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segunda geração são indispensáveis para o de a existência de uma quarta geração dos di-
gozo das liberdades obtidas por meio da pri- reitos humanos, que está ligada aos direitos
meira geração. A segunda geração possui seu surgidos com a globalização, como o direito
cerne no valor da igualdade que é produto de à informação, à democracia e ao pluralismo.
várias lutas proletárias no século XIX, que Destarte, acreditamos que essas categorias
tinham como finalidade adquirir condições enunciadas pelo renomado constituciona-
essenciais para os trabalhadores, surgindo lista brasileiro se enquadram na terceira ge-
dessa forma, os direitos sócio-econômicos e ração, posto que os direitos dos povos têm
culturais, tais como o direito ao trabalho, à como eixo o valor solidariedade que abarca
moradia, à saúde, à educação, ao lazer dentre uma dimensão transindividual e planetária.
inúmeros direitos da classe trabalhadora. Pode-se dizer que a concepção que
Por se tratar justamente de direitos traduz os direitos humanos como indivisíveis
proletários, que esses direitos foram procla- e universais tem sua origem na modernidade,
mados pela primeira vez no Manifesto Co- quando partimos do pressuposto Renascen-
munista em 1848, fortalecendo-se na Cons- tista de que o homem e seus direitos indivi-
tituição Francesa de 1864 e, ganhando status duais estão no centro do universo; Portanto,
de direitos e garantias fundamentais do indi- segundo Flávia Piovesan (2007, p.135) “uma
víduo na Constituição Mexicana de 1917³ e geração de direitos não substitui a outra”,
também na Constituição de Weimar em 1919 ademais a idéia de tais direitos serem univer-
na Alemanha. sais não esbarra nas “particularidades nacio-
Já os direitos humanos da terceira nais e regionais e bases históricas, culturais
geração, alcunhados também de direitos dos e religiosas”, pois os direitos humanos de-
povos, que têm como valor a solidariedade, vem ser considerados globalmente exigíveis,
advêm de lutas e protestos sociais do século cabendo a cada Estado aplicá-los de forma
XX, principalmente a partir da situação ca- “justa e equânime, com os mesmos parâme-
tastrófica deixada pelas duas grandes guerras tros e com a mesma ênfase”.
(COMPARATO, 2003). Os direitos avocados
nessa geração são direitos transindividuais, 2.3. A Normatização Hodierna
como por exemplo, o direito ao patrimônio
genético intocável, o direito ao meio ambien- Como leciona Norberto Bobbio (1992,
te sadio, o direito à autonomia dos povos, o p.24), “o problema fundamental em relação
direito ao desenvolvimento, o direito à paz aos direitos do homem, hoje, não é tanto o
enfim, direitos transnacionais que trazem de justificá-los, mas o de protegê-los”. O Di-
uma noção ampliada e indivisível dos di- reito Internacional dos Direitos Humanos se
reitos humanos. Constam tais direitos em consolidou no século XX, a partir da Segunda
diversos tratados de direitos humanos, em Guerra Mundial como um movimento capaz
cartas constitucionais como a Carta Africana de responder a todas as atrocidades causa-
dos direitos humanos e dos povos (1981), em das pelas duas grandes guerras. Segundo
convenções como a Convenção sobre o Direi- Flávia Piovesan (2007, p.117), “se a Segunda
to ao Desenvolvimento (1986), bem como na Guerra significou a ruptura com os direitos
Declaração do Rio de Janeiro sobre o Meio humanos, o pós-guerra deveria significar sua
Ambiente e Desenvolvimento (1992) e na reconstrução”.
Declaração Universal sobre o Genoma Hu- A certeza de que era necessária uma
mano e os Direitos Humanos (1997). delimitação da soberania estatal por meio
Paulo Bonavides (2006, p.525) defen- de uma sistematização normativa interna-
³ Segundo Fábio Konder Comparato, a Constituição Mexicana de 1917 foi “a primeira a atribuir aos direitos
trabalhistas a qualidade de direitos fundamentais, juntamente com as liberdades individuais e os direitos
políticos”. A afirmação histórica dos direitos humanos, p. 174.
cional, a qual garantisse eficácia e proteção Pacto Internacional sobre Direitos Econômi-
aos direitos humanos, impulsionou numa cos, Sociais e Culturais. Enquanto o primeiro
preocupação em positivar todos os direitos abordava questões relacionadas à liberdade
humanos surgidos durante a história. das pessoas como um direito protegido con-
Assim, os direitos humanos contem- tra os abusos do poder estatal; o segundo
porâneos possuem como base normativa pacto preconizava os direitos de igualdade
internacional a Declaração Universal dos Di- àqueles grupos sociais menos favorecidos
reitos Humanos proclamada pela Assembléia que sofriam com a segregação econômica
Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro imposta por uma minoria dominadora.
de 1948, a qual deu início, juntamente com a Ainda na seara da internacionalização
Organização das Nações Unidas, a um desen- dos direitos humanos, tem-se pela primeira
cadeamento de elaborações de leis globais vez a cautela em criar tratados e declarações
capazes de proporcionar validade e solidez à que protegiam os direitos de terceira gera-
todas as gerações dos direitos humanos antes ção, como o direito ao meio ambiente salu-
vistos apenas em lutas sociais. bre do trabalho, à paz, à biodiversidade, ao
Observa-se com a Declaração Univer- meio ambiente ecologicamente equilibrado,
sal dos Direitos Humanos uma expansão aos à independência, ao desenvolvimento e auto-
direitos sociais, alguns salientamos: o direito nomia dos povos etc.
à seguridade social e à saúde5 (arts. XXII e
XXV); o direito ao trabalho e à proteção con- 2.4. A Constituição Brasileira de 1988
tra o desemprego (art. XXIII, “1”); os direitos
mínimos dos trabalhadores (arts. XXIII, “2” Com vistas ao direito interno, foi por
e “3”, e XXIV); o direito à educação gratuita meio do processo de democratização no Bra-
(art. XXVI) entre outros. Fortificou-se tam- sil que houve a possibilidade de se elaborar
bém com a Declaração Universal a indivisibi- uma nova Carta Constitucional, a qual foi
lidade dos direitos do homem, ao passo que promulgada em outubro de 1988 e levou o
se convergiram os direitos civis e políticos nome de Constituição-cidadã. A partir do ad-
com os direitos econômicos, sociais e cultu- vento desta os direitos humanos ganharam
rais, refutando o legado nazista de que cabia status constitucional, expandindo assim,
à determinada raça uma titularidade de di- o rol de direitos e garantias fundamentais,
reitos. tendo como alicerce do Estado Democráti-
Dessa forma, começa-se a perceber co de Direito a dignidade da pessoa humana
que o fundamento dos direitos humanos – (WEIS, 2006).
a dignidade humana – passou a ser o pon- Diante do que estabelece o art. 5º, §2º
to de partida na criação das legislações no da Constituição Federal de 88, “os direitos e
pós-guerra, uma vez que “a sobrevivência da garantias expressos nesta Constituição não
humanidade exigia a colaboração de todos os excluem outros decorrentes do regime e dos
povos, na reorganização das relações interna- princípios por ela adotados, ou dos tratados
cionais com base no respeito incondicional à internacionais em que a República Fede-
dignidade humana” (COMPARATO, p.210). rativa do Brasil seja parte”, José Afonso da
Dentre os mais relevantes documen- Silva (2007, p.178) alega que em nosso orde-
tos jurídicos-políticos promulgados no âmbi- namento jurídico os direitos fundamentais
to da ONU em 1966 e ratificados pelo Brasil possuem três fontes: a Constituição Federal;
em 1991, podemos mencionar o Pacto Inter- princípios e regimes legitimados por esta;
nacional sobre Direitos Civis e Políticos e o bem como os tratados e convenções inter-
5
Art. XXV: “Todo homem tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar, a si e à sua família, saúde
e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação (...)”.
nacionais que são adotados pelo Brasil. A 3. O Direito à Saúde do Trabalhador como
celeuma neste caso se instaurava sobre a in- um Direito Fundamental
corporação no sistema jurídico brasileiro dos
tratados e convenções internacionais de di- O direito à saúde é um direito natu-
reitos humanos, que teve uma solução com o ral quando analisado sob o prisma de ser um
advento da Emenda Constitucional 45/2004 direito inalienável, imprescindível e inato ao
que acrescentou o §3º ao art. 5º da Magna homem. Não podia ser tratado de maneira
Carta. Posto isto, a recepção deste parágra- diferente o direito à saúde do trabalhador,
fo garantiu status de norma constitucional um direito fundamental que está intimamen-
formal a todos os tratados e convenções in- te relacionado a uma vida digna e, na esfera
ternacionais de direitos humanos que forem trabalhista a uma boa prestação laboral ao
ratificados segundo o procedimento legal empregador.
inserto no art. 60 da Constituição, o qual é Esse direito contém um valor essen-
destinado para as aprovações das emendas cial para o ordenamento jurídico, vez que
constitucionais pelo Congresso. sem ele a dignidade da pessoa humana fica-
Neste sentido, José Afonso da Silva ria comprometida. Nesse sentido, observa-
(2007, p.179) declara que aquelas normas se que o direito à saúde, e de igual modo o
infraconstitucionais que violarem as normas direito à saúde do trabalhador têm natureza
internacionais incorporadas pela Constitui- jurídica de direito humano, estando ele po-
ção na forma do §3º, serão inconstitucionais sitivado ou não, é um direito que deve ser
e sujeitas ao controle de constitucionalidade. respeito e cumprido, afinal se refere ao pleno
Por meio de uma interpretação sis- bem estar físico e psíquico do ser humano.
temática da Constituição de 88, conclui-se O Estado, por sua vez, deve proporcionar a
que há uma rede normativa de interdepen- sua população serviços públicos de saúde
dência entre os direitos de primeira, segun- que ofereçam condições favoráveis tanto de
da e terceira geração, não podendo afirmar prevenção quanto de tratamento de doenças.
que existe uma hierarquia entre as mesmas, É direito de qualquer cidadão brasileiro exi-
ou que há uma primazia entre os direitos à gir prestações positivas ao Estado, posto que
vida, à saúde e ao meio ambiente. Cançado nosso sistema jurídico é dotado de diversas
Trindade (1993, p.191-192) critica a teoria normas de ordem pública e documentos in-
geracional dos direitos humanos ao passo ternacionais que aclamam o direito à saúde.
que sustenta que essas três gerações não se A própria Organização Internacional
sucedem ou se substituem; Para arrematar, do Trabalho (1919) exerceu significativas
as lições do magistrado José Antônio Ribeiro contribuições aos seus Estados signatários
de Oliveira Silva, que em sua obra “A saúde no que toca à criação de recomendações e
do trabalhador como um direito humano – convenções relativas ao direito à saúde do
conteúdo essencial da dignidade humana”, trabalhador. Há em seus textos uma idéia
aduz que: de interdependência entre o direito à vida, o
O fim último de se proteger a saú- direito à saúde e o direito ao meio ambiente
de do trabalhador é o de preservar sadio. Embora no Brasil a doutrina traba-
sua integridade física e moral, vale lhista seja considerada uma ciência jurídica
dizer, sua própria vida. Para tanto,
autônoma, é fundamental que haja um trata-
a prevenção do meio ambiente do
trabalho, local em que aquele pas- mento sistematizado dessa matéria, inviabi-
sa grande parte de sua vida, torna- lizando assim, uma dissolução entre o Direi-
se condição sine qua non para o to do Trabalho, o Direito Constitucional e os
sucesso da referida tutela. (SILVA, Direitos Humanos.
2007, p.59 )
4. Considerações Finais
Referências bibliográficas
COMPARATO, Fabio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 3 ed. São
Paulo: Saraiva, 2003.
DORMELLES, João Ricardo. O que são direitos humanos. São Paulo: Brasiliense,
1997.
MACHADO, Paulo. A.L. Direito ambiental brasileiro. 12 ed. São Paulo: Malheiros,
2004.
ROSEN, George. Uma história da saúde pública. São Paulo: Hucitec/ EDUNESP,
1994.
SILVA, José Afonso da. Comentários contextuais à constituição. 3 ed. São Paulo:
Malheiros, 2007.
cada pelas agências do sistema penal como acabar se abandonando o vivente do direito,
a melhor solução para os conflitos sociais, por isso o termo vita nua usado por Agamben
exterminando os excluídos. (2004).
