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REVISTA JUSTITIA, Volume 2 - Fascículos de I a III

Período de nov./1940 a jun./1941

A MENSAGEM JURÍDICA DE DANTE

Prof. TULLIO ASCARELLI

"JUSTITIA" tem a grata oportunidade de oferecer aos seus leitores o magnífico trabalho do prof. Tullio Ascarelli sob o
título "A Mensagem Jurídica de Dante". O prof. Tullio Ascarelli nasceu em Roma no ano de 1903, formado pela
Universidade de Roma. Aperfeiçoou seus estudos em Berlim e Genebra, conseguindo, em Roma, o prêmio do
Ministério da Educação e, em Berlim, o prêmio "Humboldt Stiftung". Em 1928, publicou um amplo volume intitulado
"A Teoria Jurídica do Dinheiro", que obteve menção honrosa do "Institut International de Cooperation Intellectuelle"
e, mais tarde, o "Curso de Direito Comercial que levantou celeuma em todo o mundo jurídico. São de grande
importância seus estudos sobre "O Negócio Indireto", que trouxeram um sentido dinâmico às questões de direito;
sobre Sociedades Mercantis e Títulos de crédito, que exerceram marcada influência na orientação da doutrina e
jurisprudência italiana sobre o contrato de Sociedades mercantis assembléias, dívidas em dinheiro, cláusula ouro e
títulos de crédito. Dada a repercussão de seus estudos foi chamado a ocupar a cadeira de Direito Comercial nas
Universidades de Pádua e Bolonha, tendo sido eleito membro da comissão italiana da Nova Lei Cambial e da
comissão de revisão do ante-projeto Ítalo-Francês das obrigações bem como das comissões de redação das leis
italianas sobre Sociedades de seguro, e sobre patentes e marcas.

DANTE

- Não é sem respeito e temor que italianos, e, principalmente, italianos em terras


estranhas, se aproximam daquele que é guia e símbolo da Itália; que, de um golpe fez de uma
linguagem, depreciativamente qualificada de "vulgar" o instrumento da maior obra poética criando
a "língua italiana"; daquele que, na sua visão, soube proferir palavras de alcance universal, e soube
examinar nos seus múltiplos aspectos a alma nacional de seu povo, cantando o amor eterno da
mulher e a paixão política, o ódio e a contemplação religiosa, a ânsia de novas descobertas e a
renúncia ascética e, ao mesmo tempo, imortalizar a Florença medieval e a Itália do século XIV nas
suas mais íntimas minúcias.

Francesca e Farinata, a invectiva do Conde Ugolino e a oração de S. Bernardo, a


audácia de Ulisses e a devoção de São Francisco, remontam da fantasia do poeta e narram ao
mundo sua eterna aventura que é a aventura do homem de todos os tempos e que todos os céus e, ao
mesmo tempo, pelo milagre da criação poética, é a aventura de um povo e de uma raça em todas as
suas particularidades.

Assim, os italianos sentem em Dante, o grande poeta católico e, portanto, universal,


mais do que em qualquer outro, o verdadeiro poeta italiano ou, melhor, florentino, e nele saúdam
aquele que, quase no limiar de nossa história artística e literária, soube concretizar uma visão, que,
na sua universalidade, é singela e, em sua singularidade, abrange o universo.

Milagre da criação poética, essa "Comédia", povoada de coisas e de homens do século


XIII florentino, salienta a presença do "bel San Giovanni", e, sendo divina e universal canta o
destino do homem eterno. E esse "Milagre" não podia ser cantado no latim e sim na linguagem
vulgar forjada por mercadores e navegantes, dando à sua popularidade novo cunho de nobreza.

DANTE PROFETA

O poeta, ao mesmo tempo, profeta e "latore" de uma mensagem, qualifica a sua obra
como "'l poema sacro al quale ha posto mano, e cielo e terra". Poeta e profeta! Duas palavras que,
no fundo convergem. E os povos, nas horas mais graves da sua história a rebuscam na obra dos
próprios poetas ensinamentos e incentivos, pois os grandes poetas, desde a "Comédia"', de
Alighieri, ao gorthiano "Faust", procuram ensinar por intermédio da poesia as eternas verdades.

Através do canto da experiência pessoal, concedida para a sua própria salvação, Dante
quer anunciar uma mensagem. E, então, arvora-se em juiz e vingador de imperadores e pontífices,
de povos e reinos, castigando-os ou premiando-os, e a história da humanidade oprimida salta do
poema reorganizada e julgada. A mensagem é viva nas imagens do poema e, por isso, concreta real,
revelada, antes de ser argumentada.

