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Canotilho refere que a ideia da Constituicao como fonte de direito surge na história
constitucional romana. Aí, a expressão constitutiones principum (edicta, decreta, rescripta,
mandata, adnotationes, pragmaticae santiones) era utilizada para indicar os actos normativos
do imperador que passaram a ter valor de lei.
Nos nossos dias, as normas de Direito Constitucional são “normae normarum”, afirmando-se
como fonte de produção jurídica de outras normas, isto é são normas de normas ou fonte
primária de produção jurídica implica, o que implica a existência de um procedimento de
criação de normas jurídicas no qual as normas superiores constituem as determinantes
positivas e negativas das normas inferiores.
Sendo a Constituição um conjunto de normas, de carácter geral e abstracta, ela se traduz, nas
palavras de Canotilho, em “ordenação sistemática e racional da comunidade política,
plasmada num documento escrito, mediante o qual se garantem os direitos fundamentais e se
organiza, de acordo com o princípio da divisão de poderes, o poder político”.
Poder formal, intenção normativo, procedimento idóneo para a criação de uma lei
fundamental são, em princípio, os requisitos gerais exigidos para que um acto tenha a
natureza de força jurídica.
As fontes de Direito na acepção técnica rigorosa (fontes formais) são os modos de criação -
ou, doutro prisma, de revelação - de normas jurídicas.
Por lei (como fonte de Direito) entende-se a formação de normas jurídicas, por via de uma
vontade a ela dirigida, dimanada de uma autoridade social ou de um órgão com competência
para esse efeito. Envolve, portanto, uma intenção normativa e pressupõe uma especialização
de funções na comunidade jurídica ou uma competência predefinida.
A Constituição, como sempre foi dito, é a lei fundamental do Estado. Ela, como fonte positiva
de direito, dá validade e fundamento às normas hierarquicamente inferiores. Interessa, porém,
precisar melhor o papel da Constituição como fundamento das estruturas normativas. Isto
relaciona-se com a própria explicação da ideia de Constituição como norma primária sobre a
produção jurídica.
Nesta acepção, a Constituição é uma norma primária3 sob um duplo ponto de vista: sob o
ponto de vista genético-funcional, porque regula os processos através dos quais as normas do
sistema jurídico podem ser criadas e modificadas; sob um ponto de vista hierárquico, porque
a constituição se situa no topo da pirâmide normativa. A superioridade hierárquica da
constituição relativamente às outras normas implica uma relação axiológica entre a
constituição e essas normas, precisamente porque a sua primariedade postula uma maior força
normativa.
Outro momento essencial da Constituição como norma de produção jurídica relaciona-se com
a criação de leis com valor constitucional (leis constitucionais) modificativas das próprias
normas constitucionais.
Embora isso não venha explicitado no artigo 295 a CRM é uma norma sobre as fontes
normativas ao prever a sua própria revisão através de leis revisão sujeitas a um procedimento
específico de formação.
É a partir da leitura dessa complementaridade que Miguel Reale, seu sistematizador, afirma
que: "mister é não esquecer que a compreensão do direito como facto histórico-cultural
implica o conhecimento de que estamos perante uma realidade essencialmente dialéctica,
isto é, que não é concebível senão como processus, cujos elementos ou momentos
constitutivos são facto, valor e norma, a que dou o nome de dimensão em sentido,
evidentemente, filosófico, e não físico-matemático".
1
Cfr. Kelsen, Teoria Pura do Direito, Coimbra, 1963, Vol. II, p. 65, e agora, Allgemeine Theorie der Normen (trad. it.), 1985, p. 435.
Citados por Canotilho.
2
Lavagna, Istituzioni, citado por Canotilho.
É a partir desse enfoque que se chega à conclusão que o Direito (o direito constitucional
incluído) não pode ser considerado um esquema puramente lógico, fechado, uma abstracção,
sem resultado prático.
A ordem jurídica só tem razão ser na medida em que trouxer soluções práticas ao homem,
sobretudo como ente social, no seu dia-a-dia. Nessa esteira que se afirma que "uma estreita
ligação entre normas jurídicas e realidade social é a premissa para a construção de um
sistema que aspira a uma perspectiva de praticidade".3 O Direito deve estar voltado para o
homem, ao seu bem-estar social, ao seu livre desenvolvimento, à solução do que lhe ocorre ao
longo da sua vida, não para as construções abstractas, para o além.
