Documente Academic
Documente Profesional
Documente Cultură
Sumário:
Introdução
O objectivo deste capítulo consiste em introduzir os conceitos básicos utilizados na
Teoria do Comércio Internacional para explicar as vantagens e/ou inconvenientes
derivadas dum processo de integração económica assim como as leis que regem a sua
dinâmica. Introduzir-se-ão primeiro os argumentos que associam o comércio livre ao
aumento da prosperidade. Descrevem-se em seguida os obstáculos mais comuns
impostos à referida liberdade comercial e as razões que explicam a sua introdução.
I.1. Argumentos a favor da liberdade comercial
As correntes que defendem a liberdade de comércio internacional resultam do trabalho
dos economistas clássicos Adam Smith (teoria das vantagens absolutas) e David
Ricardo (teoria das vantagens comparativas). Estes autores demonstram que as trocas
comerciais entre países podem ser mutuamente benéficas (um jogo de vantagem mútua)
devido à especialização da produção.
Teoria das vantagens absolutas: Admitindo duas nações, se um país é mais eficiente na
produção dum bem e menos eficiente na produção doutro então esse país deveria
30
Nos USA, em autarcia, 6 unidades de trigo podem ser trocadas por 4 unidades de vinho.
Se, via comércio internacional, mais do 4 unidades de vinho podem ser obtidas com 6
unidades de trigo, torna-se vantajoso para os USA especializar-se na produção de trigo e
importar vinho. De modo análogo, na UE 2 unidades de vinho podem ser trocadas por 1
unidade de trigo. Se mais trigo pudesse ser obtido conviria à UE especializar-se na
produção de vinho e importar trigo.
Admita que, dando-se a abertura das trocas comerciais entre os USA e a EU, é possível
trocar 6 unidades de vinho por 6 unidades de trigo. A UE ganharia com a abertura ao
comércio internacional visto que em autarcia para obter 6 unidades de trigo tinha que
utilizar recursos (horas de trabalho) equivalentes à produção de 12 unidades de vinho
enquanto agora bastam-lhe 6 unidades de vinho (i.e., poupa 3 horas de trabalho). Os
USA também ganham, visto que em autarcia 6 unidades de trigo podiam ser trocadas só
por 4 unidades de vinho e agora podem obter 6 unidades de vinho (poupando 2 unidades
de vinho, ou seja poupando 30 mn de trabalho). Deste modo, com a abertura das trocas
comerciais ambos os espaços económicos obtêm a mesma quantidade de bens utilizando
menos recursos, aumentando deste modo a capacidade de produção em ambos. Em
síntese, a abertura das trocas comerciais permite, via especialização, aumentar a
eficiência produtiva.
O Teorema de Heckscher-Olin: A teoria das vantagens comparativas explica as
vantagens do comércio internacional na base da especialização de cada país de acordo
com as vantagens comparativas, mas não analisa o que determina as vantagens
comparativas em cada país considerado. O teorema de H-O tenta explicar o padrão das
vantagens comparativas entre países, i.e., o que faz um país ter uma vantagem
comparativa na produção de determinado bem. De acordo com esta perspectiva, as
32
trocas comerciais podem ser explicadas pela intensidade relativa de recursos existentes
em cada país. Considerando novamente o caso de dois países (A e B), dois produtos (x e
y) e dois factores (trabalho e capital), o país A é considerado ter uma relativa
abundância num dado factor relativamente ao país B se o rácio do montante total do
respectivo factor (por exemplo trabalho/capital), é superior em A que em B e se o custo
relativo do trabalho relativamente ao capital é menor em A que em B. Se a produção do
bem x requer mais trabalho que capital que a produção do bem y então o produto x é
dito ser trabalho intensivo. De acordo com o teorema de H-O, cada país exportará o bem
cuja produção é intensiva no factor em que o país é relativamente abundante. No caso
analisado o país A especializar-se-ia na produção/especialização do produto x e o país B
especializar-se-ia na produção/especialização do produto y.