O leitor da "Divina Comédia" é ao mesmo tempo dominado pela imagem poética e


induzido a refletir sobre a mensagem, que se desenrola nas imagens do poema, sendo impossível
compreender uma sem a outra. É isso que nos comove no canto de Francesca, diante da "piedade"
dos dois cunhados, apenas culpados daquele pecado de amor "che a cor gentil ratto s'apprende", e,
contudo, arrastados para sempre "nella bufera infernal che mai non resta", e condenados juntos pela
eternidade por terem cedido a uma tentação, que, apesar de tudo, se ilumina de uma pureza que
desperta piedade no decorrer dos séculos.
A reação romântica absolveu e enalteceu Francesca. Reivindicou o direito da mulher de
amar, mas jamais mulher alguma foi tão mulher e jamais canto de amor comove tanto. No fundo de
nossa consciência, sentimos que a mensagem de Dante, católico, fere mais de rijo do que tantas
soluções fáceis e que o drama do amor está ainda e estará sempre no problema e no contraste,
cantado pelo Poeta: nesse incontido assomo do mais lindo dos sentimentos com as sombras do
primeiro pecado: no drama contido da consciência moral e do desejo amoroso.

Se se suprimir o drama, eliminar-se-á a poesia do amor, a poesia da mulher, eterna


inspiradora e, também, eterna corruptora, pois que cada um de nós se fez e se faz homem através da
experiência de uma "donna Pietra", sensualmente desejada e, ao mesmo tempo, odiada e de uma
Beatriz, divinamente enaltecida e, na experiência amorosa do moço, a mulher assume uma
duplicidade berrante, Eva e Maria. . .

E a mensagem dantesca é eloqüente em todos os cantos do poema sacro, desde os


círculos do inferno à dolorosa ascensão do monte do Purgatório e as contemplações suaves do
paraíso. Mensagem viril e dramática que nos coloca sempre diante desse dualismo e desse
contraste: a ânsia da busca e a necessidade da aquiescência, que se não podem deslindar, enquanto
perdurar essa corrida atrás da morte a que chamamos vida...

Foi para seguir "virutute e conoscenza" que Ulisses se lançou para além dos limites das
colunas de Hércules, símbolo dessa ansiedade de descobertas, que o mundo grego nos transmitiu, e
sobre cujas bases se acimenta a civilização. E, nos versos do poeta, já no umbral do mundo
moderno, pasma-se ao sentir aquela impaciência, que, dois séculos mais tarde, impelia os
navegantes a desmantelar as muralhas do mundo antigo, e implantar o início de uma nova
civilização. Dante canta o fracasso do empreendimento de Ulisses, já predestinado pela vontade
divina: "e la prora ire in giù, com'altrui piacque, infino a che il mar fu supra noi richiuso". -
Fracasso eterno da eterna fraqueza da mentalidade humana, ansiosa sempre por novas verdades e
orgulhosa de suas conquistas e, no entanto, impotente para romper o véu do mistério e
constantemente humilhada em seu orgulho: "ché se potuto aveste saper tutto, mestier nou era
partorir Maria"... Busca eterna e gloriosa, eterno e imprescindível fracasso!... É o drama da
inteligência umana e do mistério insondável...
LIBERDADE E AUTORIDADE

À entrada do Purgatório, Dante colocou, como guarda, Catão, pagão, mas não danado,
acérrimo inimigo de Cesar, que ao poeta aparecia como fundador de um império providencial.

Suicida, e, todavia, não condenado nas selvas dos suicidas, mas salvo. E, ali, à porta do
Purgatório, Catão deverá permanecer até a consumação dos séculos e então, somente então, lhe será
franqueada a alegria do Paraíso, no momento em que "la sua veste sarà sovra le altre chiara". Catão
é o símbolo eterno do amor da liberdade, dessa mesma liberdade que o poeta procurava, segundo as
palavras de Virgilio: "Libertà va cercando ch'é si cara, - come sa chi per lei vita rifiuta!"

Liberdade e autoridade! Catão e Cesar! Os dois pólos eternos da dialética política!


Catão salvo e, entretanto, excluído do Paraíso, até a consumação dos séculos, está a simbolizar este
eterno dualismo e contínuo contraste. E, contudo, o contraste deve ser, também, subjugado e
vencido. Conta o que talvez seja lenda, podendo ser, entretanto, a verdade histórica: ao frade que o
interrogara sobre o escopo de sua peregrinação sem fim, o Poeta, extenuado, respondeu: "Paz!".

Liberdade e paz! - Eterna aspiração dos homens, que vivem em "quest'aiuola che ci fa
tanto feroci". E, ao encerrar o seu estudo sobre a "Monarquia", Dante, o filósofo, concluiu com esta
frase, que é o mais profundo anseio do homem e de toda a humanidade: che a ció deve
massimamente tendere, cioé che in questa piccola zolla dei mortali si viva liberi e in pace".

Aninha-se entretanto, na simplicidade dessa aspiração todo o problema do direito e da


política, problema que surgiu ao poeta tão tragicamente grave no século XIV, em que o ódio atirava
uns contra os outros, quei che un muro ed una fossa serra". A indignidade dos poderosos e a
temeridade da plebe, a instabilidade dos princípios e a ausência de orientadores davam-lhe a
impressão de que o mundo estivesse "smarrito nella selva selvaggia ed aspra e forte", da qual
somente um auxílio divino poderia salvá-lo.