Agamben (2004, p.11) afirma que a Desta forma, Carvalho (2007) através
situação excepcional é cada vez mais utiliza- das postulações de Agamben aduz que o ho-
da nos governos atuais e que “a implicação mem na atualidade tornou-se semelhante ao
da vida nua na esfera política constitui o vín- homo sacer, encontrando-se privado do que
culo originário – ainda que encoberto – do seria uma forma de governo autoritária, o
poder do soberano”. que lhe afasta tanto do ideal de lei positiva
Em Roma o homo sacer (homo sacro) quando dos direitos humanos. O homem vê-
era o individuo que cometia um delito e não se, então, diante da terrível diáspora de sua
era possível retirar sua vida diante disso. Po- vida matável e sacrificável. Com isso, mesmo
rém, caso alguém lhe matasse não cometeria perante a inserção dos direitos humanos nas
um homicídio. Sua vida não era importante. constituições dos Estados de Direito há sem-
Para Agamben (2002) a vida do homo sacer é pre uma exceção, de forma que perante qual-
a vida sacra, seria a vida insacrificável e tam- quer perigo, alega-se a necessidade, podendo
bém matável. Segundo Carvalho (2007) ele facilmente desperdiçar uma vida humana.
encontrava-se fora da jurisdição dos homens Para Agamben (2004, p. 41): “A teoria da
e também não encontrava respaldo na legis- necessidade não é aqui outra coisa que uma
lação divina. Será acobertada sua vida nua no teoria da exceção em virtude da qual um caso
interior da ordem jurídica, sem nenhuma pro- particular escapa à obrigação da observância
teção, de forma a lhe excluir, sendo que qual- da lei”.
quer pessoa e o soberano podem matá-lo. Atualmente a vida política se mos-
Agamben (2004) cita como principal tra pela da cultura do individualismo, da
referencia na afirmação de um Estado de reificação do indivíduo, onde medidas ex-
exceção como paradigma de governo o au- cepcionais de violência e autoritarismo são
tor Carl Schmitt. Para este, o soberano seria tomadas sob os argumentos de desenvolvi-
quem decide sobre o Estado de exceção. Para mento e proteção. De acordo com Carvalho
os que estão sob o poder do soberano, a vida (2007, p. 14): “No mundo contemporâneo,
se encontra nua e quem está no poder vai de- porém, a biopolítica se caracteriza essencial-
cidir sobre o que deve ser feito com as pes- mente como cultura do genocídio e do exter-
soas, se serão excluídas ou não da sociedade mínio”. Demais disso, referido autor coloca
em que vivem. que os objetos do poder do soberano, que
Nota-se que em determinados casos a são a igualdade e a dignidade, são usurpa-
lei ou os princípios jurídicos não serão apli- dos pelo individualismo exacerbado, através
cados, mesmo existentes não vão amparar da expansão mundial, com formas cada vez
certos indivíduos, diante de um ordenamen- mais abusivas de poder, justificadas através
to jurídico, este estará suspenso por determi- da expansão de mercado e de um discurso de
nação de quem está no poder. Para Agamben garantir a superioridade, através de racismo
(2004, p. 12) quando ocorre o Estado de ex- étnico, cultural, religioso, global. Exemplo
ceção há uma crise política, onde “medidas de tais afirmações é trazido por Agamben
excepcionais encontram-se na situação pa- (2004, p. 14), onde informa que a military
radoxal de medidas jurídicas que não podem order promulgada pelo Presidente dos EUA
ser compreendidas no plano do direito, e o em 13/11/2001 traz claramente um modelo
Estado de exceção se encontra como forma em que ocorre a suspensão de direitos de um
legal daquilo que não é legal”. Através de vivente, um verdadeiro Estado de exceção,
uma suspensão, no Estado de exceção, vai com relação aos não-cidadãos americanos
suspeitos de atividades terroristas. A ordem agências tornam-se cada vez menos proteti-
do presidente George Bush anula todo esta- vas, caracterizando um verdadeiro retorno
tuto jurídico de um individuo, produzindo ao estado de natureza. Diante disso, tem-se
um ser inominável e inclassificável. São ape- a repressão como forma de controle as pes-
nas detainees, a eles não serão aplicadas leis soas, tentando recompor as relações sociais
e nem mesmo um controle do judiciário. extremamente degradadas. Para Carvalho
A vida política atual remete seu (2007, p. 16): “são os fracassos da política e
desenvolvimento na figura de um verdadei- da democracia como alternativa à violência
ro Império, existe uma nova ordem jurídica que determinam o uso da força e da repressão
planetária, através de um poder superior como mecanismo de gestão dos conflitos”.
que governa o mundo (CARVALHO, 2007). Por meio das exigências de regulação
A figura do Império corresponde a um poder e segurança, bem como de um maior contro-
sem fronteiras e sem limites nenhum. Além le, cada vez mais latentes em face das classes
disso, para alcançar tal Império há sempre sociais afastadas da aquisição de bens e con-
uma luta. Para Negri e Hardt apud Carvalho sumo, tem-se um Estado de exceção como
(2007, p. 14-15) forma política dos Estados constitucionais.
O subdesenvolvimento viria a ser uma forma
O Império não só administra um de exceção permanente do sistema capitalista
território com sua população, mas na sua periferia. Através da idéia de Império,
também cria o próprio mundo que atualmente deve-se procurar a manutenção
ele habita. Não apenas regula as
da ordem, baseando-se na excepcionalidade
interações humanas como procu-
ra reger diretamente a natureza do que é urgente.
humana. O objeto do seu governo O Estado deixa de regular, como lhe
é a vida social como um todo, e as- cabe, as relações sociais, com o capitalismo,
sim o Império se apresenta como o mercado é quem define. Observa-se aí um
forma paradigmática de biopoder. processo de desinstituição que leva a elimi-
Finalmente, apesar de a prática do nação das relações sociais, bem como a vio-
Império banhar-se continuamen- lência, criando uma situação de anomia. Isso
te em sangue, o conceito de Impé-
porque há uma crescente marginalização
rio é sempre dedicado à paz – uma
paz perpétua e universal fora da econômica de certas classes sociais, diante
história. da revolução tecnológica que vem eliminan-
do postos de trabalho. Além disso, há a des-
O biopoder mundial pretende, mais truição das próprias instituições com o novo
do que por “fim a história”, reger a vida hu- modelo jurídico político, que busca o romper
mana, através de suas indicações e pela visão as fronteiras através do capital e com as re-
das classes que estão no poder do que seja des de comunicação.
viável a alcançar a dignidade. Assim, usa de Por certo a sociedade pós-moderna
mecanismos e formas de legitimação que le- não encontrou uma ordem necessária, para
vam a um “amplo e assombroso processo de se embasar na sociedade moderna, esta mar-
vitimação de abundantes contingentes popu- cada pela reafirmação do Estado-nação e
lacionais e de degradação da dignidade hu- pela pureza de seus indivíduos, que chega-
mana” (CARVALHO, 2007, p. 15). ram a casos extremos como o nazismo. Hoje
Essa nova ordem aparenta-se como o que se tem é uma sociedade voltada exclu-
desumana e excludente, o que importa é so- sivamente ao mercado e os que não podem
mente as relações sociais relativas ao mer- participar deste novo modo de vida, movido
cado, as pessoas se encontram vulneráveis somente pelo consumo, são excluídos. Tais
perante esta agressiva situação, sendo que as pessoas, encaradas a partir da nova perspec-
América Latina do horror inaugurado nos co (volkish). Torna-se mais fácil alcançar as
Estados modernos pelos fascismos do sécu- pessoas, que pelo baixo grau de cultura ade-
lo XX. É o espaço da eliminação dos corpos, rem ao que lhe são postos. A polarização da
da vida matável sem sacrifício, sem procedi- riqueza tornou a classe média anômica e a fez
mento, sem regras, na suspensão do Direito. reclamar por normas sem motivos. Existem
leis que se escondem atrás de um discurso
3. Poder seletivo, Estado de Exceção e autoritário simplificado e popular, prove-
o Direito Penal do Inimigo. niente do modelo norte-americano, que ser-
ve na verdade como controle para a classe
Historicamente, o poder punitivo que lhe reafirma.
do Estado sempre atuou de forma a selecio- Assim o poder legislativo aceita o
nar um número determinado de pessoas, so- discurso, elaborando normais penais mais
bre as quais exercerá todo o processo de cri- rígidas, eis que segundo Carvalho (2007, p.
minalização. Muitas vezes, destes indivíduos, 34): “leis penais são baratas, de propaganda
retira-se o caráter de ser humano, tratando- fácil e a opinião pública se engana com su-
os apenas como entes perigosos. Estes não ficiente freqüência sobre sua eficácia”. Neste
merecem a aplicação das garantias constitu- sentido, afirma Gomes (2009) que o Direito
cionais de um Estado de direito. Tais pessoas Penal serve como instrumento para soluções
são tratadas como os inimigos da sociedade. de problemas, porém é certo que seu uso re-
O tratamento diferenciado é observado tanto corrente não soluciona os conflitos, sendo
doutrinariamente quanto legalmente (ZA- que para tal autor isso reflete o simbolismo
FFARONI, 2007). do direito penal.
Zaffaroni (2007) considera que se A essência do tratamento diferen-
criou nas últimas décadas em todo o Ociden- ciado de certos indivíduos está na negação
te um novo discurso de autoritarismo cool no de ser considerado como pessoa, mas como
Direito Penal. Usado como propaganda, de- entes perigosos. Existe uma diferença entre
fende o que está na moda, o que é cool, não os cidadãos (pessoas) e os não cidadãos (ini-
há uma convicção profunda, apenas adere ao migos) conforme expõe Martín (2007). Esta
que se diz para não ser estigmatizado ou visto aceitação confronta o Estado de direito. Não
como antiquado, perdendo espaço na publi- será levado em conta se a “não pessoa” con-
cidade. O discurso autoritário cool carece de siderada perigosa possui certos direitos, mas
embasamento acadêmico. Trata-se de sim- se algum deles lhe é privado por sua condição
ples propaganda, como se o poder punitivo de ente perigoso.
fosse uma mercadoria. Os que vão difundir Na América Latina, o poder puniti-
este discurso único são formadores de opi- vo é exercido através de medidas de conten-
nião, não possuem dados empíricos. Muitas ção provisórias. A liberdade é privada antes
vezes o utilizam para manipular as opiniões de uma sentença definitiva, por uma medida
das vítimas ou de seus parentes, para reali- preventiva, apenas por presunção de pericu-
zarem uma campanha de “lei e ordem”, com losidade de um individuo. Em relação diver-
objetivo de vingança. Segundo Gomes (2009) sa ao que ocorre com o discurso norte ameri-
o discurso de lei e ordem trazido pela mídia cano nos Estados Unidos, nos países latinos,
expõe a violência como um produto de mer- o sistema penal pretende controlar os exclu-
cado. Através desta manipulação, vão influir ídos, como os desempregados, enquanto os
nas condutas dos políticos e abalar os pilares policiais controlam o poder político, sendo
da democracia. estes independentes e corrompidos (ZAFFA-
O autoritarismo é difundido no RONI, 2007). Nesta região, o discurso cool é
mundo, através desse discurso populares- inserido em uma sociedade onde há a inver-
são do sistema penal. Existem prisões lota- nunca será suprimida, apenas reduzida. Com
das de pessoas sem condenação e o direito à isso, a parte penal tornou-se o campo mais
execução penal é quase impossível, tendo em afetado pelo Estado de policia, já que é o lado
vista que é aplicado a um número reduzido mais vulnerável de um Estado de direito. Se
de detentos. uma legislação faz mais concessões ao poder
Cerca de três quartos dos presos da punitivo, a seletividade arbitrária também
América Latina encontram-se neste confi- será expandida pelas agências de criminali-
namento cautelar. A seletividade é praticada zação secundárias e menor será o exercício
através do processo de criminalização secun- do controle jurídico nestes casos.
dária, onde existe um tratamento diferencia- A seletividade se desenvolve por
do. Através de confinamentos de contenção, meio da criminalização primária e secundá-
prolongados ou indefinidos, todos são consi- ria. A primeira é elaborada pelas agências po-
derados inimigos. O instrumento do direito líticas, corresponde ao ato de elaborar uma lei
penal liberal é o direito processual, o qual vai penal que incrimine um fato, e a conseqüente
legitimar os confinamentos cautelares, es- punição de certas pessoas. Já a criminaliza-
gotando assim a maior parte do exercício do ção secundária será executado por meio de
poder punitivo. Nessa esteira, afirma Batista outras agências em relação àquelas em que
sobre o sistema latino-americano (2003, p. a lei foi elaborada. Corresponde à ação exer-
54) cida sobre pessoas em concreto. Inicia-se
O sistema penal está estruturalmen- nessa etapa o desencadeamento de uma série
te montado para que não opere a legalidade de atos, que poderão chegar até a imposição
processual e para exercer seu poder com o de pena a um indivíduo, restringindo-se sua
máximo de arbitrariedade seletiva dirigida liberdade. Serão responsáveis durante todo o
aos setores vulneráveis. Na América Latina, a procedimento as agências policiais, judiciais,
própria lei se ocupa de renunciar à legalidade e por fim a agência penitenciária (ZAFFARO-
concedendo ampla margem de arbitrarieda- NI; PIERANGELI, 2008).
de as suas agências. A criminalização primária é exten-
sa. Os conflitos criminalizados que existem
Assim, existe na América Latina um em uma sociedade são demasiadamente
desdobramento do sistema penal em sistema mais altos que aqueles que chegam ao co-
penal cautelar e sistema penal de condena- nhecimento das agências. Os números reais
ção, sendo que o primeiro tornou-se mais são nomeados como cifras ocultas (BARAT-
importante que o segundo, eis que corres- TA, 2002). As agências que vão exercer a cri-
ponde ao maior número de criminalização, minalização secundária são deficientes e por
produto de infrações de pouca gravidade. isso o sistema penal leva até o final da crimi-
Através de um direito penal autoritário, reco- nalização secundária uma pequena parte da
nhecendo ou não sua natureza penal, nega-se que foi prevista primariamente.
a vigência do principio da inocência, previsto De acordo com Baratta (2002), na
nas Constituições. O sistema penal cautelar, criminalização primária há uma expressão
como forma predominante no exercício do do sistema de valores nas leis. Dá-se prefe-
poder punitivo implica em um grave defeito, rência a cultura burguesa e individualista,
pois leva as agências executivas, em especial protegendo o patrimônio privado e se diri-
a policial, a defenderem sua arbitrariedade gindo às maneiras de desvios que são típicos
(ZAFFARONI, 2007). de grupos sociais mais baixos. Isto pode ser
Zaffaroni (2007) explica que o poder observado no elevado número de delitos con-
punitivo contém a elevada seletividade como tra o patrimônio, conforme estatísticas judi-
uma característica estrutural, sendo assim ciárias.
