente envolvidos com a atividade empresarial. Também
deverão ser respeitadas as limitações para os membros do conselho fiscal.

Esse órgão é responsável pelo acompanhamento, junto à administração dos negócios da


sociedade, e o fará através de pareceres. Já está decidido, pelas cortes brasileiras, que este
parecer emitido pelo Conselho Fiscal não tem caracter vinculativo, ou seja, deverá ser
encaminhado para votação em Assembléia ou Reunião.

As deliberações sociais poderão ser tomadas em reunião (caso a sociedade conte com menos
de 10 sócios) ou em assembléia (caso a sociedade conte com mais de 10 sócios), nos termos
do Art. 1.072 do Código Civil de 2002. A reunião será desprovida de qualquer formalidade, e
sua convocação, instalação, freqüência deverão ser estipuladas no próprio contrato social. Já a
assembléia tem forma vinculada, e essa forma deverá obrigatoriamente ser respeitada.

A assembléia deverá ser convocada mediante avisos publicados por três vezes na imprensa
oficial e em jornal de grande circulação, com antecedência mínima de 8 (oito) dias. A
assembléia só poderá deliberar validamente se atendem à convocação sócio/sócios titular(es)
de pelo menos ¾ (três quartos) do capital social. Caso não seja atendido esse quórum de
instalação, deve-se proceder à segunda convocação, com três outras publicações e avisos e
antecedência de 5 (cinco) dias. Atendidas as formalidades, a assembléia se instala validamente
com qualquer número.

Na hipótese de uma pequena quantidade de sócios, a sociedade poderá ainda optar pela não
realização nem de Assembléia, nem de reunião, formalizando em escrita e registrando a
deliberação, de acordo com o Art. 1.072, §2° do Código Civil de 2002. Isso porque, na
sociedade limitada, geralmente encontramos um tipo empresarial menor no qual todos os
sócios participam ativamente do cotidiano da empresa.

SOCIEDADE ANÔNIMA

O tratamento jurídico para este tipo empresarial encontra-se na Lei 6.404/76, a Lei das
Sociedades Anônimas. Apesar do nome específico, poderíamos considerar esse diploma legal
um modelo de “Código Societário”. Nele encontramos todos os tipos de disposição a respeito
de sociedade empresarial.

O Código Civil de 2002, em seus Arts.1.088 e 1.089, faz menção ao tratamento das sociedade
anônimas. Ocorre que o Conselho Nacional da Justiça Federal optou por desconsiderar tais
artigos, frente à prévia existência de farta legislação sobre o assunto, na Lei 6.404/76.

O modelo S/A ou companhia é um modelo estritamente empresarial. O seu objeto é sempre


empresarial, nos termos do Art. 2° da Lei 6.404/76. Esse modelo tem como paradigmas dois
elementos fortes: o capital e a responsabilidade dos sócios.

O capital é a única exigência para a participação no tipo empresarial. Na S/A, a única condição
para a participação de alguém é que tenha capital para investir na sociedade. Seu credo, cor,
sexo, intelectualidade... nada disso é levado em consideração.

O outro fator de grande importância é a questão da responsabilidade dos sócios. Aqui, cada
sócio ou acionista é estritamente responsável por subscrever e integralizar suas ações. E
ponto. Nada mais. Não existe compromisso com o todo e muito menos com a parte do outro. É
o cume do capitalismo e consagra todos os princípios do direito empresarial: a busca do lucro
como principal objetivo, a atividade como instrumento para obter vantagens e a limitação da
responsabilidade.

Podem ser levantadas como características da sociedade anônima:

a) capital dividido em ações;

b) responsabilidade dos acionistas restrita ao valor das ações subscritas e integralizadas;

c) natureza jurídica empresarial, por força de lei;

d) livre participação de incapazes e proibidos de comercializar (só lhes é vedado a participação


na administração).

A companhia poderá ser fechada ou aberta. Será aberta quando negociar seus valores
mobiliários em mercado de balcão ou bolsa de valores (Art. 4° da Lei 6.404/76).

Valores mobiliários são títulos, papéis, documentos que as sociedades anônimas colocam no
mercado a fim de captar investimentos (ações, debêntures, partes beneficiárias e bônus de
subscrição).

A negociação poderá ocorrer em Bolsa de Valores (Bovespa, Nasdaq, entre outras) ou em


mercado de balcão (local onde se negocia o primeiro lançamento do valor mobiliário no
mercado – a intermediação da negociação de valores mobiliários se dá por um banco ou
instituição financeira). A supervisão de todas essas operações encontra-se nas mãos da CVM
(Comissão de Valores Mobiliários), uma autarquia que fiscaliza e regula o mercado aberto.

A companhia fechada, por sua vez, não negocia seus valores mobiliários nem em mercado de
balcão, nem em bolsa de valores. Ela negocia particularmente seus valores. E não pense que
isso é sinônimo de pequenez da empresa. O grupo Votorantim é uma companhia fechada por
decisão de seu diretor-presidente, Sr. Antônio Ermírio de Morais.

A companhia terá nome empresarial na forma de denominação, a não ser em situações


especiais, em que, por exemplo, houver uma homenagem a um sócio fundador (Art. 3° da Lei
6.404/76).

O capital social é um dos elementos-chave deste modelo societário. O valor do capital deverá
ser verdadeiro. Caso ocorra a superavaliação dos bens para aparentar um capital social maior,
poderá ser considerada a hipótese de responsabilização dos sócios administradores (Art. 8° da
Lei 6.404/76).

O capital social não poderá ser modificado (majorado ou diminuído), a não ser em hipóteses
específicas previstas em lei. E, ainda, nos termos do Art. 5° da Lei 6.404/76, o valor disposto
em estatuto ou ata assemblear deve ser exato (não poderá ser indexado) e grafado em moeda
nacional.

Diferentemente das quotas, as ações deverão, sempre, ter o mesmo valor para a companhia. É
claro que o valor de negociação, em bolsa ou não, poderá ser variado. Mas, para a sociedade,
o valor deverá ser sempre o mesmo.

As ações podem ter estruturas físicas diversas. Existem as ações cartulares ou documentais,
hoje pouco usuais, que são impressas em certificados (Art. 24 da Lei das Sociedades
Anônimas) e também as ações escriturais, que não existem fisicamente, mas são dados
contábeis que constam apenas em livro escritural da companhia e nos registros da instituição
financeira.

Podem as ações ser ainda de espécies diferentes. As ações ordinárias são aquelas que, como
o próprio nome indica, conferem obrigações e direitos comuns (essenciais) aos seus
detentores. Dê uma olhadinha no Art. 109 da Lei das Sociedades Anônimas. Esses são os
direitos essenciais de um acionista na sociedade anônima. As ações preferenciais, descritas no
Art. 17 da mesma lei, podem ter suprimido o seu direito de voto, por outro lado asseguram aos
proprietários certas vantagens sobre o acionista ordinário (direito de dividendos prioritários,
participação prioritária em acervo das sociedades...).

Você se lembra de termos estudado os valores mobiliários logo ali em cima? Eu falei de mais
alguns valores que não as ações, não foi?

As partes benefíciárias são títulos que asseguram a seus proprietários participação nos lucros
(Art. 46 da Lei das Sociedades Anônimas). Quem compra ou adquire uma parte beneficiária
terá direito de receber parte do lucro, caso esse efetivamente ocorra. Podem ser resgatáveis
em dinheiro ou em forma de ações.

A debênture é um título da dívida privada. Representa um empréstimo, um contrato mútuo


entre a companhia e o debenturista. Se você comprasse uma debênture de uma Sociedade
Anônima, você se tornaria o credor dela. Logo, na escritura da debênture, você encontraria o
prazo e em que condições aquele valor seria devolvido a você. A escritura de emissão de
debêntures deve ser arquivada no Registro Público de Empresas Mercantis (Junta Comercial,
lembra?).

Na sociedade anônima, os sócios majoritários ou o administrador de fato é denominado por


sócio controlador. É aquele que tem maioria da participação societária, nos termos do Art.
116 da Lei 6.404/76. Pode ser tanto uma pessoa natural, como uma pessoa jurídica como um
acordo de acionistas (Art. 118 da Lei das S/A).

Os órgãos sociais de uma companhia são: Assembléia Geral, Conselho de Administração (que
não é obrigatório em todos os tipos de sociedade anônima), Diretoria e Conselho Fiscal.

A Assembléia Geral, formada por todos os acionistas com direito a voto, divide-se em
Assembléia Geral Ordinária (AGO) e Assembléia Geral Extraordinária (AGE). Através de um
quadro comparativo, estudaremos a diferença entre esses dois tipos de assembléia:

AGO AGE
Deverá realizar-se 1 (uma) vez
a cada exercício social, nos 4 Realizar-se-á quantas vezes
(quatro) primeiros meses do quanto forem necessárias.
exercício social.
Objetos residuais: fusão da
Objeto: Art. 132 da Lei das companhia, cisão... em geral,
Sociedades Anônimas assuntos que não fazem parte do
cotidiano de uma S/A.

O Conselho de Administração irá se sobrepor à diretoria, tendo em vista tratar-se de um


órgão de competência deliberativa – traça a política e estratégia administrativa a serem
adotadas pela diretoria. A diretoria, por sua vez, guarda as atribuições executivas – irá executar
tudo que for levado pelo conselho de administração e aprovado pela Assembléia Geral.

O Conselho de Administração deverá ser composto apenas por acionistas, salvo se o estatuto
dispuser em contrário (Art.140 da Lei das S/A), é órgão facultativo, via de regra (a não ser nas
sociedades de economia mista e nas companhias abertas de capital autorizado). Caso não
haja conselho de administração a diretoria assumirá suas funções.

O Conselho Fiscal é órgão de existência obrigatória na S/A, mas de instalação facultativa.


Como assim? Ele existirá sempre, com seus membros. Agora, seu funcionamento será
decidido pela Assembléia, que poderá optar. Tem por função examinar e dar parecer nas
contas dos administradores.

Encerramos aqui a nossa excursão pela primeira parte do Direito Empresarial. Daqui para a
frente desbravaremos, juntos, outros caminhos: os títulos de crédito, os contratos empresariais
e os institutos da falência e recuperações. Espero que você tenha aprendido tanto quanto eu
aprendi montando essas aulas pra você. E que também já esteja ansioso pelo próximo passo!
Vamos???

Resumo

Depois de termos estudado bastante a teoria societária, chegamos ao ponto principal: conhecer
as sociedades empresariais, suas características, benefícios, suas particularidades.

Destaquei, como início do nosso estudo, dois tipos societários: as sociedades em comum e as
sociedade sem conta de participação. Isso porque elas são exceções.

A sociedade em comum, antigamente conhecida como sociedade de fato ou irregular, é a por


nós hoje conhecida como “sociedade informal”. Sim, aquela sem registro ou mesmo sem
sequer um contrato social. O legislador não foi nem um pouco benevolente com este tipo de
reunião societária. Em não havendo registro, os sócios que cuidarem dos negócios serão
responsáveis por todas as operações ocorridas em sociedade. Nossa... que responsabilidade,
hein?

As sociedades em conta de participação eram muito comuns antigamente, tendo em vista um


incentivo fiscal que era disponibilizado para essa relação. Hoje em dia, temos, na verdade, que
ficar muito atentos ao tratar com uma sociedade como esta. Isso porque ela não é registrada e
compõe-se de duas modalidades de sócios: o participante (também chamado oculto) e o
ostensivo – responsável pelo desenvolvimento do negócio.

As demais sociedades deverão ser regularizadas, ou seja, registradas na Junta Comercial de


seu respectivo Estado.

A sociedade em nome coletivo é uma sociedade muito antiga que exige, para sua formação, a
presença de apenas sócios na forma de pessoa natural e ainda cria a responsabilidade
subsidiária para estes na hipótese da falta de recurso da sociedade para arcar com suas
obrigações.

A sociedade em comandita simples e por ações faz uma diferenciação bem interessante.
Temos o sócio comanditário que responde limitadamente pelas suas obrigações e não participa
da administração da sociedade (na comandita por ações este é conhecido como sócio diretor).
Já o sócio comanditado será aquele que tem responsabilidade ilimitada perante a sociedade e
participa de sua administração.

A sociedade limitada é a o tipo mais presente no Brasil. Caracteriza-se pelo fato de formar-se
com sócios quotistas, que respondem pelo valor integralizado do capital social. Este fato
diminui o risco dos sócios, que ficam mais aliviados ao formar tal tipo societário. O Código Civil
de 2002 inseriu em seu texto dispositivos interessantes que possibilitaram a existência de
sociedades limitadas de vários tamanhos e com perfis diversos. Ela é considerada uma
sociedade coringa, hoje.

A sociedade anônima é o tipo mais seguro. Isso porque o acionista responde apenas pelo valor
de suas ações, o que é uma grande garantia para o investidor. Ela é tão importante, que
ganhou regramento próprio: a Lei 6404/76, diploma extenso e perfeccionista na forma de tratar
da sociedade, que guarda inúmeras especificidades.
ATIVIDADES

1) Quais os ônus para aqueles que desejam realizar a atividade empresarial na informalidade,
ou seja, sem registro?

2) Na sociedade em conta de participação, quais as conseqüências da falência do sócio


participante? E do sócio ostensivo?

3) Quais as principais características das sociedades em comandita simples e por ações?

4) Por que a sociedade limitada é tão benquista pelos sócios?

5) Quais as principais características das sociedades anônimas?


Aula 11 – Os títulos de crédito e a atividade empresarial

Objetivos

• Identificar a importância do crédito para o Direito Empresarial.


• Reconhecer a importância da história para a formação da teoria geral dos títulos de crédito.
• Conhecer os fundamentos da teoria geral dos títulos de crédito.

Introdução

Olá!
Começamos agora uma nova jornada pelo Direito Empresarial. Estudaremos os títulos de
crédito, que efetivamente representam o maior aliado do empresário. Claro que, antes de entrar
diretamente em conceitos, atributos, obrigações, devemos fazer uma incursão na história da
instituição do crédito para descobrirmos juntos o porquê de sua existência.

HISTÓRIA E CONCEITO DE CRÉDITO

A história dos títulos de crédito começa muito antes do que imaginamos. Na verdade, começou
quando o ser humano conseguiu explorar melhor o meio em que vivia. Com a exploração,
nasceu a prática do escambo = troca.