Por exemplo, se a China tem uma abundância em mão de obra barata e a produção têxtil
é trabalho-intensiva, a China tenderá a exportar têxtil. Em contraste, se os USA são
abundantes em capital (ou em mão de obra altamente qualificada: capital humano) e os
computadores são intensivos em capital, a China especializar-se-á na indùstria têxtil e
importará computadores, enquanto os USA se especializarão em computadores e
importarão têxteis.
Este teorema tem algumas limitações, em particular: apesar de explicar adequadamente
os padrões comerciais entre países com graus de desenvolvimento muito desiguais
torna-se pouco operacional quando se trata de explicar os fluxos comerciais entre países
com graus de desenvolvimento similares (como é o caso de parte dos membros da UE).
Acrescente-se que o teorema em causa implicitamente pressupõe uma tendência para
uma equalização das remunerações dos factores a nível internacional devido ao aumento
da especialização/trocas comerciais entre países (quanto mais um país se especializada
num bem intensivo num dado factor maior tende a ser a procura desse factor e
consequentemente maior é a tendência para o aumento da remuneração do mesmo).
Comércio Intra-Ramo diferenciação da produção: Uma larga percentagem (70-80% em
muitos casos) do comércio entre países da UE consiste na exportação/importação do
mesmo produto ou grupo de produtos. Por exemplo, a Itália exporta Fiat e importa
BMW da RFA e Renault da França. Este padrão de comércio é designado por comércio
intra-ramo e corresponde a produtos substitutos mas ligeiramente diferentes entre eles.
Este tipo de diferenciação do produto significa que uma firma ou planta se pode
especializar num número limitado de variedades dum dado produto aproveitando
trabalho e máquinas mais especializadas, etc. Outras variedades do produto podem ser
33
Gráf. I.1. Oferta e Procura dum bem num dado país pequeno e potencialmente sujeito ao
comércio internacional
Pd
a c d
b
Pw
D
Qs Q’s Q’d Qd
Com a introdução da tarifa t o preço interno (doméstico) para o produto vai aumentar
para (1+t)Pw, ou Pd no diagrama. Assumindo estarmos perante uma ‘nação pequena’, o
preço mundial vai manter-se igual a Pw. O novo preço interno vai ser Pd. A introdução
da tarifa aduaneira provoca os seguintes efeitos na procura, oferta e comércio externo:
• A quantidade procurada diminui de Qd para Q’d.
• A quantidade oferecida aumenta de Qs para Q’s.
• A quantidade importada cai de (Qd-Qs) para (Q’d-Q’s).
A barreira aduaneira implica adicionalmente os seguintes efeitos ‘financeiros’:
* A despesa dos consumidores no produto muda de Qd . Pw antes da introdução da
tarifa para Q’d . Pd após introdução da tarifa.
* O rendimento do produtor aumenta de Qs Pw antes da introdução da tarifa para Q’s .
Pd após a introdução da tarifa.
* A balança comercial (neste caso o montante pago em importações) melhorará de (Qs-
Qd).Pw para (Q’s – Q’d). Pw.
A introdução da barreira aduaneira redistribui o bem estar entre os três principais grupos
da sociedade: produtores, consumidores e contribuintes. Para se ter uma ideia destes
36
C
A
O Q
F
G
O Q
Px
S Px
interna
P’
P’’ Procura
de
Import.
O
F G Quantida O H Importações
de
Px Px Oferta
SRW Exp.
de X
P’’
DRW
X
O F G O H X
40
O lado esquerdo do gráf.. I.6. representa a oferta de X pelo RW, enquanto o lado direito
da mesma figura combina a procura e oferta de importações de X em H e mostra o
efeito da tarifa T nas importações de H e nas exportações de RW. A tarifa aumenta o
preço do bem X em H de Pft para P’. O preço fronteira (i.e., o preço recebido pelos
agentes do RW cai para P’-T. O volume de importações decresce de Mft (ou Xft de
exportações) para M’ (que é igual a X’).
