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3º ANO
Aulas
Prof. Doutor José Alberto Coelho Vieira
(2005/2006)
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Índice
Aulas Teóricas..................................................................................................................4
1ª Aula (14/10/05).............................................................................................................4
2ª Aula (21/10/05).............................................................................................................4
3ª Aula (28/10/05).............................................................................................................6
4ª Aula (04/11/05).............................................................................................................8
5ª Aula (11/11/05)...........................................................................................................10
6ª Aula (18/11/05)...........................................................................................................15
7ª Aula (25/11/05)...........................................................................................................16
8ª Aula (02/12/05)...........................................................................................................18
9ª Aula (09/12/05)...........................................................................................................20
10ª Aula (16/12/05).........................................................................................................24
11ª Aula (06/01/06).........................................................................................................24
13ª Aula (13/01/06).........................................................................................................26
14ª Aula (20/01/06).........................................................................................................29
15ª Aula (27/01/06).........................................................................................................33
16ª Aula (03/02/06).........................................................................................................37
17ª Aula (10/02/06).........................................................................................................40
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
AULAS TEÓRICAS
1ª AULA (14/10/05)
Sumário: Apresentação.
2ª AULA (21/10/05)
Sumário: Conceito e objecto de Direitos Reais; Princípios Gerais.
Direitos Reais
Ramo de Direito Objectivo que regula os direitos subjectivos reais que têm por objecto coisas
corpóreas, presentes, móveis ou imóveis.
Ramo de Direito Civil/Direito Privado na medida em que prevalece o critério de igualdade e liberdade
das partes - insere-se no Direito Geral Comum. É também conhecido por Direito das Coisas.
De referir que nem toda a disciplina dos Direitos Reais se encontra no Livro III do CC.
A expressão “Direitos Reais” pode ser empregue com dois sentidos distintos:
(1) na acepção de Ramo de Direito
(2) na acepção de direito subjectivo (ex.: direito de propriedade), utilizada para designar situações
jurídicas reais.
Garantias Reais
São cinco, a saber:
(1) Consignação de rendimentos (art. 656º a 665º CC) Estas garantias
(2) Penhor (art. 666º a 685º CC) encontram-se no Livro II
(3) Hipoteca (art. 686º a 732º CC) (Direito das Obrigações)
(4) Privilégios Creditórios (art. 733º a 753º CC) e não no Livro III
(5) Direito de Retenção (art. 754º a 761º CC) (Direitos Reais)2.
Podemos, pois, concluir que os Direitos Reais têm um estado de desenvolvimento científico inferior
àquele que encontramos nas obrigações. Até porque muitas das soluções normativas que vamos estudar
(a propósito da propriedade, da posse) têm origens que remontam ao Direito Romano e começaram por
ser reguladas por outras áreas do Direito. Isto levou a que o legislador, no CC, optasse por avançar com
a disciplina específica dos Direitos Reais sem ter tido a preocupação de elaborar uma parte geral
(conjunto de regras constantes no início do regime). Assim sendo, essa parte geral não existe no campo
dos Direitos Reais. Tal não significa, contudo, que não possamos encontrar no CC disposições que são,
na verdade, gerais em relação à disciplina dos Direitos Reais.
O direito de propriedade, por exemplo, agrega as disposições básicas de Direitos Reais. A partir daqui
podemos inferir tal regime regra, designadamente: tutela do direito, conteúdo do direito, factos
constitutivos, translativos ou extintivos do direito.
Em suma, na ausência de uma parte geral positivada na lei em matéria de Direitos Reais, existe uma
parte geral criada cientificamente e construída em torno, ou com base no Direito de Propriedade. O
legislador aproveitou a disciplina do direito de propriedade para fundamentar os diversos Direitos
Reais.
Objecto dos Direitos Reais
1
Dentro desta classificação tripartida o CC regula apenas a disciplina dos direitos reais de gozo. (dúvida)
2
A circunstância de estes direitos se encontrarem no Livro II do CC (Livro das Obrigações) não transforma o seu regime num regime
obrigacional.
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Os Direitos Reais sendo um ramo de direito autónomo, regulam um objecto específico, designadamente
as coisas corpóreas,3 móveis ou imóveis e presentes.
Exemplo:
A celebra com B um contrato de compra e venda de um telemóvel, dispensando qualquer registo quanto
à entrega da coisa. Aqui, o direito real é constituído por força de celebração do contrato – este é o
momento em que se constitui ou transmite o direito real.
Nota:
Os Negócios Jurídicos podem ser reais (1) quanto à constituição e (2) quanto aos efeitos.
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No âmbito desta disciplina e no que às coisas diz respeito, importa atender à distinção entre coisas corpóreas (aquelas que se revelam aos
sentidos – ex.: cadeira) e coisas incorpóreas (aquelas que apenas são apreensíveis pelo intelecto humano – ex.: marca, patente, etc.) e entre
coisas presentes (aquelas que têm existência actual) e coisas futuras (aquelas que não têm existência actual ou não estão na disposição do
disponente).
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No âmbito desta matéria o Prof. referiu como indicada a consulta do Vol. III do Manual de Obrigações de Menezes Leitão.
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Entrega (de uma coisa).
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
De referir que o art. 408º/1 CC apenas se reporta aos negócios jurídicos reais quanto aos efeitos; não
se trata aqui de um qualquer contrato mas apenas daqueles (contratos) que desencadeiam a constituição
de efeitos reais no nosso ordenamento jurídico.
Em suma: Um contrato com eficácia real só determina a constituição ou transmissão desse efeito real
aquando do momento da sua celebração (i.e. basta a celebração do contrato!).
As Excepções encontram-se nos arts. 408º/2 e 409º CC.
3ª AULA (28/10/05)
Sumário: Excepções ao Princípio da Consensualidade; Cláusula de reserva da propriedade.
Princípio da Causalidade.
Nos termos do art. 408º CC, o direito real constitui-se ou transmite-se por via da celebração do contrato,
i.e., a nossa ordem jurídica basta-se com a celebração do contrato com eficácia real. A excepção
encontra-se nos artigos 408º/2 e 409º CC.
Excepções:
*
Art. 408º CC (Contratos com eficácia real)
n.º 2) “Se a transferência respeitar a coisa futura ou indeterminada, o direito transfere-se quando a
coisa for adquirida pelo alienante ou determinada com conhecimento de ambas as partes, sem prejuízo
do disposto em matéria de obrigações genéricas e do contrato de empreitada; se, porém, respeitar a
frutos naturais ou a partes componentes ou integrantes, a transferência só se verifica no momento da
colheita ou separação”.
2. Coisa indeterminada
De acordo com o Princípio da Especialidade, uma coisa deve ser certa e determinada uma vez que a lei
exige que haja um acto de determinação.
Quer isto dizer que só quando a escolha for feita, com o conhecimento das partes (quando o vendedor
der conhecimento ao comprador), só quando a prestação for determinada/especificada (ainda que o
contrato respeite a prestação de coisa genérica) é que o direito ganha eficácia real.
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Ver art. 204º CC
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Frutos naturais : o direito de propriedade em relação aos frutos só é adquirido, pelo adquirente, quando
houver colheita. Enquanto aqueles estiverem na árvore continuam a fazer parte do imóvel.
Consequentemente, só quando se dissociarem da árvore é que o direito real sobre aqueles poderá
constituir-se ou transmitir-se.
Partes integrantes: o direito real só poderá constituir-se ou transmitir-se com a separação material.
Em todos estes casos (art. 408º/2 e art. 1212º), os direitos reais não se constituem ou transmitem
aquando do momento da celebração do contrato, mas em momento posterior, isto é, quando a separação
ocorre. O contrato continua a ser constitutivo ou translativo dos efeitos reais só que tais efeitos só se
verificam em momento posterior ao da referida celebração do contrato.
Para o PROF. COELHO VIEIRA, todos estes exemplos são apenas excepções parciais na medida em
que não se reportam à exigência de qualquer outra formalidade. Reportam-se, isso sim, ao momento em
que a celebração ou transmissão do direito real ocorre.
A cláusula de reserva da propriedade assume-se como a cláusula por via da qual as partes estipulam
que o direito de propriedade só se transmitirá para o adquirente mediante o pagamento do preço (total
ou parcial) ou mediante qualquer outro evento estipulado por aquelas (partes).
Esta cláusula tem uma função de garantia e de salvaguarda do vendedor na medida em que a
transmissão do direito real em questão fica suspensa até à verificação do evento ou do cumprimento da
obrigação definidos pelas partes. Em suma, por via desta (cláusula de reserva) impede-se que o direito
real se transmita no momento da celebração do contrato.
Importa salientar que a cláusula de reserva da propriedade é aplicável a qualquer outro direito real, que
não apenas o direito de propriedade, designadamente e a título de exemplo: direito de usufruto (art.
1439º), direito de superfície (art. 1524º) - esta é uma conclusão que se obtém por via de uma
interpretação extensiva do preceito que alude ao direito de propriedade (Ver art. 1305º CC).
Nota:
No que concerne a coisas imóveis ou coisas móveis sujeitas a registo, deve a cláusula de reserva de
propriedade constar de registo. No caso de bens móveis (não sujeitos a registo) a cláusula de reserva da
propriedade vale nos termos definidos pelas partes.
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
No que diz respeito ao momento em que se produz a eficácia real existem posições divergentes:
MENEZES CORDEIRO: sustenta que a eficácia real só se dá quando se verifica a condição a que as
partes subordinaram a realização de um determinado evento.
Para o PROF. COELHO VIEIRA: a verificação do evento, que pode ser o pagamento do preço ou
outro, tem uma certa analogia com o regime da condição. Tal como a condição, que tem eficácia
retroactiva, também a verificação do evento a que as partes subordinaram a eficácia real terá que ser
retroactiva. Ou seja, os efeitos reais produzem-se à data da verificação do evento mas reportam-se à
data da celebração do contrato (por via do efeito retroactivo).
