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s í s i f o / r e v i s t a d e c i ê n c i a s d a e d u c a ç ã o · n .

º   5 · j a n / a b r 0 8 issn 1646‑4990

A construção das práticas em enfermagem:


a formatividade nos cuidados aos diabéticos
em contexto comunitário

Alexandra Cosme
alexandra.cosme@hotmail.com
Centro de Saúde do Bombarral

Resumo:
Nas últimas décadas, assistimos a constantes mutações sociais e técnicas em todas as ci‑
ências. A Enfermagem não constitui excepção, pelo que a actualização exige o desenvol‑
vimento de competências e práticas que deverão fluir do processo de formação. Neste en‑
quadramento é essencial questionar as práticas profissionais, centrando­‑nos na formação
em contexto de trabalho, partindo do pressuposto que a formatividade implica os actores
sociais no seu todo. A população seleccionada foi a dos diabéticos, no contexto comuni‑
tário, pela problemática que os envolve no seu meio ambiente, exigindo respostas inte‑
gradoras. Analisamos as dinâmicas formativas que ocorrem no projecto de cuidados aos
diabéticos, onde se relacionam o processo de socialização, a formação e a saúde. Como
estratégia metodológica, utilizámos o estudo de caso. A unidade de análise foi o centro
de saúde no qual decorre o projecto. Para recolha de informação empírica utilizámos a
observação participante, entrevistas semi­‑estruturadas a diabéticos e enfermeiros e para
complementar efectuámos a análise documental. Com esta investigação, pretendemos
contribuir para a compreensão e desenvolvimento das práticas em Enfermagem, através
de uma abordagem centrada nas pessoas e nos seus contextos.

Palavras­‑chave:
Aprendizagens informais, Cuidar em Enfermagem, Cuidados aos diabéticos, Formação
profissional.

Cosme, Alexandra (2008). A construção das práticas em enfermagem: a formatividade nos cuidados
aos diabéticos em contexto comunitário. Sísifo. Revista de Ciências da Educação, 05, pp. 33-44.
Consultado em [mês, ano] em http://sisifo.fpce.ul.pt

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Introdução interrelacionam o processo de socialização e da for‑
mação dos enfermeiros, permitindo desenvolver os
Este artigo é o culminar de um trabalho de investiga‑ modos de construção dos cuidados e de formação em
ção realizado no decorrer do Mestrado em Ciências contexto de trabalho (Abreu, 2001; Costa, 2000).
da Educação — área de especialização em Formação Esta investigação tem como tema central a cons‑
de Adultos. Esta dissertação (Cosme, 2004) centrou­ trução das práticas dos enfermeiros em contexto
‑se na análise das diversas e profundas alterações, comunitário. O objecto de estudo relaciona­‑se com
que assistimos ao longo das últimas décadas, na área os processos interactivos da formação e da prática
da saúde, resultantes da evolução da construção so‑ dos enfermeiros nos cuidados aos diabéticos, onde
cial dos cuidados. Esta construção deixa de se cen‑ o contexto de trabalho e as interacções que aí ocor‑
trar na doença e na técnica para evoluir no sentido rem são valorizados. Seleccionámos um contexto de
da prevenção e da transformação da relação dos pro‑ trabalho singular, o contexto comunitário, especi‑
fissionais de saúde com o meio ambiente e os uten‑ ficamente no Centro de Saúde de Lourinhã, onde é
tes; a evolução científica e técnica também ocorrem desenvolvido um projecto de cuidados à população
de forma acelerada, o que exige que a formação se diabética. A comunidade foi o contexto selecciona‑
desenvolva, à semelhança do que se passa noutros do, pelo seu elevado grau de complexidade porque
campos profissionais, no sentido de se transformar permite analisar as práticas profissionais na pers‑
no pólo dinamizador da mudança. pectiva destes mas, também, como são sentidas pe‑
No processo de mutações sociais e científicas ac‑ los utentes, contextualizando as situações diferen‑
tuais, a Enfermagem revela­‑se como uma profissão tes da vida e da saúde no seu meio sócio­‑cultural.
em evolução, quer a nível de políticas e filosofias, Este contexto induz uma representação diversa da
quer a nível da relação com o utente como inter‑ assistência de Enfermagem: “não uma assistência
veniente nos cuidados de saúde. As problemáticas balizada pela estrutura do centro de saúde e limi‑
actuais exi­gem o desenvolvimento de competências tada aos gabinetes ou às salas de tratamentos, mas
que deverão fluir do processo de formação e inte‑ sim uma assistência articulada com e na comunida‑
grar todos os intervenientes no processo de cuidar, de” (Abreu, 2001, p. 211).
no sentido da construção dos cuidados e da saúde. Seleccionámos o Centro de Saúde da Lourinhã
Na última década, a Enfermagem tem sido alvo que tem um projecto de cuidados aos diabéticos
de vários estudos que deram relevo a aspectos di‑ classificado, de modo informal, como inovador,
versificados mas que permitem obter dados, com tanto pelos profissionais de saúde, como pelos dia‑
especial ênfase para a compreensão da produ‑ béticos, com quem tivemos oportunidade de con‑
ção de cuidados a determinados utentes, onde se tactar, a nível profissional, na fase inicial de escolha

