Sunteți pe pagina 1din 33

Economia Internacional

O ”MUNDO DO PACÍFICO” – FLUXOS DE CAPITAIS E RELAÇÕES ENTRE


MOEDAS

José Félix Ribeiro

A Economia Mundial foi marcada durante a década de 90 por quatro grandes Forças
Motrizes, fortemente inter-relacionadas: Emergência de Economias, Mutação de
Tecnologias, Internacionalização de Empresas e Globalização de Poupanças

• O aspecto principal da Emergência de Economias foi a ascensão das economias da


Ásia/Pacífico e das “Economias Chinesas” (República Popular da China, Hong Kong,
Taiwan e Singapura) como força motora do crescimento na Ásia/Pacífico, economias
caracterizadas por elevados níveis de poupança e orientação exportadora de bens;
em fase mais atrasada de emergência encontra-se a Índia, embora tenha vindo a
acumular um potencial tecnológico significativo, que a transforma já em parceiro das
empresas americanas da área das Tecnologias da Informação; uma consequência
chave da emergência das economias é a pressão sobre a oferta de petróleo e gás
natural e respectivos preços; em consequência desta elevação a economia da Rússia
tem por sua vez novas condições para se tornar também uma economia emergente;

• o aspecto principal da Mutação Tecnológica é a convergência das


telecomunicações/Informática e Audiovisual em torno da nova fronteira aberta pela
Internet e pela criação do ciberespaço exigindo um investimento maciço na
constituição das respectivas infra-estruturas (equipamentos e “software”) e no
estabelecimento das conexões de um número crescente de utilizadores a esse
espaço e a exploração do código genético;

• o aspecto principal da Internacionalização das Empresas consiste em que na


indústria e nos serviços a posição das empresas não se joga no seu “mercado único”
de base, mas na presença em pelo menos dois dos principais mercados
desenvolvidos (América do Norte, Europa Ocidental e Ásia do Nordeste (Japão e
Coreia do Sul) e de uma presença selectiva numa das macro-regiões em que se
concentram as Economias Emergentes (Ásia/Pacífico e América Latina), experiência
há muito feita pelas maiores empresas dos EUA, depois ensaiada pelas empresas
japonesas a partir da segunda metade da década de 80, e por último pelas empresas
europeias a partir da segunda metade da década de 90;

• o aspecto principal da Globalização é a constituição de um “pool” mundial de


poupanças, disponível para investimento em qualquer parte do mundo, através dos
mercados de capitais, crescentemente integrados, e do papel central dos investidores
institucionais e dos bancos de investimento no sistema financeiro internacional; no
centro deste processo está o modo como as economias da Ásia/Pacífico (com
destaque para o Japão) transferem o seu excesso de poupanças.
Informação Internacional

Figura 1

QUATRO DINÂMICAS CHAVE NA ECONOMIA MUNDIAL

EMERGÊNCIA
DE
ECONOMIAS

GLOBALIZAÇÃO DE
POUPANÇAS

INTERNACIONALI-
MUTAÇÃO DE
ZAÇÃO DE
TECNOLOGIAS
EMPRESAS

1. O “MUNDO DO PACÍFICO” NO CENTRO DA ECONOMIA MUNDIAL

Já anteriormente se formulou a hipótese que a Economia Mundial tem como estrutura


organizadora o que se designou como “Mundo do Pacífico”, ou seja o conjunto acções e
interacções entre alguns grandes Entidades:

• Os EUA, o Japão, as Novas Economias Industrializadas – Coreia do Sul, Singapura,


Taiwan e Hong Kong/China – as Economias Emergentes – China e Ásia dos Sudeste
(Indonésia, Malásia, Tailândia e Filipinas), o México e a Arábia Saudita e o Reino
Unido.

Considerando agora os Atributos e as Interacções destas Entidades (traduzidas em


“fluxos”) podem destacar-se os seguintes aspectos característicos das duas últimas
décadas:

54
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

• os EUA acumulam conhecimentos, inovam num largo espectro de sectores e


actividades e valorizam essa acumulação e inovação no mercado de capitais; atraem
recursos humanos de elevada qualidade das economias emergentes e capitais de
médio/longo prazo de todo o mundo para os seus mercados de acções e obrigações e
para o investimento nas empresas neles sediadas;

• os EUA têm níveis reduzidos de poupança privada (sobretudo das famílias), embora
estas apliquem as suas poupanças em activos que permitem aumentar rapidamente o
seu património (imobiliário, na fase de inflação; acções de empresas, na fase de
desinflação);

• os EUA funcionam como o “consumidor de última instância” no “Mundo do Pacífico”


absorvendo uma parte, hoje não maioritária, mas de qualquer modo muito
significativa, das exportações de produtos industriais da Ásia/Pacífico; têm défices
comerciais em larga escala com o Japão, com as “Novas Economias Industrializadas”
(Coreia do Sul, Taiwan, Singapura, China/Hong Kong) e com Economias Emergentes,
nomeadamente com a China;

• os EUA, pela via do Investimento Directo Internacional das suas empresas


multinacionais e pelo processo de diversificação geográfica das “carteiras de activos”
dos grandes investidores institucionais – fundos de pensões, fundos mobiliários e
companhias de seguros de vida – que são actores dominantes á escala dos mercados
de capitais de todo o mundo, geram fluxos de capitais a longo prazo que se dirigem
para as Novas Economias Industrializadas e para as Economias Emergentes do
“Mundo do Pacífico”;