Sustenta que a verdadeira excepção no âmbito da cláusula de reserva da propriedade só existe quando o
evento a que as partes subordinaram a eficácia real não ocorre de todo. Quando não, ou seja, quando se
verifica tal evento, o contrato produz eficácia real no momento da sua celebração mas com eficácia
retroactiva.
No âmbito desta temática, uma das questões que se coloca prende-se com o que sucede ao direito real
se o contrato vier a ser inválido? Ora, nos termos do art. 289º CC, se aquele contrato (inválido) for o
facto constitutivo ou translativo do direito real, este (direito) não opera, não se constitui.
O nosso sistema é, pois, um sistema de causa, i.e., sem causa não há efeito real, sendo que a causa não
existe quando o facto jurídico celebrado não for válido.
Em suma: a aquisição do direito real, pelo adquirente, em Portugal, supõe que o facto jurídico celebrado
seja válido. Quando tal facto é inválido, o direito não se constitui ou transfere.
4ª AULA (04/11/05)
Sumário: Princípio da Tipicidade.
Em suma:
Às partes está vedada a possibilidade de criarem direitos reais inominados. Admitindo a hipótese de as
partes estabelecerem, via contrato, a atribuição de eficácia real a uma determinada figura, tal só será
possível se a referida figura comungar das características do direito real enunciado pelo legislador.
Quando não, tal figura, ainda que estipulada pelas partes, não constitui um direito real. Importa, pois,
reter que toda a estipulação contratual, que não respeite a tipologia dos direitos reais, passará apenas a
ter natureza meramente obrigacional – dá-se a conversão do contrato que deixa de produzir efeitos reais
para passar apenas a produzir efeitos obrigacionais.
Este raciocínio é facilmente perceptível se atendermos ao regime de abertura, consagrado no plano das
obrigações (vide art. 405º CC), por contraposição com o regime dos direitos reais , este, sim, tipificado
e taxativo.
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Em conformidade com o princípio da tipicidade, não significa que todos os direitos reais constem e estejam regulados no Livro III (Livro das
Coisas) do CC. Em suma os direitos reais consagrados no CC não esgotam o leque disponível, sendo possível encontrá-los em legislação
avulsa – ex.: direito real de habitação periódica.
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
OLIVEIRA ASCENSÃO considera que, não obstante o facto de esta tipicidade se prender com
questões de segurança jurídica, ainda assim, tal segurança poderia ser alcançada por outra via que não a
da consagração deste princípio.
Quando na letra da lei se estabelece “não é permitida a constituição, com carácter real, de restrições
ao direito de propriedade ou de figuras parcelares deste direito...” poderíamos ser levados a pensar que
apenas a “constituição de restrições” deveria obedecer ao princípio da tipicidade. Mas não! Quando se
fala de tipicidade estamos a reportar-nos aos direitos reais. A qualificação dos direitos reais, enquanto
tal, é que deve obedecer ao princípio da tipicidade. A lei reservou para si o monopólio da criação dos
direitos reais.
Questão:
A posse será ou não um direito real?
Ver a este propósito o art. 1281º CC (em relação ao 3º de boa fé).
A rouba um relógio a B e vendeu-o posteriormente a C (sendo que C desconhecia o roubo e comprou
de boa-fé). Nestes casos, A, ainda que esbulhado8, não pode solicitar a restituição. Consequentemente,
C vê a sua posição salvaguardada.
Em suma, não é pelo facto de as partes terem atribuído eficácia real a uma figura que essa eficácia
existe. Neste caso, estaríamos perante uma figura inominada. O que o legislador faz é converter esta
relação numa outra onde apenas figura o direito obrigacional entre A e B.
Isto significa que, se o que as partes estipularem, como direito real, não respeitar a tipologia definida na
lei, tal é tomado por esta última como uma modalidade de obrigação (o que resulta da atipicidade das
obrigações – art. 405º CC). De salientar que esta conversão é automática sendo que a inquirição ou
auscultação da vontade das partes não é levada a cabo pelo legislador.
De referir que a posição assumida pelo legislador, no âmbito do art. 1306º CC, difere da adoptada nos
termos do art. 283º CC. OLIVEIRA ASCENSÃO critica esta posição, uma vez que entende não haver
razões para se criar um regime diferente do previsto no art. 283º CC. Na opinião deste, o legislador
deveria ter seguido o mesmo regime em ambos os preceitos.
Nota:
Ainda a propósito desta temática importa referir os direitos mineiros previstos por lei. Esta questão teve
por base a salvaguarda da expectativa, juridicamente fundada, por parte de quem fica com o minério
encontrado. Trata-se de uma figura, que alguns chegaram a avançar como uma categoria de direito real,
que se encontra relacionada com outras como a concessão ou o direito de usufruto. Entende-se, pois,
que a posição de A, enquanto titular do direito de propriedade sobre a mina, difere da posição de B
enquanto titular do direito de propriedade sobre o minério encontrado (na referida mina).
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Esbulhar: privar da posse de...espoliar; Esbulho: privação da posse de uma coisa por meio de fraude ou de violência.
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Considerando esta questão na óptica do direito de usufruto, discute-se se é, ou não, condição e requisito
que o usufrutuário respeite (1) a forma ou substância da coisa (art. 1439º CC) e/ou (2) o destino da
coisa (art. 1446º CC).
OLIVEIRA ASCENSÃO sustenta que a norma do art. 1439º CC é uma norma injuntiva, logo a
proibição aqui inscrita não pode ser afastada pelas partes, enquanto que a norma inscrita no art. 1446º
CC seria uma norma supletiva.
MENEZES CORDEIRO perfilha uma posição contrária. Entende que o preceito inscrito no art. 1439º
CC se assume como uma norma supletiva enquanto que o art. 1446º CC inscreve uma norma injuntiva.
Bibliografia:
OLIVEIRA ASCENSÃO – páginas 69 a 74
MENEZES CORDEIRO – páginas 148 a 152
CARVALHO FERNANDES – páginas 27 a 30
5ª AULA (11/11/05)
Sumário: Princípio de Inerência; Princípio da Absolutidade; Princípio da Transmissibilidade;
Princípio da Publicidade; Organização Registal Portuguesa.
Os direitos reais também não podem incidir sobre coisa futura. O direito real só se constitui e transmite
em relação a coisas com existência actual, i.e., em relação a coisa certa e determinada, individualizada e
concreta. Quando não, não estamos perante um direito real.
Exemplo: Se, na minha loja, tenho 5 televisores SONY e vendo um ao cliente X, qual dos 5 televisores
vendi? O direito real só se constitui e transmite quando se determinar o televisor a vender.
Conclusão: o direito real só pode constituir-se e transmitir-se quando se trata de uma coisa determinada.
A eficácia real depende da determinação da coisa. Ver a este propósito o art. 280º CC.
Há quem sustente que, do Princípio de Inerência, decorre o direito de sequência ou direito de sequela.
A ideia de sequência exprime a oponibilidade que o direito real tem em relação a terceiros que violem
tal direito.
Para o Prof. Coelho Vieira, este direito de sequência não é uma característica autónoma. É, sim, uma
decorrência e uma ideia subjacente ao Princípio de Inerência. Em suma, concorda com a existência
deste princípio mas não com a autonomização desta figura do direito de sequência ou sequela.
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Importa salientar que nem todo o direito real nasce forçosamente de uma relação jurídica. Quer isto
dizer que, se de facto há direitos reais que se constituem no âmbito de uma relação jurídica (ex.: compra
e venda), outros há que não emergem no seio daquela. Consequentemente é válido afirmar-se que o
direito real não é absoluto quanto à sua estrutura.
Por outro lado, quando se refere o princípio da absolutidade não nos estamos aqui a reportar a aspectos
relacionados com a estrutura mas sim com a oponibilidade. Quando se refere que um direito real é
absoluto quanto à oponibilidade, estamos tão só a aludir ao facto e à possibilidade do titular, uma vez
constituído o seu direito real, poder fazer-se valer dele contra qualquer terceiro que o viole. Em suma,
qualquer direito real tem como característica a oponibilidade.
Como vimos, também nos direitos reais de garantia se assegura ao titular, desse direito, a execução de
uma coisa, seja qual for o terceiro que a tenha em seu poder. Ou seja, o direito real não se detém com a
posse da coisa por parte de um terceiro, i.e., vale independentemente do terceiro que a tenha em sua
posse. Podemos, pois, concluir que o princípio da absolutidade está subjacente à disciplina dos direitos
reais. Existem, todavia, excepções a esta regra – vide art. 1281º CC.
Uma outra questão que se coloca neste âmbito prende-se com a prevalência dos direitos reais sobre os
direito de crédito.
OLIVEIRA ASCENSÃO sustenta que esta prevalência é característica do direitos reais. Ex.: num
cenário em que A celebra um contrato de promessa com B (i.e. pretende vender o direito de propriedade
sobre o imóvel X a B) e, posteriormente acaba por vender a C. Quid iuris?
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Confrontado com este cenário, OLIVEIRA ASCENSÃO entende que o proprietário do imóvel seria C
na medida em que A, ao vender a C, impossibilitou o cumprimento da obrigação por parte de B.
Consequentemente o direito de crédito de B extingue-se e A adquire então legitimidade para vender a
C.
Para o PROF. COELHO VIEIRA, considerando o cenário supra mencionado, não há qualquer conflito
de direitos reais. Consequentemente não faz sentido falar-se de prevalência como característica dos
direitos reais. Senão vejamos:
A vende o direito de propriedade sobre o imóvel X a B [arts. 408º/1 e 879º/al a)]. Posteriormente, A
opta por vender tal direito a C. Entende-se, pois, que C não adquiriu qualquer direito na medida em
que, à data, o negócio, celebrado entre este e A, seria nulo [art. 892º] por falta de legitimidade deste
último (A).