Os homens do seu tempo pareciam-lhe "pecoce matte", sem guias temporais e


espirituais que, por sua vez já haviam esquecido as próprias funções e deveres. Florença, contra a
qual mais intensa assoma a sua indignação, porque maior é o seu amor, aparece-lhe corrompida e
vil. "La gente nova e ì subiti guadagni, orgoglio e dismisura han generati, - Firenze, in té, sí che tu
giá ten piagni", - exclama o poeta, que na sua cidade não vê "che gente avara, invidiosa e superba",
incapaz de viver civicamente no tumulto das leis sempre novas, porém nunca aplicadas, e no
desvairamento dos ódios particulares em cujo fervilhar "un Marcel diventa ogni villan che
parteggiando viene".

O poema deseja ser, também, uma mensagem de salvação para aquela sociedade
corrompida, da qual, cheio de indignação, o Poeta se afasta, desbravando o seu próprio caminho,
porque, no tumulto das paixões partidárias, "forte (é) a veder chi più si falli". Se ousa falar e
escrever, é porque o desmantelamento moral e intelectual já atingira as raízes da corrupção e, na sua
célebre epístola, dirige-se, altivamente, a reis, povos e autoridades, além de escrever tratados,
destinados, como se lê no preambulo de "Monarquia", a fazer triunfar, entre as malhas fortes da
lógica, uma verdade nunca dantes conhecida.

Não se iludia e muito menos se vangloriava o pensador, porque de fato a crise, que
revolvia a Europa do século XVI, e devia originar a criação do estado moderno, banidas as formas
da sociedade medieval, era crise moral e intelectual, da qual, como sói acontecer, se sucediam as
lutas armadas, mais como sintomas do que como causa, pois se lutava e se resolvia tanto nos
campos de batalha, como no recesso das consciências. Esta crise exteriorizava-se, por sua vez,
contraditória e extenuantemente nessa vasta literatura filosófica, que defendia e superava a herança
intelectual da era medieval.

Desde a posição moderada do "De Regime Principum", escrito, em parte, por S. Tomás;
até ao opúsculo com o mesmo título de Egídio Romano, reivindicando a "plenitudo potestais" do
Sumo Pontífice, segundo os princípios da bula do Papa Bonifácio; até aos tratados dos juristas
franceses, que teorizavam a plena soberania do Rei de França, pois eram intérpretes das exigências
daquela burguesia, aliada ao poder real; até as reafirmações curiais dos decretalistas, quer
dominicanos, quer agostinianos; até ao "Defensor Pacis" de Marcilio de Pádua, em que o
contratualismo medieval abre campo para o conceito moderno da soberania popular, - é tudo uma
vastíssima literatura política e jurídica. Essa literatura era arma de propaganda nas lutas de Felipe, o
Belo, e de Ludovico, o Bavaro, mas, também, não deixa de ser o documento, - e bastaria apenas o
"Defensor Pacis", de Marcilio, - de um movimento mais profundo dos espíritos, que, partindo dos
esquemas da polêmica política, geração de séculos anteriores, se encaminha para aelaboração de
novos conceitos.
A CRISE DO SÉCULO XIV

Declinava uma forma de civilização, de cultura. Surgia outra da operosidade do tráfico


das comunas italianas e da pretensa independência do poder imperial e papal do rei de França. As
velhas cisões e os antigos contrastes perdiam o significado e as idéias, que avultaram, ruíam
fragorosamente. Jazia o império sem autoridade. Era vã a ilusão do seu ressurgimento. Saltando da
colisão entre o império e o papado para um conflito mais real entre a Igreja e o Estado Moderno,
que surgia, o mundo celeste era esquecido pela terra, apinhada de mercadores atilados, preocupados
apenas com os próprios interesses. Mas, nesse novo mundo, ainda sem consciência da sua
originalidade, que encontrará com mais facilidade seus contistas do que seus poetas, não podendo
incutir ao Poeta senão tristeza e desânimo, peculiares nas grandes crises históricas, onde se
desmoronam os princípios básicos da vida, - o homem era presa dos acontecimentos, como nau sem
leme no meio da borrasca.

A luta assume, então, um caráter trágico e íntimo de guerra civil, a desencadear-se entre
irmãos e dentre, de cada alma. O futuro surge negro e angustioso aos homens, que parecem
abandonados por Deus.

Crise moral e religiosa, religiosa no mais vasto sentido da palavra, magnificamente


representada pelo extravio na selva dantesca e pela luta extenuante para a salvação, para a conquista
e reconquista daquela paz e harmonia, que surgem sempre ao homem como o Paraíso Perdido do
seu passado e que, no entanto, pode ser unicamente o fruto mal sazonado de sua ofegante jornada.