a exclusão social que sofre um inimigo da so- to à liberdade, são privadas de seu direito à
ciedade, seja pela sua presunção de periculo- intimidade, à privacidade, à saúde, inclusive
sidade, seja por seu status no atual desenvol- sexual e reprodutiva; à segurança pessoal. As
vimento desenfreado do capitalismo, é maior situações específicas que afetam as mulheres
no caso dos homens, que geram mais insegu- em particular são potencializadas nos cárce-
rança a sociedade, eis que correspondem ao res para as mulheres em situação de maior
estereótipo do delinquente que não merece vulnerabilidade como grávidas, doentes,
as garantias penais e processuais. Nesta es- idosas, pessoas com deficiência mental, indí-
teira, outro apontamento que pode ser feito genas, vítimas de violência sexual e estran-
se relaciona com o crescimento industrial e a geiras. Existe uma completa ausência de po-
sobra da mão de obra dos trabalhadores, que líticas penitenciárias específicas para mulher
através de seu encarceramento desocupam presa.
os grandes centros urbanos, deixando um Um indicador objetivo disso é a não
bom cenário para a classe hegemônica que se elaboração e publicização, de dados consis-
encontra no poder, fingindo existir um Esta- tentes e suficientes para conhecer quantita-
do democrático de direito. tivamente os problemas das mulheres. As
Sobre a situação da mulher encar- informações pontuais que se tem acesso não
cerada, em 2007 a Centro Pela Justiça e pelo recebem o tratamento qualitativo da perspec-
Direito Internacional (CEJIL) e pelas enti- tiva de gênero, nem descriminação nas aná-
dades que constituem o Grupo de Estudos e lises quantitativas. Como conseqüência são
Trabalho Mulheres Encarceradas finalizaram raras as políticas públicas com perspectiva de
o Relatório sobre as mulheres encarceradas gênero, que incluam ou considerem a com-
no Brasil, realizando um levantamento a res- preensão sobre o problema com sensibilidade
peito dos números, do perfil e das condições para as peculiaridades da situação da mulher
gerais da mulher encarcerada, em termos encarcerada. De acordo com o relatório,
de garantias ou não direitos (civis, políticos,
sociais, econômicos e culturais). Nesse rela- Para além das violações (...) referi-
tório, em síntese, o que se constatou foi que das, as mulheres encarceradas são
a situação das de violação dos direitos nas objeto de violações geradas pela
unidades prisionais femininas no Brasil são discriminação de gênero, e pela
iguais aos homens. Tanto nas masculinas, negligência do Estado quanto à
quanto nas femininas, são vários os direitos identificação e atenção às suas ne-
violados, reproduzindo o mesmo desamparo cessidades específicas. A Conven-
experimentado pelos homens presos. ção Interamericana para Prevenir,
Todavia, essa realidade que ultra- Punir e Erradicar a Violência Con-
passa as condições inadequadas de habitabi- tra a Mulher (Convenção de Belém
lidade e salubridade e a recorrência de tortura do Pará) como instrumento inter-
e maus tratos no cotidiano do cumprimento nacional específico de proteção
de penas, soma-se e se agravada por conta é, da mesma forma, severamente
das recorrentes violações de gênero prati- violada. A mulher detida no siste-
cadas contra as mulheres. Apesar de terem ma prisional brasileiro, nas con-
recebido sentenças de restrição de liberdade, dições descritas a seguir, sofre
o que se verifica na prática é que há uma ex- violações decorrentes das carac-
tensão de privações nas unidades prisionais terísticas inerentes à qualidade de
femininas que se caracterizam violações aos pessoa do sexo feminino, quais se-
direitos humanos das mulheres presas. As jam violência física, sexual e sofri-
mulheres não são privadas só de seu direi- mento psicológico” (2007, p. 57).
ensino fundamental incompleto. Em seguida mônio, principalmente por furto e roubo. Ve-
encontram-se os que cursaram até o ensino rificamos nestes dados novamente a questão
fundamental completo: 20.290 mil homens da seletividade de certas pessoas frente ao
e 1.215 mil mulheres. Por certo na realidade sistema penal. Na atual situação do mundo,
sócio-econômica em que vivemos o grau de em que o controle sobre a vida dos homens é
instrução das pessoas depende da classe so- feito pelas relações econômicas, não existem
cial a que pertencem, eis que se fazem parte empregos e oportunidades de uma vida dig-
de famílias com poucos recursos, terminam na para todos. Tal fato se relaciona com um
por deixar os estudos para trabalhar. verdadeiro abismo econômico existente en-
Segundo Baratta (2002) a seletivi- tre as classes sociais, onde algumas têm mui-
dade começa na escola. Isto ocasiona mui- to e outras nada, levando, por conseguinte, a
tas vezes em fatores que auxiliam a pessoa ocorrência dos crimes contra o patrimônio.
cometer um delito, como no caso de parcas A classe hegemônica acha que resolverá os
condições econômicas de sustentar a si e a problemas escondendo nas prisões aqueles
sua família. Demais disso, existe a questão considerados inúteis, os que não fazem parte
da vulnerabilidade de certas pessoas, que do mercado de trabalho, não são consumi-
são selecionadas pelas agências do sistema dores, tornando-se vidas desnecessárias ao
penal, sendo vistas com preconceito. Com atual sistema capitalista.
certeza as pessoas com baixa instrução se Continuando a análise, ainda sobre
tornam vulneráveis, eis que não possuem o perfil do preso, encontram-se os números
conhecimentos de seus direitos, tornando-se totais de delitos tentados e consumados, que
um fácil alvo de arbitrariedades. não se entende importante a essa pesquisa.
Em seguida, existe a quantidade de Na sequência estão os números de presos pri-
presos conforme a nacionalidade, outro pon- mários e reincidentes. Aqui cumpre ressaltar
to que não parece oportuno analisar com base que no caso dos homens a maioria detida se
na teoria levantada. Observa-se apenas que tratam de reincidentes (39.906 mil), confir-
a grande maioria se trata de brasileiro nato mando a falha no sistema penitenciário atu-
(134.063 mil). O dado posterior relaciona-se al, que apenas degrada um ser humano, sem
com a quantidade de presos por tempo total possibilidade de ressocialização e reeduca-
das penas. A maioria das mulheres cumpre ção, impossibilitando que exista outro cami-
pena de 04 anos. Por outro lado os homens nho a não ser o da criminalidade. Além disso,
em sua maioria cumprem pena de 04 a 08 o fato de ter sido encarcerado acaba geran-
anos, dado que se relaciona com a quantida- do um preconceito contra aquele ind ividuo,
de de detentos cumprindo pena em regime continuado a ser visto como um inimigo da
fechado. sociedade e esta, por sua vez, fecha as portas
O próximo dado fornecido que se para que o condenado se ressocialize, como
mostra importante para o presente trabalho, ensina Shecaira. Já no caso das mulheres a
ainda na categoria de perfil do preso, refere- maioria correspondente a 2.480 mil se trata
se com o número de detentos por crimes con- de presas não reincidentes.
sumados e tentados. Ressalta-se que alguns Prosseguindo, observam-se os da-
estabelecimentos não forneceram tais dados. dos relativos à quantidade de presos por fai-
Referente a quantidade de homens presos, xa etária. No caso dos homens (40.479 mil) e
que são considerados mais importantes a este também das mulheres (3.334 mil) são jovens,
trabalho por serem vistos como os estereóti- possuem entre 18 a 24 anos e 25 a 29 anos.
pos dos inimigos da sociedade, dos 135.725 Verifica-se que se tratam de pessoas que não
mil presos no total, 93.954 mil se encontram tiveram chances de acesso ao mercado de
detidos pela prática de crimes contra o patri- trabalho, pois como já exposto possuem uma
instrução baixa. Por certo tais pessoas dificil- tivamente a grande quantidade de pessoas
mente chegaram a uma idade mais avançada, presas, que não são fornecidos tratamentos
tendo em vista a elevada taxa de mortalidade ambulatoriais adequados, assim como fal-
entre elas. tam leitos para gestantes no caso das mu-
A informação seguinte correspon- lheres, apenas 81, em locais onde há gran-
de a quantidade de presos por cor de pele/ de incidência de contaminações e violência
etnia. A maioria dos homens e mulheres são contra os que lá se encontram. Mais uma vez
negros e pardos, sendo 68.134 mil e 3.198 ressalta-se o descaso do Estado, que tem o
mil respectivamente. Isto demonstra a exis- dever de propiciar condições para que todos
tência ainda de um preconceito contra estas vivam com dignidade, desrespeitando o que
pessoas, mantido ao longo dos séculos no di- determina nossa Constituição, configurando
reito penal. Devido a todo processo históri- novamente uma exceção.
co, onde os negros sofreram atrocidades por Os próximos indicadores, relativos
sua cor de pele, vemos que ainda permanece a quantidade de fugas, de abandono, reinclu-
a discriminação de tais pessoas e a sua pre- sões, presos envolvidos em motins e rebeli-
sunção de periculosidade, sendo inimigos em ões, quantidade de óbitos, procedimentos
potenciais, mesmo não se encontrando em disciplinares iniciados e concluídos não se
situação delituosa, as autoridades policiais mostram relevantes neste trabalho, de acor-
sempre os colocam como suspeitos, sendo do com a teoria levantada e o que se pretende
um público permanente para as arbitrarie- confirmar com esta sincrética análise.
dades dessas agências. Por fim, na categoria capacidade
Mudando a categoria para o Trata- de ocupação, observamos o número de va-
mento Prisional, ainda com o preenchimento gas existentes nos estabelecimentos penais,
pelo estabelecimento penal, encontram-se sendo certo que a capacidade existente para
a quantidade de presos que trabalham fora os presos no cárcere é bem menor do que o
dos estabelecimentos (8.307 mil homens e número real de presos. Fato considerado
458 mulheres) e no interior deste (29.934 importante a esta pesquisa é o número de
homens e 2.240 mulheres). Podemos obser- vagas disponíveis para presos provisórios,
var que os números são baixos, se relativos a correspondente a 16. 715 mil no total. Ocorre
toda população carcerária. É certo que o tra- que em todo o Estado de São Paulo existem
balho serve como uma medida de ressociali- cerca de 42.168 mil presos provisórios. Isto
zação, além do benefício da remição. Sendo confirma o grave problema das prisões cau-
assim, o sistema penitenciário de São Paulo telares na América Latina, exposto por Za-
não está apto a promover uma melhoria na ffaroni (2007), sendo que além de superlotar
vida do detento, para que volte ao convívio as prisões, há um desrespeito ao princípio da
da sociedade, deixando os encarcerados em inocência, também previsto na Constituição
precárias situações e sem uma ocupação. Federal.
Ressalta-se que a maioria, correspondente a Diante disso, podemos notar, mes-
14.657 homens e 1.172 mulheres, trabalham mo de forma superficial, a existência de um
ajudando no sistema penal, o que impossi- inimigo no sistema penal brasileiro e em
bilita a aprendizagem de uma profissão para decorrência a abertura de exceções, mesmo
quando deixarem o cárcere e procurarem estando em um Estado de direito. Observa-
uma vaga no mercado de trabalho. se a presença de características comuns a
Na quantidade de leitos, 598 mas- quase toda população carcerária, o que vem
culinos e 22 femininos, verificamos o precá- a confirmar a seletividade sofrida por algu-
rio atendimento prestado aos encarcerados. mas pessoas, conforme sua cor, sexo, grau de
Caso adoeçam vemos por estes dados, rela- instrução etc. Além disso, ressalta-se o pro-
blema do cárcere em nossa sociedade, que se ra confirma a exclusão causada pelo abismo
mostra cada vez mais uma medida precária entre as classes sociais, advindo do sistema
para a reeducação de quem praticou um deli- capitalismo. A marginalização que sofrem
to, atentando gravemente contra a dignidade os pobres, na maioria das vezes privados de
das pessoas. quaisquer direitos e garantias, termina por
incentivar que certos indivíduos sejam mais
5. Conclusão aptos a pratica de delitos, bem como são sele-
cionados pelas agências policiais mais facil-
No Brasil mesmo sob a égide de um mente devido a sua vulnerabilidade.
direito penal pertencente ao Estado demo- No Direito Penal atual, construí-
crático de direito, podemos ver que direitos e do ao longo dos anos por meio de batalhas
garantias não são cumpridos, tornando com travadas com o autoritarismo do Estado e a
que a exceção se torne a regra. O filosofo ita- supressão de garantias, analisa-se que ain-
liano Giorgio Agamben foi quem explicou a da não se pode afirmar a existência de um
situação de exceção dentro dos Estados atu- modelo ideal de um Direito Penal do Estado
ais, intitulados como democráticos de direi- democrático de direito. Pela incapacidade do
to, com maior precisão, alarmando para a Estado de resolver seus conflitos, pelo des-
gravidade que isto pode ocasionar. Na exce- comprometimento dos juristas, pela atuação
ção existe uma regra, uma lei, que em deter- da mídia ou do poder legislativo nas elabora-
minado caso não é aplicada. Assim, no Brasil ções das leis penais, vê-se que o poder puniti-
podemos observar tal situação constante- vo só consegue se efetivar em relação àqueles
mente, com a ação arbitraria das agências do advindos das classes marginalizadas, os quais
sistema penal, bem como em leis penais que são tratados de forma arbitrária, já que nem
confrontam princípios constitucionais. Nes- mesmo conhecem os direitos que possuem.
te diapasão, a existência de um direito penal Por certo os crimes praticados pelas classes
do inimigo, em situações excepcionais, é algo sociais mais elevadas, como crimes econômi-
que no Brasil não pode existir, porque, em cos e tributários, poucas vezes são incrimina-
regra, nos deparamos com um verdadeiro di- dos, sendo que causam muitas vezes ofensas
reito penal que trata de forma desigual deter- de maior grau à bens fundamentais do que os
minadas pessoas, os inimigos. Diante disso, pequenos delitos contra o patrimônio.
a possibilidade da barbárie torna-se possível,
como já assistimos por diversas vezes, tor-
nando-se a vida humana sem valor perante
o que determina o Estado e os detentores do
poder, se trata de uma vida nua.