Em suma, podemos afirmar que o princípio regra assenta no facto de o direito real poder ser onerado
e susceptível de transmissão.
Excepção feita ao disposto no art. 1488º CC, nos termos do qual, os direitos de uso e habitação,
verdadeiros direitos reais, não são susceptíveis de transmissão.
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(2) Publicidade organizada: corresponde à existência de registo. É utilizada em relação a uma certa
categoria de coisas imóveis [prédios – ver art. 1º Cód. Registo Predial] ou coisas móveis sujeitas a
registo9 e visa, essencialmente, a segurança do comércio jurídico.
Conclusão:
Efeitos da Publicidade
1. Enunciativa
2. Consolidativa (a posse nunca é consolidativa)
3. Constitutiva (ex.: entrega da coisa em penhor)
4. Aquisitiva (quando através da publicidade se chegue à aquisição de direitos)
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Em matéria de Registo Predial, o país encontra-se organizado nos termos de um sistema de base
territorial, ou seja, apresenta-se dividido em áreas territoriais, sendo que a cada uma destas zonas
corresponde uma Conservatória do Registo Predial que agrega o registo de todos os prédios dessa área
territorial (aqui só se registam prédios10).
O objectivo é propiciar o conhecimento da situação jurídica, de cada prédio, a todos os interessados que
consultem os registos (ex.: ver se há alguma situação de hipoteca, usufruto, etc.). O registo assume,
desta feita, no nosso país uma função de publicidade.
O sistema visa, como tal, transmitir confiança aos interessados naquilo que o registo patenteia.
Por via deste (registo), presume-se quem é o titular do direito real – trata-se de uma presunção ilidível
[ver art. 1252º/2 e 1261º CC e art. 7º Cód. Registo Predial].
De referir também que a posse, para além de ter que ser pública [art. 1262º], faz presumir o direito do
possuidor, i.e., afere-se pelo direito mais amplo – o direito de propriedade [art. 1268º].
Em suma: presume-se a posse daquele que exerce o poder de facto [art. 1252º/2], consequentemente
presume-se o direito de propriedade, i.e., presume-se o direito real [art. 1268º]. Importa também referir
que a posse deverá ser pública, isto é, deverá ser conhecida pelos destinatários e leia-se, também, pelos
interessados. Isto significa que tem como limite a causalidade fechada e não a “posse vale título” como
se verifica em outros países.
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Não confundir Registo Predial com Cartório Notarial. Enquanto que o registo é feito na Conservatória do Registo Predial do lugar do prédio,
o acto notarial pode ser realizado em qualquer lugar.
11
In Dicionário Jurídico; Ana Prata, Almedina; pág.896. De referir que a posse vale título nada tem a ver com a figura da usucapião, uma vez
que esta está dependente de um prazo.
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6ª AULA (18/11/05)
Sumário: Conteúdo do Registo Predial; Princípios subjacentes ao Registo: Princípio da Tipicidade.
3.Averbamentos (são alterações que se verificam tanto à descrição como à inscrição – art. 102º Cód.
Registo Predial)
1.1 Averbamentos à descrição (art. 88º Cód. Registo Predial)
1.2 Averbamentos à inscrição (art. 100º Cód. Registo Predial)
1) Actos Definitivos
2)Actos Provisórios:
- registo provisório por dúvidas (art. 70º Cód. Registo Predial) – quando o conservador tiver reservas
em relação ao registo
- inscrições provisórias por natureza (art. 92º Cód. Registo Predial)
Os registos provisórios caducam se não forem convertidos em definitivos ou renovados dentro do prazo
da respectiva vigência (art. 11º/2 Cód. Registo Predial).
Em matéria de registo provisório de aquisição importa atender ao disposto no art. 47º/3 Cód. Registo
Predial.
De considerar, também, o prescrito no art. 92º/2-al. a) Cód. Registo Predial em matéria de registo
provisório das inscrições de penhora12. É, igualmente, de atender às convenções de reserva de
propriedade, também elas sujeitas a registo nos termos do art. 94º/al.a) Cód. Registo Predial.
(1)Princípio da Tipicidade
Como já vimos, a tipicidade é um princípio geral dos direitos reais [art. 1306º]. Tal significa que os
tipos reais são apenas e tão só aqueles que se encontram previstos e estipulados por lei (não sendo
condição que se apresentem inscritos no Livro III do CC). Também no âmbito da matéria em análise
somos confrontados com a tipicidade registal. Significa isto que apenas são registáveis os factos
mencionados no Cód. Registo Predial [art. 2º] e apenas estes. De referir também que nem todos os
factos referidos no artigo em questão constituem direitos reais (vide a posse [al. e], o arrendamento [al.
m] e o ónus [al. s].
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Não confundir penhora com penhor, uma vez que a primeira se afigura como um mecanismo de apreensão dos bens do devedor enquanto
que este último se assume como uma garantia.
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7ª AULA (25/11/05)
Sumário: Princípios subjacentes ao Registo: Princípio da Tipicidade; Princípio da Legalidade;
Princípio da Prioridade; Princípio da Instância; Princípio do Trato sucessivo, Princípio da
Legitimação.
(2)Princípio da Legalidade
Compete ao conservador apreciar a viabilidade do pedido de registo, em face das disposições legais
aplicáveis, dos documentos apresentados e dos registos anteriores, verificando especialmente a
identidade do prédio, a legitimidade dos interessados, a regularidade formal dos títulos e a validade dos
actos dispositivos neles contidos –art. 68º Cód. Registo Predial.
A falta de legalidade dos factos supra referidos pode determinar a recusa do registo – art. 69º Cód.
Registo Predial.
Nos casos em que subsistam dúvidas o registo poderá, então ser provisório (nos termos do art. 70º Cód.
Registo Predial), sendo que esta decisão susceptível de recurso. Esta legalidade de que falamos é
substancial e formal.
Acresce o facto de ao conservador caber o papel de “polícia fiscal” na medida em que, ao verificar o
não cumprimento dos encargos fiscais, poderá e deverá recusar o registo definitivo (ex.. registo de um
imóvel sem que o imposto de sisa, actual IMI, tenha sido pago).
Ainda um outro exemplo: num cenário de compra e venda de um imóvel por escrito particular, o registo,
por razões óbvias [art. 875º CC], será recusado por manifesta nulidade [art. 69º/1-al.d) Cód. Registo
Predial], designadamente por violação de forma [artigos 220º e 286º CC]. E se o contrato fosse
anulável? Deverá o conservador recusar o registo? Neste caso não, uma vez que em matéria de
anulabilidade só têm legitimidade para a arguir as pessoas em cujo interesse a lei estabelece [art. 287º
CC].
(3)Princípio da Prioridade
Nos termos deste princípio e de acordo com o disposto no art. 6º Cód. Registo Predial, prevalece o
registo feito em primeiro lugar desde que os direitos sejam compatíveis entre si. Todavia, se estivermos
perante um cenário em que dois registos, duas inscrições hipotecárias tenham sido realizadas na mesma
data, aqueles concorrem proporcionalmente (concorrem entre si na proporção dos respectivos créditos),
uma vez que o critério “hora do registo” não conta nos termos deste princípio.
Destaca-se neste âmbito o prescrito no n.º 3 do art. 6º Cód. Registo Predial: “O registo convertido em
definitivo conserva a prioridade que tinha como provisório”. De referir que quando os registos
provisórios são convertidos em definitivos, os seus efeitos retroagem ao momento da sua constituição.
Nota: O contrato de promessa só pode ser sujeito a registo se tiver eficácia real.
Exemplo:
Retroage e destrói a CV
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(4)Princípio da Instância
Nos termos deste princípio a regra é as de os registos serem feitos a pedido de uma das partes. Todavia,
casos há em que podem ser realizados oficiosamente. Quem pode pedir o registo? Nos termos do art.
36º Cód. Registo Predial têm legitimidade para pedir o registo os sujeitos, activos ou passivos, da
respectiva relação jurídica e, em geral, todas as pessoas que nele tenham interesse.
Em conformidade com o disposto no art. 39º Cód. Registo Predial, o registo pode ser pedido por
mandatário com procuração, sendo que os advogados e solicitadores não necessitam de tal procuração
uma vez que se entende deterem poderes de representação para intervir no respectivo título.
Não sendo o registo obrigatório, seriamos levados a considerar que aquele constituiria algo de
facultativo. Todavia, esta facultatividade é aparente. Ou seja, estamos, pois, perante uma
obrigatoriedade indirecta, não directa, consequentemente pode dar-se o caso de o registo não patentear
todos os actos jurídicos relativamente a um determinado imóvel.
(6)Princípio da Legitimação
Ver a este propósito o art. 9º Cód. Registo Predial. Trata-se de ma norma que se dirige ao notário e
assume-se como a “guarda avançada” do Princípio do trato sucessivo (sendo este último dirigido ao
conservador).
Efeitos do Registo
1. Efeito Presuntivo: art. 7º Cód. Registo Predial – o registo predial contém a titularidade presuntiva do
direito de propriedade. De referir que o registo não presume nada relativamente à descrição, mas apenas
à inscrição, i.e., a presunção de que o direito existe e de quem é o seu titular.
Importa aqui conjugar o art. 7º Cód. Registo Predial como art. 1268º CC (Presunção da titularidade do
direito), sendo que esta última disposição prevalece, em princípio, sobre a do registo.
2. Efeito Consolidativo: art. 4º/1 Cód. Registo Predial (articulado com o art. 408º/1 CC) e art. 4º/2 Cód.
Registo Predial (articulado com o art. 687º CC - constitutivo).
Nota:
Importa não confundir
» registo com matriz. Esta última é um registo das finanças para efeitos fiscais e não faz presumir a
propriedade do imóvel.
» registo com escritura pública. Esta última é um documento autêntico, realizado pelo notário, que
constitui a forma legal de alguns negócios jurídicos.