A perca de bem estar sofrida pelo RW devido á imposição da barreira aduaneira
corresponde ao rectângulo b (devido à diminuição das vendas). O país H obtém um
ganho no bem estar derivado do rendimento da tarifa igual ao valor unitário da tarifa (t)
multiplicado pelo volume das importações (M’), indicado pelos rectângulos m e n. A
perca em excedente privado (i.e., a soma das alterações no excedente do consumidor e
no excedente do produtor) corresponde às áreas f e m. O impacto global da tarifa no
bem estar de H é deste modo a diferença entre as áreas n e f. Em termos do gráf.. I..1.
acima, o triângulo f é igual à soma dos triângulos b e d.
Gráf.I..6. O efeito duma tarifa no país importador (H) e nos países exportadores (RW)
P’
tarifa m
f
Pft
b n
c
P’-T
tarifa
exemplo mais conhecido dum cartel deste tipo é a OPEP (Organização dos países
exportadores de petróleo).
Em Fevereiro de 2004 a OPEC decidiu cortar a produção em 10% de modo a manter
os preços do crude elevados no Verão, quando a procura tende a baixar
substancialmente. A nova quota de produção entre os membros do cartel(em milhões
de barris por dia) passou a estar assim distribuída: Arábia Saudita 7.9, Irão: 3.6,
Venezuela: 2.82, UEA: 2.14, Nigéria: 2.02; Kuwait: 1.97, Líbia: 1.31, Indonésia: 1.27;
Argélia: 0,78 e Qatar: 0.64.
Único pretendeu eliminar este tipo de barreiras entre os EMs da UE e reduzir o seu
impacto nas trocas com países terceiros
A abertura de concursos públicos para fornecimento de bens e prestação de serviços (em
particular na área das obras públicas) tem como principal característica o da falta de
transparência, podendo as autoridades locais, regionais ou nacionais favorecer as
empresas nacionais em detrimento dos concorrentes estrangeiros.
I.3. Críticas aos argumentos que defendem a liberdade comercial como
instrumento de aumento da eficiência na afectação de recursos
Existem algumas reservas à perspectiva neo-liberal no contexto das relações
económicas internacionais. Em seguida apresentam-se as principais:
● O caso das indústrias nascentes: Quando uma indústria é iniciada necessita de tempo
para adquirir massa crítica em termos de experiência e competência (recursos de gestão,
redes de comercialização, capacidade financeira, etc) ou de dimensão para poder
aproveitar as economias de escala. Uma indústria nascente não pode desta forma
competir com uma indústria estrangeira que já está perfeitamente estabelecida no
respectivo mercado. De acordo com este argumento, a nova indústria deveria ser
protegida (e.g., através duma tarifa) até atingir a dimensão suficiente para competir com
as firmas estrangeiras.
Todavia, para este argumento ser válido, a indústria tem que eventualmente conseguir
tornar-se competitiva com as firmas estrangeiras a preços definidos no mercado
mundial. Adicionalmente, os benefícios de consolidação da indústria em causa devem
suplantar os custos de protecção. Além do mais, o risco de se seleccionar uma indústria
que na prática acaba por não se consolidar apesar das medidas proteccionistas tende a
ser elevado.
● O caso da tarifa óptima: O raciocínio para este caso é o seguinte – a introdução duma
tarifa sobre um bem largamente utilizado implica uma diminuição do consumo e
consequentemente originando uma diminuição dos preços internacionais do produto em
causa. De notar, todavia, que este argumento só se aplica para o caso duma grande
nação capaz de influenciar os preços mundiais. O risco da introdução duma tarifa nestas
circunstâncias está na possibilidade de retaliação por parte de outros países.
● O caso das industrias tradicionais: a razão de ser da justificação de proteccionismo
nestes casos prende-se com a necessidade de impedir o aumento do desemprego. O
provável impacto destas medidas todavia é, regra geral, o de adiar o ajustamento,
44
tendendo a tornar mais difícil a necessária transferência de mão de obra dos sectores em
declínio para os sectores mais dinâmicos.