Analisando um relatório do censo
penitenciário de São Paulo, pode-se confir-
mar, mesmo com dados obtidos sem muita
precisão, que a população carcerária confir-
ma os estereótipos escolhidos pela coletivida-
de. A maioria se trata de homens, com pouca
idade, baixa escolaridade e lá se encontram
devido à prática de crimes contra o patrimô-
nio. Outro elevado número corresponde aos
presos provisórios, pela simples presunção
de periculosidade, como afirma Zaffaroni
(2007). Isso mostra que a situação brasilei-
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ZAFFARONI, Eugênio Raúl. O inimigo no direito penal. Tradução de Sérgio Lamarrão. Rio de
Janeiro: Revan, 2007.
¹Jornalista, graduado pela UNICOC, Ribeirão Preto. Prepara-se para cursar pós-graduação Lato Sensu sobre
Jornalismo Internacional. Atua como webjornalista. E-mail: michelmontefeltro@gmail.com
²Jornalista, graduada pela UNICOC, Ribeirão Preto. Estudou seis meses na Universidad Rey Juan Carlos, como
complemento de sua formação. Atuou como jornalista na EPTV de Ribeirão Preto. E-mail: lala_sdp@hotmail.com
³Jornalista, doutor em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (Brasil), onde investiga so-
bre comunicação e novas tecnologias, em especial mobilidade e Internet. Foi orientador desta pesquisa, desenvol-
vida pelos alunos como trabalho de conclusão de curso. É professor visitante da Universidade Técnica Particular
de Loja (Loja, Equador), onde orienta estudos sobre a mesma temática. E-mail: denis@ojosenelmundo.com
4
Disponível em http://www.oed.com/about/. Acessado em 05/10/2009. O Oxford English
Dictionary (OED) é um dicionário publicado pela Oxford University Press e é considerado um
dos mais conceituados da língua inglesa.
Anos mais tarde, no final do século mandavam para Augsburgo informações so-
XIX, começo do XX, as pessoas assistiram a bre a cotação de determinadas mercadorias
uma revolução nas tecnologias de comuni- nas feiras, do câmbio e ainda dos conflitos
cação e informação. O que levou a formação existentes nas mais diferentes regiões e que
dos meios de comunicação como instituições podia prejudicar a economia e os negócios.
privadas de alcance global, tanto para o jor- As notícias eram transmitidas dentro das
nalismo quanto para o entretenimento – cul- próprias casas bancárias.
tura e diversão. Por causa disso, os meios De acordo com o autor, na época do
de comunicação foram se aperfeiçoando mercantilismo6 houve uma ascensão do jor-
cada vez mais para se adaptarem ao mundo nalismo internacional. Folhas com notícias
que estava se modernizando. Em 1980, por de economia e política de toda a Europa
exemplo, a rede de televisão CNN5, que hoje eram impressas e vendidas a quem quisesse
é uma das referências em jornalismo inter- comprar e não mais circulavam dentro de
nacional começou as transmissões de rede. O um mesmo aglomerado comercial e finan-
fato que a fez ganhar notoriedade foi a cober- ceiro, como acontecia com a casa de Függer.
tura da guerra do golfo, em janeiro de 1991. As informações impressas passaram a ser
compradas por grupos indistintos de pessoas
3. Jornalismo Internacional que mais tarde seriam chamadas de agentes
econômicos.
Segundo Natali (2004, p.19), jornalis-
tas de todo o mundo dizem que o jornalismo Pode-se falar quase que de uma
internacional nasceu em Londres, no século, epidemia de publicações pareci-
no século XIX, quando os periódicos impres- das que floresceu sobre a Euro-
pa na primeira metade do século
sos ampliavam a área geográfica de interesse
XVII. Entre 1610 e 1645, esses
e de cobertura em razão da expansão do im- jornais baseados em informações
pério colonial britânico. Levando as notícias econômicas e políticas estrangei-
sobre Londres a outras partes da Inglaterra. ras já circulavam a Suíça, Áustria,
Mas de acordo com o autor (2004, p.19), esse Hungria, Inglaterra e França (NA-
viés do jornalismo nasceu muito antes disso. TALI, 2004, p. 23)
Ainda segundo Natali (2004, p. 20),
Jacob Függer, um dos banqueiros mais im- Na segunda metade do século XIX, de
portantes da época (séculos XV e XVI) na 1861 até 1865, a Guerra Civil Americana foi
Europa, morava na cidade de Augsburgo, na acompanhada por 150 correspondentes de
Alemanha. O banco dele controlava as jazi- guerra. Os jornais e revistas já estruturados
das de cobre da Hungria e possuía reservas como empresas procuravam obter mais in-
de 4,7 floris, o equivalente a 13 toneladas de formações com menor custo. A idéia, então,
ouro. Com tamanha fortuna, ele financiou a foi a de constituir um local, onde um mesmo
campanha de Carlos V para tornar-se impe- repórter ou uma equipe de repórteres pu-
rador na época do Império Cristão do Oci- dessem produzir material para mais de um
dente. Függer tinha negócios com várias par- órgão de imprensa. Surge então a agência de
tes da Europa, e para se manter informado do notícias.
que acontecia em cada lugar, os agentes dele De acordo com Natali (2004, p. 31),
5
Disponível em http://dn.sapo.pt/inicio/interior.aspx?content_id=601301. Acessado em 25/11/2009. O site
é do jornal português “Diário de Notícias”. A matéria fala sobre o lançamento de um livro que traz a história
rede de TV CNN. Durante a reportagem o jornalista Miguel Gaspar faz um breve histórico sobre a CNN.
6Disponível em http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=746. Acessado em
06/10/2009. Pode-se dizer que o mercantilismo é um conjunto de práticas adotadas pelo Estado absolutista
na época moderna, com a finalidade de obter poder e riqueza. A concepção predominante parte do simples
fato de que a riqueza da nação é determinada pela quantidade de ouro e prata que ela [a nação] possui.
7
Disponível em: http://arturaraujo.blogspot.com/2008/04/o-que-agncia-hoyler-o-que-so-as-agncias.html.
Acessado em 13/11/2009. Artur Araujo é professor mestre em jornalismo e dá aulas na Pontifícia Universi-
dade Católica (PUC) de Campinas e possui um blog com os slides das aulas que ministra na universidade.
sob o ponto de vista informativo. Ele então nacional com jornais da Itália, França, Ale-
transforma o estabelecimento de tradução manha, Inglaterra e Estados Unidos. Inovou
de correspondência estrangeira, que havia em vários aspectos jornalísticos, o que aju-
adquirido em 1832, e cria um serviço de di- dou a construir sua imagem de credibilidade
fusão de informações, conhecida como Agên- e prestígio. Em 1980, foi o primeiro jornal da
cia Havas. Mais tarde a Havas deu origem a Espanha a criar um Estatuto da Redação e a
uma das agências de notícias internacionais figura do ombudsman10.
mais importantes do mundo, a France Pres- Fundado no dia 04 de maio de 1976,
se (AFP). A partir daí começa a história das por José Ortega, Jesús de Polanco e Juan
agências de notícias internacionais em todo Luis Cebrián, o jornal nasceu num período
o mundo. de transição política do regime ditatorial
Havas marcou a evolução do campo para a democracia. Seis meses após a morte
jornalístico. A fundação da agência dele ins- do general Francisco Franco (1892 – 1975),
pirou a criação de outras, dois de seus anti- que liderou o período de ditadura na Espa-
gos colaboradores, Wolff e Reuter, fundaram nha e presidiu o país por 34 anos. Em sua
a Agência Wolff na Alemanha (1848) e a linha editorial, o El País ressaltava defesa à
Agência Reuter na Inglaterra (1851), respec- liberdade e apoio a essa mudança política e
tivamente. Em 1848, uma cooperativa de seis social11.
jornais nova-iorquinos fundava a Associated Em 1977, o jornal cria e pública o “Li-
Press. vro de Estilo do El País”12. Referência ainda
hoje para jornalistas não só espanhóis, mas
5. O jornal El Pais de diferentes partes do mundo. Apesar de
publicado e comercializado, o Grupo PRISA
O El País, propriedade do Grupo PRI- define o livro como um “código interno de re-
SA8, é o jornal diário de conteúdo geral com dação que recorre além das regras formais de
maior difusão e influência na Espanha. O jor- expressão, mas cláusulas de conduta essen-
nal se define como “um diário independente, ciais sobre como os profissionais do diário
de qualidade, vocação européia e defensor da devem realizar suas tarefas”13.
democracia pluralista”9, de acordo com seus Em 1981, no dia 23 de fevereiro, o
primeiros editoriais. jornal ganhou credibilidade após ao 23-F,
Com sede em Madri, possui hoje oito episódio em que um grupo de guardas civis
edições regionais na Espanha. Além de qua- tentou dar um golpe de Estado contra o Par-
tro edições internacionais, na Alemanha, lamento. Antes mesmo que o Rei Juan Car-
Bélgica, México e Argentina, onde se publi- los I se pronunciasse na televisão espanhola
ca uma edição global que é distribuída pela condenando o golpe, o El Pais publicou uma
América Latina. edição especial do jornal intitulada “El Pais,
Ao longo de sua história, o El País Con La Constituición”. Foi o primeiro diário
firmou vários acordos de colaboração inter- que saiu às ruas naquela noite posicionando-
8
Disponível em http://www.prisa.com/areas-actividad/elpais/. Acessado em 18/09/2009.
9 Idem.
10 Disponível em http://www.elpais.com/fotogalerias/popup_aninacion.html?xref=20041011el
pepusoc_2&k=breve_historia_pais. Acessado em 18/09/09.
11 Disponível em http://www.revistalatinacs.org/09/art/05_804_03_Brasil/Denis_Porto_
Acessado em 18/09/09.
13 Idem.
14 Disponível em http://www.elpais.com/fotogalerias/popup_aninacion.html?xref=20041011
elpepusoc_2&k=breve_historia_pais. Acessado em 19/09/09.
15 Idem.
16 Ibidem.
17 Disponível em http://www.prisa.com/areas-actividad/elpais/. Acessado em 20/09/09.
como aconteceram.
Também é possível concluir que o jor-
nal constrói uma imagem de dependência da
América Latina em relação aos Estados Uni-
dos, principalmente Cuba. Foram publicadas
13 matérias que citavam de alguma forma,
sutil ou não, essa relação de dependência.
Apenas de Cuba, foram sete matérias. O jor-
nal se mostrou muitas vezes claramente con-
tra os governos de Cuba e Venezuela, criti-
cando Castro e Chávez.
Os governos das nações latino-ame-
ricanas foram retratas como esquerdistas e
o Brasil como líder na região. Sobre o Brasil
houve ainda uma contradição em duas maté-
rias. Uma delas publicou que com a doença
de Dilma Rousseff começou uma discussão
no Partido dos Trabalhadores e no país sobre
uma possível reforma na Constituição para
permitir o terceiro mandato do presidente
Lula. Já a outra, publicada poucos dias de-
pois, disse que surgiu um boato e não uma
discussão oficial.
Foram abordados também temas
como a violência de presos políticos e o nar-
cotráfico em diferentes países do continente.
Por esses motivos, conclui-se que
a imagem da população latino-americana
é construída sutilmente de forma negati-
va pelo El País. Abordando apenas temas
que mostram as fragilidades do continente,
aumenta-se no público espanhol a crença de
inferioridade e dependência destes povos em
relação às maiores potências mundiais.
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Acessado em 10/11/2009.
p.21) não existe uma definição única de con- Embora muitos elementos interfiram
texto, ou seja, não há um conceito padrão na interpretação de textos por parte dos alu-
definido para determinar o significado de nos, a presente pesquisa aborda apenas as-
contexto. pectos relacionados aos fatores de coesão e
Com base em análises no contexto de coerência, os principais podem comprometer
situações, Hyme (apud KOCH, 2003, p.22) ou facilitar o entendimento do texto. Nesse
caracteriza contexto como um esquema que sentido, percebe-se a necessidade apresentar
contempla elementos diversos, tais como: os conceitos desses dois elementos, antes de
cenário e/ou lugar, falantes, propósitos e re- analisar sua influência na interpretação de
sultados, sequência de atos, normas de inte- textos, a fim de que seja possível ampliar as
ração e interpretação e gêneros textuais. possibilidades de pesquisas, estudos e rees-
Nessa perspectiva, entende-se que truturação de ideias.
para que um texto seja iniciado, é preciso
definir um lugar ou cenário onde os fatos 3.1 Definição e relação entre coesão e
acontecerão, os participantes que dele farão coerência
parte - distribuídos em falantes e ouvintes -
além do conteúdo ou mensagem que deseja De acordo com Koch e Travaglia
ser emitida, obedecendo a regras e a normas (1993), a coesão é um fator que facilita a re-
para que seja possível que o ouvinte e/ou lei- lação com a coerência, embora não seja um
tor compreenda. É necessário ainda a defini- fator indispensável para que exista a coerên-
ção de finalidades e propósitos. cia. Na verdade, a coesão ajuda a perceber a
No entendimento de Platão e Savioli coerência na compreensão do texto. De acor-
(2005), contexto é definido da seguinte forma: do com os autores, “coesão é, então, a ligação
entre os elementos superficiais do texto, o
É a unidade maior em que a uni- modo como eles se relacionam, o modo como
dade menor está inserida. Assim, as frases ou partes delas se combinam para
a frase (unidade maior) serve de assegurar um desenvolvimento proposicio-
contexto para a palavra; o texto,
nal” (KOCH; TRAVAGLIA (1993, p.13-14).
para a frase, etc. O contexto pode
ser explicito, quando é expresso Para Halliday e Hansan (apud KOCH;
com palavras, ou implícito, quan- TRAVAGLIA, 1993, p.14) a coesão está relacio-
do está embutido na situação em na às relações de significado que existem den-
que o texto é produzido (PLATÃO; tro do texto, ou seja, é o que faz dele um texto e
SAVIOLI, 2005, p.14-15). não uma sequência de frases sem sentido.