Enquanto para alguns sobrava a caça, fruto de um trabalho diário de perseguição, para outros
era a abundância da pescaria que gerava sobras. Aproveitando-se das sobras, o homem
resolveu promover a troca de mercadorias.

O escambo, que é essa troca de bens e, eventualmente, de serviços por bens, foi um dos
colaboradores do desenvolvimento intelectual. Ocorre que, contraditoriamente, o escambo
limitava a circulação livre de bens, já que estava condicionado a uma necessidade, que nem
sempre ocorria: trocar a caça pela pesca (como o exemplo acima). E se quem disponibiliza a
caça está interessado em vegetais? E se o responsável pela pesca precisa efetivamente é de
água?

O ser humano, então, deu mais um passo em direção à evolução: notou que alguns produtos (o
sal, por exemplo) eram facilmente comercializáveis, utilizou-se desse produto como
instrumento de troca constante, ou seja, percebeu que a troca, usando esse produto, era
sempre bem-vinda, tendo em vista que ele não pereceria e poderia ser útil em situações
futuras, como produto e também como instrumento de troca.

Com a descoberta da fundição de metais e sua utilização pelas sociedades, o homem começou
a estabelecer um novo valor comunitário de trocas, já que se percebera a possibilidade de, em
todos os lugares, estabelecer um preço que se mensurava como um peso em ouro, prata,
cobre ou bronze.

A criação da moeda foi o ponto máximo dessa evolução. O Estado tomou para si a
responsabilidade da fabricação de tal artifício e a preservação de seu caráter oficial.

Bom, até o presente momento dei ênfase às relações imediatas, de caráter absolutamente
consumível. O crédito ganha ainda mais importância quando observamos as relações mais
duradouras, em que o elemento confiança aparece como chave do negócio.
Um problema real, com relação ao “instituto crédito”, é que, em tempos remotos, como você já
deve ter estudado em disciplinas relacionadas com o Direito, a obrigação (seja ela civil ou
mercantil) só poderia ser cumprida pelo titular da obrigação. Ou seja, era clara a existência de
um laço pessoal na relação entre os envolvidos no crédito. Se alguém contraía dívida, teria que
responder com seu corpo. Com o aparecimento da Lei Paetelia Papiria, em 429 d.C, houve a
separação entre o patrimônio e a pessoa, o que proporcionou a intervenção no patrimônio do
devedor e não na própria pessoa (que já ela não tinha tanto valor como o patrimônio em si).

Com essa desvinculação do caráter pessoal do crédito, a sua circulação ficou muito mais
simples e até possível. Mas só com o aparecimento da cártula ou do título é que a circulação
de riqueza tomou outras proporções. Isso ocorreu na Idade Média, quando, por necessidades
mercantis, começaram a aparecer documentos que representavam direitos de crédito, que,
num primeiro momento, não permitiam transferência, mas que, mais uma vez por força de
circunstâncias históricas, adquiriram a qualidade de endossáveis.

Não me canso de repetir, em minhas aulas, que o ramo do “Direito Empresarial” é fruto de uma
contingência e reflexo de necessidades históricas de engrandecimento da qualidade do
comércio. O estudo do direito creditício fica ainda mais interessante quando compreendemos
esse processo.

Desde então, a história do crédito se solidificou ao construir uma trajetória e uma metodologia
de evolução e utilização desses instrumentos de circulação de riqueza – e nada mais interessa
ao empresário do que a RIQUEZA.

Poderíamos, juntos, analisar um conceito de crédito que será muito mais fácil de compreender
se efetivamente levarmos em consideração essa evolução histórica já mencionada.

Na troca de bens geralmente existirá um lapso temporal entre a prestação e uma


contraprestação (entrega da mercadoria/ pagamento do preço) e aí encontramos o elemento
chave: a confiança. É absolutamente necessário o elemento “confiança” para que um dos
contratantes conclua sua parte no negócio e aceite que a outra conclua a sua num outro
momento, que pode ser pré-combinado ou não.

O crédito, ou seja, a confiança que uma pessoa inspira em outra de cumprir, em um tempo
futuro, obrigação assumida na atualidade veio facilitar grandemente as operações comerciais.

CONCEITO DE TÍTULO DE CRÉDITO

Torna-se praticamente impossível conceituar títulos de crédito sem citar o conceito de Vivante,
que elaborou a definição mais simples e completa desse instituto: “Título de Crédito é o
documento necessário para o exercício do direito, literal e autônomo, nele mencionado”

Antes de analisar os elementos desse conceito que nos ajudarão a tomar consciência do
conceito como um todo, acho importante irmos ao Código Civil de 2002, que tenta (mas não
consegue!!!) conceituar devidamente o instituto. O Art. 887 desse diploma legal traz o seguinte
texto: “Art. 887. O título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e
autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei.”

O conceito lhe parece bem próximo do de Vivante, não? Mas não é. Existe uma palavrinha que
praticamente inutiliza o conceito criado pelo legislador. E essa palavrinha é “contido”. O
entendimento doutrinário e jurisprudencial é no sentido de não se confundir o crédito com o
título. O crédito não está contido no título, e se fosse assim, com a morte do título não teríamos
mais o crédito. O crédito existia antes e com certeza não se prende ao título, que tem a função
de representar o crédito.

Partindo para a análise do conceito de título de crédito, deparamo-nos com alguns elementos,
atributos ou princípios que devem nortear sua criação, utilização e tradição. A doutrina, por
vezes, diverge com relação aos critérios de nomenclatura, mas vou utilizar aqui um tratamento
bem tradicional, adotado pela corrente majoritária.

O primeiro termo para o qual gostaria de chamar sua atenção é “documento”. O título de crédito
é um documento, e aí encontramos o nosso primeiro elemento – a documentalidade ou
cartularidade: existe aqui a densificação do crédito em um documento.

Além de documentar o crédito, o doutrinador fala em “direito literal”. A literalidade é o


predicado de correspondência entre o teor do documento e o documento em si. Para ficar mais
claro, poderíamos busca em Ascarelli as variações da literalidade. A literalidade positiva é
aquela em que TUDO o que está literalmente disposto no título tem validade. Já o aspecto
negativo desse atributo apregoa que TUDO o que não está literalmente disposto no título não
tem qualquer significado para o mundo jurídico. Como exemplo, poderíamos mencionar a
hipótese de que um cidadão X aposta sua assinatura em um título de crédito, acreditando
tratar-se de um compromisso em testemunhar a favor do credor. Ora, se a assinatura está
literalmente no título, quem a inseriu terá responsabilidade com o crédito e não a de ser mera
testemunha.

Um terceiro atributo essencial de um título creditício é a autonomia. Essa autonomia diz


respeito a cada obrigação contida no título. Cada uma é autônoma com relação às outras.
Quem se obriga se obriga por que e pelo que assinou. Se eu tenho um título com problemas na
assinatura do devedor principal, esses problemas não se estenderão ao avalista, por exemplo.
O aval é uma obrigação autônoma com relação ao devedor principal.

Existem ainda atributos considerados como não essenciais. A abstração diz respeito ao
princípio da inoponibilidade das exceções ao portador de boa-fé. Com relação a esse atributo,
acho bastante interessante pensarmos em um exemplo concreto: Você acabou de receber um
cheque de sua irmã como fruto de pagamento de uma dívida já antiga. Ao recebê-lo, percebeu
que seu valor era idêntico ao da sua dívida com a mercearia da esquina. Passando pela porta
da tal mercearia, entregou para seu José o cheque e aproveitou para comprar uma
lembrancinha para as crianças, já que o crédito fora recuperado. Ao tentar depositar o cheque,
seu José deparou-se com uma ordem de sustação realizada por sua irmã. Logo, logo, bateu à
porta dela, titular do cheque, fazendo a cobrança. Sua irmã alegou que a dívida original (com
você) já estava vencida e que não suspenderia a ordem de sustação do título. Não, não, não!
Nem ela, nem você poderiam fazer isso.

O terceiro de boa-fé não pode ser afetado por vícios e irregularidades presentes quando da
criação do título. A dívida deverá ser quitada com seu esforço, e você, a posteriori, deverá
procurar sua irmã para saber da legitimidade da sustação.

Na verdade, esse atributo não é essencial, porque no título de crédito existem momentos
diferentes.

Um momento contratual, que, no exemplo acima, encontra-se no pagamento que sua irmã lhe
fez. Todas as defesas poderiam ser apresentadas por ela: prescrição da obrigação, erro de
compensação, confusão feita com o cheque...

Num segundo momento, o crédito transforma-se em promessa unilateral de vontade, ou seja,


não poderá haver alegação do negócio subjacente. A relação exclusivamente cambial liga
credor e devedor. Nesse caso, quando da circulação do cheque, as defesas antes existentes
contra o devedor principal já não podem ser opostas perante terceiros. Seu José não sofrerá
prejuízo por um problema entre você e sua irmã: resolvam o problema de vocês depois. Faça
imediatamente o pagamento de seu José.

O último atributo, também não essencial, é a chamada, pela maioria da doutrina, causalidade.
Nem todos os títulos de crédito têm absoluta vinculação em relação ao negócio que lhe deu
origem. A duplicata, por exemplo, é um título causal. Sua origem está vinculada à emissão de
nota fiscal - fruto de venda de produtos ou prestação de serviços. Já a nota promissória pode
ser emitida sem nenhuma vinculação. Por isso não se trata de um atributo essencial.
CÓDIGO CIVIL DE 2002

O Código Civil também inovou, como no Direito Empresarial, a teoria dos títulos de crédito?
Existe uma mudança de paradigmas ou coisa parecida? Vejamos.

Nos termos do Art. 903 do CC/02, temos que, salvo disposição diversa em lei especial, regem-
se os títulos de crédito pelo disposto nesse Código. Curiosamente, os títulos de crédito mais
comuns, de utilização diária, têm tratamento em lei especial: logo poderíamos reservar seu
tratamento aos dispositivos legais específicos. (Lei das letras de câmbio, lei do cheque, lei da
duplicata...)

De acordo com Vivante, o tratamento se dará de forma dissociada: o título típico, nominado e
com lei específica que prescreva seus elementos continuará sendo tratado por ordenamento
jurídico particular, próprio.

O título denominado atípico, que, antes do Código Civil de 2002, não existia, agora seria
tratado pelo Art. 889 e seguintes do Código Civil de 2002. Na verdade, o CC/02 traria os
elementos essenciais para criação de um título de crédito novo, não tipificado.

Com relação à prescrição de tais títulos, teríamos o prazo do Art. 206, § 3°, VIII: prescreve-se
em 3 (três) anos a pretensão para haver o pagamento de título de crédito, a contar do
vencimento, ressalvadas as disposições de lei especial.

A execução também não se dará diretamente, como no caso dos títulos de crédito tradicionais.
O Art. 585, VIII do Código de Processo Civil confere ao título de crédito típico a qualidade de
título executivo extrajudicial, ou seja, não haverá necessidade de uma sentença de um juiz
reconhecendo a validade e credibilidade do título, pois ele, por si só, já faz prova de sua
exigibilidade. Não houve previsão de que os títulos de crédito atípicos fossem considerados
títulos executivos extrajudiciais.

E com o contrato e a assinatura de 2 (duas) testemunhas? Assim eles teriam reconhecido o


direito de serem considerados títulos executivos extrajudiciais? Conforme já vimos, de acordo
com o atributo da literalidade, qualquer assinatura posta em um título de crédito terá significado
cambial e não contratual.

Será cabível o protesto de tais títulos atípicos? Nos termos do Art. 1° da Lei n° 9.492/97 (Lei de
protestos – estudaremos do que se trata isso, mas acredito que você já tenha ouvido falar
alguma vez em protesto, nome positivado no SPC ou SERASA...), o protesto é o ato formal e
solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em
títulos e outros documentos de dívida, ou seja, poderá, aí, haver a abrangência dos títulos de
créditos atípicos.

LEGISLAÇÃO ESPECIAL

O Brasil é signatário de uma convenção internacional em matéria de títulos de crédito –


Convenção de Genebra ou Lei Uniforme de Genebra (LUG) –, que foi promulgada entre nós
por meio do Decreto 57.663/66, como normalmente é denominada na doutrina.

Acontece que, internamente, o Brasil já contava com um diploma de inegável qualidade no que
diz respeito ao tratamento das Letras de Câmbio e Notas Promissórias. Só que o Poder
Executivo, na época, baixou um decreto determinando o cumprimento da Convenção
Internacional, logo o sistema legal de tratamento dos títulos de crédito pode parecer um pouco
confuso.

Vamos desfazer esse “embrulho”?

Em princípio, vigora a Lei Uniforme de Genebra (LUG), que conta como Anexo 1 da Convenção
de Genebra sobre Letra de Câmbio e Nota Promissória.
Não terão validade, entretanto, perante a legislação brasileira, os seguintes dispositivos da
LUG: Art. 10; 3ª alínea do Art. 41; números 2 e 3 do Art. 43; quinta e sexta alíneas do Art. 44.

O Art. 38 da LUG deve ser completado nos termos da reserva, ou seja: as letras de câmbio
pagáveis no Brasil devem ser apresentadas ao aceitante no próprio dia do vencimento.

A taxa de juros de mora no pagamento de letra de câmbio ou nota promissória não é a


constante dos arts. 48 e 49, mas a mesma devida em caso de mora no pagamento de impostos
devidos à Fazenda Nacional (nos termos do Art. 406 do Código Civil de 2002).

No Decreto n° 2.044/08 (Lei brasileira que trata de letras de câmbio e nota promissória)
continuam em vigor os seguintes artigos: Art. 3° (relativo aos títulos sacados); Art. 10, sobre a
pluralidade de sacados; Art. 14 (quanto à possibilidade e aval antecipado); Art. 19; Art. 20
(salvo quanto às conseqüências na inobservância do prazo nele consignado); Art. 33
(responsabilidade civil do oficial do cartório de protestos); Art. 36 (anulação de títulos); Art. 54, I
(referente à expressão “nota promissória”).

CLASSIFICAÇÃO DOS TÍTULOS DE CRÉDITO

Existem inúmeras classificações para os títulos de crédito em toda a doutrina, mas resolvi
utilizar um critério que será útil para ajudá-lo a compreender melhor o instituto creditório em
estudo.

