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INTRODUÇÃO
As mãos são importantes fontes de contato com o meio externo e essenciais na
expressão da individualidade(1-2). As lesões traumáticas das mãos podem
acarretar seqüelas decor-rentes de deficiências motoras e/ou sensitivas, muitas
vezes permanentes, afetando tanto as atividades funcionais do dia-a-dia, bem
como as profissionais antes exercidas.
Diversos estudos têm levantado dados sobre as lesões das mãos, quanto a: faixa
etária, sexo, causas mais comuns, tipos de lesão e afastamento do trabalho(3-13).
A mão também é um órgão freqüentemente lesado na criança, como alvo de
agressão, primário ou secundário, quando esta tenta defender-se do agressor.
Lesões podem ser provocadas por numerosos instrumentos, levando a
queimaduras, eritemas, contusões ou até fraturas(14-17). Agressões e brigas entre
adultos jovens também são relatadas na literatura como situações relacionadas aos
traumas das mãos(18), bem como por socos em portas de vidro relacionados ao
consumo de álcool(19-20) ou por lançamento de rojões ou fogos de artifício,
acarretando, na maioria das vezes, graves lesões(21-22).
MÉTODOS
O estudo realizado foi do tipo retrospectivo descritivo, visando levantamento de
dados sobre os acidentes envolvendo a mão, durante o ano de 2000, no Hospital
das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São
Paulo (HCFMRP-USP).
Os materiais utilizados como fonte de coleta dos dados dos indivíduos foram os
prontuários, que ficam arquivados sob a responsabilidade do Serviço de Arquivo
Médico do hospital. O referido hospital é um centro de referência terciário no
tratamento dos traumatizados encaminhados da cidade e região. Para a pesquisa
nosológica foram usadas as denominações dos traumatismos das mãos
classificados segundo o Código Internacional das Doenças (CID-10). A partir do
agrupamento dessas palavras, o sistema informatizado de arquivo do hospital
produziu uma lista de 2.556 prontuários, sendo considerada a população do
presente estudo.
RESULTADOS
Segundo dados estatísticos da Central de Processamento de Dados da instituição,
dos 47.120 casos atendidos no ano de 2000, 19,6% (9.249) foram traumas em
geral. Desses traumas, 65% (6.015) dos atendimentos foram realizados pela clínica
de Ortopedia e Traumatologia.
Da amostra analisada, 66,6% (235) dos casos eram procedentes de Ribeirão Preto
e 33,4% (118), encaminhados de outros municípios; em apenas dois casos não
havia essa especificação no prontuário.
Com relação à ocupação principal, a amostra dos casos aten-didos com traumas
das mãos apresentou freqüência maior entre os classificados como menores e
estudantes, com 28%; seguidos pelas profissões de nível técnico que lidam com
ferramentas, como marceneiros, carpinteiros, mecânicos, pedreiros, com 24%,
seguidos por outras ocupações. Os indivíduos auto-identificados como ligados ao
comércio e serviços gerais e as mulheres classificadas como do lar tiveram
distribuição similar: 14% e 12%, respectivamente. Já ocupações ligadas a
atividades como de profissionais liberais, funcionários públicos e profissionais das
letras e artes tiveram baixa freqüência de lesões da mão.
Dos casos analisados neste estudo, a mão mais lesada foi a direita, com 49,9%,
com pequena diferença com relação à mão esquerda, com 41,3%. Uma pequena
percentagem sofreu lesão bilateral, 8,2%, geralmente associada a queimaduras.
Apenas dois casos não continham a informação do lado lesado no prontuário
(gráfico 2).
De todos os casos estudados, 73,2% do total (260), os traumas nas mãos não
vieram associados a nenhum tipo de lesão em outras partes do corpo. Os
politraumatizados ficaram em segundo lugar, com 52 casos, 14,6% (tabela 1).
Esses casos estavam associados a traumas mais graves, como queimaduras e
acidentes de trânsito, com lesões extensas e múltiplas.