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do contexto do estudo. Escolhemos o projecto trabalho; num segundo bloco reflectimos sobre as
porque consideramos que para a compreensão da práticas de cuidados em Enfermagem e sua interli‑
formatividade dos contextos, é essencial analisar gação com o diabético como actor principal destes
as interacções nos cuidados onde existem diversos cuidados.
actores que expressem e abordem criticamente as
práticas. formação: da concepção à produção de saberes
Centrámo­‑nos numa população específica, os em contexto de trabalho
diabéticos, porque estão em crescimento numérico Para a análise da relação da formação com a pro‑
no conjunto da população, situação que, segundo dução de saberes centrámo­‑nos na noção de que a
as projecções de diversos organismos (OMS, INE, formação a promover não se deve limitar às práticas
DGS) se manterá, durante as próximas décadas. mais usuais no domínio da formação profissional,
Estes utentes são grandes consumidores de cuida‑ práticas de ensino e de aprendizagem, mas dar um
dos de saúde, pelas vulnerabilidades inerentes aos lugar de destaque às práticas de desenvolvimento
seus problemas físicos, emocionais e sociais, o que das capacidades formativas das pes­soas, dos gru‑
tem dificultado as respostas a estes mesmos proble‑ pos e das instituições. Na falta destas práticas, a
mas que não se enquadram nas soluções globais do formação não faz mais do que reforçar o modelo
nosso sistema de saúde. biomédico predominante, e manter o significado
A nível social, a análise da problemática do da saúde limitado à ausência de doença (Honoré,
diabético torna­‑se importante pela dimensão que 2002).
adquiriu na nossa sociedade, pela elevada preva‑ Para questionar as práticas de formação dos
lência e incidência do diagnóstico e complicações, adultos é necessário ultrapassar os modelos escola‑
não implicando apenas os diabéticos, mas também res, na medida que estão incluídas num processo de
as suas famílias, a comunidade e o próprio sistema socialização, em que os indivíduos são simultanea‑
de saúde. Com toda esta dimensão exige­‑se aos mente objectos, sujeitos e agentes (Lesne, 1987).
profissionais de saúde, especialmente àqueles que Nesta perspectiva, a produção das práticas pro‑
trabalham na comunidade, que aceitem o desafio fissionais remete, essencialmente, para o processo
da construção de soluções integradoras, através de de socialização profissional, vivido nos contextos
mecanismos de suporte comunitários que respon‑ de trabalho. Não é pela acumulação de cursos,
dam às problemáticas dos diabéticos, inspirados conhecimentos ou técnicas que se constrói a for‑
em abordagens humanizadas e integradoras. mação, mas através de um trabalho de reflexão,
Este estudo tem como questão central: Quais de cada indivíduo, sobre as suas práticas e de uma
as dinâmicas formativas que ocorrem no projec‑ permanente construção da sua identidade pessoal
to de cuidados aos diabéticos onde são exercidas (Nóvoa, 1991).
práticas de Enfermagem? Ao estudarmos o proces‑ Para que o adulto aceite a formação, é necessá‑
so de construção das práticas dos enfermeiros em rio que nela encontre uma resposta concreta para os
contexto de trabalho, tentamos conhecer como o seus problemas do quotidiano.
fazem, como analisam as suas práticas e como estas Questionar a construção da prática profissional,
são apercebidas pelos utentes. faz­‑nos perceber que a formação e as aprendizagens
se baseiam na noção de que a experiência é um dos
saberes a que os adultos se reportam. Para Domini‑
Da formação à construção de cé (1990, p. 150) é importante “(…) devolver a ex‑
cuidados na comunidade periência o lugar que merece na aprendizagem dos
conhecimentos necessários à existência”. Assim, o
A nível teórico, o desenvolvimento do quadro de processo formativo tem como ponto de partida as
referências foi subdividido em dois grandes blocos, experiências para a construção das práticas.
num primeiro analisamos a formação em contexto A formação contribui para a construção das
de trabalho, mais especificamente a relação entre a competências profissionais, privilegiando os pro‑
formação e a produção de saberes em contexto de blemas reais da prática, relacionando­‑os com a