A ETERNIDADE DA MENSAGEM DANTESC A

Diante do trabalho, que forjava uma nova civilização, Dante se alenta na tradição do
pensamento antigo e medieval e apanha-lhe e recompõe-lhe os motivos. À Florença do século XIV,
que, logo depois, surgiria na humana comédia do "Decameron", de Boccacio, o Poeta opõe a sua
visão dos reinos de além-túmulo. A vida política moderna, que surgia dos escombros da Europa
medieval, o filósofo ajusta a tradição já morta de um Império, que Arrigo VII, de Luxemburgo, não
podia, por certo, fazer renascer. Mas é essa inatualidade de Dante em relação à sua idade, que nos
permite verificar a eternidade de sua mensagem, pois terá sempre esse cunho, porquanto não
constitui banal panacéia e dá ao seu caráter, tido como utópico, um valor constante.
Foi condenado, como herege, pelo cardial Bertrando del Poggetto, no meio de lutas, nas
quais o poeta como homem e homem político, tomará parte. A sua teoria político-jurídica invocada
por católicos e protestantes, por liberais e ditadores, é um símbolo sempre vivo, porque utópica e a
sua mensagem é eterna justamente porque, mau grado escrita diante de acontecimentos
historicamente prefixados, pode transcender as contingências históricas e pode avançar com toda a
sua veemência pelo mundo das idéias, ainda que madrasta lhe tenha sido a sorte nos programas
políticos do século XIV. Mortos eram os sonhos, espalhados na alma do exilado pelo fim do longo
interregno imperial e pela chegada à Itália de Arrigo VII e inútil seria confrontar os seus programas,
os seus projetos, as suas esperanças como a realidade e as possibilidades da Europa do século XIV.
Mas, fora das contingências históricas, permanecerá sempre vivo aquilo que podemos tornar a
chamar como a substância do pensamento político-jurídico de Alighieri.

A UNIDADE DAS GENTES NA IDÉIA DO IMPÉRIO E O


VALOR DO DIREITO ROMANO

Será sempre viva a reafirmação substancial da união do gênero humano, que é o marco
de partida e a preocupação contínua do pensamento dantesco. União dos seres humanos, que, no seu
pensamento não significa diminuição e, muito menos, negação das suas várias e múltiplas
formações políticas e da soberania dos Estados, mas, pelo contrário, o seu reconhecimento nas
formas complexas, que elas assumem nos povos e nos tempos diversos, como as lembrou e celebrou
o Poeta, convergindo cada uma para um determinado fim particular.

Mas essa variedade de povos e de regimes políticos, particulares a cada povo, não
deprecia a unidade fundamental da família humana, da qual derivam as lindes à ação de cada Estado
particular, manifestando-se, segundo o seu pensamento, no Império a que Dante chama de
"Romano", porque, criado como uma necessidade lógica, acima de todas as eventualidades
históricas, não podia ser ligado senão a essa Roma eterna, onde "Christo é romano", e que, no
decorrer da história, lhe apareceria igualmente personificado no espanhol Traiano e no alemão
Arrigo. Esse princípio já se avolumava no seu espírito como um acontecimento bíblico infalível, da
mesma maneira que, na história da Torre de Babel, a derrocada inevitável da consciência desta
unidade era coisa biblicamente indicada. Esse princípio foi biblicamente revelado e, depois,
filosoficamente argumentado pelos filósofos gregos até a doutrina tomista, tornando-se então, tarefa
dos doutos o indagar os precedentes e as várias manifestações dessa teoria na história do pensaento.
No seu espírito, assim como na tradição, para a qual imediatamente se volta, o Império
se identificava com o Direito Romano e a unidade imperial se identificava com a unidade jurídica
européia, fundada sobre esse Direito que teve a sua renascença na Escola de Bolonha. Unidade
jurídica positiva e real, manifestada no universal reconhecimento da época, e pelas práticas
quotidianas, oriundas da vasta aplicação do Direito Romano, que, adaptado às condições e às
necessidades do tempo, ia conquistando o mundo civilizado, sem armas. O renascimento do Direito
Romano e sua expansão progressiva em toda a Europa continental, a partir do Século XII é um
fenômeno único e singular. Ressuscitado com os ensinamentos da escola Bolonhesa e, novamente,
estudado nas obras dos juristas, o Direito Romano torna a ser um Direito de prática aplicada,
desenvolvido e remoçado pela obra de interpretação. E essa aplicação estende-se para adiante, para
os séculos sucessivos. Abrange praticamente toda a Europa continental. Influi até sobrea Inglaterra.
Espalha-se tanto que, ainda hoje, podemos reconhecer, no Direito Romano, a base comum das
legislações da Europa continental e América Latina. O Direito Romano aparecia como um direito
de razão, comum a todos, como se fora o esqueleto natural do edifício jurídico, que cada Estado,
depois, completava, diversamente, segundo os próprios estatutos. Como base comum era, por isso
mesmo, logicamente superior e anterior às várias leis particulares e era a expressão jurídica dessas
exigências elevadas e básicas, que não encontram confins nos Alpes e nos Pirineus. Era, portanto,
natural chegar da unidade jurídica à política surgindo, espontaneamente, da tradição romana, o
conceito da unidade da família humana, que se avantajava à concepção aristotélica do Estado
autárquico, numa visão mais ampla de caráter jurídico e político. Esse ideal não foi casualmente
encabeçado pelos juristas e, já no século XIV, Bartolo de Sassoferrato, que, entre os homens de leis,
mais deveria contribuir para a doutrina jurídica omum ao mundo civil, através dos séculos, agarrou
e defendeu o ideal de Dante. E a insistência com que esse jurista, seguindo embora a trilha desse
ideal, se bateu pelas novas tendências do seu tempo, afirmando, em contraste com as tradições
medievais a ampla soberania dos Estados particulares, estabelece nova prova de tudo aquilo, que,
acima das contingências históricas da sua formulação, constitui o mais profundo significado do
ideal político do poeta da "Comédia".