Serão nominais ou nominativos os títulos que forem emitidos em favor da pessoa cujo nome
conste no registro do emitente.

Os títulos ao portador, ao contrário, são aqueles que não consignam o nome do favorecido.
Hoje, no direito brasileiro, para fins de arrecadação, não são mais permitidos, por lei, os títulos
ao portador.

Isso por que os títulos ao portador têm circulação fácil, mas não segura. Os nominais, por sua
vez, têm circulação segura, mas não fácil. Os títulos à ordem têm uma circulação ao mesmo
tempo fácil e segura, ou seja, através do endosso, teremos a melhor e mais segura forma de
transmissão de crédito.

Os títulos à ordem são aqueles que trazem os nomes de beneficiários e, junto a esses, uma
cláusula esclarecendo que o direito à prestação pode ser transferido pelo beneficiário a outra
pessoa. (“Pague ao Sr. José ou à sua ordem...”).

Estudaremos mais adiante o endosso, quando, com certeza, essa informação sobre os títulos à
ordem ficará ainda mais fundamentada em seu entendimento.

REQUISITOS ESSENCIAIS

Como em qualquer negócio jurídico, nos títulos de crédito deverão, primeiramente, ser
respeitados os dispositivos do Art. 104 do Código Civil de 2002: agente capaz, objeto lícito e
possível, forma prescrita ou não defesa em lei. Já falamos sobre esse artigo anteriormente. Ele
norteia toda a orientação de atos de competência do direito privado. Isso porque ao privado é
delegado fazer tudo que a lei não proíbe. Então a variedade de atos que nos são lícitos está
somente adstrita às expressas proibições legais.

Mas existem ainda os requisitos próprios do Direito Cambiário, aplicáveis genericamente a


todas as modalidades de títulos de crédito. E, por último, também devem ser levadas em
consideração as exigências da legislação específica com relação a cada título de crédito.
Alguns dos requisitos essenciais genéricos são: denominação do título; assinatura de seu
criador; identificação de quem deve pagar; valor a pagar; data ou época do pagamento e data
de emissão.

Quando o título encontrar-se incompleto, a omissão de dados pode ser suprida pelo portador
de boa-fé, até o momento de fazer valer publicamente o título, ou seja, no fim da circulação,
nos termos do Art. 388, II do Código de Processo Civil:

“Art. 388. Cessa a fé do documento particular quando:

I – (...);

II – assinado em branco, for abusivamente preenchido.

Parágrafo único. Dar-se-á abuso quando aquele que recebeu documento assinado, com texto
não escrito no todo ou em parte, o formar ou o completar, por si ou por meio de outrem,
violando o pacto feito com o signatário.”

Bom, acho que, pra começar, demos grandes passos com relação aos títulos de crédito, não é
mesmo? Você percebe a importância da história no contexto do direito empresarial? Mesmo os
títulos de crédito, que já existem de longa data, sofreram e continuam sofrendo influência do
tempo. O que dizer dos títulos de crédito e a era digital? Muita polêmica já foi levantada,
existem países que admitem alguns deles: a duplicata digital, por exemplo.

O Brasil já assumiu um posicionamento sobre esse assunto. Não reconhece nenhuma


assinatura, que não a de próprio punho, para a validação de um título de crédito, nos termos do
Art.889 do Código Civil de 2002. Felizmente, muitas mudanças têm acontecido, principalmente
na área de certificação digital e assinaturas eletrônicas, o que poderá favorecer uma
readaptação do legislador brasileiro ao cenário mundial.

É ou não é um assunto absolutamente atual?

Resumo

Nesta aula, aprendemos muito sobre um tema que quase todos julgam conhecer: o crédito.
Lembro-me, até hoje, de minha primeira aula de direito empresarial quando o professor fez a
pergunta: “O que é crédito?” Eu sabia... mas não sabia responder...

Percebe-se, portanto, que institutos que utilizamos no nosso dia a dia são e podem ser muito
mais úteis do que pensamos, contato que haja o domínio conceitual e prático destes.

Esta primeira introdução busca demonstrar a estrutura dos títulos de crédito e sua utilidade no
nosso cotidiano, suas características, peculiaridades. Na próxima aula exploraremos melhor os
títulos em si, pelo menos os mais utilizados, já que hoje podemos lançar mão de outros
recursos para realizarmos nossas operações creditícias.

Atividades

1) Conceitue crédito.
2) Quais os princípios essenciais dos títulos de crédito? E os não essenciais?
3) Qual o significado de título a ordem, nominativo e ao portador?
4) Como se dá o tratamento dos títulos de crédito no código civil de 2002?
5) Faça um breve relato da evolução histórica dos títulos de crédito.
Aula 12 – Dos títulos de crédito: a letra de câmbio

Objetivos

• Reconhecer os principais títulos de créditos típicos.


• Entender o contexto histórico do surgimento da letra de câmbio e sua importância para o
estudo dos títulos de crédito.
• Conhecer as particularidades de uma letra de câmbio: modalidades, requisitos,
características.

Introdução

Depois de vasculharmos um pouco do histórico, dos requisitos, atributos, princípios e de outras


generalidades mais sobre os títulos, entraremos agora no estudo dos títulos de crédito em si.
Quais são eles? Cada um tem sua função? E suas particularidades?

Quais são os títulos de crédito?

- letra de câmbio;

- nota promissória;

- cheque;

- duplicata;

- outros títulos: notas e cédulas de crédito, cédula de crédito imobiliário, cédula de crédito
bancário, conhecimento de depósito e warrant, conhecimento de transporte marítimo.

Sim, existem vários tipos, alguns têm especificidades que os tornam únicos.

O mais importante, neste momento, é entender que todo o nosso estudo sobre os institutos
mais importantes ligados aos títulos de créditos será feito através da análise da letra de
câmbio. Apesar de aparentemente incomum (muito utilizada apenas em negócios
internacionais), é o título de crédito mais complexo, em que possivelmente poderemos
encontrar as mais variadas relações cambiais.

Fonte: http://commons.wikimedia.org
O que é uma letra de câmbio? É um título de crédito no qual alguém (1) declara que alguém (2)
irá pagar certa quantia a alguém (3).

De acordo com Martins:

é uma ordem dada, por escrito, a uma pessoa, para que pague a um beneficiário indicado, ou à
ordem deste, uma determinada importância em dinheiro. Requer, portanto, a letra de câmbio,
três elementos pessoais, que no título têm funções diversas: o que dá a ordem, chamado
sacador, o a quem a ordem é dada, que se chama de sacado; e aquele a favor de quem é
emitida a ordem, denominado de tomador ou beneficiário.

Não existe, em toda a doutrina, certeza quanto ao nascimento histórico da letra de câmbio.
Sabe-se apenas sobre a grande influência do direito italiano, francês e alemão em sua criação.

Foi aproximadamente na Idade Média, basicamente no litoral italiano, o começo da


estruturação desse instituto. Encontrando-se as cidades italianas com a atividade mercantil a
pleno vapor, por elas passavam mercadores de vários territórios, levando consigo várias
modalidades de moedas para realizarem seus negócios.

Para facilitar o comércio, surgiram os cambistas ou banqueiros, responsáveis pela troca das
moedas. Em um primeiro momento, essa troca era manual e efetuada em feiras, onde seus
responsáveis ficavam sentados em um banquinho (daí o nome “banqueiros” e logo depois
“bancos”).

Ocorre que, em meio a estradas perigosas e transportes suspeitos, os mercadores, com medo
de regressar às suas terras de origem conduzindo quantias generosas em moedas, deixavam-
nas em mãos dos banqueiros que ficavam responsáveis pela entrega dos pagamentos nos
lugares determinados. Para certificar a existência de um depósito, o banqueiro emitiam um
documento em que dizia que ele tinha a responsabilidade de fazer o pagamento aos credores
especificados do mercador em local pré-estabelecido.

Emitido tal certificado, que, na verdade, consistia em uma promessa de pagamento e não em
uma ordem, o banqueiro deveria enviar uma carta ao seu correspondente na localidade do
pagamento, determinando que entregasse à pessoa que conduzia o documento, ou a algum
representante, a importância determinada. Essa carta, sim, tinha um conteúdo de ordem de
pagamento e é reconhecida como a origem da letra de câmbio. Com o passar do tempo, houve
a simplificação do processo e a introdução de outros institutos: a possibilidade de endosso,
com o Código de Comércio Francês, de 1808. No século XIX, na Alemanha, através de estudos
realizados por Karl Einert, a letra de câmbio deixou de ser um simples meio de pagamento de
uma obrigação ou instrumento de um contrato preliminar para passar a ser uma modalidade de
título de crédito.

A letra de câmbio é um instrumento de declaração unilateral de vontade, elaborada em tempo e


lugar certos (nela firmados), por meio da qual certa pessoa (chamada sacador) declara que
uma outra pessoa (sacado) deverá pagar a um terceiro (tomador ou beneficiário) uma
determinada quantia, num local e numa data – ou a prazo –, especificados ou não. Considera-
se o título completo quando o sacado nele aposta sua assinatura, completando, assim, o ato
unilateral do saque.

No Brasil, a letra de câmbio apareceu (não como um título de crédito) primeiramente no Código
Comercial, datado de 1850, que, em seu Título XVI, descrevia o tratamento jurídico para letras,
notas promissórias e créditos mercantis. Enquanto estiveram em vigência as normas desse
dispositivo legal, a jurisprudência e a doutrina trataram de reformular uma série de disposições
acerca de letras de câmbio.

A Lei n° 2.044, de 1908, já atualizada de acordo com a doutrina alemã, descrevia o instituto
cambiário como autônomo com relação aos outros títulos e eficaz, mesmo desprendido de
outros negócios subjacentes, além de oriundo de um ato unilateral de vontade do subscritor.

Consegui demonstrar que o legislador brasileiro estava acompanhando as mais modernas


teorias existentes sobre o direito cambiário, sendo que, até hoje, a legislação continua
impecável, mesmo após o advento da Lei Uniforme de Genebra?

No período de 1910 a 1912, o Brasil, representado através de delegados especiais, participou


de uma das principais conferências internacionais para a unificação do direito sobre a letra de
câmbio e a nota promissória. Dessa reunião surgiu a disposição do governo brasileiro de aderir
ao acordo internacional, o que efetivamente ocorreu por meio de um Decreto Executivo de n°
57.663, de 24 de janeiro de 1966.

A letra de câmbio é, como vimos, um instrumento de crédito muito antigo na história, e sofreu,
ao longo dos anos, variações em seu regulamento legislativo, bem como na prática de sua
utilização. Atualmente, o título (e o instituto) é regulado pela LUG (Lei Uniforme de Genebra) e
supletivamente pelo Decreto 2.044/08 nas normas que não entrem em conflito com a referida
Lei Uniforme.

Conforme já vimos na aula 11, os conflitos não existem mais. O que efetivamente existe é uma
combinação de normas, fruto da Lei Uniforme e da Lei 2.044 de 1908. Se ainda restarem
dúvidas, recorra às explicações da aula anterior.

CARACTERÍSTICAS PRÓPRIAS DA LETRA DE CÂMBIO

Além dos atributos essenciais dos títulos de crédito (documentalidade, literalidade, abstração),
encontramos também, de acordo com a legislação específica, algumas características
especiais próprias das letras de câmbio:

• É um título à ordem. O título foi criado para a circulação. Logo, a cláusula “à ordem” é de sua
natureza, ainda que não venha expressamente escrita. Assim, para inviabilizar a circulação do
título, este deverá conter a cláusula, e não, a ordem expressa em sua cártula.

• É um título formal, logo deverá contar com os requisitos essenciais para os títulos de crédito,
já listados na nossa última aula. A expressão “letra de câmbio”, por exemplo, deverá existir no
título para que a letra valha como tal e possa gozar de certos direitos especiais de que não
gozam outros documentos de crédito.

• Consagra-se, também, em sua abstração. Uma vez preenchidos os elementos formais da


letra de câmbio, o título é absolutamente válido, independentemente da relação que lhe deu
origem. Por resultado dessa característica, temos que o portador de boa-fé, que recebeu o
título regularmente, tem os seus direitos de crédito garantidos, ainda mesmo que haja ocorrido
irregularidades no negócio que deu lugar ao nascimento ou transferência da letra.

• É um documento que deve ser apresentado para que os direitos nele contido sejam
exercidos. Caso a letra se perca ou seja destruída, será necessário um procedimento formal
para que o proprietário possa receber o direito representado pela mesma. Caso o devedor
resolva fazer o pagamento mesmo com a ausência do título, incorre no risco de pagar
indevidamente. E, você sabe que quem paga mal, paga duas vezes... Mesmo porque o
tomador, ou beneficiário do crédito, deverá entregar o título quitado ao devedor para encerrar
ali a relação cambial.

Requisitos essenciais

Nos termos do Art. 1° da Lei Uniforme de Genebra, a validade da letra de câmbio está
condicionada a alguns fatores.

a) A denominação “letra de câmbio” deve estar inserta no próprio texto do título e expressa na
língua empregada para a redação desse título.
b) O título deverá conter o mandato puro e simples de pagar uma quantia determinada. Se
houver divergência entre a indicação numérica e a indicação por extenso da quantia,
prevalecerá a última. Todavia, se a indicação da quantia for feita mais de uma vez, seja por
extenso, seja em algarismo, e divergirem as diversas indicações, deverá ser considerada a que
expressar menor valor.

A jurisprudência, por sua vez, já tem admitido a cambial indexada (a quantia a ser paga é
expressa com o aditamento de fator oficial de correção). O entendimento foi assim formado
com base na argumentação de que a exigência de indicação da quantia não significa exatidão,
mas determinação. Mesmo porque, em se tratando de um título com vencimento a posteriori,
poderá ocorrer a mitigação de seu valor real.

c) O nome da pessoa a quem se deve proceder o pagamento deverá estar expresso (ex: Ao Sr.
José da Silva, Rua José de Anchieta, 678, Nova Iguaçu. Pague V. Sª ao Sr. João Fernando,
pela presente letra de câmbio, a importância de R$ 5.000,00). É o nome do SACADO, ou seja,
o nome da pessoa contra quem a ordem é emitida, o sujeito passivo da relação cambial.

d) O nome da pessoa a quem, ou à ordem de quem, a letra deve ser paga também deve estar
expresso: aqui encontramos a figura do TOMADOR, o beneficiário da ordem que deverá ser o
receptor da quantia prometida pelo sacador e providenciada pelo sacado.

e) A indicação da data em que a letra é passada deve constar no título: depois de o título ser
revestido dos principais requisitos formais, somente poderá ser considerado um título que vale
por si mesmo, independentemente da causa que lhe deu origem, a partir da data em que foi
passado.

f) A assinatura do sacador também deve constar na letra: em se tratando de uma ordem de


pagamento, faz-se necessária a existência de alguém que responda por esse pagamento, se a
pessoa a quem ele foi ordenado não o realizar. Fica afastada a viabilidade de assinatura a rogo
ou lançamento de impressão digital. Existe divergência na doutrina sobre ser a letra de câmbio
reproduzida por outro meio mecânico.