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qualidade dos cuidados, de forma a proporcionar saúde e a contribuir para a elabora­ção de um per‑
possíveis mudanças a nível institucional. Questio‑ curso comum. Neste sentido, o diabético tem que
námos a prática profissional que não reflecte apenas ser o principal interveniente em todo o processo de
acções isoladas ou abstractas, na medida que con‑ adaptação à doença.
sideramos que a resposta dos enfermeiros inseridos Para analisarmos a construção das práticas de
no contexto de trabalho não engloba só factores in‑ Enfermagem no cuidar destes utentes é importante
dividuais, como também as interacções que estabe‑ uma visão integradora do diabético, que tem de se
lecem com o contexto de trabalho. adaptar a diversos constrangimentos, quer físicos,
Para estudar a formatividade dos enfermeiros em quer sociais, de forma a conseguir controlar a sua
contexto de trabalho devemos assim, adoptar uma patologia e não desenvolver complicações irrever‑
perspectiva abrangente, de forma a compreender‑ síveis.
mos as suas dimensões. Partimos do pressuposto Em 1998 no Dossier Diabetes, a DGS (Direcção
que a formatividade dos enfermeiros os implica no Geral de Saúde), define de modo geral, as funções
seu todo enquanto actores sociais, onde se cruzam dos enfermeiros:
utentes e profissionais. Entendemos que o conceito
de formatividade define a natureza de um trajecto A enfer­meira, além de exercer a arte de cuidar, presta
de formação, de limites, de espacialidade e de tem‑ cuidados técnicos individualizados de Enfermagem,
poralidades difusas, no qual a aprendizagem não participa activa­mente em programas de vigilância,
se restringe à lógica instrumental. Ou seja, através de promoção e educação para a saúde, desenvolven‑
do infor­mal, da formação em contexto, o indivíduo do actividades, inerentes à sua for­mação científica,
constrói uma profissionalidade (Abreu, 2001). dirigidas a grupos vulneráveis e de risco (s.p.).

O diabético: da problemática social Estas orientações internacionais para o trata‑


à construção de cuidados de enfermagem mento da diabetes realçam a importância de uma
na comunidade actuação adap­tada aos problemas dos utentes. O
No segundo bloco analisamos especificamente grande objectivo dos cuidados à pessoa com dia‑
as práticas de cuidados de Enfermagem e sua in‑ betes é conciliar prevenção de complicações com
terligação com o diabético como principal alvo de a promoção da saúde, ou seja, existem actuações
cuidados. Estas práticas são entendidas como um no sentido de aumentar o potencial de saúde des‑
sistema complexo de interacções, não só de acção sas pessoas, para dessa forma também prevenir as
repetida, mas que se pretende de acção regulada e graves e incapacitantes complicações, onde cuidar
reflectida (Shön, 1996), onde quotidianamente in‑ é “ajudar a viver” (Collière, 1989, p. 177).
teragem diferentes actores: os que cuidam (enfer‑
meiros), os que são cuidados (utentes), o contexto
de trabalho e todos os outros profissionais que in‑ Opções metodológicas:
tervêm nos cuidados. do objectivo à análise
No campo da saúde, é essencial que as prá­ticas e tratamento dos dados
sejam partilhadas com os parceiros dos profissionais
que são os utentes, devendo existir uma atitude de O objectivo deste estudo centrou­‑se numa tentativa
escuta e disponibilidade para os ouvir atentamente, de compreender as dinâmicas formativas que ocor‑
favorecendo a sua expressão (Honoré, 2002). rem no projecto de cuidados aos diabéticos onde
Nos cuidados de Enfermagem, especificamente são exercidas práticas de Enfermagem.
no contexto comunitário, são importantes as inte‑ As questões orientadoras definidas foram: Qual
racções entre os actores, promovendo o debate e a o papel dos dispositivos de formação no desenvol‑
reflexão para formular os objectivos e preparar as vimento dos cuidados aos diabéticos? Que articu‑
acções a conduzir para os alcançar, relacionando­‑as lação existe entre a experiência, contexto de traba‑
com a missão global de saúde. Assim, cada um será lho e construção de competências nos cuidados aos
convidado a expri­mir a sua própria concepção de diabéticos? Qual a influência das interacções entre