De acordo com Beaugrand e Dress-
Logo, é possível concluir que contexto ler (apud KOCH; TRAVAGLIA, 1993, p.16),
engloba um conjunto de conhecimentos lin- a coesão é o meio pelo qual os elementos do
guísticos que possibilitam uma situação co- texto se encontram relacionados entre si.
municativa. Ele adquire muita importância Com o objetivo de exemplificar como
na Lingüística Textual, que revolucionou a a coesão pode estar presente em um texto,
maneira de analisar os textos. Antes, o texto Cabral (2009) menciona um trecho de Jor-
era considerado em si, como algo fechado, dão e Bellezi (2007):
atualmente, analisa-se todas as referências
extratextuais que possam auxiliar na com- Os sem-terra fizeram um protesto
preensão. em Brasília contra a política agrá-
ria do país, porque consideram in-
3. Fatores de Coesão e Coerência e a Inter- justa a atual distribuição de terras.
Porém o ministro da Agricultura
pretação de Textos
considerou a manifestação um ato
de rebeldia, uma vez que o proje- ída pela expressão “capital do Brasil”.
to de Reforma Agrária pretende Diante da importância dos termos de
assentar milhares de sem-terra coesão para melhor compreensão da mensa-
(JORDÃO; BELLEZI, 2007 apud
gem, também se torna necessário ressaltar o
CABRAL, 2009, p.1).
valor da coerência. Na definição de Franck
(apud KOCH; TRAVAGLIA, 1993, p.15) coe-
De acordo com a autora, os termos
rência significa:
destacados têm a função de unir as partes do A conexão formal e de conteúdo
texto, ou seja, são responsáveis pela coesão entre elementos seqüenciais (fra-
textual. Cabral (2009) esclarece que vários ses, enunciados, atos de fala etc.)
recursos estão associados à coesão de textos, que coloca estes elementos em re-
entretanto, a autora destaca: lação uns com os outros e o insere
numa forma de organização su-
• Palavras de transição – trata-se de perior como, por exemplo, nomes
em uma lista, frases em um texto,
palavras que estabelecem a inter-relação en-
atos de fala numa sequencia (dia-
tre os enunciados, sejam frases, orações ou lógica) etc.
parágrafos. Podem ser representadas por
preposições, conjunções, alguns advérbios e A coerência trata da continuidade dos
locuções adverbiais e podem indicar uma in- sentidos, ou seja, trata-se da “configuração
trodução (inicialmente, primeiramente, antes de conceitos e relações subjacentes à super-
de tudo), uma continuação (além disso, bem fície do texto e são mutuamente acessíveis e
como), conclusão (afinal, portanto, enfim), relevantes” (p.16).
tempo (enquanto isso, ocasionalmente, atu- A coerência está intimamente ligada
almente), conformidade (conforme, de acor- com a boa formação do texto, numa situação
do com, igualmente), causa e conseqüência comunicativa entre os usuários, fazendo com
(por isso, daí, assim), ou esclarecimento (isto que o texto faça sentido para os mesmos.
é, ou seja, quer dizer). Alguns exemplos são Sendo assim, está direcionada à interpreta-
mencionados a fim de ilustrar as possibilida- bilidade do texto e à capacidade que cada re-
des de coesão textual. ceptor tem de entender e compreender o seu
sentido. Porém, faz-se necessário esclarecer
• Coesão por referência – diz respeito que a coerência é vista também como uma
às palavras que têm a função de fazer refe- continuidade de sentido perceptível no texto,
rência. mas essa percepção não está ligada à grama-
- pronomes pessoais: eu, tu, ele, me, te, os... ticalidade apenas, pois, enquanto a coesão é
- pronomes possessivos: meu, teu, seu, nosso... explicitamente revelada por meio de marcas
- pronomes demonstrativos: este, esse, aquele... linguísticas presentes na superfície textual,
- pronomes indefinidos: algum, nenhum, todo...
a coerência é ao mesmo tempo semântica e
- pronomes relativos: que, o qual, onde...
- advérbios de lugar: aqui, aí, lá...
pragmática e, embora esses dois fatores pre-
(CABRAL, 2009, p.2). dominem, ela possui dimensão sintática gra-
matical e linguística. Koch; Travaglia (2008)
• Coesão por substituição – ocorre afirmam que:
quando o nome (de pessoa, lugar, objeto,
etc), verbos, períodos ou trechos do texto A coerência está diretamente liga-
são substituídos por uma palavra ou expres- da a possibilidade de estabelecer
são que se aproximem no sentido, evitando, um sentido para o texto, ou seja,
assim, a repetição do nome no decorrer do ela é o que faz com que um tex-
texto. A palavra Brasília, por exemplo, em to faça sentido para os usuários,
outros momentos do texto pode ser substitu- devendo, portanto ser entendido
4. Conclusão
Referências bibliográficas
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KOCH, Ingedore Villaça; TRAVAGLIA, Luiz Carlos. A coerência textual. 14.ed. São
Paulo: Contexto, 2002.
É notável que a educação brasileira em seu sistema. Após esse momento e até
encontra-se com dificuldades, dados do IBGE nos dias atuais a democratização do ensino
e INEP confirmam essa afirmação ao indicar tem estado nos discursos políticos em busca
que muitas crianças ainda estão fora da es- da igualdade social, porém mesmo com au-
cola, mesmo no ensino fundamental, nível mento na oferta de vagas ainda grande par-
que teoricamente seria obrigatório a todos, e te da classe popular continua fora da escola
muitos que estão na escola não saem aptos ou não permanece nela, mesmo no ensino
para a convivência nessa nova sociedade que fundamental, nível obrigatório assegurado
se baseia na leitura e escrita. Constitucionalmente (SOARES, 2002).
Também se observa fatores muito pre- Segundo Soares (2002), as classes
sentes na educação, tais como a evasão e a re- populares viveram e vivem até hoje uma luta
petência, pois muitas crianças entram no sis- constante para acesso a escola pública: “Nes-
tema escolar, mas são obrigados a abandonar ta luta, porém o povo ainda não é vencedor,
o ensino, por diversos motivos, como ter que continua vencido: não há escola para todos, e
contribuir para um aumento da renda fami- a escola que existe é antes contra o povo que
liar, desencadeando um trabalho precoce, ou para o povo” (SOARES, 2002. p. 9).
por se deparar com um sistema que valoriza Ainda Soares (2002) prova que não
somente os costumes, valores e linguagem da há escola para todos ao mostrar dados do
classe dominante, fazendo com que os domi- censo realizado no ano de 1980, indicando
nados, sintam-se excluídos e marginalizados que cerca de 30% de crianças brasileiras de 7
do sistema escolar (SOARES, 2002). a 14 anos, encontravam-se fora da escola e ao
Segundo Soares (2002) na sociedade fazer análise dos dados por Estado, é possível
atual a necessidade da leitura e escrita se faz notar que em muitos estados metade da po-
cada vez mais presente, uma vez que, tudo pulação dessa mesma faixa etária encontra-
gira em torno desse mundo letrado, além da se fora da escola. E ainda mostra que a escola
grande era tecnológica que sofre constantes é antes contra o povo que para o povo, ao evi-
mudanças e está alicerçada na escrita, conse- denciar que estatisticamente de cada 1000
quentemente pessoas que apenas conseguem crianças que iniciam a 1ª série, menos da me-
decifrar o código escrito não conseguem se tade chega à 2ª, menos de um terço consegue
inserir nessa nova sociedade. Portanto não atingir a 4ª, e menos de um quinto conclui o
basta ser apenas alfabetizado, mas sim saber 1º grau, mostrando assim, as elevadas taxas
utilizar as práticas de leitura e escrita nas di- de evasão e repetência.
versas atividades cotidianas. Para uma possível transformação do
A democratização do ensino tem sido quadro educacional é necessário a mobili-
defendida desde 1882, por Rui Barbosa, ao zação e o investimento nos profissionais da
analisar a educação e perceber grandes falhas educação e na sua formação, é de extrema
¹Este artigo é fruto de pesquisa realizada como Trabalho de Conclusão de Curso, para a Graduação em
Pedagogia – Licenciatura, das Faculdades COC, realizado sob orientação da Profa. Dra. Marina Caprio.
De acordo com Goulart (2000), para A autora diz que o letramento é de-
formar cidadãos capazes de ler e interpretar corrente das sociedades grafocêntricas, pois
o que lêem, o modo de se ensinar deve se mo- tecnologia se desenvolve de maneira acelera-
dificar. Os educadores precisam levar textos da, utilizando-se primordialmente da escri-
do cotidiano dos educandos para as salas de ta, por isso ser alfabetizado não basta para
aula, além de permitir que os alunos iniciem acompanhar toda a evolução.
sua escrita da maneira que consideram cor- Ela explica que o surgimento do con-
retas, ou seja, inventada, para que no decor- ceito de letramento no Brasil, ocorreu desde
rer do processo cheguem próximos a escrita os tempos de Brasil Colônia, pois até recen-
convencional, além de respeitar a individua- temente, o problema era o analfabetismo, e
lidade de cada aluno. ao ser parcialmente resolvido, abriu espaço
Estes métodos auxiliam no processo para o letramento.
de alfabetização, portanto não pode-se deixar De acordo com Soares (2000) alfabe-
de lado o letramento, pois segundo Oliveira tização é um elemento indispensável do le-
(2005), mesmo o aluno dominando o código tramento e sendo assim, não se distinguem,
escrito, ele ainda necessita desenvolver a flu- ou seja, deve-se alfabetizar letrando.
ência de leitura e escrita, pois sem esta fluên-
Alfabetizar letrando significa
cia ele pode até compreender um texto, mas
orientar a criança para que apren-
não conseguirá redigir um texto. da a ler e a escrever levando-a a
De acordo com Soares (2000), letra- conviver com práticas reais de
mento é a capacidade do aluno de saber ler e leitura e de escrita, substituindo
escrever, mas não apenas ler, e sim interpre- as tradicionais cartilhas por livros,
tar os diversos textos que fazem parte do dia- por revistas, por jornais, enfim,
a dia, como jornais, cartas, bilhetes, receitas, pelo material de leitura que cir-
documentos pessoais, sem dificuldade. cula na escola e na sociedade, e
criando situações que tornem ne-
E para Kleiman (2007) letramento
cessárias e significativas práticas
focaliza no ensino e na aprendizagem dos de produção de textos. (SOARES,
aspectos sociais da língua escrita, portanto 2000, p.3)
assumir o letramento na aprendizagem dos
alunos implica em alfabetizar através de Ainda do ponto de vista da autora su-
práticas sociais trazidas de experiências dos pracitada durante o processo de escolariza-
educandos, levando em conta a diversidade ção o letramento deve ser responsabilidade
existente nas salas de aula. de todos os professores, pois, em todas as
Novamente de acordo com Soares disciplinas os educandos aprendem lendo e
(2000), o termo letramento ainda não está escrevendo e ao escolher os gêneros para se
presente nos dicionários, mesmo havendo trabalhar em sala de aula os critérios devem
arquivos e documentos que venham com esta ser bem fundamentados, afastando assim, os
palavra de título. O letramento não foi intro- aspectos negativos e o exagero na utilização
duzido pela mídia nem pelas escolas e profes- de diferentes gêneros.
sores, estando presente apenas no espaço de Já que o letramento é responsabili-
pesquisas. Portanto o conceito de letramento dade de todos os professores, sua formação
surgiu quando a alfabetização tornou-se in- e sua prática deve sempre estar em questão,
satisfatória, desde que passaram a pensar refletindo o que deve ser melhorado, para
sobre analfabetismo funcional -UNESCO na assim promover uma educação de qualidade
década de 70 - e perceberam que saber ler e para todos.
escrever sem saber fazer uso dessas habilida- Segundo Santos e Bernardes (2003),
des eram insuficientes. os cursos de formação de professores estão
deixando a desejar, além de que, quando es- te dono exclusivo do saber tem o seu papel
ses docentes chegam às escolas se deparam modificado, pois o acesso as informações se
com apego aos modelos tradicionais de ges- tornam mais fáceis e rápidas, porém a escola
tão escolar, não permitindo mudanças, além não conseguiu ainda se adaptar a essa nova
de se depararem com reivindicações pela va- realidade, permitindo que o alfabetizador
lorização docente. passe a ser muito criticado. (SANTOS e BER-
Para Kleiman (2008) há alguns anos NARDES, 2003).
atrás o maior questionamento não era sobre Santos e Bernardes (2003), destacam
como o professor ensinava a ler e escrever, ainda que os cursos de formação inicial de
mas sim sobre a sua própria competência de professores mantêm a dicotomia teoria/prá-
conseguir fazer uso das práticas de leitura e tica, pois acreditam que ao ensinar a técnica,
escrita, uma vez que, uns nem conheciam a os professores se tornam aptos a desempe-
matéria que deviam ensinar, não liam e nem nhar um papel profissional de qualidade. E
escreviam corretamente. os cursos de formação continuam não apre-
A partir dos estudos de Santos e Ber- sentando resultados significantes.
nardes (2003), embasados nos teóricos Mag- Para Santos e Bernardes (2003) a
da Soares, Antônio Nóvoa e Sônia Kramer, mudança da realidade educacional depende
fica notável que a necessidade de alfabeti- da formação de professores, estes devem ser
zadores mais qualificados, não é atual e sim vistos como agentes construtores de conhe-
desde as primeiras décadas do século XIX e cimento.
o que é nítido são cursos de licenciaturas su- Segundo Brito (2006) a formação
perficiais que deixam grande lacuna, ao for- do profissional da educação para as séries
mar alfabetizadores despreparados. iniciais do ensino fundamental muitas ve-
Para Santos e Bernardes (2003) a for- zes parece não ser tratada com seriedade e
mação de professores está longe da realidade, compromisso, e ao longo dos anos o trabalho
ela necessitaria formar alfabetizadores que se docente passou por várias transformações,
vêem como produtores de conhecimentos. pois o educador não é mais considerado ape-
Santos e Bernardes (2003) defende nas transmissor de conhecimentos, e sim um
que se deve levar em consideração a histó- profissional reflexivo, com capacidade de re-
ria de vida de cada professor, considerando formular e criar um novo sentido ao seu fazer
que a maneira de viver dentro e fora da es- pedagógico.
cola deve ser estudada e que sua identidade Brito (2007) ressalta que para o pro-
e cultura oculta interferem no seu trabalho cesso de alfabetização ser de qualidade os
diário. cursos de formação de professores devem
“A formação dos alfabetizadores é um prepará-los para lidar com uma sala com di-
processo longo e complexo. Longo porque ferentes níveis de desenvolvimento, uns em
deverão estar sempre estudando. Comple- processo de alfabetização, outros em desen-
xo, porque não se tem um modelo pronto e volvimento de suas habilidades de escrita, ou
acabado, ideal para cuidar de sua formação” ainda em diferentes níveis de letramento.
