O processo de mudança do manejo convencional para o ecológico tem sido chamado de “conversão”. As motivações para a conversão podem ser várias. ◦ o atrativo maior vem da possibilidade de melhorar sua produção e comercialização sem onerar sua planilha de custos. ◦ o prêmio atualmente pago pelos produtos orgânicos. Contudo, a maioria dos agricultores compartilha o interesse de, inicialmente, ajustar sua produção às normas da produção orgânica, de modo a garantir sua possibilidade de ingresso no mercado orgânico. Chegar ao ponto desejado usualmente se traduz em estabelecer uma nova rotina de manutenção da fertilidade do sistema e de escoamento da produção. A maior parte das conversões não tem incorporado o tempo de maturação do reaprendizado e a necessidade de ajuste de todos esses aspectos. Também não é raro encontrar-se casos de culturas displicentemente tratadas, a que o agricultor, por não aplicar agrotóxicos, chamou de orgânicas, e cujo destino mais provável é o insucesso. Para tornar a conversão mais fluida, lógica e compreensível, uma ferramenta especialmente útil é a abordagem sistêmica Com essa abordagem, é possível ter uma visão macro do sistema de produção a converter, identificando-se precisamente os pontos mais relevantes. Progressivamente, pode-se ir descendo aos detalhes pertinentes, sem, contudo perder tempo ou energia em aspectos de pouca relevância. Além disso, o método permite a clara compreensão por todos os envolvidos das etapas a serem vencidas durante a conversão. A nitidez, a objetividade e a eficácia do programa de conversão dependem muito da experiência do técnico que assessora o processo. ◦ Bons conhecimentos na área biológica, na abordagem sistêmica e bom senso Uma vez caracterizados com nitidez o ponto de partida e o ponto de chegada, o passo seguinte é estudar o menor caminho possível entre eles, considerando as potencialidades e limitações do sistema em termos de capital, terra, mão-de-obra e conhecimento. Daí a necessidade de que o plano de conversão seja claro, lógico e compreensível, e que todas as fases sejam interativa e iterativamente discutidas entre assessor e agricultor. O ponto de partida O ponto de chegada É diagnóstico da A definição do ponto de propriedade: chegada resulta da interação entre o gerente ◦ recursos disponíveis do sistema que se (naturais, humanos, pretende converter e o benfeitorias, infra- assessor com experiência estrutura regional); no assunto. ◦ aspectos relacionais Criando uma (relações sociais e oportunidade ímpar de comerciais); aprendizado, que ◦ a ocupação da área; convém explorar. ◦ rendimento físico e Esse ponto de chegada econômico. pode ser traduzido numa Anaminése. representação É uma fotografia do esquemática do futuro sistema, em que sejam presente. visíveis as mudanças a introduzir. Entre a situação inicial real e a situação idealizada costuma haver um grande número de ENTRAVES a resolver. Focalizar o conjunto desses entraves e possíveis soluções, procurando-se definir quais os que, corrigidos, podem acelerar e tornar mais eficiente a conversão. Ressalta-se que os pontos-chave com elevada freqüência não são apenas biológicos, adentrando as áreas da administração, das relações humanas (familiares, sociais, econômicas) e da capacitação do pessoal envolvido. Os pontos-chaves precisam ser especificamente definidos. Definidos os pontos-chaves, é muito importante estabelecer um calendário de trabalho de fácil visualização pelos responsáveis por sua execução, para que as mudanças sejam implementadas e surtam os efeitos desejados no seu tempo. Por melhor que seja o plano de conversão, a identificação dos pontos-chaves e o cumprimento do cronograma e de suas metas setoriais, costuma haver necessidade de ajustes no percurso. Na grande maioria dos casos, a conversão abrange mudanças nas vias de comercialização. Como se trata de um mercado diferenciado, convém que os canais de comercialização sejam definidos anteriormente à produção, sob a pena de não se obter o prêmio esperado. Não obstante, do ponto de vista da conversão de sistemas convencionais a orgânicos, e considerando a necessidade de escoar a produção, convém ao agricultor consultar seus possíveis compradores sobre a modalidade de certificação requerida. Com essas informações, pode-se organizar desde o começo a produção de modo a atender a essas exigências. Formalmente, a área está convertida quando cumpriu os prazos e