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os actores no desenvolvimento destes cuidados? totalidade dos enfermeiros envolvidos no projecto
Que papel é atribuído ao projecto de cuidados aos e a cinco diabéticos, constituindo estes últimos a
diabéticos na construção das práticas de Enferma‑ nossa amostra intencional, não­‑representativa. Para
gem? Que práticas profissionais de Enfermagem a sua selecção optámos por definir critérios qualita‑
são específicas dos cuidados a estes utentes? Qual tivos: participação no projecto há pelo menos dois
o significado das práticas de cuidados de Enferma‑ anos; interesse que a prevenção das complicações
gem para os diabéticos? Como são percepcionadas não se restrinja ao tratamento curativo da diabetes;
pelos diabéticos as dinâmicas formativas nos cui‑ capacidades físicas e psíquicas que permitam a co‑
dados? municação; disponibilidade de tempo para a reali‑
Relativamente à estratégia metodológica, a zação da entrevista. Como técnica complementar
problemática desenhada assim como as questões utilizámos a análise documental referente ao pro‑
orientadoras apontaram para a utilização do estu‑ jecto e ao Centro de Saúde. A análise e tratamen‑
do de caso, através de uma abordagem qualitativa, to de dados foram realizados através da análise de
de modo que permitisse o contacto directo com a conteúdo.
situação e as práticas em contexto de trabalho que Todo o processo de implementação das estraté‑
se enquadram numa realidade particular. Foi nosso gias de investigação e técnicas de colheita de dados
objectivo, compreender, em profundidade e pelo exigiu uma reflexão permanente do investigador,
contacto directo, a situação e o contexto em que se que permitiu no decorrer do trabalho no contexto
enquadra a pesquisa e se movem os actores. do estudo, a delimitação e clarificação da estrutura
A unidade de análise foi o Centro de Saúde, no do mesmo, através do desenvolvimento da relação
seio do qual era desenvolvido o projecto de aten‑ com as pessoas e com o próprio contexto. Esta di‑
dimento personalizado ao diabético. Posicionámos nâmica possibilitou a descoberta constante de in‑
este estudo na proximidade do paradigma inter‑ formação, que permitiu reajustamentos no proces‑
pretativo, pela preocupação em compreender o so de investigação, pela permanente confrontação e
mundo social como ele é, ao nível da experiência análise dos dados.
subjectiva (Bogdan & Biklen, 1994). Para compre‑
ensão das problemáticas da saúde, especificamente
na Enfermagem, remete­‑nos para um nível micro A construção das práticas em
no qual o indivíduo é a unidade. Posicionámo­‑nos, enfermagem
também, na abordagem fenomenológica que tenta
compreender o significado que os acontecimentos e Ao longo do desenvolvimento da investigação,
interacções têm para a pessoa comum, em situações existiu um processo de (re)formulação que preten‑
particulares (Bogdan & Biklen, 1994). demos, seguidamente, analisar de forma a desco‑
Em termos da recolha de informação empírica, brirmos as especificidades dos cuidados aos diabé‑
utilizámos como técnicas nucleares a observação ticos, as interacções entre os actores e a construção
participante e as entrevistas. A observação decor‑ dos cuidados aos diabéticos.
reu ao longo de três meses durante duas a três ho‑
ras por dia, em diferentes momentos do dia, e em As especificidades dos cuidados aos diabéticos
dias de semana também diferentes. Observámos e Os cuidados aos diabéticos exigem uma abordagem
participámos nas consultas e acções na comunida‑ global de saúde, não fragmentada num somatório
de. Terminámos este período quando verificámos de problemas, em presença dos quais é difícil para
que a nossa presença no terreno já não permitia o cada um situar­‑se, pelo que tem necessariamente
acesso a novos dados relevantes para a pesquisa. que ser desenvolvida uma abordagem transcultural
Após o primeiro mês do período de observação da saúde, tendo em consideração as problemáticas
elaborámos os instrumentos de colheita de dados, da população e do seu meio envolvente. A análise
os guiões das entrevistas, consoante as informações do material empírico permite­‑nos verificar que nos
recolhidas no terreno. Foram realizadas entrevistas cuidados aos diabéticos na comunidade, o enfer‑
semi­‑estruturadas a três enfermeiros para inquirir a meiro está numa posição privilegiada, tem acesso

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a uma visão integral do indivíduo inserido no seu relação de confiança, no sentido de trabalharem
contexto social, o que facilita a sua intervenção em parceria na construção das práticas de cuida‑
adap­tada aos problemas dos utentes. dos. Também verificámos que existem determina‑
Os enfer­meiros são os que têm uma acção mais dos cuidados que são importantes para os diabéti‑
directa e constante sobre o utente, pelo que são os cos, onde os mais valorizados foram os relacionais
ver­dadeiros veículos da acção educativa (Couto & e os comunicacionais. Os cuidados técnicos foram
Camarneiro, 2002). os menos valorizados pelos diabéticos, porque o
Através da análise do material empírico, veri‑ fazer, no caso destes utentes, nem sempre é um
ficámos que existe uma percepção positiva por fazer activo, físico, com as mãos, muitas vezes a
parte dos diabéticos sobre os cuidados de Enfer‑ manutenção de uma abordagem e de uma atitude
magem, que influenciam a imagem que têm destes positiva são de maior auxilio para o diabético (Ver
profissionais e permite o desenvolvimento de uma quadro n.º1).

Quadro n.º 1
Características dos cuidados de Enfermagem valorizados pelos diabéticos

Cuidados de Enfermagem Características Excertos do material empírico


Ocorrem na interacção do enfermeiro com o “Um bom enfermeiro é aquele que se esforça
Relacionais utente, na compreensão e empatia para com o para nos ajudar, que dá tudo por tudo!” (En‑
outro, com grande ênfase para a afectividade. trevista ao diabético A)

Surgem na interacção do enfermeiro com o “Para mim ser boa enfermeira é dar umas
utente baseados na comunicação verbal e não­ boas informações ao doente, o que há­‑de fa‑
Comunicacionais ‑verbal, com ênfase para a simplificação e ade‑ zer e não há­‑de de fazer, tem que ter cuidado
quação das mensagens e linguagem e o uso de com o quê, para mim é assim.” (Entrevista ao
repetições. diabético B)

Baseados essencialmente na acção dos profis‑ “Acho importante verem os pés, medirem a
sionais no decorrer dos procedimentos técni‑ tensão, fazerem a picada no dedo, mas o mais
Técnicos
cos. importante é falarem comigo, não tanto faze‑
rem estas coisas.” (Entrevista ao diabético E)