● Crítica dos pressupostos da teoria das vantagens comparativas: A teoria tradicional
que advoga o comércio livre através do princípio das vantagens comparativas é
baseadas num conjunto de hipóteses extremamente restritas no que se refere à estrutura
da economia. Em particular, assume-se que existe uma perfeita competição no mercado
de produtos e de factores quer a nível nacional quer a nível internacional. Todavia as
estruturas de mercado existentes são, regra geral, monopolistas e/ou oligopolistas onde a
concorrência é extremamente imperfeita. Nestas condições, torna-se impossível
verificar à priori se uma tendência no sentido do comércio livre melhorará a situação de
partida em termos de eficiência ou se a introdução de medidas proteccionistas a tornará
pior. Nestas condições só uma análise caso a caso pode definir qual a política mais
apropriada.
● Teoria do Comércio estratégico: Esta perspectiva, ao criticar as hipóteses
simplificadoras da teoria tradicional do comércio internacional inclui a necessidade
duma análise dinâmica do processo de criação de vantagens comparativas em
detrimento da concepção estática clássica. No mundo actual, o desenvolvimento
tecnológico, assim como o aproveitamento de economias de escala estáticas e dinâmicas
desempenham um papel central. Estes fenómenos permitem a uma empresa ganhar
vantagens competitivas independentemente da dotação inicial de factores existentes no
país de que a firma é originária. As implicações deste ponto de vista é o de considerar
que a vantagem comparativa pode ser num certo sentido criada e pode ter uma natureza
temporária.
As prescrições que a teoria em causa propõem consistem em conceder um papel activo à
política comercial do governo e ao proteccionismo. De acordo com esta perspectiva, o
governo pode criar uma vantagem comparativa para firmas em indústrias de alta
tecnologia, através de protecção temporária, subsídios e benefícios fiscais. Estratégias
no sentido de promover o investimento em infraestruturas, capital humano e I&D
podem também desempenhar um papel importante.
Esta estratégia informa, todavia, do problema já indicado para o caso das indústrias
nascentes: como escolher os sectores que virão a ser ‘vencedores’ e como impedir que
os outros países utilizem políticas semelhantes no sentido de contrariar a criação de
vantagens comparativas pelos seus concorrentes.
45
→ Como notas finais sobre a política económica que subscreve o proteccionismo refira-
se que:
1. É verdade que a teoria tradicional é estática e baseia-se na existência duma
estrutura de mercados de concorrência perfeita, o que é totalmente irrealista;
2. Contudo, as propostas de activismo no comércio internacional não conseguiram
até ao momento serem uma alternativa à teoria tradicional;
3. A defesa do proteccionismo depende muitas vezes mais da existência de grupos
de pressão bem organizados que da defesa do interesse geral. È conhecido que a
defesa da protecção comercial para um certo produto (e.g., aço) vai aumentar o
preço doméstico desse produto com vantagem para os produtores domésticos e
desvantagem para os consumidores. Todavia, o benefício para os produtores
pode ser muito elevado (baixo número de operadores) enquanto o custo para os
consumidores tende a ser difuso (elevado número de agentes). Assim, os
produtores tendem a organizar-se em grupo de pressão na defesa de medidas
proteccionistas, suportando os respectivos custos, enquanto os consumidores
tendem a ser passivos. Não é por acaso que, quer nos USA quer na UE, os
sectores altamente protegidos são o aço, a agricultura, os têxteis e o vestuário e a
indústria automóvel.
۩ Conceitos a reter:
♠ Argumentos a favor da liberdade de trocas internacionais.
♠ Teoria das vantagens absolutas.
♠ Teoria das vantagens comparativas.
♠ Renda/excedente do consumidor e renda/excedente do
produtor.
♠ Efeitos da imposição de barreiras aduaneiras nos países
importadores e nos países exportadores.
♠ Classificação dos principais obstáculos ao comércio
internacional.
46