A palavra “assinatura”, usada pela LUG (Lei Uniforme de Genebra), deve ser lida em sentido
abrangente, alcançando mais que a mera firma, ou seja, qualquer outro meio identificador do
sacador, suficiente para responsabilizá-lo.

Existem também os requisitos não obrigatórios ou não essenciais: época do pagamento, lugar
do pagamento, lugar da emissão, dentre outros.

MODALIDADES DE LETRA DE CÂMBIO

O título – neste caso específico, letra de câmbio – deve indicar o momento a partir do qual o
crédito passa a ser exigível, ou seja, a data do seu vencimento. Nos termos do Art. 33 da LUG
(Lei Uniforme de Genebra) existem 4 (quatro) modalidades desse título:

a) Letra de câmbio passada à vista: o vencimento se dá no ato de apresentação da letra de


câmbio ao sacado.

b) Letra de câmbio passada a dia certo: o vencimento se dará em um dia especial, estipulado
ou marcado (o vencimento deverá se dar em um dia útil, ou seja, um dia em que houver
expediente bancário).

c) Letra de câmbio passada a certo tempo da data: o título tem seu vencimento fixado em dias,
semanas ou meses contados da data do saque. O vencimento ocorrerá no último dia do prazo,
sem se contar o dia em que a letra foi sacada. Devem ser apresentadas para aceite, pelo
tomador, até o vencimento fixado para o título (Art. 21 da LUG).
d) Letra de câmbio a certo tempo da vista: O dia inicial do prazo para vencimento é a data do
aceite ou a data do protesto por sua falta. O tomador deverá apresentar a letra ao sacado para
o aceite até o prazo de 1 (um) ano após o saque.

O vencimento poderá ainda se dar de forma extraordinária, quando o beneficiário (ou tomador)
não obtiver espontaneamente do sacado o aceite, seja por motivo de ausência ou impedimento
do sacado, ou por oposição deste, tácita ou explícita. Nesses casos, o tomador tem o direito de
exigir do sacador o resgate imediato do título.

Também poderá ocorrer o vencimento antecipado, na hipótese de declaração de falência do


devedor empresário (Art. 333 do CC/02) ou de declaração civil de insolvência do obrigado (Art.
751, I, do CPC).

Nas últimas duas hipóteses, os débitos, tanto do falido como do insolvente, têm vencimento
antecipado. Imediatamente após a instauração do regime falimentar, todos os credores
(mesmo os créditos ainda não exigíveis) podem exercer a defesa de seus direitos. É imposição
da par condittio creditorum (que estudaremos na última parte do nosso curso). Mas para cobrar
a dívida, o credor deverá seguir o procedimento legal específico para tal e respeitar as
preferências e privilégios elencados na lei.

Em virtude de suas características, de sua natureza especial e das garantias que lhe são
conferidas por lei, a letra de câmbio exerce grande função econômica, sendo absolutamente
visível como “papel-moeda internacional”. Possibilita que operações que ocorrerão em tempos
diferentes possam ser compensadas. O crédito ganha fôlego, como fonte de riquezas,
acrescendo o patrimônio real das pessoas com um outro, decorrente da confiança.

Conforme já explanei, é a partir desse título tão completo que faremos o estudo das obrigações
cambiais: o aceite, o endosso e o aval. Isso porque na letra de câmbio podemos encontrar
essas três obrigações juntas ou em momentos diferentes.

Apesar de não ser um título de crédito muito comum, seu estudo é de suma importância, já que
traz em sua estrutura toda a evolução histórica que ocorreu no ramo do direito cambiário.

Na próxima aula entraremos mais profundamente nas obrigações cambias que, com certeza,
tornarão mais claro o estudo das cambias, de forma bem geral.

Até a próxima!!!

Resumo

Os recursos creditícios dos quais fazemos uso hoje não surgiram de um passe de mágica.
Todos foram sendo desenvolvidos através do uso continuado ao longo do tempo. Esta é uma
característica marcante dos títulos de crédito: não há um desenvolvimento teórico muito
grande, tendo em vista que eles se aprimoram com o uso e com o decorrer do tempo.

A letra de câmbio pode não ser tão conhecida ou mesmo usada nos dias de hoje, o que não lhe
tira a importância que tem na evolução dos títulos cambiários. Sendo assim, achei interessante
trazer os institutos principais do crédito que foram desenvolvidos através dela: o aceite, o
endosso, o vencimento, o pagamento e o aval, que serão tratados na próxima aula.

Atividades

1) Quais são as partes integrantes da letra de câmbio? Qual a função de cada uma delas?
2) Quais as características próprias da letra de câmbio?

3) O que é o aceite?

4) Quais as modalidades de vencimento de uma letra de câmbio?

5) Quando haverá o vencimento antecipado da letra de câmbio?


Aula 13 – Das obrigações cambiárias

Objetivos

• Entender a importância das obrigações cambiais para a circulação e efetividade do título de


crédito.
• Conhecer o aceite e sua importância.
• Reconhecer a utilidade e a importância do endosso.

Introdução

Conforme eu já havia dito, prosseguiremos no estudo dos títulos de crédito tomando por base a
letra de câmbio. Isso porque se trata de um título considerado completo, ou seja, que poderá
receber qualquer um dos tipos de obrigação cambial em seu corpo, espelhando toda a teoria
dos títulos de crédito. Após este estudo, passaremos à análise dos outros título importantes e
também mais utilizados no dia-a-dia de sua profissão.

No direito das obrigações, que subsidia todo o estudo do Direito Empresarial, reconhecemos o
pagamento como o fim desejado de todas as obrigações. Isso porque, por mais importante que
seja o débito, o que se espera é que ele seja quitado.

Nos termos do Art. 389 do Código Civil de 2002, temos:

“Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e
atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de
advogado.”

O título em si já se constitui como uma obrigação. Acontece que, para sua maior efetividade,
criaram-se outros recursos para que o título ganhasse autonomia e credibilidade. Essas
obrigações são: o aceite, essencial no que se refere a títulos sob a forma de ordem de
pagamento; o endosso, forma segura de circulação de títulos não ao portador, e aval, que
nada mais é do que uma garantia de pagamento.

Fonte: http://commons.wikimedia.org

De acordo com Martins, o aceite é “ato formal segundo o qual o sacado se obriga a efetuar, no
vencimento, o pagamento da ordem que lhe é dada.”
Para melhor elucidar esse brilhante conceito, recorreremos a um sistema gráfico:

Sacador (aquele responsável pela criação do título de crédito)

Sacado (aquele contra quem se expede a ordem)

Tomador (ou beneficiário) (aquele a quem deve ser pago o título)

A metodologia é simples, apesar de não aparentar ser. Vamos lá? O sacador emite uma letra
de câmbio em favor do tomador ou beneficiário, emitindo uma ordem para que o sacado faça o
pagamento de determinada quantia, em local e data determinados. O tomador vai até o sacado
e requisita o aceite, ou seja, o compromisso de que, nas condições ditadas no título, haverá a
quitação do débito. Ficou mais fácil? Talvez um exemplo com nomes o ajude a fixar melhor.

João Roberto, importador de mercadorias, emite uma letra de câmbio em favor de Liliane, que
mora fora do Brasil, para que esta receba determinada quantia de um fornecedor seu, que tem
sede na mesma localidade em que vive Liliane. O Sr. Geraldo é o responsável pela sede da
empresa fornecedora. De posse da letra, Liliane vai até o Sr. Geraldo requisitar dele o “aceite”
de que, em dia próprio e naquele local, ele lhe dará a quantia combinada. O sr. Geraldo assina
no anteverso do título. Está configurado o aceite. Daí para a frente, o Sr. Geraldo tornou-se o
principal obrigado pela letra de câmbio. Lembrando apenas que, caso o Sr. Geraldo não honre
seu compromisso, João Roberto continua como responsável pelo débito, só que agora como
obrigado indireto.

Quando o tomador ou beneficiário fizer a apresentação (ato de submeter uma ordem de


pagamento ao reconhecimento do sacado ou ato de exigir o pagamento) do título de crédito,
ele o fará ao aceitante, ou seja, àquele que é o chamado “devedor direto”, responsável direto
pela quitação da dívida. O aceite é o reconhecimento (feito, neste caso, pelo sacado) da
validade da ordem emitida pelo sacador, mediante assinatura na cártula, passando o sacado a
ocupar a função de aceitante.

O aceite estará presente em todo o título de crédito em forma de ordem de pagamento (por
exemplo, letra de câmbio e duplicata). Em se tratando de ordem de pagamento, o sacado é o
único que tem o direito de aceitá-la. Por esse fato é que o nome do sacado é requisito
essencial na confecção da letra de câmbio.

A assinatura do sacado será dada no anverso (frente) da letra; caso seja dada no verso, deverá
ser acompanhada da expressão que identifica sua aceitação. O aceite só existe em títulos de
crédito, ou seja, é uma obrigação exclusivamente cambial.

O aceite poderá ser puro ou simples. Nesse caso, o devedor principal (sacado) simplesmente
lançará sua assinatura na cártula. Não haverá nenhuma modificação ou objeção ao que já está
descrito no título. Caso o sacado se recuse a aceitá-la, isso não inviabilizará o título. A letra de
câmbio nasce com o saque (assinatura do sacador). O aceite não é obrigatório. Nesse caso,
fica como principal responsável o sacador, o emitente do título. A prova da recusa do aceite se
dá mediante protesto (estudaremos o instituto do protesto com bastante cuidado nas próximas
aulas. Fique tranqüilo!).

O sacador garante 2 (duas) situações diferentes no título: o pagamento dele, já que todos os
que assinam no título (lembra-se do princípio da literalidade?) garantem a sua quitação.
Garante, ainda, o aceite: caso haja recusa do sacado em concedê-lo, haverá o vencimento
automático do título de crédito.

E se o sacado só aceitar pagar parte do crédito? Ou mesmo se aceitar pagá-lo por inteiro, mas
em localidade diversa da acordada? A chamada recusa parcial poderá se dar em duas esferas:
poderá haver a recusa do aceite em relação à quantia expressa no título e aí, de acordo com a
doutrina majoritária, não haverá o vencimento antecipado do título (possibilidade de
apresentação imediata ao emitente – sacador), por se tratar de um exercício regular de direito.
Já na hipótese de recusa por outro motivo, haverá o vencimento antecipado do título, o sacador
será chamado a responder pelo título e o aceitante fica obrigado nos termos de seu aceite. Ex:
“Aceito pagar na praça de outra cidade que não a determinada no título...” Nesse caso, o
vencimento será antecipado, o emissor da letra deverá arcar com as obrigações nela
estampadas e eu serei obrigada a pagar nos termos do meu aceite, ou seja, em outra cidade.

Com relação aos demais termos do título de crédito, a exemplo do citado anteriormente
(mudança de praça de pagamento), a doutrina promoveu todo um estudo para resolver tal
problemática. Já vimos que em matéria de títulos de crédito - letra de câmbio e promissórias -
existe uma certa “inflação” legislativa: o tratamento conferido pela LUG ( recebida no Brasil
através do Decreto 57.663/66) e pelo Decreto 2.044/1908.

Vimos também que, com relação às matérias reservadas, existirá a aplicação do último diploma
legal. Nesse caso, prevalece, entretanto, o entendimento de acordo com o Art. 26 da LUG, que
permite o aceite parcial tanto com relação à quantia como aos termos da letra. Ocorre que, em
não se tratando de discrepância entre valores, haverá o vencimento antecipado do título, que
ocorrerá na nova praça eleita para o pagamento. O sacador e o aceitante serão responsáveis,
conjuntamente, pela quitação da obrigação carturária. Vamos conferir o que diz o Art. 26 da
LUG?

“Art. 26. O aceite é puro e simples, mas o sacado pode limitá-lo a uma parte da importância
sacada.

Qualquer outra modificação introduzida pelo aceite no enunciado da letra equivale a uma
recusa do aceite. O aceitante fica, todavia, obrigado nos termos do seu aceite.”

Logo ambas as alterações são permitidas, tanto o aceite parcial em razão de quantia
controversa, como em relação a alguns termos inseridos na cártula.

Cabe ressaltar que o aceite é irretratável e seu cancelamento tem os mesmos efeitos de uma
recusa.

O sacador poderá, ainda, inserir uma cláusula “sem aceite” que não garantirá a obrigação. O
beneficiário está dispensado de apresentar o título para o aceite. Deverá fazê-lo apenas para
fins de pagamento, mantendo-se, assim, o emissor do título como obrigado principal da
mesma. Caso o tomador resolva apresentá-la para aceite mesmo assim, e o sacado se recusar
em apostar ali sua assinatura como aceite, não haverá o vencimento antecipado do crédito
descrito na cártula.

O aceite poderá ainda ser oferecido em documento apartado. É a única obrigação cambial que
poderá ser dada fora do título de crédito. Ocorre que não terá validade perante terceiros, mas
apenas entre aqueles que participam do negócio.

ENDOSSO

O título de crédito poderá circular de duas formas: através de simples transmissão da cártula
(onde não haverá garantias) e através de endosso, com a assinatura do responsável pelo
crédito no anverso, verso ou no dorso do título de crédito.

Sabe-se que a transmissão do título ao portador é rápida, mas insegura, o que não ocorre na
hipótese do aparecimento do endosso, em que existirá uma transmissão rápida e garantida.

Aquele que, como forma de resolver a obrigação, simplesmente entrega ao credor o título, sem
endosso, não assume qualquer responsabilidade pelo pagamento da cártula. A simples
tradição transmite apenas o papel, enquanto o endosso transmite o direito mencionado no
papel.