Os resultados obtidos no contexto de cuidados medidas a seguir. O que é um direito e um dever


aos diabéticos são congruentes com os resultados de qualquer utente. No entanto, em determinado
obtidos por Abreu (2001), no seu estudo relativo momento do seu percurso como diabéticos deci‑
à identidade profissional dos enfermeiros em con‑ dem não realizar os cuidados preventivos, muitas
texto comunitário, onde concluiu que no centro vezes pela dificuldade de aceitação da doença. O
do debate sobre a formação e a assistência colocam que primeiramente emerge para o diabético é a in‑
sempre a relação, a qual é referenciada como o âma‑ certeza perante o futuro e o sentimento de impotên‑
go da assistência em cuidados de saúde primários. cia para lidar com as novas situações. Isto faz com
Com base no material empírico, verificámos que que negue a realização dos cuidados. O confronto
os diabéticos têm a percepção da importância da com a diabetes é difícil e apesar de não se ignorar
sua participação nos cuidados e que ela realmente a sequência de estados emocionais que podem co­
existe no contexto deste estudo. Estes utentes estão ‑ocorrer (choque, negação, depressão, adaptação e
informados sobre os cuidados e desejam ser bem reorganização), considera­‑se que a adaptação, pelos
informados sobre o seu estado. Tal como refere seus efeitos prolongados, é o processo mais compli‑
Honoré (2002), os utentes começam mesmo a de‑ cado (Couto & Camarneiro, 2002).
sejar ser implicados nos processos de decisão que No decorrer dos cuidados aos diabéticos ve‑
lhes dizem respeito e na escolha dos tratamentos e rificámos que são abertos espaços de análise e

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problematização que permitem novas aprendiza‑ Para Boavida (2001), a finalidade da interacção
gens, mesmos que não conscientes e intencionais do enfermeiro e diabético centra­‑se na perspecti‑
por parte dos actores, as designadas aprendizagens va de que o utente é um indivíduo único que tem
informais. As mais valorizadas pelos diabéticos, que viver com uma contingência — a diabetes —;
no decorrer dos cuidados, centram­‑se essencial‑ acompanhá­‑lo é ensiná­‑lo a vi­ver saudável.
mente a nível dos cuidados preventivos relativos à As interacções no grupo de Enfermagem surgem
alimentação, exercício físico e cuidados podológi‑ como potenciadoras da capacidade formativa das
cos. Estas aprendizagens informais podem ocorrer práticas, na medida em que o grupo se formaliza
todos os dias, em qualquer momento, quando os nas relações que estabelece, nas normas que define,
diabéticos se encontram e têm uma conversa sobre construindo saberes neste contexto. Para a compre‑
a saúde, que implique o desenvolvimento dos cui‑ ensão da interacção entre os enfermeiros na cons‑
dados preventivos. Através destas aprendizagens trução dos cuidados aos diabéticos em contexto
no quotidiano existe uma ligação entre a saúde e comunitário, é notória a importância do debate e da
a forma­ção. reflexão para a formulação dos objectivos, de forma
Estas práticas reforçam a abordagem holística a preparar as acções a desenvolver para os alcançar,
dos cuidados em detrimento do modelo biomédi‑ relacionando­‑as com a missão da organização. Esta
co. Toda a experiência de uma acção de saúde abre dinâmica no grupo induz atitudes reflexivas e res‑
aos seus actores a possibi­lidade de exercer, no local ponsabilizantes dos cuidados que permitem ques‑
onde vivem, uma acção formativa para a saúde, per‑ tionar as vivências experienciadas no quotidiano
mitindo, assim, a construção de práticas de saúde de cuidados e em alguns momentos rotinizados. A
comunitárias (Honoré, 2002). dinâmica das relações no grupo, bem como a sua
coesão, funcionam como pólos dinamizadores de
Os cuidados aos diabéticos: uma evolução dos cuidados.
a interacção entre os actores Tal como Crozier e Friedeberg (1977) referem,
Os cuidados aos diabéticos apresentam­‑se com ele‑ formar­‑se será também aprender a minimizar o de‑
vado grau de complexidade porque induzem uma sequilíbrio resultante do exercício do poder atra‑
representação diversa dos cuidados de Enfermagem vés de aprendizagens colectivas numa perspectiva
que não se limita à actuação do próprio enfermeiro, de desenvolvimento de uma acção colectiva cons‑
mas impõe uma interacção entre estes, outros pro‑ ciente, alternando as regras do jogo e as zonas de
fissionais e os próprios utentes. Nesta perspectiva, incerteza.
os cuidados a nível de Centro de Saúde exigem, As organizações de saúde, nas quais se inclui
actualmente, contínuas interacções entre todos os o Centro de Saúde, são locais onde estão em inte‑
actores e o seu meio ambiente, no sentido de pro‑ racção grupos com estatutos diferentes, podendo
mover mudanças, o que permite o desenvolvimento existir uma luta pelo poder de forma a reforçar as
de novas modalidades de formação em contexto de posições existentes. Nos cuidados aos diabéticos
trabalho. Desta forma, todos os contextos de vida esta luta está polarizada no grupo dos enfermei‑
são considerados como lugares de formação, de ros e médicos. Na interacção entre estes grupos o
modo a promover a descoberta da saúde, enquadrar poder está presente em todas as actividades da ac‑
as práticas, envolver todos os parceiros e estabele‑ ção, sob a forma de trocas e de negociações, onde
cer a sua relação com o contexto de vida. fica demonstrada a capacidade de cada profissional
Na análise do material empírico, verificámos estruturar os processos de negociação a seu favor,
que o grande objectivo da interacção entre enfer‑ de forma a atingir os seus objectivos; para tal, são
meiros e diabéticos centra­‑se na relação de ajuda, explorados os constrangimentos e oportunidades
onde existe uma negociação entre estes actores, no das diversas situações, para impor os termos de
sentido de promover a articulação entre a preven‑ negociação favoráveis aos seus interesses. Cada vez
ção de complicações e a promoção da saúde, de for‑ mais, os enfermeiros, a nível do Centro de Saúde,
ma a ajudar o diabético a reorganizar a sua vida e passam a assumir um papel central, com um cres‑
aumentar o seu potencial de saúde. cimento das suas actividades autónomas, visto que

