Sunteți pe pagina 1din 7

Sexualidade, tráfico de mulheres e direitos reprodutivos: relações e

implicações
Lúcia Isabel da Conceição Silva1
Marcel Hazeu2

“Desde o século XVIII o sexo não cessou de provocar uma espécie de


erotismo discursivo generalizado, e tais discursos sobre o sexo não se
multiplicaram fora do poder ou contra ele, porém lá onde ele se exercia e como
meio para seu exercício; criaram-se em todo canto incitações a falar; em toda
parte, dispositivos para ouvir e registrar, procedimentos para observar,
interrogar e formular. Desenfurnam-no e obrigam-no a uma existência
discursiva. Do singular imperativo, que impõe a cada um fazer de sua
sexualidade um discurso permanente, aos múltiplos mecanismos que, na
ordem da economia, da pedagogia, da medicina e da justiça incitam, extraem,
organizam e institucionalizam o discurso do sexo, foi imensa a prolixidade que
nossa civilização exigiu e organizou. Talvez nenhum outro tipo de sociedade
jamais tenha acumulado, e num período histórico relativamente tão curto, uma
tal quantidade de discursos sobre o sexo” (Foucault. 1988 / 2006. p. 39).
É com a veemência do discurso acima que Foucault, em sua análise da
sexualidade nos tempos modernos, critica (denuncia) e expõe a “vontade de
saber” sobre o sexo como estratégia de controle dos indivíduos e de exercício
de poder. Talvez, conforme afirma o autor, vivamos numa sociedade em que se
fale de sexo mais do que de qualquer outro assunto, numa tarefa obstinada de
dar conta de um assunto que, sabemos, nunca teremos falado o suficiente, e
nunca, certamente, com a coragem necessária.
. A sociedade em geral é altamente erotizada, na lógica da dominação
pelo mercado. No comércio, o corpo de mulheres sem roupa passou a ser
atrativo para a venda de absolutamente quase tudo, de carros, a sapatos até
cerâmicas para piso. E para se realizar sexualmente o mercado oferece desde
atributos até define nossas fantasias e desejos sexuais através de sua
produção pornográfica voltada para o público masculino (como dominar e o que

1
Psicóloga. Professora da Universidade Federal do Pará e pesquisadora da ONG SODIREITOS / Belém –
Pará.
2
Articulador da ONG SODIREITOS/ Belém - Pará. Coordenador da Pesquisa Trinacional sobre Tráfico
de Mulheres.

1
fazer nas relações sexuais: oral, anal e vaginal etc), e das revistas para
mulheres (como agradar um homem, ter múltiplos orgasmos etc) e livrinhos
para mulheres (viver uma paixão por um homem inalcançável, alguém mal que
ela consegue mudar). Parece que falar de sexo e sexualidade passou a ser o
denotativo da coragem, da ousadia e da “mentalidade aberta”. É esse o
imperativo que obriga a sexualidade a se dizer e a se mostrar o tempo inteiro.
É preciso que se fale e se fale cada vez mais, já que a sexualidade é objeto de
disputa política, científica, jurídica e econômica.
Contraditoriamente, os mesmos dispositivos utilizados para fazer falar,
para formular verdades sobre o sexo criam, ao mesmo tempo, mentiras para
ocultá-lo. A sociedade que produz, tolera e incentiva todo um discurso sobre a
sexualidade, que é conivente com as mais absurdas e desrespeitosas formas
de exposição e uso do corpo da mulher na mídia é a mesma que formula todo
um discurso da moral e racionalidade para definir sobre o que falar e sobre o
que calar em relação à sexualidade e quem pode e quem não pode falar a
respeito.
Essa atitude demonstra a forma hipócrita e ambivalente com que
lidamos com as questões da sexualidade. Como indagava Foucault, esse tanto
falar não é prova suficiente de que a sexualidade permanece secreta e que é
intenção que assim se mantenha? Não é essa devotação a falar que a valoriza
como segredo?
A despeito de toda essa produção discursiva, claro está de que estamos
diante de um assunto sobre o qual ainda há muitos silêncios. É isso que faz do
sexo, referindo-nos mais uma vez a Foucault, objeto de verdade e falsidade.
E de que silêncios ou de quais falsidades estamos falando?
Aborto, virgindade, casamentos entre pessoas do mesmo sexo etc. A
lista pode ser longa, mas vamos nos ater a uma questão que em si, agrega
vários aspectos importantes ou vários desses silêncios: o tráfico de mulheres
para exploração sexual.
Sem entrar na discussão sobre conceituação – já que existe literatura
relativamente ampla a respeito, nos parece importante atentar para as
situações peculiares que configuram esse crime. Trata-se de um mercado
altamente marginalizado e organizado dentro de um nível mínimo ou
inexistente de visibilidade da sua situação ou da presença do Estado.