A cessão de créditos e direitos não é um fenômeno exclusivo dos títulos de crédito, como se
pode perceber nos Arts. 286 a 298 do Código Civil de 2002. Ocorre que, em função da
circunstância histórica, a circulação do crédito cambiário dá-se de forma bem mais ágil.

O endosso é a obrigação cambial pela qual se transfere um título de crédito.

De acordo com Coelho, “conceitua-se, então, endosso como o ato cambiário que opera a
transferência do crédito representado por título ‘à ordem’. É claro, a alienação do crédito fica,
ainda, condicionada à tradição do título, em decorrência do princípio da cartularidade.”

Conforme já estudamos, os títulos, em matéria de circulação, serão, via de regra, “à ordem”, ou


seja, passíveis de circulação. A cláusula pode ser expressa ou tácita. Na verdade, caso não
seja inserida expressamente a cláusula “não à ordem” na letra de câmbio a mesma não será
transferível por endosso, mas apenas como cessão de crédito.

Para que haja a transferência legal da letra é necessário que o endossante seja realmente o
titular do crédito referido.

Nos termos do Art. 12 da LUG, o endosso parcial não terá validade. Aquele que resolver
endossar, deverá fazê-lo pelo inteiro teor da cártula. Não se admite o fracionamento. O
endosso deverá ser simples, puro, incondicionado. Caso seja inserida alguma cláusula
limitadora, esta será desconsiderada, ineficaz com relação ao título.

Existem algumas modalidades de endosso que são de interessante estudo:

a) ENDOSSO PRÓPRIO/PLENO: é a obrigação cambial pela qual se transfere a propriedade


de um título de crédito. É a transferência da cártula e do crédito.

b) ENDOSSO IMPRÓPRIO: é a obrigação cambial pela qual se transfere o título, mas não o
crédito nela mencionado. Dentro dessa modalidade encontram-se 3 possibilidades:

• endosso mandato (procuração): neste caso, o endossante constitui o endossatário seu


procurador. O endossatário tem a posse do título para receber o crédito em nome do
endossante. Recebe o crédito e entrega o título e o crédito para o endossante. É o mandato do
direito civil, com uma especificidade cambial. O endosso mandato não se extingue com o óbito.
Sua descrição legal encontra-se no Art. 18 da LUG:

“Art. 18. Quando o endosso contém a menção ‘valor a cobrar’ (valeur em recouvrement) ‘para
cobrança’(pour encaissement), ‘por procuração’ (par procuration), ou qualquer outra menção
que implique um simples mandato, o portador pode exercer todos os direitos emergentes da
letra, mas só pode endossá-la na qualidade de procurador.

Os coobrigados, neste caso, só podem invocar contra o portador as exceções que eram
oponíveis ao endossante.

O mandato que resulta de um endosso por procuração não se extingue por morte ou
sobrevinda incapacidade legal do mandatário.”

• endosso garantia/caução: o endossante constitui ao endossatário uma garantia, que é o


título de crédito. O emitente elabora o título dele mesmo em garantia de uma obrigação com
terceiro. Neste caso, o título de crédito servirá como garantia. (Lembra-se dos cheques caução
nos hospitais, que foram suspensos pelo Código de Defesa do Consumidor? Pois é um
exemplo de endosso caução.) Extinta a obrigação, sem problemas, devolve-se o título. Caso
haja problemas com o efetivo pagamento, haverá a penhora do crédito. Sua descrição legal
encontra-se no Art. 19 da LUG.

“Art. 19. Quando o endosso contém a menção ‘valor em garantia’, ‘valor em penhor’ ou
qualquer outra menção que implique uma caução, o portador pode exercer todos os direitos
emergentes da letra, mas um endosso feito por ele só vale como endosso a título de
procuração.
Os coobrigados não podem invocar contra o portador as exceções fundadas sobre as relações
pessoais deles com o endossante, a menos que o portador, ao receber a letra, tenha procedido
conscientemente em detrimento do devedor.”

• endosso fiduciário: construção doutrinária do Código Civil/2002. Trata-se de alienação


fiduciária em garantia de um título de crédito. A responsabilidade é do endossante que
permanece na posse do título.

c) ENDOSSO EM PRETO: neste caso, o endossante nomeia expressamente o endossatário.

d) ENDOSSO EM BRANCO: o endossante se limita a assinar o título. Neste caso, o título


circula ao portador. Aquele que detém o título presume-se iuris tantum o proprietário do título.
De acordo com a Lei 8.088/90, Art. 19, §2°, fica vedada a emissão de títulos ao portador no
Brasil.

e) ENDOSSO TARDIO: pode ser considerado como endosso tardio aquele que for concedido,
em cártula, através da assinatura, após o prazo de vencimento do título.

Vamos supor que Dona Gracinha, dona de uma gorda poupança, fez, a pedido de seu filho, um
empréstimo de uma quantia significativa à Tatiana, sua nora, para que a mesma montasse sua
tão sonhada lojinha de roupas de bebê. Na nota promissória, ficou estabelecido que o
empréstimo deveria ser quitado em um mês a partir daquela data. Após o vencimento do título,
sem que sua nora fizesse o pagamento, Dona Gracinha transferiu o título, através de um
endosso, para seu filho, a fim de que o mesmo procedesse à cobrança da dívida.

De acordo com a doutrina majoritária, o endosso dado após o vencimento tem o mesmo efeito
de um endosso comum.

Na verdade, a doutrina minoritária considera ainda a possibilidade do endosso dado após o


protesto ou o prazo para o protesto do título. Esse endosso é denominado ENDOSSO
PÓSTUMO. Nesse caso, será considerado o endosso, mas com efeitos de cessão de crédito.

E o que diferenciaria a cessão de crédito de um endosso?

Quanto à extensão da responsabilidade do alienante do crédito perante o adquirente, o


endossante responde, via de regra, tanto pela existência do crédito quanto pela solvência do
devedor. O endossatário poderá executar o crédito contra o endossante, caso o devedor não
tenha realizado o pagamento deste.

Já em matéria de cessão de crédito, o cedente responde apenas pela existência do crédito e


não pela solvência do devedor. Vamos até os artigos 295 e 296 do Código Civil de 2002 para
conferir a informação:

“Art. 295.Na cessão por título oneroso, o cedente, ainda que não se responsabilize, fica
responsável ao cessionário pela existência do crédito ao tempo em que lhe cedeu; a mesma
responsabilidade lhe cabe nas cessões por título gratuito, se tiver procedido de má-fé.

“Art. 296. Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pela solvência do devedor.”

Quanto aos limites do devedor em face da execução do crédito pelo adquirente, temos que, em
se tratando de uma cessão de crédito, o devedor poderá se defender, quando executado
(chamado em juízo para fazer o pagamento do título) pelo cessionário, argüindo matérias
referentes à sua relação jurídica com o cedente (Art. 294 do Código Civil de 2002).

Já quando a transferência de crédito se der por meio de endosso, o devedor não poderá
defender-se quando executado pelo endossatário, argüindo matérias atinentes a sua relação
jurídica com o endossante.

Ou seja, o endosso é sempre mais eficaz e seguro do que a cessão de crédito.


O efeito de cessão de crédito também existirá quando for inserido o endosso em título com a
cláusula “não à ordem”. Essa cláusula deverá ser expressa no título, pois é declaração que
proíbe o endosso, mas não o proíbe. Caso o portador desobedeça à ordem e insista em
endossar o título, a transferência terá efeitos de cessão de crédito.

Nos termos do Art. 15 da Lei Uniforme de Genebra, temos:

“Art. 15. O endossante, salvo cláusula em contrário, é garante tanto da aceitação como do
pagamento da letra.

O endossante pode proibir um novo endosso, e, neste caso, não garante o pagamento às
pessoas a quem a letra for posteriormente endossada.”

E a relação entre o protesto e o endosso?

Aqueles que têm um convívio mínimo com as relações empresariais conhecem o termo
protesto. (Geralmente em forma de ameaça: “Se não me pagar, levo seu nome ao protesto!”.)
Faremos um estudo mais aprofundado sobre o protesto daqui a algumas aulas, mas posso
adiantar para você: com certeza, o instituto do protesto não tem nada a ver com o sentido em
que foi tomado no mercado.

O protesto, na verdade, é uma prova de apresentação do título para o pagamento. Se você tem
uma letra de câmbio na qual eu sou a sacada e aceitei, caso na data do vencimento eu não
faça o pagamento, você deverá fazer o protesto para que fique provado que, na data
combinada, eu não fiz o pagamento. Não deveria ser, como efetivamente é, uma forma de
coação ou mesmo de constrangimento do devedor.

O protesto obrigatório ocorrerá em desfavor dos coobrigados (endossante e sacador) e será


facultativo com relação ao obrigado principal (sacado). Neste caso específico, recorreremos ao
Decreto n° 2.044/1908, em seu Art. 28:

“Art. 28. A letra que houver de ser protestada por falta de aceite ou de pagamento deve ser
entregue ao oficial competente, no primeiro dia útil que se seguir ao da recusa do aceite ou ao
do vencimento, e o respectivo protesto tirado dentro de 3 (três) dias úteis.”

Caso o endosso seja passado sem nenhuma indicação de data, existirá a presunção relativa
(que pode ser contestada, caso haja provas contundentes em sentido contrário) de que o
mesmo foi passado antes do vencimento do título, in casu.

Acho melhor deixarmos o Aval para a próxima aula, certo? Até lá, então.

Resumo

Nesta aula continuamos a explorar o imenso universo de possibilidades no direito cambiário.

Primeiramente o aceite, obrigação cambial não muito comum para nós. Através do aceite o
sacado ocupa a posição de devedor principal da letra. Além diss,o existem ainda outros efeitos
grandiosos advindos da aposição da assinatura do devedor na cambial.

O endosso, por sua vez, já mais conhecido, é a forma mais segura e rápida de transmissão de
títulos de crédito. Cabe ressaltar que ele tem ainda outras funções: procuração, caução...
institutos pouco utilizados, hoje em dia, mas muito úteis.

Na próxima aula, falaremos sobre o aval: uma obrigação cambial intrigante e que gera efeitos
graves na vida do avalista. Vamos lá?
Atividades

1) Como será feito o aceite na letra de câmbio?

2) Quais as conseqüências, para o sacador, da recusa do aceite? E para o sacado?

3) Quais os efeitos do endosso dado após a data de vencimento do título?

4) Faça um paralelo entre endosso e cessão de crédito.

5) Quais os efeitos do endosso parcial?


Aula 14 – Do aval, da nota promissória e do cheque

Objetivos

• Conhecer o aval como obrigação cambial.


• Difereciar o aval das outras obrigações cambiais.
• Entender o funcionamento de uma nota promissória.
• Compreender a metodologia de um cheque.

Introdução

Ao recomeçarmos nosso estudo sobre as obrigações cambiais, gostaria que relembrássemos


que todas elas têm interferência direta na existência, circulação e confiabilidade da letra.

Enquanto o aceite viabiliza a existência de dois devedores - um principal e outro indireto - e o


endosso facilita a circulação segura do título, o aval cria a figura de um coobrigado efetivo, que
assume a obrigação de fazer o pagamento do título, custe o que custar.

Acredito que você considere óbvio que o título existirá independentemente dessas obrigações,
mas que elas reforçam sua evolução e desenvolvimento, não há dúvida. Afinal, de que serviria
um título que não circulasse, ou que, circulando, não tivesse nenhuma garantia de pagamento?

Ou de que serviria numa letra de câmbio a figura do sacado, sem o aceite? Ele poderia até
figurar no título, mas seria uma figura sem nenhuma confiabilidade.

E o que se pode falar da possibilidade de outrem assumindo como sua a obrigação cambial?
Pode algo ser mais sólido do que isto? Então vamos entender a metodologia de um aval? O
que é um aval? Como inseri-lo e fazer com que ele tenha validade? Vejamos.

AVAL

O aval pode ser definido como a obrigação cambial que garante a adimplência do título de
crédito. Será uma obrigação de cunho cambial (só existe em títulos de crédito) assumida por
um terceiro, estranho à relação estampada no título, em que se busca garantir o pagamento da
obrigação como se fosse o devedor principal.

Logo, esqueça a partir de agora a frase: “Para eu alugar um apartamento preciso de dois
avalistas”. Não, não, não.... Você agora já sabe que o aval só existirá em um título de crédito. E
pelo que você já sabe, não se pode incluir o contrato como um deles.

Para avalizar um título, é necessário que o avalista seja capaz civil ou empresarialmente.
Mesmo que o devedor principal não tenha essas características, você se torna responsável
pelo pagamento, ou seja, se uma criança de três anos preenche indevidamente um cheque de
sua mãe e pede que você assine no verso do título e você o faz, está absolutamente
comprometido com o pagamento do título, com base no princípio da autonomia. De acordo com
esse princípio, as obrigações presentes no título são independentes entre si.

Cada um dos que assumem obrigações no título (sacador, endossante e aceitante) pode ter
obrigações suas avalizadas. Desta forma, uma mesma letra pode assumir muitos avais, o que ,
de certo, aumenta a garantia de seu pagamento, conferindo maior força e credibilidade ao
título.
Ocorre que, apesar de poder nascer de todas essas outras obrigações, o aval não se confunde
com nenhuma delas e nem com outras garantias do direito comum (fiança, por exemplo),
apesar de ter grande afinidade com as mesmas.

Para complicar um pouco mais as coisas, a própria Lei Uniforme de Genebra faz confusão
entre o aval e a fiança, ao declarar, no art. 31, 1ª alínea, que “o dador do aval é responsável da
mesma maneira que a pessoa por ele afiançada.” Aí, então, fica realmente difícil não confundir,
não é mesmo? O que ocorreu foi uma tradução incorreta do texto em francês, gerando ainda
mais desconforto com relação ao assunto.