É verdade que o mundo medieval, debatendo-se na infinita multiplicidade dos seus


organismos políticos, custodiava, com mais intensidade do que hoje, a consciência da unidade
básica da família humana, no duplo vínculo da unidade religiosa, proveniente da revelação cristã, e
da unidade jurídica, fundada no Direito Romano, ambas descritas na mesma língua. A civilização
moderna, surgida sob o signo dos grandes estados nacionais centralizados, não encontrara ainda
essa conciliação, que sentimos necessária entre a soberania do Estado e a unidade dos povos. Dessa
unidade jurídica dos povos, uma mentalidade medieval não podia ver outro símbolo senão dentro do
império, que parecia continuar a reivindicar a unidade que, entretanto, tinha sido efetiva sob o signo
de Roma, conseguindo conciliar a liberdade dos povos com uma unidade política, justamente por
isso vital. Essa unidade aparecia às mentalidades medievais quase reconhecida e consagrada pelas
mesmas circunstancias da divina revelação. Era o Império que se identiicava com a reconhecida
unidade jurídica, proveniente da aplicação do ressurgimento do Direito Romano, então, e por isso,
classificado de "Direito Comum". Por sua vez, essa mesma aplicação encontrava a sua justificação,
na idéia do Império.

É' precisamente da perseverança desse conceito unitário que Dante arranca a


justificativa da visão monárquica do seu Império, como a reafirma-lo e celebra-lo. O poeta orienta
sua idéia de Império pela idéia monárquica do Imperador, parecendo-lhe entretanto, comprometer
esse conceito unitário, tão asperamente defendido, embora preteridas formas notáveis de
coordenação mais fecundas para os organismos menores. Mas no seu cérebro é esta a elevada
unidade jurídica da família humana, constantemente focalizada como base de sistema e o
imperador, - invocado por ele, - nada mais é do que um vingador e um ministro de uma jurisdição
que foge arrepiado ao seu próprio poder. E então, ai, a invectiva do poeta contra a doação de
Constantino, que dava a origem ao Estado Territorial da Igreja e do poder temporal do papado.
Reconhecia Dante aí, de um lado, a alienação por parte do Imperador de coisa não sua, pois lhe era
vedado retalhar a jurisdição do Império, e, de outro, como conseqüências, as origens das corrupções
sucessvas: "Ahi, Constantin, di quanto mal fu matre, non la tua conversion, ma quella dote, che da
te prese il primo ricco patre!..."

A IDÉIA DO IMPÉRIO E A IDÉIA DA PAZ

União dos povos e união jurídica! Supremacia geral de uma lei comum acima dos
estatutos particulares! Era isso, no pensamento do Filósofo e do Poeta, o meio para a conquista da
paz tanto assim que o ambicionado Imperador, como se lê na conclusão do "De Monarchia", "li regi
tenga contenti ne li termini de li regni si' che pace tra loro sia, ne la quale posino le eitadi e in questa
pace le vicinanze si amino, in questo amore le cose prendono egni loro bisogno, lo qual preso,
l'uomo vive felicemente, che é quello per lo che esso é nato".

O pensador Marcilio de Pádua classificou o imperador de "Defensor Pacis". Em todas as


publicações da era medieval, o problema político gira em torno da idéia da paz. A política surge
como meio para difusão da paz entre os homens de boa vontade. Desde a época turbulenta
medieval, chega até nós a invocação da paz e como séculos felizes de pacificação, temos as
consciências medievais e os séculos do Império Romano. As consciências medievais identificavam
nesta função de paz o fascínio de Roma e a prática imperial. A supremacia da lei imperial comum
apresentava-se assim concebida. Não era a negação da reconhecida soberania dos vários organismos
políticos. Ao contrário, era a sua integração para um fim elevado de paz e de justiça, que os
organismos políticos singulares, sozinhos, não podiam atuar, impelidos uns contra os outros,
guerreando-se mutuamente, para satisfação da própria cupidez. E a soberania dos estados
particulares era compreendida como legítimo exercício da autoridade, em harmonia com este direito
suerior e não como arbítrio absoluto, que anularia a verdadeira liberdade.

Esta concepção, embora constantemente negada, é imorredoura, nas consciências. As


mesmas difíceis tentativas com que os Estados tentam esboçar a comunidade internacional, sempre
reivindicada em benefício do ideal de paz e liberdade dos povos, - não constituem, por acaso, uma
eterna homenagem a essa insuprimível verdade? A norma jurídica aparece ao Poeta baseada na
justiça superior e não na força. Superior por isso à soberania política, pois encontra no Direito a sua
orientação e não o direito, que tem no Estado a sua única fonte. E isso justamente para que o Direito
e o próprio Estado possam cumprir, entre os homens, a sua função de garantia de liberdade e paz.
Séculos mais tarde, o místico Pascal reconheceu na paz o fundamento do direito, nessa mesma paz
em que a consciência medieval identificava os séculos do Império Romano.