(SANTOS e BERNARDES, 2003, p.10). Gauthier et al (1998, apud CAMPE-
Santos e Bernardes (2003) a partir de LO, 2002.) mostra que um processo de ensino
pesquisas notaram que os cursos de formação aprendizagem eficaz exige que a formação do
de professores não conseguem articular teoria professor seja adequada fazendo com que o edu-
e prática, não conseguem identificar os pro- cador tenha domínio de diversificados conheci-
blemas mais comuns na busca de soluções. mentos, sendo nas áreas disciplinares, curri-
E o que agrava ainda mais o proble- culares, das ciências da educação, da tradição
ma é que com as novas tecnologias o docen- pedagógica, experiências da ação pedagógica.
Brito (2007) enfatiza que por muito Também para Brito (2007) é de extre-
tempo o uso das cartilhas predominou e com ma importância a valorização da língua oral e
isso todos os alunos eram vistos como papéis suas diferentes formas de uso como ponto de
em branco que deviam ser moldados, como partida para a construção da escrita e tam-
também, vistos de forma homogênea, sem bém a compreensão de que a escrita infantil
considerar que cada um tem uma forma úni- é resultante de suas experimentações e hipó-
ca de aprendizagem e cada um se encontra teses não devendo ser vista como erro.
em um nível de desenvolvimento. Portanto os docentes devem ser me-
Santos e Bernardes (2003) concorda lhores preparados para entender a dinâmica
com a autora ressaltando que as práticas do- da aprendizagem, para que deixe de cometer
centes tem se resumido ao ensino da leitura sérios equívocos como o ensino da escrita
e escrita totalmente desvinculado com a rea- de forma mecânica e técnica, mas sim voltar
lidade, não trabalhando com textos da reali- atenção para a formação de alunos reflexivos,
dade social. Para Santos e Bernardes (2003, capazes de usar a leitura e escrita nas práti-
p.9) “O ensino de leitura estaria calcado na cas cotidianas. E um passo para isso é trans-
responsabilidade do alfabetizador de fazer ferir o enfoque do como ensinar para como o
com que a criança seja leitora e não simples- aluno aprende (BRITO, 2007).
mente alfabetizada”.
Com base nas pesquisas sobre letra-
mento a criança está em constante contato
com a escrita em diversos momentos na so-
ciedade letrada, entende suas funções e per-
cebe que a escrita aparece de diversas ma-
neiras como em um bilhete, jornal e revista,
dessa forma, a escola deve abrir espaço para
o letramento, levando para dentro das salas
de aula textos das práticas sociais (BRITO,
2007).
E ainda conforme Soares (1998, apud
BRITO 2007) existem diferentes níveis de
letramento dependendo da necessidade do
contexto e sendo assim a aprendizagem da
escrita não ocorre de forma linear é um com-
plexo processo que se constrói em cada indi-
víduo de forma diferente.
Para Brito (2007) as crianças que
chegam as escolas públicas são capazes de
aprender ler e escrever, o que falta são os
professores identificarem os níveis de desen-
volvimento de cada um, para que as ativida-
des sejam pertinentes para que avancem ain-
da mais e compreendam a real função social
da língua.
O professor deve ser capaz de refletir
sobre sua prática e conhecer profundamen-
te os conhecimentos lingüísticos (BRITO,
2007).
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SOARES, Magda Becker. Linguagem e Escola: Uma Perspectiva Social. São Paulo: Ática, 2002.
ria e, finalmente, elementos para avaliações jada, e num ritmo próprio, regulado apenas
parciais e finais. pelo desejo de aprender e pela capacidade
Assim, pode-se dizer que a caracte- de assimilar e digerir o que se encontra pela
rística básica da EaD é o estabelecimento de frente, não é viável chamar essa experiência
um processo educativo que permita comu- de ensino a distância, como se fosse a In-
nicação e interação entre professor e aluno, ternet que ensinasse, ou como se fossem as
que se encontram distantes no espaço e no pessoas que estão por trás dos materiais que
tempo. ensinassem. Trata-se, outrossim, de apren-
dizagem mediada pela tecnologia, aprendi-
2.2. Educação, Ensino e Aprendizagem zagem não decorrente do ensino, portanto,
à Distância uma autoaprendizagem.
As palavras de Moran (2006, p. 22)
Para Chaves (1999) não resta dúvida sintetizam esta nova visão de educação, uma
de que a educação pode acontecer por meio educação inovadora, como no fragmento que
do ensino a distância. Porém, que a educa- segue.
ção pode acontecer por meio da autoapren-
dizagem, que não é provocada por nenhum Aprendemos melhor quando vi-
processo formal de ensino, mas que acontece venciamos, experimentamos,
por meio de interações com a natureza, com sentimos. Aprendemos quando
relacionamos, estabelecemos vín-
outras pessoas e com o meio cultural em que
culos, laços entre o que estava sol-
vive. Segundo o mesmo autor, a aprendiza- to, caótico, disperso, integrando-o
gem que assim ocorre é mais significativa em um novo contexto, dando-lhe
(acontece com mais facilidade, é retida por significado, encontrando um novo
mais tempo, é mais facilmente transferida sentido. Aprendemos quando
para outros domínios e contextos, entre ou- descobrimos novas dimensões de
tros) do que a aprendizagem que decorre de significação que antes se nos esca-
processos formais e deliberados de ensino pavam, quando vamos ampliando
o círculo de compreensão do que
(i.e., através da instrução).
nos rodeia, quando como numa
De acordo com Chaves (1999) nas cebola, vamos descascando novas
novas tecnologias à nossa disposição, em es- camadas que antes permaneciam
pecial na Internet, e dentro da Internet, na ocultas à nossa percepção, o que
Web, destaca-se não o fato de que podemos nos faz perceber de outra forma.
ensinar a distância com o auxílio delas: é que Aprendemos mais quando estabe-
elas nos permitem criar ambientes ricos em lecemos pontes entre a reflexão e
possibilidades de aprendizagem, nos quais a ação, entre a experiência e a con-
ceituação, entre a teoria e a práti-
que pessoas interessadas e motivadas podem
ca; quando ambas se alimentam
aprender quase qualquer coisa sem precisar mutuamente. Aprendemos quan-
de um processo de ensino formal e delibera- do equilibramos e integramos o
do. sensorial, o racional, o emocional,
Entretanto, quando alguém usa os o ético, o pessoal e o social. Apren-
recursos hoje disponíveis na Internet para demos pelo prazer, porque gosta-
aprender de forma explorativa, automoti- mos de um assunto, de uma mídia,
vada, ele usa materiais de natureza diversa, de uma pessoa. O jogo, o ambien-
te agradável, o estímulo positivo
preparados e disponibilizados em momentos
podem facilitar a aprendizagem.
e contextos os mais variados, não raro sem “Aprendemos mais, quando con-
nenhuma intenção didática, numa ordem to- seguimos juntar todos os fatores:
talmente imprevisível e, portanto, não plane- temos interesse, motivação clara;
desenvolvemos hábitos que facili- gia dos sistemas educacionais para atender
tam o processo de aprendizagem; a grupos heterogêneos da sociedade que por
e sentimos prazer no que estuda- inúmeras razões não tiveram acesso a ser-
mos e na forma de fazê-lo.
viços educativos regulares. Partindo desse
Aprende-se com a realidade e a mes- ponto podemos afirmar que essa modalida-
ma está em constante movimento, e cabe a de de ensino evidencia-se como uma forma
nós enquanto profissionais da área de educa- de superar as dificuldades relacionadas a
ção criarmos situações que propiciem a nos- situações geográficas, sociais, econômicas e
sos alunos o prazer em aprender. profissionais, visto que permite a democra-
Assim, a tecnologia, com seu leque de tização do acesso a cursos de formação em
informações, pode ser vista como ferramenta in- diferentes áreas do conhecimento.
dispensável no processo ensino-aprendizagem. Assim, considerando o contexto mun-
dial de mudanças aceleradas em todas as di-
2.3. Novo Paradigma Educacional e a mensões da vida social que exigem adapta-
Educação a Distância ções dos sistemas educacionais a educação
a distância vem adquirindo reconhecimento
Segundo Lopes; Newman; Salva- como uma modalidade de educação apro-
go (2003) um novo paradigma educacional priada para o alcance de metas de políticas
aflora, e as pessoas precisam estar prepara- públicas, especialmente em países como o
das para aprender ao longo da vida, podendo Brasil, onde há grande dispersão geográfica
intervir, adaptar-se e criar novos cenários. dos alunos. E embora ela seja relativamente
Neste paradigma, a visão de fragmentação recente no país, devemos destacar iniciativas
e divisão vem sendo superada, marcando a ou movimentos que contribuíram de forma
sociedade do conhecimento, propondo a to- significativa para que tal modalidade fosse
talidade, reassumindo o todo. criando ao longo dos anos uma nova metodo-
Essa conscientização levará o profes- logia para a disseminação do conhecimento
sor a questionar a didática do “ensino-apren- (BELLONI, 2001).
dizagem” que prevê quem ensina (o profes- Além disso, tal modalidade de ensino
sor) e quem aprende (o aluno). Demo (2001, evidencia que o ciberespaço será o principal
p. 15) efetivamente derrota essa prática como ponto de apoio de um processo ininterrupto
“instrucionismo, pois este apenas ensina, de aprendizagem e ensino da sociedade por
treina, inculca, domestica”. Demo refere-se à si mesma. E assim será possível confirmar as
alusão de Paulo Freire em falar da “politici- perspectivas dos compromissos assumidos
dade da aprendizagem”, pois, para o autor, em conferências internacionais de educação,
“....aprender sempre acarreta a formação de isto é, “o direito de aprender por toda vida”
um sujeito capaz de construir sua própria au- (ROCHA; LIMA, 2008).
tonomia crítica e participativa”.
Nesta perspectiva, o Ensino a Distân- 2.4. Autonomia do Aluno no Ensino a
cia aparece como uma possibilidade, uma Distância
alternativa pedagógica. As necessidades se
diferem em cada período da história da hu- Segundo Moore (1996), a “autonomia
manidade, pois surgem novas necessidades do aluno”, é uma medida que permite que
na convivência social, e em especial no mer- seja o aluno e não o professor a determinar
cado de trabalho e consequentemente a edu- os seus objetivos de aprendizagem. Tal com-
cação precisa acompanhar esse processo. portamento para Malcolm Knowles deveria
Barreto (2006) apresenta a EAD ser natural para o adulto, que constitui, na
(Educação a Distância) como uma estraté- verdade, o tipo de pessoa, que já tem o seu
psicológicos, sociais e técnicos a serem en- tudo mais outro menos, tiro minhas dúvidas
frentados pelos participantes de um proces- com a tutora ou na internet”.
so ensino/aprendizagem no contexto digital “Só no horário escolar, porque tenho
(LOPES; NEWMAN; SALVAGO, 2003). muito pouco tempo, então não dá pra estu-
dar em casa e tirar as dúvidas só na escola
3. Resultados da Pesquisa Empírica mesmo”.
“Posso dizer que 90% sim (tem tem-
Para alcançarmos os objetivos pro- po). Uma média de 3 dias por semana. Tiro
postos neste estudo, buscamos esclarecer minhas dúvidas em livros, tele curso e TV”.
as dificuldades que os alunos encontram no
processo do Ensino à Distância em uma ins- Quando foi pedida uma comparação
tituição de ensino na cidade de Jaú, interior com o ensino de hoje e o ensino que obtive-
do Estado de São Paulo. ram no passado, a maioria respondeu que:
O instrumento de coleta de dados foi “o ensino de hoje está mais avança-
uma entrevista semi-estrutura, definida em 5 do, mais aproveitado de que no passado, só
dimensões, sendo que este trabalho centrou deveria as aulas ser mais longas, e muita
sua análise nas dimensões 2 e 3, que dizem pouca hora para as aulas”.
respeito às dificuldades que os alunos encon- “ o ensino está mais atualizado, a lei-
tra no estudo a distância. tura está mais presente no dia a dia”.