As diferenças entre aval e fiança podem ser resumidas em um quadrinho que o ajudará a se
lembrar delas com maior facilidade:

AVAL FIANÇA
É uma OBRIGAÇÃO CAMBIAL, ou seja, tem
que ser prestada em um título. Em qualquer É uma modalidade de contrato. Pode garantir
outra base, mesmo que por escritura pública, qualquer obrigação, menos a cambial.
não é aval.
Em se tratando de fiança civil, haverá o
Não existe aqui o denominado “benefício de “benefício de ordem”. O fiador poderá indicar
ordem”. Esse instituto permite ao garantidor a os bens do afiançado para que sejam
indicação de bens do devedor principal para levantados antes dos seus, para o
que os mesmos sejam executados antes de pagamento da dívida. Em se tratando de
seu próprio patrimônio. No aval a obrigação é fiança empresarial, mesmo sem o benefício
direta. de ordem, temos a questão do contrato, que
nunca foi, nem será um título de crédito.
Existe a autonomia das obrigações, ou seja,
Em se tratando de um contrato acessório, se
não importa a validade ou não da primeira
a obrigação principal tornar-se inexigível, a
obrigação avalizada, o aval sempre será
fiança também será invalidada.
válido se for concedido por um agente capaz.

Com relação ao endosso, a diferença fica mais clara: o endosso é forma de transferência
cambial, mediante a assinatura do detentor de boa-fé, no verso ou no anverso da letra,
garantindo o endossante, salvo cláusula em contrário, o aceite e o pagamento da mesma. O
aval, por sua vez, é um garantia adicional dada por um terceiro que vem ocupar posição
especial no título, não havendo necessidade de que a pessoa que ocupa essa função especial
seja a detentora legitimada do mesmo (o que é essencial no endosso) para assumir tal
obrigação.

O aval poderá ser concedido em preto ou em branco. Na hipótese do aval em preto, existe a
identificação do avalizado e, por conseqüência, a equiparação dos dois como obrigados.

Na hipótese de aval em branco, o avalista não diz a quem cambialmente se equipara.


Presume-se, então, que o aval foi dado em relação ao devedor principal.

A dificuldade se dará quando duas ou mais pessoas comparecerem como avalistas da mesma
obrigação. Esses avalistas podem ser simultâneos – quando todos garantirem diretamente o
avalizado –, ou sucessivos – quando um avalista garante outro avalista. Em regra, não
havendo declaração de sucessividade, presume-se serem os avais simultâneos.

O Supremo Tribunal Federal tem entendimento (Súmula 189) de que “avais superpostos em
branco são considerados simultâneos e não sucessivos.” Nesse caso, a regra é a solidariedade
entre os avalistas, e a exceção se daria por conta dos avais sucessivos, em que existiriam o
benefício de ordem e a subsidiariedade.

O fato de o avalista ser equiparado ao devedor no título de crédito não exclui o mesmo do
dever de cumprir a obrigação ali contida. O avalista pode pagar e cobrar do seu avalizado em
regresso, do mesmo modo que tem o direito de fazê-lo de quaisquer dos obrigados anteriores
ao avalizado. Por exemplo: assumo a condição de avalista no título de crédito. Na verdade, eu
não sou devedora. Mas por amizade, vínculo familiar, ou outra razão, assumo essa condição.
Caso seja obrigada a pagar, não é justo que eu assuma o prejuízo, pois, como já disse, não
sou a devedora. Cabe a mim, agora, recorrer ao devedor de verdade, o avalizado, para que me
devolva o valor que desembolsei em nome dele. Isto é cobrar em regresso.

Uma “novidade” pra lá de interessante: lá no meio do código foi inserido um artigo que parece
não ser nenhuma novidade, mas que, se for tomado em sua literalidade, poderá causar vasta
modificação na estrutura dos títulos de crédito. O Art. 1.647 do CC/02 exige outorga uxória para
o aval. Ocorre que o Conselho da Justiça Federal já dispôs, em seu enunciado 132, que a
expressão “ou aval”deverá ser suprimida do texto.

Isso porque exigir a anuência do cônjuge para a outorga do aval é afrontar a Lei Uniforme de
Genebra e descaracterizar o instituto. Ademais, a celeridade indispensável para a circulação
dos títulos de crédito é incompatível com essa exigência, pois não se pode esperar que, na
celebração de um negócio corriqueiro lastreado em cambial ou duplicata, seja necessário, para
obtenção de um aval, ir à busca do cônjuge e da certidão de seu casamento, determinadora do
respectivo regime de bens.

Se o avalista pagar a importância devida à letra a endossatário ou avalista posterior poderá


riscar do título o seu aval, bem como os dos endossantes e avalistas posteriores. Para a lei
brasileira e para os efeitos mercantis, o aval cancelado é tido como não escrito.

NOTA PROMISSÓRIA

Fonte: promissoria-www.broffice.org.br

A nota promissória surgiu paralelamente à letra de câmbio, ou seja, nos fins da Idade Média,
como um facilitador das relações mercantis. A doutrina tradicional vê na promessa de
pagamento dos antigos banqueiros italianos da Idade Média a origem da nota promissória que,
desse modo, antecedeu a letra de câmbio.

No Brasil, a nota promissória não recebeu qualquer tratamento especial por parte do Código
Comercial de 1850, que sempre a equiparou às letras de câmbio. No Decreto n° 2.044, de
1908, houve uma regulamentação mais específica, inclusive com tratamento diferenciado
daquele conferido às letras de câmbio.
Art. 56. São aplicáveis à nota promissória, com as modificações necessárias, todos os
dispositivos dos Título I desta Lei, exceto os que se referem ao aceite e às duplicatas.

A Lei Uniforme de Genebra também traz um tratamento diversificado para as notas


promissórias, em seus Arts. 75 a 78.

Ao contrário da letra de câmbio, na promissória há uma confissão de dívida, ou seja, a


promessa de pagamento é feita pelo devedor (aquele que emite a nota) em favor de um credor
que será identificado ou não. O pagamento será feito a favor daquele que se apresente como o
legítimo possuidor da cártula. Não existirá, portanto, nesta relação, um aceite, já que se trata
de uma promessa direta, sem a existência de ordem.

A nota promissória poderia ser considerada como uma promessa de pagamento que alguém
faz em favor de outrem. Com o saque, surgem duas situações jurídicas diversas: a do
promissário, que se obrigou a saldar a obrigação cambiária e a daquele que se beneficia de tal
promessa (sacador, emitente ou subscritor).

A LUG, em seu Art. 75, enumera alguns requisitos básicos para a existência e validade da nota
promissória:

1 – a denominação “nota promissória” inserta no próprio texto do título e expressa na língua


empregada para a redação desse título;

2 – a promessa pura e simples de pagar uma quantia determinada;

3 – a época do pagamento;

4 – a indicação do lugar em que se efetuará o pagamento;

5 – o nome da pessoa a quem ou à ordem de quem a nota deve ser paga;

6 – a indicação da data e do lugar em que a nota promissória é passada;

7 – a assinatura de quem passa a nota promissória (subscritor).

Importante frisar que o título emitido em branco não poderá ser considerado inválido. A
validade ou invalidade do título, em se tratando dos requisitos mínimos, não é apurada na
assinatura, ou seja, nos elementos que estejam devidamente grafados quando da emissão da
nota, mas sim no momento em que o título for exigido. O portador, de boa-fé, tem autonomia
para fazer o preenchimento das lacunas na forma e no tempo certos.

Por se tratar de uma promessa de pagamento, à nota promissória não se aplicam as


disposições a cerca de aceite, antecipação de vencimento por falta de aceite ou cláusula não
aceitável. O subscritor é o devedor principal, nos termos do Art. 78 da LUG.

Art. 78. O subscritor de uma nota promissória é responsável da mesma forma que o aceitante
de uma letra.

A possibilidade de cobrança tanto de uma letra de câmbio como de uma nota promissória se
perde em 3 (três) anos, a contar do seu vencimento, ou seja, caso você tenha uma nota
promissória em mãos para fazer a cobrança, deverá observar o prazo de seu vencimento. A
partir desta data deverá ser contabilizado o prazo de prescrição do título, que é de 3 (três)
anos.

A nota promissória não é um título necessariamente vencido a vista. Apesar da não existência
de aceite, ela pode ser emitida com vencimento certo tempo da vista. O credor deverá
apresentar o título ao visto do emitente no prazo de 1 (um) ano (Art. 23 da LUG).

A nota promissória, como qualquer outro tipo de título de crédito, desprende-se da causa que
lhe deu origem, por força do princípio da inoponibilidade das exceções pessoais e, por tal
razão, pode, vencido e não pago o título, o portador executar o emitente baseado apenas no
título.

Ocorre que é bastante comum encontrarmos a emissão de notas promissórias vinculadas a um


contrato original. A existência do título, dessa forma, fica vinculada ao cumprimento do contrato
de que resultou a promissória como uma condição de aperfeiçoamento deste. Nessa hipótese,
considera-se possível a alegação de não cumprimento do contrato principal como causa de
invalidação do título de crédito. Nesse caso, a relação existente nesse momento é contratual e
não de promessa unilateral de vontade, daí o princípio da inoponibilidade das exceções
pessoais tornar-se mais forte.

CHEQUE

Historicamente, considera-se bastante discutível a origem do cheque. Alguns autores


consideram possível seu nascimento no Antigo Egito, em documentos que continham ordens
de pagamento com relação a terceiros (não seria uma forma de letra de câmbio?).

Outros reconhecem seu nascedouro na segunda fase da Idade Média, quando seriam emitidas
ordens contra bancos com características similares ao modelo da atualidade. Na Inglaterra, o
uso desse tipo de títulos tornou-se muito constante, tendo em vista que os reis entregavam aos
seus credores ordens de pagamento contra seu próprio tesouro. Com a evolução, ampliou-se o
uso de tais títulos, que não eram mais exclusivamente de uso da coroa. Daí, o instituto ganhou
o mundo, chegando aos Estados Unidos e à França.

No Brasil, a primeira menção ao título é a do Regulamento do Banco da Província da Bahia, em


1845. Na verdade, a palavra “cheque” só veio a ser utilizada no Decreto n° 149-B, de 20 de
julho de 1893.

Algumas tentativas aconteceram no sentido de se unificar o direito sobre o cheque, e, em 1942,


o Brasil aderiu às convenções resultantes da Conferência de Genebra. Em 1985, a Lei 7.357
revogou todas as disposições ao seu contrário e passou a reger o cheque.

O que é o cheque? Trata-se de uma ordem de pagamento à vista, sacada contra um banco ou
uma instituição financeira a ele equiparada, nos termos da Lei 4.595/64(sociedades de crédito,
financiamento e investimento, caixas econômicas, cooperativas de crédito), com base em
suficiente provisão de fundos depositados pelo sacador em mãos do sacado ou decorrente de
contrato de abertura de crédito entre ambos.

O cheque é um título vencível à vista, nos termos do Art. 32 da Lei de Cheques (Lei 7. 357/85).

Art. 32. O cheque é pagável à vista. Considera-se não-escrita qualquer menção em contrário.
Aí, você pode dizer: “Bom, mas, professora, ontem mesmo eu dei um cheque pré-datado para
pagamento das compras do mês... Como isso é possível?” O cheque pré-datado, que na
verdade deveria ser chamado de pós-datado, é uma convenção social. O estabelecimento o
recebe e aceita realizar seu depósito dentro de um prazo, tendo em vista que existe um
contrato (mesmo que não escrito), uma convenção entre as partes determinando que o
pagamento do negócio vá se efetivar daquela data a um prazo.

Caso o estabelecimento resolva fazer o levantamento do pagamento antes do prazo, a


indenização será devida, só que a instituição financeira deverá efetivamente fazer o pagamento
do cheque, tendo em vista a natureza do título de vencimento à vista.

Bom... Se você anda mesmo acompanhando o desenrolar do curso, seria uma boa hora para
uma pergunta: o cheque é mesmo um título de crédito? Lá no início, falando sobre a teoria dos
títulos de créditos, vimos que o conceito de crédito seria: “a troca de bens no tempo. Existe um
lapso temporal entre a prestação e a contraprestação, com base no elemento confiança.”

O cheque será considerado um título de crédito não pelo elemento “crédito” em si, já que este
não existe de modo abstrato, e sim pelo fato de possuir o sacado, a quem a ordem de
pagamento é dada, determinada importância em dinheiro que na realidade pertence ao
depositante.

O sacado, que nesta relação será sempre uma instituição financeira, deve ter, sob seu domínio,
uma conta corrente bancária do sacador com saldo suficiente para quitar o cheque. A provisão
de fundos deverá estar presente quando da apresentação do título, nos termos da Lei 7.357/85,
em seu Art. 4°, § 1°.

Não cabe, portanto, qualquer responsabilidade do sacado com relação ao pagamento do título.
O banco ou instituição financeira não garante o pagamento do título e nem poderá ser aceitante
(Art. 6° da Lei 7.357/85), bem como endossante ou avalista (Art. 18, §1° e Art. 29 da Lei
7.357/85) por parte do sacado. O banco ou instituição financeira só terá responsabilidade se
agir licitamente, não podendo assumir qualquer obrigação cambial referente a cheques
sacados por seus correntistas.

De acordo com a Resolução n° 885/83, o cheque é um título de modelo vinculado, ou seja, só


serão considerados como cheques aqueles títulos que estiverem de acordo com os padrões
estabelecidos pelo Banco Central.

O cheque é um documento literal e conta, também, com o requisito da abstração. Dessa forma,
as exceções pessoais relativas ao negócio que deu origem ao título somente poderão ser
opostas a quem tenha participado do negócio. Endossado o cheque a terceiro de boa-fé,
eventuais questionamentos ligados à causa originária do débito não poderão ser alegados
contra o terceiro portador de boa-fé do título.

O local de emissão deverá constar no título. Em hipótese de ausência desse dado, presume-se
como local aquele designado ao lado do nome do sacador, nos termos do Art. 2°, II da Lei
7.357/85.

A assinatura também é um requisito essencial, podendo ser feita por processo mecânico a teor
do que dispõe o Art. 1°, parágrafo único da Lei 7.357/85. Requisito inafastável para o emprego
de assinatura mecânica é seu prévio registro em ofício de notas do domicílio do usuário.

De acordo com o Art. 12 da Lei 7.357/85, inexistindo coincidência entre a quantia expressa por
valor numérico e a expressa por extenso, esta prevalecerá. Indicada a quantia mais de uma
vez, quer por extenso, quer por algarismos, prevalece, no caso de divergência, a indicação de
menor valor.

O aval poderá integrar o título de crédito desde que o avalista ou avalizado não seja o sacado.
Os Arts. 29 e 30 da Lei 7.357/85 versam especificamente sobre esse assunto:

“Art. 29. O pagamento do cheque pode ser garantido no todo ou em parte, por aval prestado
por terceiro, exceto o sacado, ou mesmo por signatário do título.