Direito e Paz! Duas palavras, que se apresentam indissoluvelmente ligadas,


manifestando-se o direito como instrumento para a realização da paz e a paz como premissa do
direito. Paz entre os indivíduos! Paz entre as classes sociais! Entre os povos! Entre os países! Essa
aspiração é tão profunda, que parece, alguma vez relegar para um segundo plano a aspiração à
justiça, sobrepondo as exigências da certeza e segurança acima das da equidade. Mas somente de
uma moralidade superior poderá surgir a paz, segundo o conceito profundo do poeta porque a paz
só pode derivar da vitória sobre a cupidez própria da natureza humana e que a arrasta
constantemente para as guerras e pecados. Por isso, para cumprir a sua missão de paz, o Direito
deve assumir uma missão educadora. No conceito de Dante, o Direito e a Moral surgem sempre
conexos e não é possível conceber o Direito fora de uma base e de uma missão morais.

"Nella selva selvaggia ed aspra e forte", onde o Poeta, perdido, inicia a sua viagem, três
feras lhe vão ao encontro, esbarrando-lhe o caminho, que o conduziria àquele monte deleitoso,
símbolo da felicidade terrena. E é com dificuldade que ele consegue safar-se às insídias da "lonza" e
do leão, quando, bruscamente, diante de seu caminho, uma loba, mais sanguinária e mais cruel, lhe
arranca qualquer possibilidade de salvação. Aparece-lhe, então, o "montovano" Virgílio, oráculo de
antiga sabedoria e vaticinador da revelação, anunciando-lhe uma viagem mais longa, necessária
para a salvação. Pois que a famélica loba "non lascia altrui passar per la sua via, - ma tanto
l'impedisce che l'uccide; e ha natura sí malvaggia e ria - che mai non empie la bramosa voglia - e
dopo il pasto ha piú fame che pria". Mas esta cupidez, simbolizada pela loba será vencida pelo
"Veltro", "che la fará morir con doglia" - "Questi non ciberá terra né peltro, ma sapienza, amore e
virtute e sua nazion sará tra Feltro, e Feltro". A mais dscutida das alegorias de Dante arrasta-nos, de
novo, à sua Mensagem político-jurídica. Na alegoria do "Veltro", o qual, desdenhando gozos e
riquezas, vencerá a cupidez, encontramos mais uma vez a mensagem do Poeta e a invocação ao
Imperador, ministro de superior justiça. Justiça elevada que poderá dominar a cupidez e abrir o
caminho rumo ao deleitoso monte da felicidade e da paz. Justiça superior, representada por ministro
invulnerável a qualquer paixão.

O FUNDAMENTO DO DIREITO

O Poeta dá a esse Império e Direito um cunho divino. É por inspiração divina que
Justiniano, nos seus versos, recolhe e transmite os monumentos da sabedoria jurídica romana.
"Cesare fui e sono Giustiniano, che per voler del primo amor ch'io sento dentro le leggi trassi il
troppo e il vano!" O direito não é para o poeta a interpretação de uma transitória correlação de força
das várias categorias sociais ou simples manifestação da soberania estatal, pois, se assim fosse, a
base da sua validade não repousaria senão sobre a manifestação da vontade soberana, e o Estado,
por sua vez, surgiria como um simples postulado, antes de ser justificado. Ao contrário reconhece as
bases de cada direito positivo numa justiça elevada, derivando desta a justificativa e, juntamente, os
limites da autoridade estatal. Por isso, distingue dos estatutos particulares e eventuais um direito
geral e eterno de valor superior. Espalha-se aí, nesta concepção, a teoria tomista do direito natural e,
também, o fascínio do Direito Romano conceido como um direito de razão, limite e base das leis
particulares.

O positivismo jurídico, assim intimamente coordenado ao triunfo dos estados modernos,


combateu e achincalhou esta concepção, e sempre pretendeu subtrair a norma jurídica a qualquer
outro critério de validade, que não fosse o critério formal da emanação da vontade do Estado. Com
isso surgiu menos diferença entre a lei e os estatutos particulares ou regulamentos administrativos e
a distinção só pode ser focalizada em caráteres extrínsecos e formais. Contudo, a concepção seguida
pelo Poeta parece constituir a expressão genuína da nossa consciência e "l'irreductible droit naturel"
encontra-se, sempre, nas origens do progresso jurídico. É em seu nome que a nossa consciência
distingue o justo e o injusto e julga leis e soberanos, embora se apresentem perfeitas as primeiras e
valorosos os segundos. Encontra-se esse conceito no limiar da história moderna inglesa, nas
veementes palavras com que o jurista Coke negava ao rei Stuart o direito de interpretar a "comon-
law", vaticinando assim as revoluções inglesas do sécul XVII. É esse conceito, que, sob as vestes
mais racionalistas do que místicas e religiosas, se estende desde Grozio até NOSSOS tempos. É
esse conceito invocado por povos e estados, para justificar pretensões antagônicas, reconhecendo-se
que estas necessitam sempre de justificação superior.