Observou-se que quanto à classifica- “O que antes era bom, agora melho-
ção na faixa etária, 78% estão entre 15 a 20 rou bastante”.
anos. Constata-se que nesta faixa etária o in- “Hoje o ensino obtém mais dificulda-
dividuo encontra-se no auge de suas funções de para mim na área de matemática, pois
físicas, psíquicas e intelectuais. Sendo que ouve muitas mudanças em relação de letras,
22% então acima de 45 anos. e muitas contas em uma.”
Ao analisarmos cada uma das catego-
rias, trazemos as falas dos alunos como evi- Quando perguntados quanto ao tem-
dências de poder argumentativo, como colo- po que voltou a estudar e quais as mudanças
ca Demo (1998), possibilitando-lhes assumir observadas em relação ao seu aprendizado,
o lugar que lhes deve ser atribuído, ou seja, o ou seja, o que as mudanças ocorridas acres-
lugar dos principais atores deste processo de centaram em suas vidas, conferimos algumas
aprendizado. das respostas:
Questionando-se quanto às dificulda-
des que eles encontram para desenvolver seu “Por enquanto não mudou nada em
conhecimento, 100% dos entrevistados dis- minha vida, faz três meses que voltei a es-
seram que é a falta de tempo para estudar so- tudar, mas até lá (no final do curso) sei que
zinhos. A maioria é do sexo feminino, e, além vai mudar.”.
de trabalharem fora, também têm atividades “Voltei a estudar há oito meses. Vejo
do lar, filhos para cuidar, ficando muito difí- que em termos de conhecimento melhorou
cil para estudar, conforme apontaram. muito, abriu uma forma de enxergar outras
Para um total de 80%, o tempo dedi- possibilidades”.
cado ao estudo é somente no horário escolar, “A explicação é melhor com as aulas
e tirar as dúvidas, somente no dia de aula. de vídeo, você aprende mais e tudo o que é
Podemos conferir estas considerações em al- passado e sempre bem explicado”.
gumas falas: “Voltei a estudar há três meses, estou
“Eu estudo em casa também, não te- me sentindo mais segura, mais atualizada”.
nho horário certo para estudar. Um dia es- “Voltei a estudar depois de 12 anos
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plasticidade e generalização.
Figura 3. Perceptrons ligados formando
uma camada para entrada de sinais e uma única
Neurônio para saída.
5. Agradecimentos
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dade, a decisão dos sujeitos de pesquisa são As empresas pesquisadas têm como
intencionais, em função de características uma característica comum o reconhecido
específicas. sucesso em seus setores, mais de 13 anos de
Assim, este trabalho pode ser classi- atividades, número de funcionários superior
ficado como sendo um estudo exploratório e ou igual a 30, atuam em setores altamen-
multicaso observacional, pois, parte da análi- te competitivos, estão divididas em setores
se do processo de formulação de estratégia de conforme mostra a tabela 1 e foram selecio-
cinco empresas da região de Ribeirão Preto, nadas em função do relacionamento do pes-
tendo sua origem ao longo de processos de quisador com seus proprietários através do
reflexão, de consultorias em pequenas em- SEBRAE-SP.
presas e de leituras em bibliografias da área.
2.3. Instrumentos de Coleta de Dados
2.2. Escolha dos Casos de Estudo
O processo utilizado para coleta de
Na definição da unidade caso, partiu- dados foi o de entrevista semi-estruturada
se para a procura de pequenas empresas que realizada com o empresário. Esta entrevista
tivessem mais de 10 anos de existência, pois, foi baseada em um roteiro pré-definido, divi-
passaram pelos 5 anos mais difíceis decor- dido em 2 partes:
rentes da abertura do negócio (segundo SE- • Parte 1: referente aos dados gerais
BRAE-SP (1999)) e que fossem reconhecidas da empresa e empresários, tem como obje-
como empresas de sucesso em seu setor de tivo conhecer a empresa quanto a sua es-
atuação, seja em nível regional ou nacional. trutura organizacional, tamanho, mercado,
de tal forma, que definem em que negócio a tém os métodos de planejamento racional.
empresa está ou quer estar e que tipo de em- • Evolucionária – apóia-se na me-
presa ela é ou quer ser. táfora da evolução biológica, substituindo a
Para Chandler (1962), estratégia é a disciplina do mercado pela lei da selva.
determinação de objetivos e metas de longo • Processualista - ênfase na natureza
prazo de uma empresa, a adoção de cursos imperfeita da vida humana, estratégia emer-
de ação e a alocação de recursos necessários ge de um processo pragmático de aprendiza-
para o alcance desses objetivos. do e comprometimento.
Henderson (1998) conceitua estraté- • Sistêmica - relativista, propõe que
gia como a busca deliberada de um plano de os objetivos e práticas da estratégia depen-
ação para desenvolver e ajustar a vantagem dem do sistema social específico no qual o
competitiva de uma empresa. processo de desenvolvimento da mesma está
Para Porter (1999), estratégia é criar inserido.
uma posição exclusiva e valiosa, envolvendo
um diferente conjunto de atividades. A tabela 2 fornece uma visão sobre as
Whittington (2002) divide o estudo quatro perspectivas genéricas descritas por
de estratégia em quatro escolas, (aborda- Whittington (2002).
gens) que respondem a duas questões funda-
mentais: para que serve a estratégia e como
ela é desenvolvida. Estas abordagens são
descritas como:
• Clássica - mais antiga e influente con-
As tabelas 3 e 4 nos dão uma noção das dimensões - chave destas escola.
Tabela 3 -Dimensões -
Chave das Escolas do Design, Planejamento, Posicionamento, Empreendedora e Cognitiva
Enfrenta re-
Ocasional, opor- sistência ou
Periódica, incre- Aos poucos,
Mudança ocasional tunista, revolu- construída
mental freqüente
cionária mental-
mente
Agente Executivo
Planejadores Analistas Líder Mente
Central principal
Tabela 4 - Dimensões - Chave das Escolas do Aprendizado, Poder, Cultural, Ambiental e Configuração
Qualquer um
Especialmente
Agente Aprendizes com poder,
coletividade “Ambiental” o principal
Central (quem puder) organização
executivo
inteira
4 - Análise Geral das Empresas Pesquisadas existe uma forte necessidade de se formalizar
a visão. Talvez isso possa ser explicado pelo
A figura 4 resume e mostra as princi- fato destas empresas estarem em fase de
pais variáveis encontradas na pesquisa. Nela crescimento, serem referências em seus se-
podem ser comparadas as visões e demais as- tores, e, portanto, terem necessidade de dar
pectos ligados à estratégia empresarial. passos mais seguros, apoiando-se não só na
As visões da estratégia mais percebida intuição, mas também em dados quantitati-
nas entrevistas, de acordo com o pensamen- vos e ferramentas de gestão.
to dos empresários pesquisados, foram a da Verificou-se também que todas elas
escola do design e empreendedora, porém, passaram por programas de qualidade. Algu-
tanto a visão da escola do aprendizado e do mas sistematizaram-no na forma de normas
planejamento foram citadas. como a ISO 9000, e outras apenas implanta-
Todos empresários pesquisados sen- ram sistemas de gestão com base na filosofia
tem falta de um ferramental e metodologia da qualidade, fato este que explicaria a pre-
simples, mas que apóiem no processo de ela- sença de ferramentas como SWOT, missão e
boração e implementação da estratégia, pois, política da qualidade.
DIMENSÕES
Frateschi Apis Flora Giglio & Bonfante Corrassol Consinco
CHAVES
Análise de custo,
orçamento tendên-
Ferramentas Swot, Porter, Pontos fortes e Pesquisas, custos, Orçamento,
cias, faturamento
para plane- orçamento, fracos, custos, lucro e fatura- custos, legislação
jamento
bruto, lucro, cli-
custos faturamento. mento. e políticas.
entes e concor-
rentes.
Estuda
ambiente Sim Sim Sim Sim Sim
externo
Estuda
ambiente Sim Sim Sim Sim Sim
interno
Horizonte
planeja- 2 a 4 anos 1 a 2 anos 1 ano Acima de 4 anos 1 a 2 anos
mento
Principal
dificuldade pessoas pessoas pessoas pessoas conhecimento
da empresa
fig. 5 – Processo de
formação da estratégia
Elaboração própria
cionários não existe, na pequena empresa o lhá-lo, impedindo sua livre movimentação.
proprietário está presente em todos os luga- Eles tem pouca necessidade de pessoas que
res, é ele quem implementa, quem assume a os ajudem na formação da estratégia, neces-
dianteira de todos os processos. sitam de contrabalançar suas intuições por
Devido a centralização do poder no considerações mais sistemáticas das ques-
pequeno empresário, estes além de estarem tões, sentindo falta de planejadores aptos a
mais em contato com as operações estão tam- isso.
bém ligados com as importantes informações Pode-se perceber que não existe uma
factuais, tendo assim autoridade para gerar visão única do processo de formação de es-
a estratégia. São homens de ação, práticos, tratégia, ela reflete os anseios, modelos men-
preferem o oral ao escrito, muito embora, tais, cultura, aprendizado e conhecimento do
algumas vezes, sintam falta do processo de proprietário ou estrategista, não havendo,
formalização, acreditando que se os planos portanto, uma separação nítida, marcante,
estiverem no papel possam assegurar o su- entre as dez escolas de pensamento estraté-
cesso de sua implementação. gico estudadas.
Segundo Bennett et al (2001), o grande Bethlem (2003) afirma que em sua
vilão da área da estratégia é a implementação experiência de consultoria, em mais de 300
e não o planejamento, mais ainda, o que casos descrevendo o processo estratégico em
distingue as empresas bem sucedidas é a empresas brasileiras, não ter encontrado ne-
forma como se organizam e operam para nhum representante típico de qualquer das
concretizar suas aspirações. O autor cita dez escolas.
que em estudos recentes publicados pela Amoroso (2002) afirma que a arte de
revista Fortune, cerca de 70% dos fracassos criar, desenvolver, implementar e monitorar
dos presidentes não ocorrem por falha no estratégias competitivas vem sofrendo trans-
pensamento estratégico, mas por falha na formações profundas em razão das mudan-
execução. ças tecnológicas e da velocidade das informa-
Formalizar o processo de pensamento ções, de maneira que modelos tradicionais de
do estrategista parece se um grande dilema planejamento como SWOT, Análise Estrutu-
e também a grande falácia da escola do pla- ral da Indústria e da Concorrência e outras,
nejamento. A idéia de que sistemas formais já não funcionam em muitas circunstâncias.
podem substituir a criatividade e intuição é Existe uma grande necessidade de
no mínimo grosseira. As pequenas empresas aquisição de conhecimento pelo pequeno
são em sua essência informais, e talvez esta empresário. A parceria com associações co-
seja uma das principais características que merciais e industriais, institutos de pesquisa
lhe provém velocidade e flexibilidade. O pe- e com as universidades podem auxiliar na
queno empresário sente falta de alguém ou obtenção de dados mercadológicos setoriais,
de alguma ferramenta que o auxilie na im- na formação de pessoal e também na imple-
plementação, formalização, do pensamento mentação da estratégia, o que vem a ratificar
estratégico. Nenhuma das ferramentas de a importância da formação de grupos de pes-
análise propostas pelas escolas de estraté- quisa com foco na pequena empresa, como é
gia pode prover criatividade e intuição, nada o caso na EESC-USP do grupo dirigido pelo
pode substituir a cabeça do estrategista. Prof. Edmundo Escrivão Filho e da FEA-
Para Mintzberg (2004) na organiza- USP, Ribeirão Preto, com o grupo do Prof.
ção empreendedora, tudo gira em torno do Dante Martineli. A realização de fóruns de
executivo chefe, ele controla pessoalmente discussão sobre economia, política e tecno-
todas as atividades por meio da supervisão logias, que poderiam ser realizados por um
direta. O planejamento formal pode atrapa- conjunto de universidades e pesquisadores
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EI30 (MJ.mm/ha.L)
PRECIPITAÇÃO EI30 (MJ.mm/ha.L)
MESES (BERTONI & LOM-
(mm) (KUNTSCHIK, 1996)
BARDI NETO, 1990)
Janeiro 269,3 1715,03 1831,58
Fevereiro 204,1 1125,81 1143,14
Março 163,8 806,43 786,73
Abril 78,7 264,98 226,21
Maio 59,2 171,90 139,33
Junho 31,1 64,82 46,74
Julho 25,1 46,81 32,47
Agosto 23,6 42,51 29,14
Setembro 60,9 179,67 146,40
Outubro 134,7 599,18 564,09
Novembro 173,9 882,73 870,56
Dezembro 264,6 1670,07 1777,89
TOTAL 1489,1 - -
Fator R anual (soma dos EI30 mensais) 7569,93 7594,29
Tabela 2.1. - Distribuição da precipitação média mensal na área de estudo (SIGRH,
2004) e cálculo do EI30 para cada mês e valor do fator R anual (período de 54 anos).