17
Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
8ª AULA (02/12/05)
Sumário: Sistema registal português: a questão da obrigatoriedade de registo; a protecção registal
do terceiro: análise do art. 5º do Cód. Registo Predial.
Caso C não tivesse registado, bastaria a B intentar uma acção com vista à declaração de nulidade do
negócio, provando que era o proprietário, sendo que C, que nada tinha adquirido, seria obrigado a
devolver a coisa se ainda a tivesse em sua posse.
Caso B não tivesse registado a seu favor, o conservador não teria como saber que aquele era o novo
proprietário do imóvel X, uma vez que, no registo, constaria o nome de A associado à propriedade do
imóvel em questão. Ora, se considerarmos que o registo corre por iniciativa dos interessados, fácil é de
compreender que C, ao registar, não encontraria, por parte do conservador, qualquer tipo de obstáculo.
Neste caso, o conservador lavraria a inscrição da acção de aquisição de C, passando este a constar como
proprietário no livro de registo. Não estamos, pois, perante qualquer violação do princípio do trato
sucessivo, nos termos do artigo 34º Cód. Registo Predial. O que aqui teríamos, seria tão só uma
desconformidade entre o titular do direito de propriedade na ordem substantiva (B) e o pseudo
adquirente ou o adquirente no âmbito de um negócio nulo que registou (C).
18
Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Quando o registo evidencia uma realidade que não se encontra conforme com a realidade substantiva,
como é o caso, a questão coloca-se ao nível da protecção do terceiro. Importa aqui considerar o
preceituado no art. 5º/1 Cód. Registo Predial, nos termos do qual, “os factos sujeitos a registo
(subentenda-se os enunciados nos artigos 2º e 3º Cód. Registo Predial) só produzem efeitos contra
terceiros depois da data do respectivo registo”. (Cfr. com o art. 5º/3 Cód. Registo Predial).
Nota:
Sobre a figura do “terceiro”, confrontam-se diversas posições. Para MANUEL DE ANDRADE, terceiro
seria aquele que tivesse adquirido um direito incompatível (que no nosso caso seria C). Outros
sustentam que terceiro seria aquele cuja posição jurídica deveria ser arredada caso a sua posição registal
não pudesse ser atendida.
Em suma, o art. 5º do Cód. Registo Predial não protege qualquer terceiro mas sim aquele que adquire de
autor comum um direito incompatível (art. 5º/4 Cód. Registo Predial). Todavia, para que esta protecção
ocorra, não basta que o terceiro tenha adquirido um direito de autor comum. É condição que aquele
esteja de boa fé.
Conclui-se então que o terceiro a que se reporta o art. 5º Cód. Registo Predial é, no entendimento da
doutrina, um terceiro de boa-fé (Cfr. artigos 17º/2 e 122º Cód. Registo Predial e art. 291/3º CC), ou
seja, aquele que, sem culpa, ignorava, sem ter o dever de conhecer, que estava a lesar o direito de
outrém (concepção subjectiva ética de boa-fé).
Por outro lado, e ainda nos termos dos artigos supra referidos, o terceiro protegido é apenas aquele que
adquire o direito em causa a título oneroso. Não estão aqui contemplados os casos de sucessão “mortis
causa”13 ou doação (tidas como duas figuras a título gratuito).
De referir, também, que quando falamos de terceiro protegido, para efeitos do art. 5º Cód. Registo
Predial, estamos a reportar-nos àquele que tem registo a seu favor. Significa isto que sem registo não
há protecção registal. Daí que, na hipótese apresentada (hipótese II), C para invocar a protecção
registal deveria, como é óbvio, ter registado o imóvel a seu favor.
Uma outra condição imposta prende-se com o facto de aquele registo ter sido feito em momento
temporalmente anterior ao registo levado a cabo pelo verdadeiro titular. Ou seja, considerando ainda a
hipótese II, para que C pudesse invocar protecção registal, este deveria ter procedido ao registo do
imóvel em questão antes de B ter promovido, ele próprio, o registo de aquisição. Isto porque, caso B
tivesse: (1) registado a aquisição antes de C ou (2) promovido o registo de uma acção de declaração de
nulidade (a propósito do negócio celebrado entre A e C), C não se encontraria protegido nos termos da
legislação em vigor.
Por fim, é de salientar como condição que o terceiro tenha celebrado o negócio com base na existência
de um registo desconforme com a realidade substantiva. Significa isto que, considerando ainda a
hipótese II, C teria de ter celebrado o negócio com A atendendo ao facto de este último constar, no
registo, como proprietário do imóvel.
Conclusão:
13
Sucessão cuja causa é constituída pela morte do sujeito titular dos direitos em que outrem sucede. In Dicionário Jurídico; Ana Prata;
Almedina, pág. 1147.
19
Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Podemos, então, de uma forma resumida estabelecer 5 requisitos que, cumulativamente, permitem a um
terceiro protecção registal e consequentemente a aquisição tabular do direito nos termos do art. 5º do
Cód. Registo Predial. A saber:
Significa isto que C adquire tabularmente o direito a que se reporta o seu registo (figura da protecção da
boa fé registal a favor de terceiro) em detrimento de B, cujo direito se extingue.
9ª AULA (09/12/05)
Sumário: Sistema registal português - a protecção registal do terceiro: análise do art. 17º do Cód.
Registo Predial e análise do art. 291º/1 do Código Civil.
O art. 17º/2 Cód. Registo Predial versa sobre a protecção do terceiro que adquire com base na pré
existência de um registo nulo (Cfr. art. 16º Cód. Registo Predial – Causas de nulidade).
Nota:
Importa, no âmbito desta temática, atender ao facto de o registo só ser alterado por vontade dos
interessados (Cfr. art. 36º Cód. Registo Predial), daí explicar-se a possibilidade de, muitas vezes, se
verificar uma desconformidade entre a situação substantiva e a situação registal.
Admitindo que C dispõe do seu direito a favor de D, que regista a aquisição (ex.: C vende o imóvel a
D), estabelece a lei que este último fica protegido apesar da nulidade do registo levado a cabo por C
(Cfr. art. 17º Cód. Registo Predial).
14
Aquisição Tabular: é a aquisição que se verifica por efeito do registo. Não sendo, em regra, o registo constitutivo, a aquisição tabular pode
ocorrer por se verificarem, cumulativamente, determinados requisitos. In Dicionário Jurídico, Ana Prata, Almedina, pág. 120.
20
Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
(1) Que o terceiro (D) se encontre de boa-fé, ou seja, que, desculpavelmente, ignore, sem ter o dever de
conhecer, que estava a lesar o direito de outrém;
(2) Que o contrato celebrado pelo terceiro (D) tenha sido feito a título oneroso, i.e., que o terceiro tenha
adquirido o direito em causa a título oneroso;
(3) Que o terceiro (D) tenha, ele próprio promovido o registo da sua posição em momento
temporalmente anterior à interposição de declaração de nulidade do registo realizado por C;
(4) Que este contrato celebrado tenha tido por base um registo nulo (o registo realizado por C, neste
caso), i.e., preexistência de um registo desconforme e consequente acto de disposição baseado nessa
desconformidade.
Podemos, pois, concluir que o art. 17º/2 Cód. Registo Predial só tem aplicação quando estamos perante
a existência:
- de um registo nulo por parte de quem dispõe de um direito a favor de terceiro;
- de um terceiro de boa fé;
- de um contrato oneroso;
- de um registo levado a cabo pelo terceiro antes da existência de declaração de nulidade.
Exemplo:
A vende o direito de propriedade sobre o imóvel X a B, adquirindo este último tal direito no momento
da conclusão do contrato [arts. 408º/1 e 879º/al a)]. Posteriormente, um funcionário notarial forja uma
escritura que vem permitir a C registar a seu favor. Considerando que, mais tarde, C transmite tal
direito a D, este último, verificados o requisitos supra referidos a propósito do art. 17º Cód. Registo
Predial, encontra protecção legal. Ou seja, não obstante a nulidade do negócio, D é protegido em
detrimento de B.
Ainda que, do ponto de vista substantivo, o proprietário seja B, a ordem jurídica entende, ainda assim,
atribuir, por efeito do registo, o direito real a D. A aquisição deste último deriva do registo, vulgo
aquisição tabular.
Importa aqui salientar que há uma estreita ligação entre o registo e o direito adquirido.
Consequentemente, se o registo for de propriedade o direito em questão é de propriedade. Da mesma
forma que se o registo fosse de usufruto, o direito então adquirido (por D) seria de usufruto.
Nota:
Considerando que só pode haver um proprietário singular, a aquisição tabular do direito, por parte de D,
determina a extinção do direito de B. Todavia, importa aqui considerar que, quando se trate de direitos
reais menores, não se determina a extinção do direito de propriedade mas tão só a sua oneração.
Só quando se trata de direitos incompatíveis é que a aquisição tabular do terceiro determina a extinção
do direito real da outra parte. (dúvida)
Quando se diz que o efeito atributivo do registo determina a aquisição do direito a que o registo se
reporta, estamos a reportar-nos a uma aquisição originária do direito em questão. Trata-se de um direito
constituído ex novo, não é um direito que derive de C ou B. [Importante reter!]
21
Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Considerando o disposto no art. 289º CC, “a declaração de nulidade como a anulação do negócio têm
efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie
não for possível, o valor correspondente”. Consequentemente, os efeitos ao reportarem-se ab initio, o
proprietário do imóvel X continua a ser A.
Em suma, se o negócio que A celebrou com B é nulo, este último carece, então, de legitimidade o que
significa que não pode dispor validamente a favor de C (Cfr. 892º CC). Quer isto dizer que, uma vez
que o negócio entre B e C é nulo, o proprietário do imóvel X continua a ser A.
Porém, não é de descurar o facto de C ter celebrado aquele negócio com base num registo a favor de B.