Art. 30. O aval é lançado no cheque ou na folha de alongamento. Exprime-se pelas palavras
‘por aval’, ou fórmula equivalente, com a assinatura do avalista. Considera-se como resultante
da simples assinatura do avalista, aposta no anverso do cheque, salvo quando se tratar da
assinatura do emitente.”

Existem modalidades de cheque consolidadas pela doutrina:


a) Cheque visado: aquele em que o banco sacado lança declaração de suficiência de fundos,
a pedido do emitente ou do portador legitimado. Apenas pode ser apostado o visto em um
cheque nominativo não-endossado. Não é aceite, não impõe o pagamento na insuficiência de
fundos.

b) Cheque administrativo: modelo de cheque em que sacado e sacado se confundem. É


também denominado por cheque passado sobre o próprio sacado, cheque bancário. É emitido
pelo banco, contra si próprio, ou seja, contra um de seus estabelecimentos, em favor de um
terceiro estranho a esta relação. É regulado pelo Art. 9° da Lei 7. 357/85.

c) Cheque cruzado: cheque no qual se busca possibilitar a qualquer tempo a identificação em


favor de quem foi liquidado. Foi introduzido pela Lei 7.357/85. As linhas que possibilitam ao
cheque ser “cruzado” podem ser substituídas pela expressão “para ser creditado em conta”.

O prazo de apresentação do cheque será:

- de 30 (trinta) dias se o pagamento se der na mesma praça da emissão (que consta no título);

- de 60 (sessenta) dias se o pagamento se der em praça diversa da emissão do título.

Caso o portador do cheque perca o prazo, perderá também:

- prazo de execução dos endossantes;

- crédito contra o emitente do título, se na época de apresentação havia fundos suficientes e


hoje não há mais, nos termos dos Arts. 35 e 47, II e § 3° da Lei 7. 357/85.

Cabe ressaltar que o cheque não é papel forçado, ou seja, não há qualquer lei ou disposição
que obrigue o empresário a recebê-lo. Mas, se optar por receber o título, também não poderá
impor limitações, de acordo com a legislação específica (Lei 8.078/90 – Código de Defesa do
Consumidor).

Caso você deseje cobrar o cheque judicialmente, o processo cabível será o de execução.
Nesse caso, não será necessário o protesto do título para tal, já que o mesmo pode ser
substituído por uma declaração escrita e datada pelo banco sacado com a indicação do dia da
apresentação, ou escrita e datada pela câmara de compensação do banco ou da instituição
financeira equiparada. Poderá exercer o direito creditício contra todos os devedores do cheque.

A ação de execução prescreverá em 6 (seis) meses contados do término do prazo de


apresentação, nos termos do Art. 59 da Lei 7. 357 de 1985. Para os coobrigados o prazo será
também de 6 (seis) meses do pagamento ou do dia da apresentação.

Caso haja a perda do prazo da ação de execução, poderá ainda ser requerido o pagamento
através de uma ação ordinária denominada “ação de locupletamento ilícito”. O rito desta ação é
bem mais lento, mas ela pode ser proposta em até 2 (dois) anos, a contar do dia em que se
consumar a prescrição da ação de execução.

Quando houver qualquer problema relacionado com o cheque, serão possíveis 2 (dois)
procedimentos:

- Contra-ordem: nos termos do Art. 35 da Lei 7.357/85, o emitente do cheque pode revogá-lo
através de contra-ordem dada por aviso epistolar, ou por via judicial ou extrajudicial, com
razões motivadoras do ato. A revogação só produz efeito depois de expirado o prazo de
apresentação e, não sendo promovida, pode o sacado pagar o cheque até que decorra o prazo
de prescrição.

- Sustação: é a oposição ao pagamento do cheque, fundada em motivo juridicamente


relevante, mesmo durante o prazo de apresentação (Art. 36 da Lei 7.357/85).
A declaração de não pagamento do cheque pelo banco sacado ou pela câmara de
compensação dispensa e substitui o protesto, mas os signatários respondem pelos danos
causados por declarações inexatas.

Você nem imaginava que aquela folhinha maravilhosa que abre as portas de seu crédito tinha
um tratamento tão especial, ainda mais para o direito empresarial, não é mesmo? Espero que
você tenha gostado de saber um pouco mais sobre esses instrumentos de crédito. Na próxima
aula estudaremos a duplicata mercantil ou empresarial. Agora você já sabe que comercial,
empresarial e mercantil são apenas sinônimos.

Até mais ver!

RESUMO

Nossa... Quantas novidades! E você que usa cheques todos os dias não poderia nunca
imaginar que esse é um instituto tão complexo, não é mesmo?

E o aval? Perceberam a gravidade da situação? A obrigação é tão dura que não deixa nenhum
espaço para o avalista. Este tem que assumir a obrigação, e o que lhe resta é procurar o
devedor para receber de volta os valores com que arcou.

A nota promissória também é um instrumento cambiário interessante. Muito mais simples do


que a letra de câmbio, ela engloba apenas dois sujeitos: o emissor e o beneficiário.

O aval, apesar de incomum, pode também ser lançado no cheque. Cabe ressaltar que existem
outras informações importantes sobre o cheque: vencimento, endosso, validade, requisitos, que
expus na aula e que devem ser de nosso conhecimento.

Atividades

1) Faça um paralelo entre aval e fiança.

2) Quais os efeitos possíveis de um aval antecipado?

3) Quais os requisitos essenciais de uma nota promissória?

4) Diferencie contra-ordem de sustação de cheque.

5) Quais as modalidades de vencimento do cheque? E o prazo para apresentação? E o de


prescrição da via executiva?
Aula 15 - Da duplicata e o protesto de títulos

Objetivos

• Conhecer o instituto da duplicata.


• Reconhecer o conceito e a importância do protesto.

Introdução

Chegamos agora ao nosso último modelo de título de crédito a ser estudado especificamente
em nossa caminhada: a duplicata. Passamos pelos modelos mais utilizados e tradicionais, não
desprezando as outras cambiais. Através deste modelo você poderá reconhecer, estudar e
compreender títulos como notas e cédulas de crédito, cédula de crédito imobiliário, cédula de
crédito bancário, conhecimento de depósito e warrant, conhecimento de transporte marítimo.

Mais do que importante, a duplicata é reconhecida como um dos títulos mais cambiais
existentes. Ela tem um vínculo direito com a produção e circulação de bens e serviços, o que
vincula essa cambial a áreas bem próximas do direito empresarial.

Nas vendas realizadas a prazo, o vendedor cumpre a sua obrigação de entregar o produto ou
realizar o serviço e fica estabelecido que o comprador só realizará a sua prestação em um
tempo futuro. O elemento confiança, base do conceito de crédito, chega a ser explícito nessa
relação, além de se tratar de elemento chave nas atividades empresariais.

Isso porque o crédito possibilita operações que normalmente não aconteceriam, já que o
comprador pode encontrar-se, no momento da comercialização, desprovido de numerário
suficiente para realizar a obrigação.

DUPLICATA

O tratamento do título, em um primeiro momento, deu-se pelo Código Comercial de 1850, Arts.
219 a 427, já que em vários momentos os compradores, devedores dos vendedores, não
faziam o pagamento do débito no tempo determinado. O vendedor, por força dessa situação,
tendo embora crédito contra o comprador, sentia dificuldades em fazer valerem os seus direitos
por falta de um procedimento efetivo de coação em desfavor do inadimplente.

No Art. 219 do referido texto legal, tínhamos:

“...nas vendas em grosso ou por atacado entre comerciantes, o vendedor é obrigado a


apresentar ao comprador por duplicado, no ato da entrega das mercadorias, a fatura ou conta
dos gêneros vendidos, as quais serão por ambos assinadas, uma para ficar na mão do
vendedor e outra na do comprador. Não se declarando na fatura o prazo do pagamento,
presume-se que a compra foi à vista (art. 137). As faturas sobreditas, não sendo reclamadas
pelo vendedor ou comprador, dentro de dez dias subseqüentes à entrega e recebimento (art.
135), presumem-se contas líquidas.”

Você conhece o nascedouro da duplicata? França, Itália, Inglaterra... Não! É um título


absolutamente tupiniquim, isto é, trata-se de um título eminentemente brasileiro. Em função de
sua funcionalidade e por prestar inestimáveis serviços ao desenvolvimento empresarial, a
ponto de ser chamado por Tullio Ascarelli de “título príncipe do direito brasilero”, ganhou
importância internacional, gerando títulos similares em outras partes do mundo (stabilito – Itália,
Trade acceptance e chattel paper – EUA, extrato de fatura – Portugal, conforme obligatório –
Uruguai, entre outros). Tem seu tratamento, hoje, feito pela Lei 5.474, aprovada em 18 de julho
de 1968.

Nas vendas mercantis e nas prestações de serviço quitadas a prazo, entre as parte
domiciliadas no Brasil, é obrigatória a emissão, pelo vendedor, de uma fatura para
apresentação ao comprador. No ato de emissão de uma fatura, o vendedor poderá extrair uma
duplicata para circulação como efeito comercial.

De acordo com Bulgarelli, temos:

...é facultativamente emitida, com base em fatura (esta obrigatória e discriminando as


mercadorias vendidas) representativa de contrato com prazo não inferior a 30 dias, não
podendo ser emitida outra espécie de título de crédito para documentar o saque do vendedor
pela importância faturada ao comprador.

A operação que subsidiar a criação da duplicata não poderá ser inferior a 30 (trinta) dias,
contados da entrega ou do despacho da mercadoria. O Art. 1° da Lei 5.474/68 exprime essa
obrigatoriedade:

“Art. 1°. Em todo o contrato de compra e venda mercantil entre partes domiciliadas no território
brasileiro, com prazo não inferior a 30 (trinta) dias, contado da data da entrega ou despacho
das mercadorias, o vendedor extrairá a respectiva fatura para apresentação ao comprador.”

A fatura, como prova do contrato de compra e venda ou de prestação de serviço mercantil, é de


extração obrigatória, enquanto a duplicata será facultativa.

Um convênio celebrado entre o Ministério da Fazenda e as Secretarias Estaduais da Fazenda,


com vistas ao intercâmbio de informações fiscais, possibilitou aos comerciantes a adoção de
um instrumento único de efeitos comerciais e tributários. O comerciante que adota esse
sistema pode emitir uma única relação de mercadorias vendidas, produzindo, em cada
operação que realizar, os efeitos da fatura mercantil, para o direito empresarial, e os de nota
fiscal, para o direito tributário.

O empresário que fizer uso desse sistema não poderá, entretanto, deixar de emitir o
documento em qualquer operação que realize, mesmo em se tratando de venda não a prazo. A
duplicata da fatura é que é facultativa. Mas, caso resolva emitir um título vinculado à compra e
venda mercantil com prazo para o vendedor, terá de ser a duplicata.

“Art. 2°. No ato da emissão da fatura, dela poderá ser extraída uma duplicata para circulação
com efeito comercial, não sendo admitida qualquer outra espécie de título de crédito para
documentar o saque do vendedor pela importância faturada ao comprador.”

A duplicata é um título de modelo vinculado e deve ser lançada em um impresso próprio do


vendedor, confeccionado de acordo com o padrão previsto na Resolução n° 20 da Lei de
Duplicatas (Lei 5.474/1968). Lembra-se de quando falamos sobre a regularidade do empresário
(individual ou sociedade)? Falamos sobre as conseqüências da não regularização da atividade,
e uma delas era a impossibilidade de emissão de nota fiscal. Isso porque só será permitida a
emissão desta por aqueles que estiverem em dia com as obrigações empresariais.

Existem requisitos básicos em uma duplicata:

1 – a denominação duplicata, a data de sua emissão e o número de ordem;

2 – o número da fatura;

3 – a data certa do vencimento ou a declaração de ser a duplicata à vista;

4 – o nome e o domicílio do vendedor e do comprador;


5 – a importância a pagar, em algarismos e por extenso;

6 – a praça do pagamento;

7 – a cláusula “à ordem”;

8 – a declaração do reconhecimento de sua exatidão e da obrigação de pagá-la, a ser assinada


pelo comprador, como aceite;

9 – a assinatura do emitente.

Deve-se, ainda, estar atento ao fato de que as duplicatas são submetidas a uma padronização
por parte do Conselho Monetário Nacional, que definiu três modelos, todos com altura mínima
de 148mm e máxima de 152mm e com a largura mínima de 203mm e máxima de 210mm.

Há modelos para operações que serão liquidáveis em um só pagamento, outros


correspondentes às operações com pagamento parcelado (nesse caso, mediante a emissão de
uma duplicata para cada parcela ou com a emissão de uma só duplicada em que sejam
descritas todas as parcelas).

Conforme também já estudamos, o título incompleto poderá ser devidamente preenchido pelo
legítimo portador.

Se o empresário ou a sociedade empresarial não puderem emitir a nota fiscal “fatura”, não
poderão, por conseqüência, fazer uso da duplicata mercantil tanto na produção como na
prestação de serviço.

A duplicata, portanto, é um título causal. Assim, sua regularidade está diretamente vinculada ao
negócio subjacente. Só pode ser emitida para a cobrança do preço de mercadorias vendidas
ou de serviços prestados.

Interessante frisar que, apesar da causalidade, a duplicata é tão abstrata quanto qualquer outro
título de crédito. É considerado um título causal porque sua emissão é possível para
representar crédito decorrente de uma determinada causa prevista em lei. A duplicata não pode
ser sacada, em qualquer hipótese, segundo a vontade das partes interessadas. Isso pode
ocorrer apenas na existência da compra e venda mercantil.

A duplicata deverá sempre estampar o valor total da fatura, ainda que o comprador tenha
direito a qualquer rebate, mencionando, o vendedor, o valor líquido que o comprador deverá
reconhecer como obrigação de pagar.

O Art. 19 da Lei 5.474/68 estabelece a confecção, por parte do empresário, de um “Livro de


Registro de Duplicatas”. Nesse livro serão registradas, em ordem cronológica, todas as
duplicatas emitidas, com o número de ordem, data e valor das faturas originárias e data de sua
expedição, nome e domicílio do comprador, anotações das reformas, entre outras informações.
Por força dessa escrituração, cada duplicata mercantil terá um número de ordem, o qual não
precisará necessariamente coincidir com o número de ordem da fatura ou nota fiscal-fatura. O
livro só será obrigatório para os empresários que fazem efetivo uso do título.