Nesta perspectiva, onde quer que haja um fenómeno jurídico, há sempre e necessariamente
um facto subjacente (facto económico, geográfico, demográfico, de ordem técnica etc); um
valor, que confere determinada significação a esse facto, inclinando ou determinando a acção
dos homens no sentido de atingir ou preservar certa finalidade ou objectivo (que para o direito
é fazer Justiça) e, finalmente, uma regra ou norma, que representa a relação ou medida que
integra um daqueles elementos ao outro (o facto ao valor).
Jorge Miranda tipifica ainda, da seguinte forma, além das classificações acima:
a) Normas de regulamentação e normas técnicas - consoante possuem um sentido
específico de regulamentação ou se limitam a dar, no conjunto sistemático do ordenamento, o
enquadramento técnico-legislativo de que aquelas podem carecer (assim, as definições legais,
as regras de qualificação ou as chamadas normas ordenadoras);
b) Normas autónomas e normas não autónomas - consoante valem por si, contêm todos os
elementos de uma norma jurídica, ou somente valem integradas ou conjugadas com outras;
g) Normas gerais e normas especiais - conforme dispõem para a generalidade dos casos ou
para situações especiais neles contidas;
Embora muito aceita a distinção entre normas e princípios, ela nem sempre é fácil de ser
firmada. Os autores prendem-se a mais de um critério. O mais habitual é o grau de abstracção,
pelo qual não se acentua a diferença qualitativa entre princípios e normas, mas tão-somente se
insiste no grau tendencialmente mais abstracto dos princípios em relação às normas.
Outras vezes, o que se evidencia é a aplicabilidade, o que vale dizer que os princípios
demandariam medidas de concentração em comparação com a possibilidade de aplicação
directa das normas.
Apesar das singularidades que cercam os princípios, estes não se colocam, na verdade, além
ou acima do direito. Juntamente com as normas, fazem parte do ordenamento jurídico. Não se
contrapõem às normas, mas tão-somente aos preceitos. As normas jurídicas é que se dividem
em normas-princípios e normas-disposições.
Ainda assim, contudo, é possível identificar o facto de que certas normas, na medida em que
perdem o seu carácter de precisão de conteúdo, isto é, perdem densidade semântica, elas
ascendem para uma posição que lhes permite sobrepairar uma área muito mais ampla. O que
elas perdem, pois, em carga normativa, ganham como força valorativa a espraiar-se por cima
de um sem-número de outras normas. No fundo, são normas tanto as que encerram princípios
quanto as que encerram preceitos.
Uma lei constitucional não pode violar-se a si mesma. Contudo, poderia suceder que uma
norma constitucional de significado secundário, nomeadamente uma norma só formalmente
constitucional, fosse de encontro a um preceito material fundamental da Constituição: ora, o
facto é que, no caso de semelhante contradição, a norma constitucional de grau inferior seria
inconstitucional e inválida.
Reinhold Zippelius afirma que a Constituição pode conter preceitos secundários ao lado das
normas fundamentais do Estado, dando exemplo de um preceito constitucional que permite
aos deputados utilizar os meios de comunicação públicos sem ter de pagar bilhete.
Para Canotilho, o princípio da unidade hierárquico-normativa significa que todas as normas
contidas numa constituição formal têm igual dignidade (não há normas só formais nem
hierarquia de supra-infraordenação dentro da lei constitucional). De acordo com esta
premissa, só o legislador constituinte tem competência para estabelecer excepções à unidade
hierárquico-normativa dos preceitos constitucionais (ex.: normas de revisão concebidas como
normas super-constitucionais).
Outras vezes, os princípios desempenham uma acção imediata, na medida em que tenham
condições para serem auto-executáveis.
Bibliografia:
CANOTILHO, J. J. Gomes, Direito Constitucional, 6ª edição revista, Livraria Almedina,
Coimbra, 1993.
MIRANDA, Jorge, Manual de Direito Constitucional, Tomos II e III, 4ª edição revista e
actualizada, Coimbra Editora, Coimbra, 1998.
MORAES, Alexandre de – Direito Constitucional, 13ª edicao, Editora Atlas S.A.,São Paulo,
2003.
BASTOS, Celso Ribeiro, Curso de Direito Constitucional, 20ª edicao, Saraiva editora, São
Paulo, 1999.