Isto é, C adquiriu levando em linha de conta uma realidade registal desconforme com a realidade
substantiva (e não com base num registo nulo! Daí não se aplicar aqui o art. 17º Cód. Registo Predial15).
Exemplo:
A celebra, em Dez de 2003, um negócio de compra e venda do prédio X com B. Este vende
posteriormente a C o referido imóvel em Dez de 2005. Considerando que entre o período que medeia
Dez de 2003 e Dez de 2005, só decorreram dois anos, C não granjearia de protecção legal, ainda que
tivesse registado a sua posição, caso fosse interposta uma acção de declaração de nulidade em relação
ao negócio celebrado entre A e B.
15
A grande diferença em matéria de aplicação entre o art.17º Cód. Registo Predial e o art. 291º CC, prende-se com o facto de o primeiro
pressupor a existência de um registo nulo ao contrário da segunda disposição que pressupõe a existência de um negócio inválido (nulo ou
anulável).
22
Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Mas se o negócio entre A e B se reportasse a Dez de 2001 e C adquirisse em Dez de 2004, não tendo
durante aquele período intermédio sido interposta qualquer acção de declaração de nulidade, C ficaria
protegido, em relação a A, relativamente ao direito que registou. Admitindo que em 2005 é interposta
uma acção de declaração de nulidade e que o Tribunal vem decretar como nulo o negócio celebrado
entre A e B, tal decisão já não afectaria a posição de C.
Podemos, pois, concluir que a protecção legal de que o terceiro granjeia, nos termos do art. 291º CC só
se verifica quando estivermos perante a existência existência de algumas condições:
(1) Preexistência de um negócio inválido (nulo ou anulável);
(2) Acto de disposição fundada na preexistência de um registo desconforme;
(3) Que o terceiro se encontre de boa-fé, ou seja, que, desculpavelmente, ignore, sem ter o dever de
conhecer, que estava a lesar o direito de outrém;
(4) Que o contrato celebrado pelo terceiro tenha sido feito a título oneroso, i.e., que o terceiro tenha
adquirido o direito em causa a título oneroso;
(5) Que o terceiro tenha, ele próprio promovido o registo da sua posição em momento
temporalmente anterior à interposição de acção de declaração de nulidade do negócio;
(6) Que tenham decorridos três anos desde a data da celebração do negócio jurídico 16 nulo ou
anulável.
Conclusão:
Aplica-se:
- Art. 5º/1 Cód. Registo Predial – quando estamos perante uma hipótese de dupla disposição.
Exemplo: A vende a B e posteriormente vende a C. A B
C
- Art.17º/2 Cód. Registo Predial – quando estamos perante uma hipótese sub-aquisição. Só se aplica
aos casos de nulidade registal, casos em que o terceiro adquire com base num registo nulo. A
protecção do terceiro faz-se com base na existência de um registo nulo e trata-se de uma protecção
registal automática, a contar da data em que o terceiro regista a seu favor.
Exemplo: D é sub-adquirente de C e de A. A B
C D
- Art. 291º Código Civil – quando estamos perante uma situação de invalidade do negócio jurídico
(negócio jurídico inválido: nulo ou anulável). A protecção do terceiro dá-se em situação de
invalidade substantiva e trata-se de uma protecção registal que só ocorre volvidos três anos e desde
que não se tenha verificado registo da declaração de nulidade ou anulabilidade do negócio.
Como podemos constatar, esta necessidade de proteger o terceiro de boa fé, nos termos dos artigos 5º/1
e 17º/2 do Cód. Registo Predial e art. 291º CC, está directamente relacionada com a verificação de uma
desconformidade entre a situação substantiva e a situação registal. Nestes casos, e cumpridos os
requisitos inerentes a cada uma das situações, o titular substantivo vê o seu direito ser afastado em prol
do terceiro de boa fé17.
O efeito aquisitivo do registo predial representa, pois, uma entorse às regras/normas de aquisição do
direito real. Entorse, essa, justificada pelo facto de o registo predial ser uma instituição cuja organização
está a cargo do Estado.
16
A que negócio é que nos estamos a reportar? Ao negócio entre A e B (e não ao negócio entre B e C). Isto é, o prazo começa a contar a partir
do primeiro negócio nulo ou anulável, aquele negócio que afecta a cadeia subsequente de legitimidade.
17
Há apenas uma situação em que o titular do direito na ordem substantiva pode fazer prevalecer o seu direito em relação a um terceiro de boa
fé, a saber: art. 5º/2 Cód. Registo Predial – usucapião. Esta é, em Portugal, a última ratio no que toca a direitos aquisitivos. Quem puder
beneficiar desta figura está liberto do terceiro.
23
Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Relevância da Usucapião
No sistema jurídico real português, a Usucapião releva na medida em que contraria a aquisição tabular,
i.é., a aquisição feita pelo terceiro de boa-fé que, ao registar a seu favor, se vê desta forma protegido em
detrimento do titular na ordem substantiva.
Assim sendo, pode o titular do direito real, contra o qual funcionaria a aquisição tabular, invocar a
Usucapião e obstar, desta forma, à protecção do terceiro. Importa, contudo, referir que o registo da
Usucapião tem um efeito meramente enunciativo, ou seja, traduz uma daquelas situações em que o
Registo Predial não confere publicidade (Cfr. art. 5º/2 Cód. Registo Predial). Em suma, a Usucapião
constitui a última ratio do sistema jurídico português, isto porque permite que, quem dela beneficia,
possa resistir ao efeito atributivo do registo, fazendo com que a aquisição tabular não ocorra.
Nota:
A Usucapião, a mera posse e as servidões prediais aparentes têm um denominador comum que é posse.
Ou seja, nestes casos a existência de posse basta por si só, em termos de publicidade, não sendo, como
tal, necessária a publicidade via registo.
Princípio da Consensualidade
A aquisição tabular ou o efeito aquisitivo do Registo Predial constitui uma excepção ao efeito
consolidativo – efeito que deriva do princípio da consensualidade.
A Posse
No âmbito desta temática importa realçar a destrinça entre dois conceitos que, na terminologia comum,
tendem a utilizar-se como sinónimos mas que juridicamente são em absoluto situações jurídicas
distintas, a saber: direito de propriedade (proprietário) e posse – direito real de gozo (possuidor).
(1) Elemento de Facto: Corpus Possessório; trata-se da relação entre o possuidor e a coisa possuída nos
termos da qual o primeiro tem o domínio (controlo material) sobre a coisa.
(2) Elemento Subjectivo: Animus Possidendi; trata-se da intenção ou vontade de actuar sobre a coisa
nos termos de um direito (que para os latinos era fundamentalmente o direito de propriedade).
A existência destes dois elementos permite diferenciar a posse, enquanto direito, de outras situações
como as de mera detenção, em que alguém tem uma coisa em seu poder sem ser dono daquela. Ex.:
Contrato de arrendamento – o arrendatário, não sendo proprietário, recebe a coisa, tem-na em seu poder
e pode usá-la. Aqui, o arrendatário detém o corpus mas não o animus, daí que estejamos perante uma
situação de mera detenção e não de posse.
Detenção:
- ocorre quando alguém, embora tendo a coisa em seu poder, não tem intenção de actuar sobre ela,
- não é um direito e, como tal, não é tutelada pelo sistema jurídico português – o detentor não é titular
de um direito.
24
Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Posse:
- ocorre quando alguém tem a coisa em seu poder e tem também a intenção de actuar sobre ela como
titular do direito,
- trata-se de um direito e como tal é tutelada pelo sistema jurídico português – o possuidor é titular de
um direito.
O critério de distinção entre estas duas figuras assenta na existência ou não de animus.
No entanto, estas duas figuras diferem, ainda, de uma outra: situação de contacto material com a
coisa (ex.: quando se toca num livro ou se passeia por um jardim- não se é possuidor ou detentor
daqueles, apenas se está em contacto com os mesmos)
Evolução Histórica
Considerando então:
- art.1253º/al. a) CC onde encontramos a expressão: ”possuidor precário” (os que têm o poder de
facto sem intenção de agir, i.é., os que têm o corpus sem terem o animus);
- art.1251º CC onde se atesta que pode haver posse nos termos de outros direitos que não sejam
direitos reais;
- art.1252º CC de onde se infere a presunção de existência de posse naquele que exerce o poder de
facto – o corpus possessório
Houve quem sustentasse que bastaria este poder de facto para se afirmar a posse. Daí dizer-se que em
Portugal se perfilha a Tese Subjectivista da posse.
25
Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
O PROF. COELHO VIEIRA inclina-se, todavia, para a Tese Objectivista. Contrapõe à Tese
Subjectivista os seguintes argumentos:
- A posse do incapaz;
- A posse do recém nascido;
- A posse do interdito.
No entender deste Prof. estes “estados” não são impeditivos da posse. Trata-se de um reflexo de casos
em que não havendo qualquer vontade ou intenção de agir, ainda assim, existe posse. Um outro caso,
também usado como argumento para sustentar a posição supra, prende-se com aquelas situações em que
alguém é possuidor sem o saber (ex.: ).
Considera, ainda, o PROF. COELHO VIEIRA que o art.1253º/al. a) CC é o único preceito em que se
menciona a intenção de agir. Como tal, é seu entendimento que a intenção aqui expressa não releva
como elemento constitutivo da posse mas apenas como elemento que pretende descaracterizar a
situação em causa (expressão que consta no art.) e a relega para um patamar de mera detenção.
Conclusão:
- A lei portuguesa ignora a intenção em todo o clausulado, referindo-se, apenas, a esta no
art.1253º/al. a) CC e apenas para relevar/destacar a intenção como um elemento descaracterizador
da posse.
- Dos artigos 1251º e 1252º CC retira-se que possuidor é quem tem o corpus possessório
(controle material sobre a coisa). O art.1253º CC apenas enuncia disposições legais que
descaracterizam a posse qualificando a situação como de mera detenção. A posse representa, assim,
o controle material sobre a coisa.