as prescrições de produtos e manejo previstos pelas normas. Isso não significa que o sistema e seus produtos estejam perfeitos, apenas os qualifica para o uso do selo orgânico. Se o horizonte do agricultor era a certificação, seu trabalho está concluído. Contudo, se o horizonte é criar sistemas agrícolas sustentáveis, usualmente o trabalho está apenas a meio caminho. Efetivamente, na maioria das propriedades orgânicas, ainda há muito a ser aperfeiçoado em termos de eficiência no uso dos fatores de produção, de preservação do ambiente, da quantidade e qualidade da produção e outros aspectos. Enquanto instrumento pedagógico e diretor da conversão, os aspectos centrais do plano são as representações do sistema atual e do sistema futuro e o cronograma de atividades, com metas setoriais claras. Essa parte do plano precisa ser concisa e clara o suficiente para não deixar dúvidas. O selo orgânico é um selo de qualidade, que visa a garantir que o produto foi cultivado e processado dentro de normas valorizadas pelo consumidor. Para a exportação, é necessário enquadrar-se às normas do país comprador, que podem ser diferentes das locais. Na tentativa de estabelecer parâmetros mínimos a serem atendidos mundialmente, estabeleceram-se normas internacionais, destacando-se as da IFOAM (International Federation of Organic Agriculture Movements) Um período de carência: entre zero e dois anos, dependendo do uso anterior da área, entre a realização da última prática ou produto proibido e a permissão de uso do selo orgânico; Uma listagem de produtos e/ou procedimentos proibidos: que inclui todos os agrotóxicos e os fertilizantes de alta solubilidade, especialmente os nitrogenados; Uma listagem de produtos e/ou procedimentos tolerados: a critério de uma câmara técnica ou similar, da organização certificadora. Atualmente, na maioria das normas em vigor, as caldas à base de cobre e o enxofre estão nessa condição. Um corpo de produtos e/ou procedimentos recomendados: de cuja observância se espera a boa qualidade, a produtividade e a rentabilidade da produção. Aí se enquadram a reciclagem de biomassa e nutrientes, o controle biológico de pragas, a rotação de culturas, a adubação verde, etc. O agricultor pode converter o seu sistema de produção e torná-lo cada vez mais sustentável sem a necessidade de se enquadrar nas normas. Isso permite uma flexibilidade maior, mas fecha as portas do mercado diferenciado e não propicia o contato com a comunidade ligada à produção orgânica. Na prática, a conversão costuma ser mais difícil quando se visa apenas à adequação às normas. Por outro lado, o processo costuma ser mais tranqüilo quando o objetivo é incrementar a robustez interna do sistema, reorganizando sua estrutura e funcionamento segundo princípios biologicamente mais adequados, simulando a natureza. Do ponto de vista biológico, o período de conversão compreende um ajuste fundamental: a reestruturação do manejo da fertilidade do sistema. ◦ o controle de insetos ◦ criação de condições favoráveis à produção vegetal. Aumento da biodiversidade ◦ rotação e diversificação de culturas ◦ criação de nichos de preservação de inimigos naturais. ◦ cercas vivas ◦ reservas de vegetação nativa Nutrição vegetal adequada. ◦ Trofobiose Exige prazo mais Plantas arbóreas em dilatado; quebra-ventos, Pouquíssima cercas vivas, matas arborização ciliares, reservas Nenhum elemento de legais, etc. condicionamento Ciclagem da climático. biomassa no seu Não existe divisão de todo e não apenas à talhões para efeito de fração húmica. manejo das Cobertura morta. condições de clima e Atividade deterrenos Em solo. pouco ou não adubados, com Microbriológica muitos anos de cultivo, costuma ser necessário melhorar seu estoque de nutrientes minerais para acelerar a conversão. Como fonte inicial de fósforo, pode-se utilizar termofosfatos ou fosfatos naturais de boa solubilidade. Um sistema de produção agrícola é uma exteriorização das concepções e técnicas de manejo do ambiente que estão na cabeça do agricultor; À medida que a conversão física do sistema progride, o próprio trabalho vai trazendo novos elementos para a análise do agricultor, criando as condições para a criação de novas concepções na sua cultura agrícola. (1) a mentalidade centrada na aplicação de produtos em oposição ao manejo de processos . (2) a idéia de que a fertilidade está no solo, não se enxergando que ela resulta do manejo do sistema.