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existe um aumento das suas responsabilidades, pe‑ outros profissionais (médicos e psicóloga), que
las novas situações de doença crónica como a dia‑ têm um papel importante na resolução de proble‑
betes. A representação social dos enfermeiros está mas relacionados com os cuidados aos diabéticos
em mudança, o que promove uma dinâmica forma‑ e que permitem uma dinâmica de organização de
tiva que permite o desenvolvimento dos cuidados trabalho criativa e partilhada, impulsionadora de
de Enfermagem. Assim, consideramos que, para os novos saberes organizacionais. As redes informais
enfermeiros, o Centro de Saúde representa o local são as mais valorizadas e frequentes nos cuidados, e
com maiores potencialidades de formação, visto ser centram­‑se essencialmente no contacto pessoal em
“um espaço onde estes podem realizar o seu pro‑ momentos que os enfermeiros identificam como os
jecto profissional com maior autonomia” (Abreu, mais oportunos para a resolução dos problemas.
2001, p. 212). No contexto de cuidados aos diabéticos surgem
novos modos de pensar e organizar os processos de
A construção dos cuidados aos diabéticos trabalho que fazem apelo a novos tipos de saberes:
O cuidar de uma população específica, como o trabalhar em equipa, pensar à escala da organiza‑
caso dos cuidados aos diabéticos em contexto co‑ ção no seu todo, agir estrategica­mente a partir de
munitário, tende a constituir um campo de reflexão raciocínios de antecipação. Através de uma estraté‑
emergente. Novos papéis interventivos e práticas de gia de formação global, participativa e interactiva, é
cuidados fazem apelo a inovadores modos de agir, possível construir uma visão partilhada e consen‑
que têm influências nas próprias vidas dos actores, sual do futuro da organi­zação, das suas finalidades,
mas também a nível organizacional. Neste contex‑ dos meios de acção e dos valores que lhe estão sub‑
to, o desenvolvimento dos cuidados inerentes à jacentes (Canário, 2000).
transformação ocorrida nos contextos de trabalho Após a análise do material empírico, verificá‑
faz apelo a um conjunto de saberes que não estão mos que surgem dispositivos e dinâmicas formati‑
centrados em acções isoladas, mas no processo de vas que, no contexto de trabalho, desenvolvem as
produção organizacional. condições necessárias para que os enfermeiros e os
No campo das práticas de cuidados aos diabéti‑ diabéticos transformem as experiências em apren‑
cos verificámos que emerge uma dimensão colectiva, dizagens. Identificámos um conjunto de dispositi‑
onde o exercício do trabalho ganha contornos quali‑ vos formais, não­‑formais ou informais que permi‑
ficantes. Neste contexto, a nível organizacional, cada tem a construção de cuidados aos diabéticos (ver
indivíduo forma­‑se e desenvolve saberes, influencia‑ quadro n.º2). Estes cuidados tendem a constituir­‑se
do pelo seu espaço social de interacção e pelas suas num processo global e articulado de forma a desen‑
práticas vividas, reflectidas e partilhadas, que encer‑ volver, nos actores, a reflexão que facilite a análise
ram um elevado potencial formativo e socializador. das práticas profissionais e a evolução das mesmas.
Este processo corresponde a uma dimensão co‑ Os dispositivos de formação tendem a desenvol‑
lectiva que alguns designam por aprendizagem or‑ ver todo um processo produtor de saberes, onde os
ganizacional, por intermédio da qual um colectivo momentos informais e não­‑formais são os mais va‑
de actores constrói e mobiliza, de forma partilhada, lorizados pelos enfermeiros e diabéticos, com sig‑
teorias de acção organizacional, estruturantes da nificativos efeitos no desenvolvimento das práticas
acção colectiva (Charue, 1992). a nível individual e colectivo. Tal como refere Pain
Nos cuidados aos diabéticos verificámos que (1990), as situações de trabalho têm efeitos educa‑
as potencialidades formativas do contexto de tra‑ tivos, ou seja, produzem mudanças no comporta‑
balho são influenciadas pelas relações existentes e mento dos indivíduos ou grupos, são resultado das
pela comunicação que se estabelece entre os diver‑ experiências individuais e colectivas e da aquisição
sos profissionais, um meio facilitador do diálogo de conhecimentos na acção, produzidos de modo
e da reflexão sobre as práticas que é promotor de não necessariamente consciente.
aprendizagens. No contexto comunitário analisa‑ No campo das práticas de Enfermagem e especi‑
do evidenciaram­‑se redes informais e formais de ficamente nos cuidados aos diabéticos na comuni‑
comunicação entre os enfermeiros e entre estes e dade, tal como noutros campos de acção, encara­‑se