O PROF. MENEZES CORDEIRO tem uma concepção mista. Considera que a al.a) do art. 1253º
CC, ao referir a intenção (sendo esta intenção meramente constitutiva), deve ser articulada com as
demais alíneas do artigo [al. b) e al. c)] – daí chegar a uma concepção mista (entre subjectivismo e
objectivismo). O PROF. COELHO VIEIRA não concorda com esta abordagem.
26
Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
al. a) “Os que exercem o poder de facto sem intenção de agir como beneficiários do direito” – ex.: casa
abandonada pelo emigrante que é cuidada pelo vizinho sendo que este último fá-lo sem intenção de agir
como proprietário. A declaração deste afasta a posse.
al. b) “Os que simplesmente se aproveitam da tolerância do titular do direito” – ex.: tolerância do
proprietário da garagem que deixa o vizinho estacionar o seu carro num lugar disponível. O vizinho é
mero detentor.
al. c) “Os representantes ou mandatários do possuidor e, de um modo geral, todos os que possuem em
nome de outrém” – ex.: alguém fica encarregue de vender o carro de outrem. Quem recebe o carro para
esse fim fica na posição de mandatário, pelo que não tem sobre o carro qualquer posse mas mera
detenção. Ou seja, não são possuidores mas detentores aqueles que são mandatários ou representantes
em nome de outrém.
Exemplo (2):
Admitamos, agora, que existe um C que é titular de uma servidão de passagem.
A Prédio X
C será então (1) detentor no que se refere à propriedade (detentor nos
B termos do direito de propriedade) e (2) possuidor no que se refere à
C servidão de passagem (possuidor nos termos da servidão de passagem).
A posse representa a exteriorização de um direito sobre a coisa, sendo
que quem não exterioriza tal direito real sobre a coisa não pode ser tido
como possuidor em relação à mesma.
Quais são os direitos nos termos dos quais se pode exercer a posse?
Art. 1251º CC
“Posse é o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do
direito de propriedade ou de outro direito real”. Por aqui se vê que a posse não está limitada ao direito
de propriedade.
Contudo, questiona-se se poderá ou não existir posse em relação a outros direitos reais para além dos
inscritos no Livro III do CC. Ou seja, poderá haver posse em relação a direitos reais de aquisição e
direitos reais de garantia?
27
Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
a) De usar, em relação à coisa empenhada, das acções destinadas à defesa da posse, ainda que seja
contra o próprio dono”. – Garante a defesa possessória.
Face a estas disposições pergunta-se se, neste caso, não se pode afirmar que há posse relativamente a
estes direitos. O PROF. OLIVEIRA ASCENSÃO inaugurou a doutrina que defende resposta afirmativa
à questão suscitada, sendo esta a posição da Escola de Lisboa.
A Escola de Coimbra, no entanto, só a aceita em casos excepcionais, mercê da concepção subjectivista
destes doutrinadores.
Nota:
Apesar disso, só alguns dos aspectos da posse são aceites na posse relativa aos direitos referidos.
Quererá isto dizer que é possuidor? Para o PROF. COELHO VIEIRA estamos, de facto, perante um
possuidor mas limitado aos aspectos atinentes ao seu direito de crédito. No que concerne ao direito de
propriedade será mero detentor.
Tal como no que concerne aos direitos reais de garantia, também aqui o regime da posse não é
integralmente aplicável. O regime da posse só se aplica integralmente aos direitos reais de gozo. Em
relação aos restantes, penas se lhes é aplicado parte do regime possessório.
Aspectos aplicáveis:
- Presunção da titularidade do direito (art. 1252/2 CC);
- Acções possessórias (art. 1268º CC);
- Direito de indemnização (art. 1254º CC).
Nota:
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
O Corpus representa o controle material sobre a coisa. Todavia, tal não supõe o contacto físico e
permanente com a coisa. Exemplo: eu posso ter uma casa em Guimarães e ainda assim ser possuidora
da mesma, na medida em que não é condição de existência de posse que eu resida na casa a título
permanente. É requisito da posse, isso sim, que eu tenha controle material sobre a coisa. Tanto assim é
que, se a casa for ocupada por outrem, será essa pessoa quem passará a exercer tal controle.
Posse Causal: a posse existe tanto quanto o direito, a que se refere, é da titularidade do possuidor.
Quando o possuidor é simultaneamente titular e possuidor.
Posse Formal: esta assenta no controle material sobre a coisa independentemente de o possuidor ter ou
não a titularidade do direito. Exemplo: posse pelo ladrão da coisa.
Posse Titulada: a posse diz-se titulada quando se refere a um facto jurídico idóneo. Este facto jurídico
pode ser substancialmente nulo ou anulável que nem assim deixa de haver posse. A lei abstrai-se da
validade substancial do negócio jurídico (art. 1259º CC). Ex.: uma posse adquirida nos termos de um
contrato de doação nulo. A posse é formal e, não obstante a nulidade do negócio, é também titulada.
Cfr.: art. 1254º/2 CC, art. 1260º/2 CC – situações de presunção de posse (o 1º preceito reporta-se à
posse titulada e o 2º à posse não titulada). Ver também art. 1278º/3 CC.
Posse não Titulada: quando a posse se refere a um facto jurídico não idóneo.
Posse de boa-fé: a posse diz-se de boa-fé quando o possuidor ignorava, ao adquiri-la, que lesava o
direito de outrem. O PROF. COELHO VIEIRA é apologista de uma concepção psicológica, de uma
concepção subjectiva ética de boa-fé nos termos da qual é necessário que tal desconhecimento seja
desculpável. (art. 1260º CC).
Posse de má-fé: a posse diz-se de má-fé quando o possuidor conhecia, ao adquiri-la, que lesava o direito
de outrem.
Nota:
A distinção entre posse de boa ou má-fé tem numerosas aplicações. Veja-se, a título de exemplo:
- O regime dos frutos (art. 1270º e art. 1271º CC);
- O regime das benfeitorias (art. 1273º e art. 1275º CC);
- O regime da Usucapião (em que os prazos estabelecidos são menores num cenário de boa-fé).
Posse Pacífica: a posse é pacífica quando adquirida sem violência (art. 1261º CC).
Posse Violenta: a posse considera-se violenta quando, para obtê-la, o possuidor usou de coacção física
ou coacção moral (psicológica) em relação ao anterior possuidor.
Nota:
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
- Uma das questões que se coloca neste âmbito é a de se saber se estamos a falar de violência
exercida sobre o possuidor ou se também daquela que é exercida em relação à coisa objecto da
posse? No entendimento do PROF. COELHO VIEIRA, apenas faz sentido falar de violência
exercida sobre a pessoa do possuidor e não sobre a coisa objecto de posse, mesmo que se usem
meios violentos para aceder à posse da coisa.
- Importa, também, salientar que nos termos do regime da usucapião, esta forma de aquisição é
afastada quando a posse for violenta – cfr. art. 1297º e art. 1300º CC.
- Art. 1267º/1-al.d) CC – O antigo possuidor perde a sua posse, pela posse de outrem, mesmo
contra a vontade do 1º (possuidor primário) se a posse do actual possuidor houver durado mais de
um ano. Todavia, tal prazo não corre enquanto a posse for oculta ou a violência não cessar. (art.
1267º/2 CC).
De referir que:
- Uma posse adquirida com violência é violenta para sempre, ainda que depois seja mantida
pacificamente.
- Uma posse adquirida pacificamente é pacífica para sempre, ainda que depois seja mantida
com violência.
Posse Pública: a posse pública é a que se exerce de modo a poder ser conhecida pelos interessados. (art.
1262º CC). A lei não exige o conhecimento efectivo, apenas exige a mera possibilidade de
conhecimento. Ex.: admitindo que um emigrante tinha um terreno em Guimarães onde se instalaram
umas pessoas. O facto de o emigrante não conhecer tal facto, não releva. O que conta, para efeitos de
caracterização da posse, é saber se aquele tinha ou não a possibilidade de conhecer, o que parece ser o
caso na medida em que podia saber do estado do seu terreno deslocando-se a Guimarães ou procurando
contactar pessoas da localidade (familiares, vizinhos) que lhe prestassem informação no que concerne
ao estado da propriedade.
Posse Oculta: a posse é oculta quando não pode ser conhecida pelo interessado. Ex.: se me roubarem a
carteira, eu não tenho a possibilidade de conhecer que a possui. A posse oculta trata-se de verdadeira
posse, i.é., tem todos os ingredientes da posse pública, excepto em duas situações: (1) usucapião [art.
1297º e art. 1300º CC] e (2) Art. 1267º/1-al.d) CC – nos termos do qual o prazo não corre enquanto a
posse não se tornar pública. Isto porque, só a posse pública permite a defesa por parte do possuidor
esbulhado. Este só poderá defender-se quando conhecer quem tem a coisa. Consequentemente,
enquanto a posse se mantiver oculta o prazo não corre.
RESUMO:
Caracteres da posse:
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
No âmbito destes podemos distinguir: (1) Factos Constitutivos da Posse e (2) Factos Translativos da
Posse.
(1) Factos Constitutivos da Posse (são aqueles que determinam a constituição originária da posse).
Nos termos do art. 1263º CC estamos perante 2 factos aquisitivos:
(1.1) Apossamento
Traduz situações em que alguém apreende materialmente a coisa tomando o controlo dela contra ou
sem a vontade do anterior possuidor. Respeita a coisas móveis ou imóveis e não tem necessariamente a
classificação de acto ilícito. O apossamento determina a aquisição da posse independentemente de tal se
concretizar ou não com violação do direito de propriedade. Aqui não se contempla a licitude de tal
aquisição, i.é., o apossamento não depende de uma valoração do acto como lícito ou ilícito. Traduz-se,
essencialmente, no controlo/domínio material da coisa. De referir também que o apossamento é uma
forma específica de aquisição da posse independentemente do direito a que essa posse se reporta.