2
É possível mesmo falar da reedição de relações de exploração de força
de trabalho e do corpo de um grupo de pessoas que na contemporaneidade
assume formas diversas, seja como trabalho escravo em áreas rurais ou
urbanas ou, no caso que aqui nos interessa, as práticas de casamento forçado
ou confinamento de mulheres para prestação de serviços sexuais em
garimpos, clubes ou mesmo casas localizadas em áreas urbanas. Por trás
destas diferentes formas e em comum entre elas está uma relação de
exploração e de transformação do dominado em coisa, em objeto de produção
e satisfação dos interesses e desejos dos homens.
Como justificativa, uma concepção de “homem” cujos impulsos sexuais
não podem (nem devem) ser controlados, legitima e estimula o uso e abuso do
corpo feminino, por um lado e, a longa história de educação para a submissão
e heteronomia das mulheres, por outro. São, portanto, os marcadores de
gênero, que dotam homens e mulheres de papéis s e status diferenciados que
tornam a sociedade conivente com o crime de tráfico e com a violência sexual,
esta como um ato concreto que satisfaz as necessidades de poder e controle
masculino sobre mulheres e meninas, em especial, embora também com
adolescentes do sexo masculino. São estes pressupostos ideológicos, entre
outros, que sustentam, o comércio sexual.
A ênfase na dimensão das construções subjetivas parece extremamente
importante para deslocar as assimetrias do campo da mera derivação biológica
para situar a discussão da produção das feminilidades e masculinidades no
campo dos processos históricos e culturais que são ao mesmo tempo
determinadas e determinantes da forma com a sociedade trata e legitima as
diferenças, legitimando também a inferioridade feminina. O esforço na
produção das feminilidades submissas é tremendo e é sobre essas que age o
tráfico.
Vale ressaltar que as histórias começam bem antes da situação de
aliciamento, transporte e confinamento e si: pobreza extrema, uma gravidez ou
mais uma, falta de perspectivas, de oportunidades. Abandono do companheiro.
Responsabilidade em criar filhos sozinha, estupro, namoro ou histórias de
encantamento com estrangeiros ou ainda o desejo de aventura, de busca de
liberdade, fuga de situação degradante ou de privações. São várias as

3
situações que concorrem na configuração do chamado “perfil de
vulnerabilidades”.
Sem desconsiderar de todo um conjunto de situações que envolvem o
crime de tráfico de mulheres e que caracterizam sua multidimensionalidade,
duas questões parecem relevantes: as relações e significações de gênero e,
diretamente relacionada a estes, o peso pelo sustento e educação dos filhos e
a responsabilidade cada vez mais assumida pelas mulheres nessa tarefa.
Neste aspecto, portanto, diferentes variáveis se entrecruzam, já que as
questões de gênero são transversalizadas por outras, igualmente definidoras
de poder, como classe, raça, nacionalidade e idade, por exemplo.
Como aprenderam a ser mulher e o que é ser mulher neste contexto?
Nas histórias das mulheres que enfrentaram situação de tráfico os marcadores
são comuns: pobreza associada a características extremante hostis de vida,
violência doméstica e sexual desde cedo, trabalho doméstico (babá em
especial), a primeira experiência nas rotas do tráfico de pessoas, e este como
forma de exposição a mais violência sexual, estupro, gravidez em idade
precoce, prostituição não como uma opção, mas como “a única opção”.
Dimensões materiais e simbólicas que se combinam na construção das
histórias. São estes que fornecem os parâmetros pelos quais estas mulheres
aprendem a se definir e o tamanho dos sonhos que podem acalentar.
O sustento dos filhos e a expectativa acalentada, via educação, de que é
importante encontrar um “bom homem” para sustentá-la, pesam em grande
soma como motivação para aceitar os convites ou se submeter à sedução, que,
neste caso, se traveste de consentimento.
Eis, portanto, um dos grandes silêncios que precisam ser enfrentados: a
discussão dos direitos sexuais e reprodutivos.
A crescente discussão sobre os direitos humanos abre a possibilidade
de reflexão sobre um conjunto de situações específicas até aqui negligenciadas
ou tratadas pelo viés dos preconceitos e interpretações moralistas. A mesma
sociedade que exalta a sexualidade, também silencia sobre a gravidez
indesejada e recusa o aborto, que nada mais são do que produtos do sexo. O
que está em questão é o direito da mulher sobre seu corpo, seu prazer, sua
fecundidade e a forma de vivenciar a maternidade.