Trabalha-se com o conceito de que há uma causa
para cada problema, e lhe corresponde uma solução. Essa solução normalmente é um produto comprado numa garrafa, galão ou saco.
Não obstante, posto que sempre sobram ruídos, a conversão
precisa ser planejada de modo que os envolvidos possam ir assimilando ponto a ponto os novos procedimentos. O método convencional os pesquisadores, baseados nos seus conhecimentos da produção agrícola, desenvolvem uma solução para determinado problema. Essa solução é então comunicada aos extensionistas, que a repassam aos agricultores. Na agricultura ecológica é bem diferente. As soluções mais adequadas são sempre locais, e se visa a alimentar a tomada de decisão do agricultor. O pesquisador pode contribuir para o pensar global, mas apenas o agricultor pode decidir sobre o agir local. Essas mudanças nos papéis e na natureza da tecnologia implicam mudanças nas atitudes e nas responsabilidades dos pesquisadores, extensionistas e agricultores. Em sistemas intensivos no uso de agroquímicos e com rendimentos físicos muito elevados, pode-se esperar uma baixa na produção. Isso porque as técnicas orgânicas trabalham na perspectiva de sustentabilidade, e essa ordem de rendimento não é compatível com a preservação dos meios de produção nem do ambiente. A conversão teve como unidade básica a propriedade, porque ela é o espaço dentro do qual se exerce o comando gerencial do agricultor. A conversão está concluída quando a propriedade assimilou um modo de funcionamento orgânico. Há que se ter em mente que esse não é um ponto final patamar, mas aprimoramentos são sempre possíveis, no sentido de torná-la sempre mais eficiente simultaneamente na produção agrícola, na conservação ambiental e na dimensão sócio- econômica. O conceito de Transição é fundamental.
Segundo o enfoque agroecológico, não se trata
de implementar uma NOVA REVOLUÇÃO.
Não se trata, também, de adotar modelos de
CONVERSÃO (como nos orgânicos).
O que se busca é um PROCESSO DE TRANSIÇÃO,
de construção de tipos / formas de agriculturas mais sustentáveis. Transição agroecológica Processo gradual de mudança, através do tempo, nas formas de manejo dos agroecossistemas, tendo-se como meta a passagem de um modelo agroquímico (ou outro, degradador) à tipos de agriculturas que incorporem princípios, métodos e tecnologias de base ecológica.
Trata-se de um processo contínuo,
multilinear e crescente no tempo, mas sem ter um momento final determinado. Transição agroecológica Implica não somente a busca de maior racionalização produtiva com base nas especificidades biofísicas de cada agroecossistema, mas também uma mudança nas atitudes e valores dos atores sociais em relação ao manejo e conservação dos recursos. Por incluir orientações e princípios de natureza multidimensional, incorpora o conhecimento local, mas não dispensa o progresso técnico e o avanço do conhecimento científico. Rotação de terras; Policultivos; Usos de adubos orgânicos; Conservação de Alimentos (diversas formas); Integração entre produção vegetal e animal; Variedades adaptadas (crioulas); Mercado mais interno; Uso de tração animal; Exploração de madeira. Monocultura; Insumos “modernos” (sementes híbridas, agrotóxicos, adubos químicos); Criação intensiva de animais; Voltada principalmente ao mercado externo; Motomecanização intensiva Níveis da transição agroecológica • Racionalização no uso de insumos: Incremento da eficiência das práticas convencionais para reduzir o consumo de inputs. • Substituição de insumos e práticas convencionais por “alternativas”. • Redesenho de agroecossistemas para que funcionem em base a um novo conjunto de processos ecológicos e sociais.
Gliessman, 2000 Transicão agroecológica
Racionalização
• Aumento da eficiência das práticas
convencionais para reduzir o consumo de insumos. Fonte: Gliessman (2000) Transição agroecológica
Substituição
• Substituição de insumos e práticas
convencionais por insumos e práticas “alternativas”. Fonte: Gliessman (2000) Transição agroecológica
Redesenho
• Redesenho de agroecossistemas para
que funcionem com base em um novo conjunto de processos ecológicos. Fonte: Gliessman (2000) Agroecologia Agricultura (princípios e Agricultura Convencional Sustentável conceitos)