PODER TEMPORAL E PODER ESPIRITUAL

É em conseqüência do seu conceito, transcendente do Estado e do Direito, que a


majestade do direito e do império devia parecer ao Poeta não menor do que a da Igreja, surgindo o
equilíbrio do, choque das disputas e lutas, que agitavam a sua época, como o fruto da coordenação
de dois sumos poderes dirigidos, um ao mundo temporal e o outro ao espiritual, analogamente
como, segundo a sua imagem, dois sóis "che l'una e l'altra strada faceam vedere e del mondo e di
Deo!" Afirmação que pareceu e foi realmente revolucionária! Essa Afirmação subentendia, antes de
tudo, uma revalidação da vida terrena do seu fim e da sua felicidade incerta, que, bruscamente, nos
arrasta para longe da mentalidade medieval e aos antípodas da condenação agostiniana do Estado e
nos conduz ao limiar dessa concepção toda humana da vida, que, aprofundada um século mais
tarde, abria as portas ao mundo moderno. Sente-se nesta revalidação do filósofo a alma do homem,
que, embora altivo, participara da vida do seu tempo, que lutara e pecara e blafemara, afastado de
uma posição de ascética renúncia.

Não foi por mera casualidade que o poeta colocou na própria estrutura do seu poema, ao
fim da escalada do Purgatório, o Paraíso terrestre, a conquista dessa felicidade terrena, simbolizada,
no primeiro canto do poema, pelo monte deleitoso, cujo acesso as feras impediam. Esse mérito da
vida terrena abrangia, naturalmente, a dignidade do Estado e do Direito, tão necessários, como
necessária é a vida material, cuja felicidade constituía a sua finalidade. Em virtude disto, o Estado é
independente do poder espiritual, com igual dignidade. Paridade de dignidade moderada, mas não
incompatível pelo respeito filial, ao qual, segundo o pensamento de Dante, o poder temporal é
sempre mantido nos confrontos do espiritual. Não importa se esta concepção aparenta contrastes
julgados então heréticos com a "ordinatio ad unum" medieval, tão esmiuçada pelo pensamento do
Poeta, e que, na literatura da época, punha sempre e inevitavelmente fim à superioridade de um ou
de outro sol.
Quer o papado, quer o império não sabiam criar-se a não ser com a força do poderio,
que, religioso e político ao mesmo tempo, acabava absorvendo um ou outro. Essa concepção
dantesca é profundamente viva e decisivamente moderna nessa reafirmação e distinção dos dois
poderes, reivindicando contemporaneamente, Cesar e Pedro com igual dignidade. E, estribado nesta
concepção, desgarra-se Dante do tempo medieval e estaca na soleira do mundo moderno, que,
através de séculos de lutas cruentas, devia encontrar, depois, na distinção da esfera política e da
consciência religiosa, alguns fatores da sua liberdade. Reivindicação da independência espiritual,
contra qualquer tentativa de assalto, sempre usado na história, para subordinar aos poderes
temporários o poder espiritual e elevar o Estado a uma única autoridade, não só política, mas,
também, moral. Reivindicação da independência do Estado e do Direito, imprescindíveis na luta
diária para a conquista de uma felicidade terrena. Reivindicação da nobreza da vida na terr e do
significado das suas lutas e dos seus esforços, e, também, confirmação integral do valor e da
independência do mundo espiritual, sem o qual a terra estaria privada de luz.

A concepção dantesca se opõe, ao mesmo tempo, às berrantes teocracias do Papa


Bonifácio VIII e da tradição imperialista, teocracias, que, naquele tempo, se guerreavam nos
campos de batalha, mas que correspondem a circunstancias eternas da dialética política, embora
com aspetos diversos nas várias épocas.

O EQUILÍBRIO DANTESCO

O pensamento dantesco tem, no bojo, uma constante preocupação de EQUILÍBRIO e de


harmonia.