4
Pensar a mulher implica pensar também nas funções que constituem
seu corpo, que o ordena também às funções da reprodução e que as
perturbam continuamente pelos efeitos dessas mesmas funções.
Acaba sendo necessário pensá-las como mães. A maternidade como
uma realidade que trás uma nova identidade e que implica também em
mudanças na vida muitas vezes não planejadas, entendidas e aceitas.
Pressionada para assumir este novo projeto de vida, sem preparo, condições e
informações, a resposta às vezes é ficar longe, abandonar os filhos,
transferindo a responsabilidade para outros, em geral a mãe.
Vida sexual satisfatória e segura, capacidade de reprodução e condições
de decidir quando e quantas vezes, concepção bastante abrangente de direitos
reprodutivos que traz em seu bojo o direito a condições dignas de vida, o direito
de exercer, desfrutar e controlar sua vida sexual e reprodutiva, o direito a
informações a acesso a métodos de planejamento familiar, a serviços de
saúde. Parece desnecessário dizer quantos desses direitos as mulheres, em
especial as que vivem ou viveram situação de tráfico, têm tido
sistematicamente violados.
Estas vivem um esquema de reprodução cíclica: a saída de casa, que
muitas vezes ocorre antes da gravidez, por motivos econômicos ou violência
doméstica, uma gravidez que acaba ocorrendo neste percurso de saída. A
situação de gravidez ou de ter filhos as empurra para fora de casa, para a
prostituição ou para o tráfico ou contribui potencialmente para. Tal situação
gera, por extensão, uma situação abandono dos filhos. Das e pelas
circunstâncias de tráfico, em geral, resultam novos filhos, que voltam, muitas
vezes ainda na barriga, e que acabam por enredar e vulnerabilizar ainda mais
essas mulheres. Nas duas condições, estamos diante de “órfãos do tráfico”.
Quem assume, junto com essas mulheres, a responsabilidade por isso?
Antes, durante e depois da situação de tráfico não gozam do direito à
vida sexual com liberdade e segurança, ao que poderíamos chamar do livre
exercício da sexualidade e da reprodução. Para estas mulheres, a gravidez,
muitas das vezes, não se constituiu em escolha autônoma. Para outras, A
gravidez pode funcionar como uma estratégia de sobrevivência na
adolescência, de afirmação como mulher adulta, em contraponto a sua
exclusão, discriminação e exploração. Na perspectiva de ser reconhecida como

5
mãe e aceita como esposa a gravidez é bem recebida e até desejada por elas.
Entretanto, a maternidade vivenciada de forma desprotegida e desassistida a
vulnerabiliza mais e, a alcançada vida adulta não traz a libertação da
exploração e dominação.
O significado de ser mãe assume nuances bem diferenciadas diante da
realidade, responsabilidades e expectativas sociais das mulheres com filhos e
que para estas mulheres chegam ainda bem cedo. Falamos de uma geração
de crianças e adolescentes inteiramente desamparados e sem direitos
essenciais.
Por outro lado, é preciso que se questione sobre o papel do pai, os
direitos e compromissos afetos ao exercício da paternidade, aí incluídos a
responsabilidade na prevenção da gravidez, nos cuidados com os filhos, nas
tarefas domésticas etc, a respeito das quais também se silencia. Cuidar não é
essência feminina, ao contrário do que se concebe, logo a inclusão e discussão
sobre o papel masculino na vida reprodutiva se constitui em outra demanda
importante para o debate sobre os direitos sexuais e reprodutivos e, por
conseguinte, para as discussões das desigualdades de gênero, sobre as quais
se assentam os papéis e atitudes do homem frente á sexualidade e à
reprodução.
A decisão de sobreviver do trabalho sexual, tanto no exterior como no
próprio lugar de origem, pode ser questionada como escolha livre, mas no
âmbito da garantia dos direitos sexuais não há como negar o direito da mulher
de trabalhar no mercado de sexo, ainda que por princípio, vise a exploração da
sexualidade e não a sua realização. E justamente por estes dois motivos que
se precisa de proteção das e dos trabalhadores sexuais, garantir no máximo a
sua autonomia e seus direitos, inclusive os sexuais.
No tocante aos direitos sexuais e reprodutivos é preciso que se
especifiquem os direitos e os sujeitos que a sociedade tende a tratar
abstratamente, incorrendo no perigo de esvaziar seu conteúdo.
É forçoso que se discuta sexualidade e reprodução como dimensões da
vida cidadã, onde se confrontam dimensões do âmbito da intimidade e
subjetividade com as demandas de política social. Democracia e cidadania
implicam na defesa dos direitos da mulher, que passa pela construção da
autonomia sexual e esta, diretamente relacionada à autonomia na vida

6
reprodutiva. Por estes passam questões em termos de políticas de saúde
pública, planejamento familiar, doenças sexualmente transmissíveis, aborto,
violência sexual e tráfico de mulheres. Essa garantia, entretanto, impõe
formulação efetiva de política em favor desses direitos, acesso a informações,
capacidade de decidir o que fazer, mas decisão de fato, que pressupõe a
existência de condições subjetivas e materiais para isso.
No tocante aos direitos sexuais e reprodutivos é preciso que se
especifiquem os direitos e os sujeitos que a sociedade tende a tratar
abstratamente, incorrendo no perigo de esvaziar seu conteúdo.
É forçoso que se discuta sexualidade e reprodução como dimensões da
vida cidadã, onde se confrontam dimensões do âmbito da intimidade e
subjetividade com as demandas de política social. Democracia e cidadania
implicam na defesa dos direitos da mulher, que passa pela construção da
autonomia sexual e esta, diretamente relacionada à autonomia na vida
reprodutiva. Por estes passam questões em termos de políticas de saúde
pública, planejamento familiar, doenças sexualmente transmissíveis, aborto,
violência sexual e tráfico de mulheres. Essa garantia, entretanto, impõe
formulação efetiva de política em favor desses direitos, acesso a informações,
capacidade de decidir o que fazer, mas decisão de fato, que pressupõe a
existência de condições subjetivas e materiais para isso.

S-ar putea să vă placă și