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Quadro n.º 2
Características dos dispositivos de formação
que ocorrem no contexto de cuidados aos diabéticos

Dispositivos de formação Características Excertos do material empírico


Ocorrem dinâmicas no contexto de cuidados “Sempre que estamos as três juntas há sem‑
aos diabéticos potencialmente formativas, pre uma conversa sobre os diabéticos, ou
mesmo que não conscientes e intencionais porque uma leu numa revista alguma coisa
por parte dos actores, e que correspondem a nova, ou casos práticos. No outro dia surgiu
situações pouco estruturadas e pouco organi‑ uma utente com hiperglicémia, que não con‑
Informais
zadas, onde são abertos espaços de análise das seguimos compreender, apesar de fazer insu‑
práticas de cuidados. lina, perguntamos sempre o que a colega acha
que poderá ter acontecido. Estamos sempre a
conversar porque basta uma dica (…)” (Entre­
vista enfermeira C)

Estes dispositivos caracterizam­‑se por pro‑ Posteriormente conversámos sobre as sessões


mover acções com flexibilidade de conteúdos, de educação para a saúde, que as enfermeiras
horários e locais. São baseados geralmente no iriam realizar em Janeiro e que estavam a pla‑
voluntariado, no qual está presente a preocu‑ near no momento:
pação de construir situações educativas à me‑ Enf. A. — “Estas sessões são essencialmente
dida dos problemas dos actores. Nos cuida‑ para utentes com diagnóstico de diabetes re‑
Não-formais dos aos diabéticos estes dispositivos incluem: cente. Não irá só o utente, mas também a (…)
acções de educação para a saúde e reuniões de pessoa com quem têm uma relação mais próxi‑
Enfermagem periódicas. ma e os ajuda nas actividades de vida diárias.
(…) pelo que desejamos também a partilha de
medos e receios, que só conseguiremos se o
ambiente for protector e de elevada confiança.”
(Observação participante — relatório n.º 6)

Caracterizam­‑se por uma estruturação prévia Enf. B. — “(…) existe um programa que até
de programa e horários, com base na assime‑ achamos interessante e depois vamos lá e até
Formais tria professor­‑aluno, na existência de proces‑ nem tem muito a ver.” (Entrevista enfermeira B)
sos avaliativos e de certificação e que são exte‑
riores ao contexto de trabalho.

a experiência como base fundamental para o desen‑ Nos cuidados aos diabéticos, a produção de
volvimento dos processos de aprendizagem. A cons‑ competências profissionais corresponde a um pro‑
trução dos saberes nos cuidados aos diabéticos é cesso simultaneamente individual e colectivo. As
sustentada pela reflexão sobre as práticas problema‑ competências são emergentes dos contextos de cui‑
tizadas. Neste contexto, a experiência engloba uma dados, são fruto da combinação de saberes indivi‑
forma e sentido através da re­flexão, que permite que duais que percorrem a complexidade do contexto
seja reconstruída, de forma a questionar as práticas de trabalho, atravessa as experiências do grupo e
e a organização do trabalho. A experiência reflexiva da organização.
no contexto de cuidados aos diabéticos situa­‑se a Para analisar as competências dos enfermeiros
nível individual protagonizado pelo enfermeiro, ou nos cuidados aos diabéticos, utilizámos indicado‑
a nível colectivo, centrado na interacção entre enfer‑ res identificados por Costa (2000), no seu estudo re‑
meiros e diabéticos, e grupo de Enfermagem. As ex‑ lativo às competências geriátricas dos enfermeiros,
periências dos enfermeiros vivenciadas no contexto que permitem sistematizar a construção de compe‑
de trabalho permitem que aprendam. Os actores tências num percurso profissional inscrito na pro‑
aprendem melhor quando os conhecimentos a ad‑ blemática global do cuidado e da formação em En‑
quirir se referem a situações práticas que lhes são fermagem geriátricas. Estes indicadores permitem
familiares (Dominicé, 1990; Pineau, 1991). interligar o que se faz (Acção), o que no decurso da