As causas mais freqüentes dos traumas nas mãos foram os acidentes de trânsito,
com 17,5%, seguidos pelos ferimentos por vidro ou latas e por máquinas e
ferramentas, com percentagens similares, 14,2% e 14%, respectivamente (tabela
2). Ca-sos como explosões por fogos de artifício e arrancamento de dedos em
postes de cabos elétricos residenciais metálicos tipo “torrinha” tiveram baixa
incidência neste estudo. As picadas de escorpião apareceram com freqüência duas
vezes maior do que as mordeduras de animais, respectivamente, 4,5% e 2,1%.
Com relação ao diagnóstico, na amostra como um todo, as fraturas foram as mais
freqüentes, com 117 casos (33%), seguidas pelas lesões dos tendões flexores em
associação aos nervos, com 72 casos, correspondendo a 20,3% do total (tabela 3).
DISCUSSÃO
Comparando os dados obtidos nesta amostra com a litera-tura, foi observada
incidência maior em adultos jovens, concordante com outros estudos, com
pequenas variações. Clark et al(27) encontraram acometimento na faixa etária
entre 12 e 29 anos. Batista e Filgueira(10) encontraram indivíduos com idade entre
20 e 40 anos, acima do verificado no presente estudo, possivelmente devido à
amostra escolhida para análise. Smith et al(15) detectaram a média de idade de 25
anos, com variação de 11 a 80 anos. A média de idade mais próxima foi a do
trabalho de Hill et al(16), com 27,2 anos, além da moda de 21 a 25 anos, e
variação de um a 93 anos de idade.
Neste estudo os indivíduos com ocupações técnicas que lidavam com ferramentas
cortantes como serras foram o segundo grupo em incidência. Sendo jovem, a
amostra pesquisada, muitos casos foram de menores ou estudantes.
Os traumas graves, embora menos freqüentes, são os que mais podem deixar
seqüelas, com relação à perda funcional e estética, pois em geral levam a
amputações mutilantes. Os traumas por socos em portas de vidro, em geral nos
adultos, estão associados ao consumo de álcool(20,29) e às agressões(7,18). Já
nas crianças estão associados às atividades domésticas(16). Na amostra estudada,
analisando os indivíduos de ambos os sexos na faixa etária denominada crianças e
jovens com até 17 anos de idade, houve percentagem maior de casos de lesões
com fogo e líquidos ferventes no sexo feminino, com 27,3%, comparadas com o
masculino, 10,2%. Já nas crianças e jovens do sexo masculino, as maiores
percentagens foram igualmente distribuídas com ferimentos por vidros e latas,
traumas diretos, quedas e picadas de escorpião, com 13,6% cada. Os traumas com
crianças estão na maioria relacionados às situações ligadas aos acidentes
domésticos, no esporte ou la-(14,17). Houve apenas um caso de amputação de
uma mão por moedor de carne ocorrido em uma criança.
tipo ferimento por vidro ou lata, com 31,7%. Isso talvez se deva ao fato de a
mulher apresentar maior risco de lesões domésticas, com portas e copos de vidro,
ou ao abrir e manusear latas na cozinha.
No grupo de homens considerados adultos, com idade maior ou igual a 18 anos, os
acidentes de trânsito e o uso de máquinas e ferramentas foram as causas mais
freqüentes, com 20,7% e 16,3%, respectivamente. Denota-se claramente a relação
causal com as atividades laborativas. No levantamento realizado em um hospital
universitário em 1990, 16,5% sofreram lesão por serra circular no trabalho(5).
É possível constatar também neste estudo, como na prática clínica, que as lesões
dos tendões flexores devem ser analisadas separadamente dos tendões extensores,
visto sua ocorrência ter sido bem maior.
Este estudo descritivo serviu de base para a aquisição de dados relativos aos
traumas das mãos durante um ano. Apesar de ser apenas uma amostra, foi
representativa no sentido de levantar de maneira inicial o perfil do acidentado da
mão que foi encaminhado à Unidade de Emergência do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP, no ano de 2000.
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CONCLUSÕES
1) Os traumas da mão e dedos foram responsáveis por 27,6% de todos os traumas
atendidos no HCFMRP-USP, durante o ano de 2000.
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