EI30 (MJ.mm/ha.L)
PRECIPITAÇÃO EI30 (MJ.mm/ha.L)
MESES (BERTONI & LOM-
(mm) (KUNTSCHIK, 1996)
BARDI NETO, 1990)
Janeiro 273,4 1716,42 1833,24
Fevereiro 223,7 1265,63 1303,29
Março 160,6 765,17 741,80
Abril 80,7 269,41 230,45
Maio 54,6 148,63 118,39
Junho 35,2 76,41 56,20
Julho 25,8 47,62 33,09
Agosto 28,9 56,61 40,17
Setembro 68,4 209,49 173,88
Outubro 134,3 583,18 547,26
Novembro 178,0 895,07 884,19
Dezembro 269,5 1679,61 1789,27
TOTAL 1533,1 - -
Fator R anual (soma dos EI30 mensais) 7713,25 7751,22
Tabela 2.2. - Distribuição da precipitação média mensal na área de estudo (SIGRH,
2004) e cálculo do EI30 para cada mês e valor do fator R anual (período de 33 anos).
existente na área, foram obtidos por meio da O valor de Z = 0m, previamente co-
tabela definida a partir das classificações tado, deu aos divisores principais e secun-
sugeridas por SCOPEL & SILVA (2001) e dários o comprimento de rampa 0m, pois o
BERTONI & LOMBARDI NETO (2005), que caminho percorrido pelas águas inicia-se no
atribuem valores de erodibilidade corres- divisor de água e vai até o rio. Pelo comando
pondentes a cada classe de solo, levantados mosaico, copiaram-se os rios para dentro do
a campo, por meio de amostras georreferen- plano de informação e foi atribuída a esses
ciadas, determinando-se de forma indireta vetores a função de linhas de quebras.
pelo do nomograma, desenvolvido por WIS- Utilizando a ferramenta MNT, co-
CHMEIER & SMITH (1965) APUD RESEN- mando mapa de distância, criou-se o PI na
DE & ALMEIDA (1985), cujos valores foram forma de grade retangular, com resolução
adaptados para a microbacia do córrego São em X(10m) e Y(10m). Essa grade de distân-
Simão (Tabela 2.4.). Os valores de K utiliza- cia teve como ponto de partida os divisores
dos na EUPS são do horizonte superficial do de água (0m) até as linhas de quebras carac-
solo, pois o objetivo desta é a quantificação terizadas pelas linhas da hidrografia.
da erosão laminar presente na bacia. Para geração do fator S, a partir das
A espacialização do fator K foi fei- amostras da altimetria, na categoria Relevo -
ta através da criação de um PI no SPRING MNT, através do comando MNT - Geração de
(INPE, 2007) denominado solo onde foram grade triangular, criou-se a grade triangular
digitalizadas as distintas manchas de solo (TIN) usando os rios como linha de quebra.
abrangidas pela área de estudo, sendo cada A partir dessa grade, e com o comando MNT
uma delas vinculada ao valor correspondente - Geração de grade retangular, gerou-se uma
do fator K. O PI solo foi então convertido em grade altimétrica com resolução X(10 m) e
arquivo matricial para posterior cruzamento Y(10 m). A partir dessa grade retangular al-
com os outros fatores. timétrica, usando o comando MNT - Declivi-
dade, com as opções de entrada grade, saída
2.4.3. Obtenção dos fatores L e S declividade, unidade porcentagem, gerou-se
o PI Declividade, com resolução X(10 m) e
Para cálculos do LS utilizaram-se a Y(10 m). O mapa de declividade foi obtido
equação citada por BERTONI & LOMBARDI através do “fatiamento” da grade numérica,
NETO (2005). ou seja, da associação dos intervalos da grade
a classes temáticas.
LS = 0,00984 * L 0,63* S 1,18 (2.3) As grades retangulares do compri-
mento de rampa e declividade foram intro-
Onde L é o comprimento de rampa duzidas em um programa LEGAL. Esse pro-
em m e S é o declive em %. grama gerou na categoria Fator LS - MNT, na
Para determinação do LS, primeiro forma de grade retangular, com resolução de
procedeu-se à identificação individual do L X(10 m) e Y(10 m), o PI Fator LS.
(comprimento de rampa) e do S (declivida- Ressalta-se que, na determinação do
de %). Para determinação do L, criou-se uma L, levou-se em conta a encosta natural, sem
categoria MNT, que recebesse as informa- considerar a quebra da circulação da água
ções. Criou-se um PI dentro dessa categoria por barreiras, como mata ou práticas conser-
e pela ferramenta Editar, comando Vetorial vacionistas.
do SPRING, no qual foram traçados manual-
mente todos os divisores de água principais e 2.5. Cálculo do potencial natural de
secundários do retângulo do projeto (bacia e erosão
em torno). O potencial natural à erosão é defini-
do pelas características pluviométricas, pe- tros acima, gerando uma grade onde cada
dológicas e geomorfológicas combinadas. A ponto da superfície está associado ao valor
instabilidade emergente, definida pelos fato- potencial natural de erosão.
res antrópicos, combina o potencial natural De posse do mapa resultante, em
com o uso empregado ao solo. modelo numérico de terreno, foi feito seu fa-
Para estimar o Potencial Natural de tiamento, ou seja, foram definidas as classes
Erosão (PNE) na bacia foi utilizada a seguin- de potencial natural à erosão na microbacia,
te equação: possibilitando uma melhor visualização dos
locais onde a probabilidade de ocorrer ero-
PNE= R . K . LS (2.4) são é maior.
apresentando as áreas onde o relevo, ou seja, potencial de perdas de solo e seu respecti-
o grau de declive, ou melhor, a inclinação do vo potencial natural à erosão em ton. ha-1
terreno e o comprimento da encosta é que de- ano-1. Os valores encontrados variam de 0
terminarão à velocidade de escoamento su- até mais de 4000, indicando diversas classes
perficial, caracterizando o potencial de carre- de potencial natural à erosão, o que pode ser
gamento pela erosão em termos de tamanho verificado também na Figura 3.1, que apre-
e quantidade de material e evidenciando que, senta também o mapa de susceptibilidade à
na bacia do Córrego São Simão, os valores de erosão na microbacia.
LS de 0 a 1,2 abrangem maior quantidade de
área e em seguida estão as classes de 1,2 a 2,0 Potencial Natural à
e 8,0 a 20,0. Classes de Potencial
erosão (PNE) (ton.
de perdas de solo
Valores mais elevados se associam ha-1 ano-1)
à área com declividades mais acentuadas. Baixa 0 - 100
Tendo em vista a grande complexidade do
Média baixa 100,1 - 200
relevo em uma bacia hidrográfica, a esti-
mativa automatizada dos comprimentos de Média 200,1 - 600
vertente dentro do SIG do tipo matricial, es- Média alta 600,1 - 1000
pecialmente nas áreas com vegetação natural Alta 1000,1 - 4000
ou em áreas de cultura sem terraceamento,
Muito alta > 4000,1
continua sendo um fator limitante da mode-
lagem da erosão (WEILL, 2001). Tabela 3.1. Classes de Potencial de perdas de solo e seu
respectivo potencial natural à erosão em ton. ha-1 ano-1
Portanto, em grande parte da micro-
bacia o fator LS exerce influência importan-
te no processo erosivo, se tornando um dos MACIEL (2000), em seu trabalho,
principais agentes causadores de erosão na obteve valores de PNE muito altos e extre-
microbacia. mamente altos, com perdas da ordem de
900 a 8.898 ton. ha-1 ano-1. NASCIMENTO
3.4. Carta de potencial natural à erosão (1998), encontrou valores do PNE alto e mui-
laminar to alto para a bacia do Rio João Leite, entre
388,33 ton.ha-1.ano-1 a 515,41 ton.ha-1.ano-
O potencial natural de erosão (PNE), 1, levando-se em consideração as perdas mé-
calculado para a microbacia do Córrego São dias, acima do limite de tolerância. Por outro
Simão - SP teve o objetivo principal de deter- lado, as perdas máximas de solos, atingiram
minar a erosão laminar, desconsiderando-se valores oscilando entre 1.574 ton.ha-1.ano-1
os aspectos de uso e cobertura vegetal. As a 4.833 ton.ha-1.ano-1.
classes de perdas de solo são válidas somente Na microbacia, os valores mais eleva-
para áreas continuamente destituídas de co- dos do PNE aparecem entre as classes alta a
bertura vegetal e sem qualquer intervenção extremamente alta, podendo variar de 1000,1
antrópica. a mais de 4.000 ton.ha-1.ano-1 (Tabela 3.1),
Segundo STEIN et al., (1987) e SCO- enquanto os menores valores mínimos (clas-
PEL (1988), estes valores não podem ser to- se baixa) correspondem à classe de 0 a 100
mados como dados quantitativos de perdas ton.ha-1.ano-1.
de terra por erosão, servindo assim, apenas Os maiores valores de PNE são en-
para categorizar qualitativamente as áreas contrados no centro-oeste e sudeste da ba-
quanto à sua maior ou menor susceptibilida- cia, exatamente onde o fator LS exerce maior
de à erosão laminar. influência, seguido também por uma menor
A Tabela 3.1 apresenta as classes de capacidade de suportar a erosão pelos so-
los litólicos encontrados nesta região. Neste Apesar de suas limitações, a espacia-
local foram encontrados valores de PNE de lização do potencial de perda de solo pode
9716 ton.ha-1.ano-1 , o que indica alta sus- ser utilizada em tomadas de decisão relativas
ceptibilidade à erosão laminar. É de fato, ao uso do solo, pois permite identificar áreas
este local que deve sofrer maior vigília quan- que devem ser monitoradas principalmente
do qualquer tipo de intervenção antrópica do ponto de vista dos processos erosivos. A
(agricultura, construção civil, etc.) resolver simulação do Potencial Natural de Erosão
ser desenvolvida nesse local. Sem o total por meio da USLE permitiu identificação de
cuidado, o seu potencial erosivo pode ser po- regiões com alta susceptibilidade ao proces-
tencializado, causando prejuízo econômico e so erosivo, como pode ser verificado em di-
ambiental à região da microbacia. versas áreas da microbacia, principalmente
Na microbacia existem também pon- em sua porção leste.
tos isolados onde o PNE apresenta valores As estimativas de PNE podem contri-
médios a altos, influenciados diretamente buir ainda para restringir o uso e ocupação
pelo fator LS, já que nesses locais se encon- de áreas potencialmente suscetíveis à erosão,
tram os solos com menores valores de ero- evitando assim onerar custos de infra-estru-
dibilidade, ou seja, os latossolos. Apesar de tura, patologias em obras da construção civil.
grande parte da bacia ser formada por areia É importante trazer a atenção dos planejado-
quartzosa, neste local os valores de PNE não res e autoridades locais para as regiões mais
ultrapassam 3000 ton.ha-1.ano-1, devido à frágeis, de relevo acidentado e com solos de
uma baixa influência do fator LS. alta erodibilidade. Nestas áreas podem e de-
vem ser estabelecidos programas de comba- lhorada, para que os valores de erodibilidade
te, controle e prevenção da erosão, que não associados a estes reflitam sua verdadeira lo-
descartassem a possibilidade de adoção de calização no mapa da bacia, trazendo maior
novas alternativas de uso, menos intensivas. segurança para quaisquer atividades que
possam ser realizadas, com base no mapa de
4. CONCLUSÃO susceptibilidade à erosão, sejam estas ações
de manejo ou de construção civil.
Em bacias hidrográficas, os Sistemas A equação universal de perda de solo
de Informação Geográfica são instrumentos (EUPS) pode ser empregada na estimativa
poderosos ao auxiliar no processo de mode- da quantidade de solo perdida por erosão e
lagem espacial, pois este oferece a possibili- o potencial natural de erosão em pequenas
dade de integrar dados obtidos por diferentes bacias (como a bacia do Córrego São Simão),
fontes, o que permite sua aplicação nos mais quando adaptada a um SIG.
variados campos relacionados às ciências da A metodologia utilizada para determi-
natureza. A ligação da informação espacial nação dos fatores da EUPS se mostrou muito
com a informação alfanumérica facilita a útil para a identificação das áreas com riscos
tomada de decisões e permitem a simulação de perda de solos por erosão laminar. No en-
dos efeitos da introdução de novos tipos de tanto, o modelo EUPS deixa muito a desejar
manejo, de diferentes tipos de cenário e de com respeito à qualidade e confiança nos
políticas alternativas. resultados obtidos, pois apresenta muitas li-
Neste caso específico, isso possibilita- mitações e erros quando utilizada em países
rá a gestão mais adequada da Bacia do Cór- como o Brasil. Por ser uma fórmula empírica
rego São Simão, restringindo determinados desenvolvida nos Estados Unidos, que apre-
usos do solo em áreas com maior fragilidade senta condições de solos totalmente diferen-
ambiental, o que irá incentivar a utilização de tes das brasileiras, apresenta resultados que
áreas com maior aptidão, tanto para agricul- demonstram a verdadeira situação do local,
tura, quanto para construção civil (rodovias, principalmente, no tocante à quantidade de
aterros sanitários, expansão urbana, etc...). solos perdida. Algumas correlações para o
O software SPRING, mostrou-se mui- fator K já foram propostas, mas sua precisão
to útil quanto à confecção do mapa de sus- esbarra sempre em muitas características re-
ceptibilidade a erosão laminar na microba- gionais não levadas em conta. No Brasil, uma
cia. As consultas ao banco de dados (através das maneiras de se contornar este problema
das linguagens próprias para esse fim) são seria repetir a metodologia desenvolvida pelo
simples e de fácil execução, apenas sugere-se Runoff and Soil – Loss Data Center só que
que os novos softwares que lidam com banco para uma maior gama de regiões e de solos
de dados venham permitir que várias consul- brasileiros.
tas possam ser feitas ao mesmo tempo atra- A carta de susceptibilidade à erosão
vés de um arquivo de regras. tem por objetivo fornecer diretrizes à ex-
Foi verificado que ao trabalhar com pansão urbana e de áreas cultiváveis, e ao
banco de dados, as informações devem ser gerenciamento da bacia. Se utilizada corre-
precisas e exatas, assim como os critérios tamente, esta pode nortear um maior desen-
para confecção do mapa de susceptibilidade volvimento econômico da cidade através da
à erosão. Portanto, existe a necessidade que construção civil, e no aumento de áreas agri-
sejam estudados critérios mais objetivos e cultáveis, utilizando sempre as áreas com
menos subjetivos, facilitando o trabalho com menor susceptibilidade à erosão para a sua
banco de dados. Foi notado também que o realização.
mapa de solos necessita ter sua precisão me- No caso da Bacia do Córrego de São
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