Uma segunda modalidade de inversão do título da posse prende-se com um acto, por parte de um
terceiro, capaz de transmitir o direito a que a posse se reporta. (dúvida).
Exemplo:
A, proprietário do Prédio X, cede a B o direito de usufruto do mesmo (B- detentor – art. 1253º/al. c)
CC). Posteriormente, B celebra com C um contrato de compra e venda, passando B, desta feita, a actuar
sobre a coisa nos termos do direito de propriedade.
Quando B celebra com C um contrato válido (contrato de compra e venda, doação, etc.) dá-se, por via
da inversão do título da posse, a aquisição da posse por parte de um terceiro (neste caso C que é terceiro
em relação a A). – dúvida.
Em suma, a inversão do título da posse é um facto aquisitivo da posse e não do direito a que a posse se
reporta.
Nota:
Quer o apossamento quer a inversão do título da posse, enquanto factos constitutivos da posse,
constituem factos constitutivos de aquisição originária de posse. Ou seja, quando aqueles ocorrem o
resultado é uma posse nova, originária comparativamente ou por relação com as posses anteriores (no
âmbito das quais nunca tinha havido apossamento ou inversão do título da posse).
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Detentor: alguém que tem a coisa em seu poder e passa a actuar sobre esta (coisa) nos termos de um direito que entretanto não tinha.
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(2.1) Tradição
A tradição de uma coisa é a sua entrega, através da qual se transmite a respectiva posse. (Art. 1263º/al.
b CC). A tradição pode ser: material ou simbólica.
Tradição material: situação em que se efectiva a entrega da própria coisa objecto da tradição (ex.:
compra de um livro).
Tradição simbólica: situação em que se verifica a entrega de uma coisa diferente que representa o
controle material sobre a coisa em questão (ex.: entrega das chaves de um imóvel ou veículo).
No âmbito desta temática importa ainda considerar a distinção entre “traditio brevi manu” (tradição por
mão breve) e “traditio longa manu”, a saber:
Traditio brevi manu: forma de aquisição derivada da posse que se consubstancia na conversão da
detenção em posse, por acordo entre o detentor e o possuidor. Assim sucede, por exemplo, se o
proprietário de um prédio arrendado o vende ao arrendatário. Encontrando-se a tradição material já
realizada, em virtude de um negócio anterior, o detentor transforma-se em possuidor por acordo com
aquele que era o antigo possuidor. Esta modalidade, apesar de não constar de forma explícita no art.
1263º CC, deve considerar-se implícita na al. b) do referido artigo.
Traditio longa manu: expressão latina que a doutrina usa para designar a tradição da coisa, apta a
transmitir a sua posse, realizada à distância, por acto significativo da vontade de transferir a posse do
anterior possuidor para outrem.
Exemplo (2):
A celebra com B um contrato de compra e venda do prédio X. Contudo, A, antes de vender o imóvel a
B, celebra com C um contrato de arrendamento. Quid iuris? B adquiriu a posse ainda que o
arrendamento se mantenha. A venda não tolhe a locação. (Art. 1047º CC).
No que concerne à temática alusiva aos factos translativos da posse, somos levados a concluir que, no
nosso ordenamento jurídico, a transmissão da posse por via da Tradição constitui a regra.
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
(3) Abandono
Art. 1267º/al. a) CC – Neste âmbito importa distinguir abandono de renúncia. Sendo a renúncia tida,
usualmente, como um facto extintivo, importa perceber porque é que o legislador português fala aqui
em abandono e não em renúncia. Tal prende-se essencialmente com a figura do corpus possessório. Ou
seja, para que haja renúncia da posse tem de existir:
(a) uma declaração nesse sentido por parte do titular do direito
(b) o desaparecimento do corpus possessório (perda de controlo material sobre a coisa)
Exemplo: quando se abandona um carro numa determinada rua, não estamos efectivamente
perante uma verdadeira situação de abandono. Isto porque a posse só se quebra quando o sujeito
deixa de poder actuar sobre a coisa (Art. 1257º/1 CC). Ora, neste caso, o indivíduo que
abandona o carro pode, em caso de arrependimento, recuperar a viatura.
Uma verdadeira situação de abandono dá-se quando um indivíduo, por ex., atira o relógio pela janela de
um combóio em andamento. Em suma, há abandono quando o possuidor renúncia à posse perdendo
efectivamente o controle material da coisa.
(4) Cedência
Art. 1267º/al. c) CC – A perda da posse dá-se, igualmente, por cedência. Ex.: aquando da entrega da
coisa por parte do doador/vendedor ao donatário/comprador, extingue-se a posse por parte do primeiro.
Isto é, a entrega da coisa implica a demissão do corpus possessório e consequentemente a posse não é
transmitida. Aqui, o transmitente perde a posse enquanto que o adquirente adquire uma posse ex novo.
Ou seja, não estamos perante qualquer transmissão, sendo que o que releva em matéria de extinção de
posse é precisamente a posição do transmitente.
Todavia, nem todos os casos de cedência implicam a perda da posse. Se estivermos no âmbito de um
direito real menor ou quaisquer outros (?) que pressuponham a entrega da coisa, nos termos do art.
1267º/al.c) CC, não é a cedência que determina a extinção da posse. (dúvida)
A cedência apenas determina a extinção da posse quando o corpus é definitivamente quebrado. Implica,
pois, a entrega da coisa (tradição).
(5) Qualquer facto jurídico que importe a constituição de uma nova posse a favor de alguém contra a
vontade do antigo possuidor (se a nova posse ase tiver prolongado por mais de um ano).
Ex.: Situações de esbulho pouco definido: (a) Apossamento e (b) Inversão do Título da Posse.
A lei concede o período de1 ano para permitir que o possuidor esbulhado possa defender a sua posse
(Cfr. art. 1282º CC). Durante esse ano subsiste a posse do esbulhado (desde que reunidos os requisitos
do art. 1267º/2 CC) mesmo que desacompanhada do corpus (controle material sobre a coisa). Findo
esse período o possuidor esbulhado ficará privado da sua posse.
Importa, contudo, deixar bem claro que, durante esse período de um ano, a posse do esbulhador e do
esbulhado coexistem. Admitindo o cenário de que o esbulhador possa transmitir a sua posse a um
terceiro, ainda assim, a posse deste ultimo coexiste com a do esbulhado durante esse ano.
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Findo esse ano, determina o art. 1267º/1 – al. d) CC, que a posse se extingue. Contudo, não se extingue
o direito a que a posse se reporta. Exemplo: num cenário em que é furtada uma viatura, decorrido o
período de um ano, o esbulhado perde a posse mas não perde o direito a que a posse se reportava (ex.:
direito de propriedade). Ainda assim, em situações de esbulho violento ou oculto (art. 1267º/2 CC), este
prazo de um ano não corre. Neste contexto, o esbulhado só poderá actuar desde que:
(a) a violência cesse – no caso de esbulho violento;
(b) a posse do esbulhador ou 3º (antes oculta) se torne pública – no caso de esbulho oculto.
Só, então, decorrerá o prazo de um ano que o esbulhado tem ao seu dispor para defender a sua posse.
Transmissão da Posse
O direito passa de uma esfera jurídica para outra por via do facto translativo. Passa da esfera do
transmitente para a do transmissário.
Sucessão na Posse
Art. 1255º CC
No âmbito desta, a situação jurídica mantém-se estática e é o sujeito que entra na respectiva
titularidade, i.é., há um movimento de substituição de pessoas. Os sucessores do De Cujus são
investidos na posse independentemente de saberem que são sucessores ou que a coisa existe. A posse
dos sucessores é exactamente a mesma que a do De Cujus (os caracteres da posse são os mesmos que
existiam na esfera jurídica do de Cujus, sem que haja incidência de um título translativo – não há
passagem de um sujeito para outro). Daí que quando se dá a morte de alguém e se apuram quais os
sucessores não seja necessário aferir os caracteres da posse (se de boa ou má fé, se pública ou oculta,
por ex.) destes na medida em que estes são iguais aos da posse do De Cujus.
Efeitos da Posse
Arts. 1268º a 1275º CC
Nota:
A presunção inscrita no art. 1268º/1 CC, conjuntamente com a inscrita no art. 7º do Cód. Registo
Predial, são as únicas presunções que o legislador consagra em matéria de Direitos Reais. Num cenário
de conflito de presunções, o legislador determina que prevalece a mais antiga (art. 1268º/2 CC), i.é. a
presunção que prevalece é a respeitante ao facto mais antigo.
(2) Considerando que a posse é um direito facilmente se percebe que possa ser violado. A violação da
posse determina, para o autor da violação, que este incorra em responsabilidade civil. Contudo, o
legislador limita a responsabilidade do possuidor de boa-fé em caso de deterioração – cfr. art. 1269º CC
– Responsabilidade Civil Objectiva.
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Presunção: ilação que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido (cfr. art. 1826º/1 CC – Presunção de
Paternidade).
Presunção ilidível ou “Juris Tantum”: presunção legal que a própria lei permite postergar/abandonar mediante prova de que o facto presumido
não é verdadeiro. Ex.: a presunção de paternidade é ilidível, na medida em que os artigos 1839º e 1846º CC permitem a certas pessoas [ex.: ao
filho] intentar uma acção de impugnação da paternidade por forma a conseguirem provar que o presumido pai (o marido da mãe) não é, afinal,
o verdadeiro pai e destruírem, assim, aquela presunção. Em suma, trata-se de uma presunção relativa, refutável, que admite prova em
contrário.
Presunção inilidível ou “ Juris et de Jure”: presunção legal que a lei não permite postergar em caso nenhum nem mesmo provando-se que o
facto presumido não é verdadeiro. Trata-se, em suma, de uma presunção absoluta, irrefutável, que não admite prova em contrário.
