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Cosmologia e metafísica
Jean-Michel Maldamé
Este texto é o cap. 3 de Jean-Michel Maldamé, Cristo para o universo: fé cristã e cosmologia
moderna. São Paulo: Ed. Paulinas.
Do como ao porquê
A apresentação da gênese do universo, pela introdução progressiva dos elemen-
tos que o constituem, coloca questões de outra ordem, quando não nos contenta-
mos com a questão de como se produz o processo de transformação da energia,
mas quando nos colocamos a questão do porquê da existência do universo. Eis
é uma questão nova. Ela se coloca a partir de um ponto de vista diferente do das
ciências.
1. As ciências estudam um processo de transformação. O termo deve ser enten-
dido no sentido literal: uma transformação é uma passagem de uma forma a outra.
No decorrer de um processo, um dado passa de um estado a outro. A nova forma
utiliza diferentemente o que era dado, segundo uma forma anterior. Semelhantes
transformações dizem respeito à leis da conservação da energia e às outras leis da
física que foram verificadas por outro motivo.
A reflexão filosófica não se contenta com uma análise da transformação. Ela se
interroga sobre o porquê da existência daquilo que é observado. O espírito huma-
Conclusão
A teologia cristã não procura Deus no vazio do tempo que teria precedido o tempo.
Ela procura Deus no presente. Somente este é real. O passado não existe mais e o futu-
ro ainda não existe. No presente, a inteligência de quem crê procura a marca da ação
de Deus e reconhece com deslumbramento que tudo é dom de Deus.
O fiel vive na consciência desse presente; não busca narrar a história do pas-
sado; constata o presente. Para melhor compreendê-lo, reflete sobre o que foi na
medida em que o presente é o fruto do passado. Esse passado é conhecido por
dedução a partir do presente. Por essa razão, o fiel está feliz em poder usufruir dos
conhecimentos da ciência da natureza e das ciências do homem (em primeiro lu-
gar, da história).
O fiel não vai à procura de Deus como de alguém que abriu no passado o curso
do tempo e o campo do espaço. Vai ao seu encontro no hoje, no qual ele reconhe-
ce um dom de Deus que está presente em todo ser e em todo acontecimento ao
longo de toda a duração cósmica.
Se afirmamos que o mundo sempre existiu, o teólogo concluirá que Deus dá o
ser a um mundo cuja duração não tem fronteira. Se afirmamos que o mundo co-
meçou, o teólogo concluirá que Deus dá o ser a um mundo que teve um começo.
O importante é viver o hoje que é dom de Deus. Felizmente, a questão científica
permanece aberta, o que orienta o teólogo para o seu ofício de ser humano — que
consiste em compreender a si mesmo e ao mundo e em se voltar para a fonte em
todo ser, sua própria fonte.
A teologia não cessa de ser um caminho de conversão, tanto mais que ela com-
preende a generosidade do dom primeiro à luz de sua manifestação no dom que
o completa: o perdão, uma vez que se sabe que a noção bíblica de criação apare-
ceu em Israel pela reflexão sobre a salvação. É na experiência da proximidade de
Deus que Israel resolveu o enigma da origem, e na luz da ressurreição de Jesus que
o rosto de Deus assumiu para sempre o rosto do Pai. Assim, é esperando a plena
realização de seu reino que a origem se ilumina de uma luz que não permite con-
fundi-la com o começo.