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acção decorre (Relação), e é preenchido pela capa‑ pelos diabéticos ao longo da colheita de dados, o
cidade reflexiva e implicativa do que se é (Ser). Nos que está relacionado com o facto de a Enfermagem
cuidados aos diabéticos as competências relaciona‑ ser intimamente uma profissão de relação e comu‑
das com a dimensão Ser foram bastante valorizadas nicação empática com o outro. As competências
pelos diabéticos, verificando­‑se a importância de o relacionadas com a dimensão Acção foram pouco
enfermeiro demonstrar uma capacidade reflexiva valorizadas porque os cuidados de Enfermagem
nas situações que implicam a relação de ajuda, no na comunidade se centram essencialmente nos as‑
processo de cuidar. As competências relacionadas pectos relacionais, onde os cuidados curativos não
com a dimensão Relação foram as competências são tão valorizados, tal como as técnicas executadas
mais evidenciadas, tanto pelos enfermeiros como (Ver quadro n.º3).

Quadro n.º 3
Características das competências que emergem nos cuidados aos diabéticos

competências Características Excertos do material empírico


Surgem numa perspectiva intimista, menos D. N. — “Nota­‑se que todas as enfermeiras
analisável, construídas no confronto do enfer‑ gostam muito do que fazem, sabem como fazer
Dimensão Ser
meiro consigo próprio, com os outros profis‑ e por isso conseguem­‑nos ajudar realmente.”
sionais, diabéticos e com o seu ambiente. (Observação participante — relatório n.º 12)

Ocorrem no confronto com o diabético, na “É uma boa enfermeira quando estamos à


Dimensão Relação escuta, no diálogo, na compreensão e empatia vontade para falar, quando somos bem esti‑
para com o outro. madas.” (Entrevista ao diabético C)

Surgem na perspectiva do que o enfermeiro faz “É uma boa enfermeira quando mede a tensão
Dimensão Acção
no decorrer da interacção com o diabético. arterial.” (Entrevista ao diabético A)

Os resultados obtidos no contexto de cuidados conjunto de dispositivos informais, não­‑formais


aos diabéticos são congruentes com os encontrados e formais que se articulam, numa globalidade
por Abreu (2001) no seu estudo relativo à identidade potencialmente formativa.
profissional dos enfermeiros, em contexto comuni‑ • A produção de competências profissionais nos

tário. Conclui que os cuidados de saúde primários cuidados aos diabéticos corresponde a um pro‑
eram percebidos como um conjunto de actividades, cesso de reflexão experiencial simultaneamente
como um nível de assistência, como uma estratégia individual e colectivo. As competências são emer‑
ou como uma filosofia, onde o grupo de competên‑ gentes dos contextos de cuidados, são fruto da
cias que os enfermeiros desenvolveram com maior combinação de saberes individuais que percorrem
predominância foi o das competências de relação, o a complexidade do contexto de trabalho e conver‑
que é por si um indicador da natureza do traba­lho gem para três indicadores: Ser, Relação e Acção.
desenvolvido na e com a comunidade. • Nos cuidados aos diabéticos interagem grupos

com estatutos diferentes: os utentes, os enfer‑


meiros e os médicos, onde o poder é um ele‑
Conclusões gerais mento presente, pelo que cada actor demonstra
capacidade para estruturar os processos de ne‑
As principais conclusões a que chegámos com o es‑ gociação a seu favor, para atingir os seus objecti‑
tudo são as seguintes: vos e onde são explorados os constrangimentos
e as oportunidades das diversas situações.
• A construção dos cuidados aos diabéticos a nível • O projecto de cuidados implica o trabalho em

comunitário assenta no desenvolvimento de um parceria entre os enfermeiros e os diabéticos:

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são definidas metas, objectivos, estratégias e • Nos cuidados aos diabéticos ocorrem dinâmi‑
processos de avaliação, que o tornam um me‑ cas formativas que envolvem os utentes no seu
canismo inovador, permitindo responder aos contexto social e os enfermeiros, onde ocorrem
problemas da população no seu contexto sócio­ espaços de análise e problematização que per‑
‑cultural e fazendo evoluir as práticas. mitem o desenvolvimento de aprendizagens in‑
• As práticas de Enfermagem nos cuidados aos dia‑ formais.
béticos exigem uma visão holística do utente, pelo
que é desenvolvida uma abordagem transcultural Com o percurso da investigação que desenvol‑
da saúde, tendo em consideração as problemáti‑ vemos neste artigo esperamos que tenha sido dado
cas da população e do seu meio envolvente. mais um contributo para a compreensão do univer‑
• Nos cuidados aos diabéticos existe uma percep‑ so das práticas de cuidados de Enfermagem, permi‑
ção positiva das práticas de cuidados de Enfer‑ tindo analisar os modos de construção dos cuida‑
magem por parte dos utentes, o que permite o dos e de formação em contexto de trabalho. Desta
desenvolvimento da relação de confiança. Os forma, o aparecimento de reflexões neste âmbito, só
cuidados mais valorizados foram os relacionais poderá conduzir ao desenvolvimento e visibilidade
e comunicacionais, no sentido de promoverem a destas mesmas práticas. É com esta convicção que
participação. escrevemos estas páginas.

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