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Conclusão
(1) Posse = Presunção de titularidade do direito a que a posse se reporta;
(2) O possuidor tem o direito de ser indemnizado em caso de violação do seu direito de posse;
(3) O possuidor de boa-fé tem o direito aos frutos até ao momento em que souber ou puder saber que
está a lesar outro;
(4) Benfeitorias.
Defesa da Posse
Arts. 1276º a 1286º CC
Neste âmbito, importa distinguir:
(1) Acções Possessórias – acções de tutela da posse e só da posse.
(2) Acções de defesa dos Direitos Reais – ex.: acção de reivindicação (art. 1311º e art. 1315º CC)
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Por frutos entende-se aqui os frutos naturais e civis.
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Nota:
Poder-se-ía pensar que, perante o facto de a posse se manter pelo período de um ano, caberia ao
possuidor desapossado interpor apenas uma acção de manutenção da posse, mas não. Ainda que a sua
posse se mantenha por um ano, o possuidor desapossado pode e deve reagir por via de uma Acção de
Restituição da Posse.
Isto porque no âmbito de uma:
(1) Acção de Manutenção da Posse houve uma tentativa, não consumada, de esbulho.
(2) Acção de Restituição da Posse o possuidor já foi esbulhado.
Quer no âmbito de uma Acção de Manutenção ou de uma Acção de Restituição da posse, o possuidor
tem uma ano para as interpor (art. 1282º CC e cfr. também art. 1267º/al.d ) CC).
Legitimidade Processual (art. 1281º CC): esta legitimidade, no âmbito de uma acção de manutenção ou
de restituição, é dada pela qualidade de possuidor (perturbado ou esbulhado) ou de sucessor do
possuidor.
Numa situação em que o esbulhador já não tem a posse uma vez que a transmitiu a terceiro, como
proceder? Ora se o esbulhador já não tem a posse, não fará qualquer sentido interpor uma Acção de
Restituição da Posse contra este. Esta acção deverá, sim, ser intentada contra quem tem a coisa em seu
poder, i.é., contra o terceiro. Quanto ao esbulhador, o possuidor apenas poderá intentar uma acção de
indemnização, e só esta!
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Conclusão:
Ao contrário de outros Direitos Reais, a posse não tem uma oponibilidade absoluta (situação diferente
do princípio da posse vale título). Significa, isto, que na ordem jurídica portuguesa o adquirente de
boa-fé não adquire por via da boa-fé.
Esta acção apresenta duas finalidades: (1) acção de defesa da própria posse e (2) devolução da coisa ao
esbulhado e tem por fundamento a violação da posse e só desta.! Esta acção possessória é interposta
contra quem efectivamente tem a coisa em seu poder, a saber: (1) esbulhador ou (2) terceiro (desde que
de má-fé).
Exemplo (1):
A furta o carro de B e vende-o, posteriormente, a C.
A – esbulhador (autor do furto)
B – esbulhado
C – terceiro (que é possuidor)
Se B quiser recuperar a coisa (o carro), não vai intentar a acção de restituição contra A, mas contra C (o
terceiro). Todavia, a interposição desta acção contra C só seria possível se este fosse um terceiro de
má-fé. Isto porque, num cenário em que C, tendo a posse da coisa por entrega (tradição), desconhecesse
o esbulho e, consequentemente, ignorasse que estaria a lesar o direito de outrem, a interposição de uma
acção de restituição já não seria possível, isto porque, nos termos do art. 1281º/2 CC, não se pode fazer
valer a posse contra o terceiro de boa-fé.
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Conclusão:
A Acção de Restituição da Posse é uma acção de defesa da posse em que o autor invoca como
fundamento a sua qualidade de possuidor, nos termos de um direito real, e tem por finalidade a
devolução/entrega da coisa.
Exemplo (2)
A furta o carro de B.
Pode, todavia, dar-se o caso de A (esbulhador) invocar a sua qualidade de possuidor, na medida em que
detém o controle material sobre a coisa. Ou seja, A poderá vir dizer que não devolve a coisa na medida
em que, também ele, é possuidor. Neste caso coexistem duas posses (a de A e a de B). Quid Iuris?
Este é um cenário que recai no âmbito do que se designa por conflito de posses.
Exemplo:
A furta o carro de B.
Quando B interpõe uma acção de restituição contra A terá de se confrontar a posse de ambos. Como tal:
- Se a posse de B for titulada, A deverá restituir a coisa a B [critério da melhor posse];
- Se a posse de B não for titulada, deve, ainda assim, atender-se ao critério da antiguidade.
Consequentemente, A teria de restituir a coisa a B, na medida em que a posse deste último seria a
mais antiga.
E se o réu, na acção, invocar o direito tutelar sobre a coisa? Se o esbulhador, quando demandado pelo
esbulhado, invocar excepção de propriedade?
No âmbito do sistema jurídico português, o réu pode invocar a titularidade da posse, de um outro direito
real ou, ainda, de qualquer outro direito que justifique que tenha a coisa em seu poder.
Contudo, se o réu invocar tal excepção de propriedade mas não provar a titularidade do direito, então, o
possuidor esbulhado será restituído (art. 1278º CC).
Considerando, todavia, que o réu consegue provar a titularidade do seu direito de propriedade, teríamos,
então, um conflito entre posse do autor e direito real do réu.
Se é certo que, nos termos do art. 1278º/2 CC se supõe que o direito real do réu não é provado no
âmbito de uma acção possessória, pode, todavia, dar-se o caso de, no âmbito desta acção de restituição,
para além da posse se discutir também o direito real invocado pelo réu. Ou seja, sendo certo que uma
acção possessória se encontra estreitamente relacionada com a defesa da posse, nada impede, todavia, o
réu de na acção, em concreto na contestação, invocar uma excepção de propriedade e, desta feita,
discutir-se o direito real invocado (direito de propriedade). Consequentemente, discutir-se-á, por
iniciativa do réu, numa acção possessória, o direito real invocado. Aí o réu ou prova que tal direito lhe
assiste ou não prova. Não provando, apenas se aprecia e discute a matéria atinente à posse.
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Susana Pedro Direitos Reais - 3º Ano FDL
Admitindo o cenário em que (1) o autor prova a posse e (2) o réu prova o direito real [direito de
propriedade]. Quid Iuris? Qual prevalece?
A posse formal cede sempre perante um direito real. Como tal, a acção é improcedente na medida
em que prevalece aqui o direito real. Isto é, quando a posse formal entra em conflito com o direito real,
prevalece este último. Consequentemente, o possuidor formal terá de se contentar com o desfecho da
acção em que se reconhece a titularidade do direito real do réu, que não terá assim que devolver a coisa
ao autor.
Conclusão:
A Acção Possessória de Restituição pode ter apenas como objectivo a apreciação das posses em
presença. Contudo, se o réu invocar a excepção do direito real, teremos um de dois cenários:
(1) O réu não prova o seu direito – aplica-se o disposto no art. 1278º/2 e 3 CC;
(2) O réu prova o seu direito – prevalece sempre a sua posição contra a do mero possuidor.
Ou seja, apesar de estarmos no âmbito de uma acção possessória de restituição, se o réu invocar a
excepção de propriedade, discutir-se-á, então, a titularidade do direito real.
Já o PROF. COELHO VIEIRA considera que o problema da natureza da posse se encontra relacionado
com o facto de esta ser um direito subjectivo.
No ordenamento jurídico português, a posse, por ex., releva em matéria de sucessão (art. 1255º CC),
transmite-se por mero efeito do contrato (art. 1254º CC) e subsiste um ano após a consumação do
esbulho (art. 1267/al. d) CC). Significa isto que o direito português trata a posse como uma situação
jurídica, como um direito subjectivo.
Sendo um direito, discute-se se é, ou não, um direito real, considerando a sua fraca oponibilidade
perante os demais direitos reais. De qualquer forma, importa aqui recordar que já analisamos situações
em que o direito real perde a sua oponibilidade (vide aquisição tabular). Consequentemente, entende o
PROF. COELHO VIEIRA que o facto de a posse apresentar, em determinadas situações21, uma
oponibilidade fraca tal não representa, por si só, que aquela não seja um direito real. Conclui o PROF.
COELHO VIEIRA que, de uma forma geral, os Direitos Reais não são absolutos na medida em que há
situações em que se evidencia uma restrição a tal princípio de absolutidade. Como tal, não se justifica,
então, uma distorção da natureza jurídica da posse.
Em suma, a posse não é apenas um direito subjectivo, mas um direito subjectivo real (não obstante o
facto de em determinadas circunstâncias apresentar uma oponibilidade menor). De qualquer forma é
entendimento do PROF. que os direitos reais não são inteiramente absolutos.
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Vide a fraca oponibilidade da posse, no confronto com outros direitos reais ou perante o terceiro de boa-fé.
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Composse
Art. 1286º CC – Qualquer direito real pode ser, simultaneamente encabeçado por mais do que uma
pessoa. A posse não é excepção. A compropriedade (ex.: quando duas pessoas compram um livro) é
exercida, em termos normais, pela composse.
Ao compossuidor (que em rigor mais não é do que um possuidor), aplica-se-lhe o mesmo regime do
possuidor (art. 1286º/3 CC). Excepção feita àquelas situações em que um dos compossuidores tenta
perturbar ou esbulhar os demais. Importa referir que, nestes casos, a acção possessória de manutenção
não será possível (Cfr. art. 1286º/2 CC).
Usucapião
Arts. 1287º a 1301º CC
A usucapião é tratada pelo CC como um efeito/modalidade de aquisição derivada da posse. Esta
(usucapião) representa a mais importante forma de aquisição de um direito real na ordem jurídica
portuguesa (trata-se, em termos simplistas, de um modo de aquisição pela posse).
De referi que a aquisição tabular não funciona contra a usucapião. Esta última representa um facto
aquisitivo do direito real “posse”, sendo que a posse consubstancia, ainda, um modo de aquisição de
direitos reais de gozo quando conformada com a usucapião (?).
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