Harmonia e equilíbrio nas relações entre a unidade do império e de suas leis e a


conservação da multiplicidade de organismos políticos e soberanos e de seus estatutos. Harmonia,
equilíbrio na conjugação do poder temporal e espiritual, na busca da felicidade terrena, na
preocupação da salvação eterna. Dante deu como definição do direito esta harmonia e este
equilíbrio: "Hominis ad hominem proportio quae servata servat societam et corrupta corrumpit".
Quis, assim, integrar as precedentes definições com a indicação não somente da forma, mas
também, da função do fenômeno. A força do Direito recai nesta proporção e neste equilíbrio, que,
quando acatados, conservam, e quando violados, corrompem a sociedade. A estrutura política social
e a unidade da família humana, já expressas no império, têm por fim a conservação desta
harmoniosa proporção que é, portanto, sinônimo de paz, impedindo, assim, a corrupção, emanada
da cupidez recíproca, que, fatalmente, causa a guerra. É num livro de Irnerio, o, fundador da escola
boonhesa, que se reconhece no direito e na equidade uma "coequatio et coogruentia" entre
interesses opostos, dando uma justa distribuição, entre todos os homens, de todas as coisas que a
natureza prodigalizou para o seu uso, sem desmerecer o mérito de cada um, para que a sociedade
humana se conservasse incorrupta e a comunhão de todos se mantivesse ilibada. Era este o
equilíbrio divulgado no Direito Romano, e que impelia os juristas de Bolonha a proclamar-lhe a
excelência e o superior valor em relação com a unidade jurídica européia, decantada na aplicação
universal do Direito Romano, pois a Escola Bolonhesa afirmava a necessidade e o real valor do
império. A mensagem político-jurídica de Dante relembra ainda uma vez as tradições da Escola
Bolonhesa. E a herança da unidade imperial invocada pelo Poeta é ainda para nós a realidade da
unidade no mundo católico dos direitos surgidos do tronco romano e a insubstituível consciência da
unidade básica dos povos, embora sobre o terreno social.

Unidade que nunca foi tão profunda como naqueles tempos tempestuosos, que pareciam
afunda-la no fragor das armas e no desenfrear da cupidez da loba dantesca.

O DELEITOSO MONTE

O cantor da Eneida anunciou ao poeta a aproximação do "Veltro", misterioso e


vitorioso, mas, ao mesmo tempo adverte-o a mudar de itinerário para a escalada do monte deleitoso
da felicidade terrena, através dos reinos do além-túmulo, afim de, assim, sair-se da selva do seu
extravio. Se o exilado florentino podia exaltar-se ao pensar na eleição e na "descida" de Arrigo VII
e ver aproximar-se a realização de seu ideal político, o poeta sabia que o alcance da harmonia
ambicionada não podia ser fruto mal sazonado de guerras e de combinações sagazes. Era, ao
contrário, uma conquista lenta e exaustiva através de uma experiência, que ele nos relata de sua
viagem. É esta a conquista, que ele deve fazer penosamente, com a orientação do guia da antiga
sabedoria. Conquista que o conduziu do inferno e do purgatório até o paraíso terrestre, onde será
confiado, para cumprimento da sua visão "a anima piú degna", que só podia conduzi-lo às
contemplações do paraíso, depois de se tornar "puro e disposto a salire alle stelle".

Dante sabe que não pode haver paz e harmonia entre os homens, se não tiverem como
base essa paz íntima que se oriunda da elevação moral do indivíduo e na boa vontade, para além da
qual a paz não foi anunciada. O Poeta sabe que não pode haver verdadeira liberdade a não ser
fundada nessa íntima liberdade, que torna o homem senhor das próprias paixões. O problema
jurídico reconduz ao problema moral. O progresso nas relações humanas irrompe, antes de tudo,
subordinado ao progresso moral individual, sem o qual toda a lei cai no vácuo. A "Comédia" mostra
precisamente essa constante necessidade do Estado ideal, ambicionado pelo Poeta e indica o único
meio que poderá levar de vencida aquela loba cúpida, que impede o caminho para a escalada do
monte da harmonia e da paz.

A VERDADEIRA LIBERDADE

O poeta e o homem vencem uma longa e penosa viagem através da selva do próprio
extravio, pois não fora feita com renúncia ascética e, sim, no meio dos tumultos e das paixões,
contidas, mas jamais negadas.

Por isso, o Poeta conduz o homem pelos círculos do inferno, e para a escalada dolorosa
do monte do Purgatório, porque, somente ao fim dessa viagem, - preparação imprescindível a uma
salvação mais elevada, - o homem "fatto ormai esperto e degli vizi umani e del valore" pode julgar-
se vitorioso e livre e entrar no reino da harmonia e da paz.

LIBERDADE E PAZ!

É na entrada do Purgatório que o Poeta encontra o símbolo e o campeão da liberdade:


Catão, que ama a liberdade tão querida "che per lei vita rifiuta". É ao fim da subida que o Poeta
penetra no simbólico jardim da paz. É a conquista da própria liberdade, que, no tumulto das
paixões, pode assegurar a verdadeira paz e não existe, fora desta interior elevação espiritual,
possibilidade da realização do ideal jurídico do Poeta. Liberdade e paz nas almas, como premissa
indispensável da liberdade e da paz entre os homens. Cinco séculos após, Giuseppe Mazzini, o
sonhador político, que soube dar um sentimento moral ao ressurgimento italiano, apoiava-se ainda
no Poeta e repetia a sua mensagem.

E, quando os italianos quiseram dobrar-se sobre as próprias culpas e nobrezas, que se


recordam da Comédia de Dante e, ali, em seus cantos eles se encontrarão. E, quando desejarem
elevar-se, ouvirão, reverentes, a mensagem do Poeta e, ao seu lado, caminharão de novo pelo
caminho, que da selva selvagem da cupidez conduz a contemplar "l'amor che muove il sole e le
altre stelle!"

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