Uma duplicata referir-se-á somente a uma única fatura, nos termos do Art. 2°, §2°, da Lei
5.474/68: “Uma só duplicata não pode corresponder a mais de uma fatura”.

Até o advento da Lei 8.137/1990, eram considerados crime a emissão e o aceite de duplicata
simulada, ou seja, aquela que não correspondesse a uma efetiva compra e venda mercantil.
Nos termos do Art. 172 do Código Penal Brasileiro, o comportamento típico passou a ser a
emissão de duplicata mercantil que não corresponda à mercadoria vendida em quantidade ou
qualidade compatível com a nota/fatura.

Emitida a duplicata regularmente, esta deverá ser apresentada ao devedor, em seu domicílio,
pelo próprio emitente ou por intermédio de representante, instituição financeira, procurador ou
mesmo correspondente. É a denominada “remessa para aceite”, e o credor tem 30 (trinta) dias,
a partir da data de confecção desta, para enviá-la.

Recebendo o devedor a cambial, deverá devolvê-la no prazo de 10 (dez) dias. Isso poderá
gerar posturas as mais diversas, como:

- devolver a duplicata devidamente aceita – o título encontra-se completo podendo ser inclusive
endossado para circulação;

- devolver sem o aceite e sem qualquer justificativa – o credor deverá realizar o protesto por
falta de aceite, para que prove a tentativa de obtê-lo;

- devolver a duplicata sem o aceite mas com justificativa. Nos termos do Art. 8° da Lei
5.474/68, o comprador só poderá deixar de aceitar as duplicatas por motivo de: a) avaria ou
não-recebimento das mercadorias, quando não expedidas ou não entregues por sua conta e
risco; b) vícios, defeitos e diferenças na qualidade ou na quantidade das mercadorias
devidamente comprovados; ou c) divergência nos prazos ou nos preços ajustados.

Ocorre que, se o devedor aceita as mercadorias, presume-se que tenha aceitado também todo
o texto literal do título.

Caso a intermediação tenha sido feita por uma instituição financeira e esta concorde, o sacado
(comprador) poderá manter em seu poder a duplicata, comunicando o aceite à instituição
(aceite por comunicação, muito comum hoje em dia). Essa comunicação substituirá, caso seja
necessário, na hipótese de protesto ou execução judicial, a duplicada retida (protesto por
indicação).

A duplicata poderá receber, em sua cártula, o aval, isto é, a garantia de quitação do título. Caso
não haja identificação de quem será o beneficiário do aval, ou seja, prestado um aval em
branco, este será considerado em favor do comprador, devedor principal do título de crédito.

A mesma regra com relação aos outros títulos também prevalecerá aqui: os avais brancos e
superpostos consideram-se simultâneos e não sucessivos, nos termos da Súmula 189 do STF
(já estudamos esse assunto, você se lembra?).

A duplicata, por ser sempre sacada pelo sacador em seu próprio favor, receberá, já num
primeiro momento, um endosso. Nesse caso, o endossante responde pelo cumprimento da
obrigação constante no título, sendo devedor solidário da cártula; pagando-a, tem ação de
regresso contra os coobrigados anteriores.

De acordo com o Art. 9 da Lei 5.474/68, será lícito ao comprador da mercadoria, reconhecido
aqui como o sacado, resgatar a duplicata antes de aceitá-la ou antes da data de seu
vencimento. Ou seja, assim que recebe a cártula, não aceita, nem contesta, apenas procede ao
pagamento do débito. Como prova de pagamento, deverá ser emitido um recibo, passado pelo
legítimo portador ou representante com poderes especiais, no verso do próprio título ou em
documento apartado, com referência à duplicata em questão.

Novamente o protesto aparece na duplicata. Conforme já estudamos antes, é sabido que o


protesto constitui prova de apresentação do título. Na hipótese de duplicata, essa apresentação
poderá acontecer por 3 (três) motivos: a) aceite; b) devolução; c) pagamento.

Isso significa que, para provar o ato, o melhor instrumento, em se tratando de cambiais, é o
protesto. Caso o título tenha sido apresentado para o aceite e não tenha sido aceitado, deverá
ser procedido o protesto do mesmo.

Em hipótese de retenção não autorizada por lei do título, deverá também ser realizado o
protesto. Você deve estar pensando: “Mas como, professora? Se o título está em mãos do
comprador, que não devolveu!” Nesse caso, nos termos do Art. 13, §1° da Lei 5.474/68, será
permitido (à exceção do princípio da cartularidade) o chamado “protesto por indicação”, quando
não for emitida uma triplicata.
“Art. 13 (....)

§1°. Por falta de aceite, de devolução ou de pagamento, o protesto será tirado, conforme o
caso, mediante apresentação da duplicata, da triplicata, ou, ainda, por simples indicações do
portador, na falta de devolução do título.”

O portador terá o prazo de 30 (trinta) dias, contado da data de seu vencimento, para realizar o
protesto do título. Caso não o faça dentro desse interregno, perderá o direito de regresso
contra os endossantes e seus respectivos avalistas.

O prazo para propositura de ação judicial (processo de execução) para cobrança do débito
exposto na duplicata será de:

- 3 (três) anos, a contar do vencimento do título contra o devedor principal e avalistas (Art. 18
da Lei de Duplicatas – Lei 5.474/68);

- 1 (um) ano, a contar do vencimento do título contra os coobrigados (endossantes e seus


avalistas).

Poderá ainda ser proposta ação de regresso por parte daquele que saudou o débito contra o
principal devedor. Para tanto, o mesmo terá o prazo de 1 (um) ano.

PROTESTO

O protesto de um título será necessário quando alguma obrigação anotada no título não puder
ser cumprida. Pode se tratar de um pagamento que não foi realizado ou de um aceite que não
foi devidamente passado. Nesse caso, o portador do título, seja ele duplicata, cheque, letra de
câmbio ou nota promissória, poderá procurar o Tabelionato de Protestos e proceder ao protesto
do mesmo.

Vale a pena ler o parágrafo anterior novamente. Esteja atento ao fato de que o protesto é um
ato facultativo, a não ser em casos especiais. Ninguém está obrigado a protestar um título e
existe inclusive dispensa dessa formalidade quando se tratar de cheque. Para a cobrança
judicial de um cheque, não se faz necessário que este seja protestado, mas apenas que seja
apresentado à câmara de compensação bancária.

No ordenamento jurídico brasileiro, a Lei 9.492, de 10 de setembro de 1997, faz o tratamento


do instituto do protesto.

A obrigatoriedade do protesto fica restrita ao protesto para fins falimentares, ou seja, os


documentos que ensejarão o pedido de falência deverão ser previamente protestados.

O protesto poderá ser considerado ainda necessário para o exercício da ação de cobrança
contra os demais coobrigados. Por quê? Porque estes têm o direito de se certificar de que,
antes de serem cobrados como coobrigados, o título foi devidamente apresentado (a prova é
feita pelo protesto) ao devedor principal, em local e data designados no título.

Então o que seria o protesto? Uma forma de coagir outrem a cumprir a obrigação cambial?
Uma forma de submeter o devedor da cambial ao ridículo? Teoricamente, não foi esse o intuito
do legislador ao criar o instituto do protesto (apesar de, na vida real, o protesto ser
efetivamente uma forma de coerção do devedor inadimplente).

O protesto é um ato oficial e público que comprova a exigência do cumprimento daquelas


obrigações cambiárias. Nos termos do Art. 22 da Lei 9.492/1997, a certidão lavrada pelo oficial
público é prova plena reconhecida como documento público inquestionável.

O Art. 1° da Lei 9.492/97 apresenta um conceito técnico de protesto: “Protesto é o ato formal e
solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em
títulos e outros documentos de dívida.”

A competência para a lavratura do protesto é exclusiva do tabelião de protesto de títulos e


documentos de dívida, nos termos do Art. 3° da Lei 9.492/97.

O protesto poderá ser retirado, considerando-se algumas condições. Veja.

a) Na hipótese de se tratar de letra de câmbio e nota promissória, o prazo será o dia seguinte
ao vencimento do título, nos termos da doutrina dominante. A doutrina minoritária aceita o
prazo de até 2 (dois) dias do vencimento do título para o protesto. Por via das dúvidas, melhor
ficar atento ao prazo menor.

b) Na hipótese de ser cheque, conforme já foi dito, não há necessidade de protesto como
prova, mas apenas a apresentação à câmara de compensação de um banco ou instituição
financeira equiparada.

c) Na duplicata, o prazo para o protesto é de até 30 (trinta) dias após o vencimento do título.

O protesto poderá ainda ser lavrado por vários motivos:

a) Protesto por falta de aceite: quando a cambial é apresentada para o aceite e há recusa por
parte da pessoa indicada como aceitante, nos termos do Art. 21, § 1° da Lei 9.492/97. Nesse
caso, fica provada a apresentação em tempo hábil do título para aceite.

b) Protesto por falta de pagamento: ocorrerá quando o devedor se recusar a efetuar o


pagamento do título. Somente ocorrerá após o vencimento da obrigação, nos termos do Art. 21,
§ 2° da Lei 9.492/97. Aqui fica comprovado que o credor tentou receber, na data e no local
indicados no título, o pagamento deste e não conseguiu. Esse protesto dá ensejo à cobrança
do valor dos coobrigados, ou seja, endossantes e seus avalistas.

c) Protesto por falta de devolução: ocorrerá quando o sacador detiver o título enviado para
aceite e não o devolver no prazo legal estipulado. O protesto se dará por meio de uma triplicata
( esse tipo de protesto é mais comum na hipótese de o título ser uma duplicata), ou por
indicação (Art. 20, § 3° da Lei 9.492/97).

d) Protesto com fim especial: abrange títulos e documentos, mesmo que a princípio não
protestáveis, como o protesto para fins de falência.

Todos os protestos serão lavrados no mesmo livro em cartório, conforme disposto no Art. 23 da
Lei 9.492/97. A função do tabelião, na retirada do protesto, restringe-se à análise de
formalidade. Apenas a irregularidade formal obsta o registro do protesto.

De acordo com o Art. 12 da Lei 9.492/97, o cartório, via tabelião, terá 3(três) dias úteis para
proceder ao protesto?, contados da protocolização do título ou documento de dívida. Na teoria,
existem 3 (três) correntes a respeito desse prazo.

A primeira propõe uma interpretação literal do texto, ou seja, o cartório receberá o documento,
realizará as formalidades, intimará o devedor para que se manifeste no procedimento, seja
através de uma defesa (hipótese de cobrança indevida – título prescrito, por exemplo), ou do
pagamento do título. Caso o réu não se manifeste ou se manifeste indevidamente, o cartório,
ainda dentro do prazo de 3 (três) dias, procederá ao protesto do título.

A segunda corrente aposta na fusão do Art. 12 com o Art.28 do Decreto 2.044/08. (É o decreto
que dispõe sobre as letras de câmbio e promissórias no Brasil e teve sua eficácia diferida com
a aprovação da Lei Uniforme de Genebra, lembra?)

O art. 28 do Decreto vem com o seguinte texto: “A letra que houver de ser protestada por falta
de aceite ou de pagamento deve ser entregue ao oficial competente, no primeiro dia útil que se
seguir ao da recusa do aceite ou ao do vencimento, e o respectivo protesto tirado dentro de 3
(três) dias úteis.”

Nesse caso, o prazo de 3 (três) dias só começará a correr a partir da intimação do devedor,
para possibilitar o exercício do contraditório e ampla defesa.

A terceira corrente, mais ponderada, tem como principal defensor Pontes de Miranda. Segundo
ela, o protesto deverá ser tirado em 3 (três) dias úteis, contados da apresentação. Quando, por
motivo de força maior, não puder haver a intimação dentro desse prazo, prorroga-se até a data
da intimação. E, nesse mesmo dia, lavrar-se-á o protesto.

Antes de findar o prazo do protesto o devedor poderá ainda ser sustado através do judiciário,
via medida cautelar, que deve ser obtida antes da lavratura de protesto. Para o pedido é
necessário que o devedor preste caução.

O tabelionato poderá, caso tenha alguma dúvida sobre o protesto, questionar o juiz sobre o
registro. O cidadão interessado poderá figurar como participante do processo. Mas o cidadão
não poderá, sozinho, suscitar dúvidas. Apenas o tabelião poderá fazê-lo.

Pelo fato de o protesto ter tomado o sentido de coerção de pagamento, o cancelamento da


certidão do protesto tomou corpo de atestado de idoneidade empresarial. Tornou-se uma
prática o cancelamento do protesto após o pagamento da dívida. Com o intuito de coibir esse
tipo de conduta, a certidão negativa de protesto só poderá ser concedida por ordem judicial em
autos de processo judicial ou a pedido do próprio protestado.

Terminamos aqui nosso percurso pelos títulos de crédito, institutos tão comuns no nosso dia-a-
dia. Espero que o estudo possa potencializar o uso dos mesmo e também seu conhecimento
sobre eles.

Até a próxima!

Resumo

A duplicata tem sido, paulatinamente, substituída pelo boleto bancário. Ocorre que, quando
estudamos o título cambial duplicata, percebemos como há diferença entre estes dois recursos.
Por ser um título genuinamente brasileiro, a duplicata se adapta facilmente ao dia-a-dia do
empresário. Aqui estudamos todos os recursos que podem ser utilizados quando tratamos da
duplicata. Além disse, um assunto polêmico aqui também tratado é o do protesto. Apesar de
não se restringir ao protesto de títulos, esta é a modalidade mais comum de protesto. Além dos
requisitos formais, cabe ressaltar que o conceito e a importância do protesto muitas vezes
estão equivocados: o protesto é prova de apresentação e tem como principal efeito a
possibilidade de cobrança dos coobrigados no título: endossantes e seus avalistas.

Atividades

1) Diferencie: duplicata de compra e venda e duplicata de prestação de serviços.

2) Quais os requisitos para realização de um protesto de títulos?

3) Quais os requisitos para execução e protesto de uma duplicata?

4) Quais os efeitos do protesto cartorário?

5) Qual o prazo para realização do protesto em cada título? E dentro do cartório? A lei fala
sobre o prazo?

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