• os EUA colocam uma parte significativa da sua dívida pública a curto prazo, junto dos
Bancos Centrais do Japão e das Economias Emergentes (Ásia/Pacífico e México), em
contrapartida do aumento das reservas cambiais das economias emergentes ou
recém industrializadas da Ásia/Pacífico – cujas moedas nacionais estão
tradicionalmente alinhadas com o dólar ou com um “cabaz de moedas” em que o
dólar é predominante;

• o Japão gera e acumula conhecimentos tecnológicos num conjunto relativamente


focalizado de áreas – chave da mutação tecnológica em curso (vd. microelectrónica,
optoelectrónica, fotónica, terminais de computação e jogos, materiais funcionais para
a micro e optoelectrónica, instrumentação e meios de diagnóstico, burótica, robótica,
novas motorizações etc.) e difunde nos EUA e em toda a Ásia/Pacífico as suas
competências excepcionais na área da fabricação;

• o Japão acumula excedentes comerciais, com os principais Actores do “Mundo do


Pacífico” – EUA, Novas Economias Industrializadas e Economias Emergentes, sendo
o “negativo” da posição dos EUA que acumula défices com todos eles;

• o Japão é a economia que poupa em 1ª Instância no “Mundo do Pacífico”,


exportando capitais a curto prazo para os EUA (adquirindo títulos do tesouro como
contrapartida das suas reservas cambiais maioritariamente expressas em dólares ou
emprestando em yens a operadores norte-americanos que transformam esses

55
Informação Internacional

empréstimos em investimentos em activos de longo prazo, noutros locais do “Mundo


do Pacífico), para as Economias Emergentes, sob a forma de empréstimos bancários
a curto prazo; e exportando capitais a longo prazo para os EUA e Reino Unido (em
ambos os casos, sob a forma de Investimento Directo Internacional, e no caso dos
EUA também sob a forma de aquisição de títulos do Tesouro a longo prazo pelos
investidores institucionais japoneses – nomeadamente pelas companhias de seguros
de vida);

• as Novas Economias Industrializadas (Coreia do Sul, Singapura, Hong Kong,


Taiwan), todas elas com elevadas poupanças privadas, orçamentos tradicionalmente
equilibrados ou excedentários e atraindo elevados fluxos de Investimento Directo
Internacional (menos a Coreia do Sul, até recentemente), têm vindo a colocar capitais
a curto prazo nos EUA (vd. acumulação de reservas cambiais em títulos do tesouro a
curto prazo) e a longo prazo nas Economias Emergentes, nomeadamente da China;

• as Economias Emergentes (China e Sudeste Asiático) apresentam elevadas


poupanças privadas, em simultâneo com a capacidade de atracção de elevados
fluxos de capitais a longo prazo, com destaque para o Investimento Directo
Internacional; e colocam volumes elevados de capitais a curto prazo nos EUA, por via
do seus Bancos Centrais (como forma de materializarem as suas crescentes reservas
cambiais);

• a Arábia Saudita é o grande fornecedor de petróleo das economias importadoras do


“Mundo do Pacífico” (embora o México e a Venezuela funcionem como fornecedores
“regionais” mais significativos dos EUA); conforme o nível dos preços do petróleo,
cujas transacções são feitas em dólares e o câmbio do dólar face ao yen e às moedas
europeias, assim obtém níveis de “renda petrolífera” mais ou menos elevados, que
por tradição, coloca maioritariamente junto de instituições financeiras dos EUA.

O “Mundo do Pacífico” dispõe assim no seu interior dos principais motores de deslocação
das “Fronteiras Geoeconómica e Tecnológica e de Infra estruturação da Economia Mundial,
articulando, também no seu interior as principais Assimetrias, nomeadamente as da
Poupança /Investimento, Conhecimentos/Competências e Energéticas. Pode pois, a esta
luz, afirmar-se que constitui o “sistema motor” da Economia Mundial. Mas se quisermos
completar este modelo simplificado da Economia Mundial teríamos que introduzir quatro
outras entidades:

• a Europa Continental – dominada pelas quatro grandes economias que estão no


centro da zona euro – Alemanha, França, Itália e Espanha – e ainda pela Bélgica e
pela Áustria, partilhando entre si um modelo básico de capitalismo fortemente
diferenciado do modelo anglo-saxónico;

• a Europa Atlântica – que podemos situar entre a Europa Continental e o “Mundo do


Pacífico” dominada pelo Reino Unido e pelas pequenas economias fortemente
internacionalizadas, com forte relação de investimento com os EUA e com elementos
do modelo de capitalismo anglo-saxónico – Irlanda, Holanda, Luxemburgo, Suécia,
Finlândia e Suíça – em paralelo com elementos do modelo euro-continental;

56
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

• a América do Sul organizada em torno do Mercosul – que inclui o Brasil, Argentina,


Uruguai e Paraguai – e que está presente no comércio internacional, sobretudo por
via das matérias primas e dos produtos da sua transformação; e é caracterizada por
baixas taxas de poupança, ao contrário do que acontece com as Ásia;

• a Rússia – cuja presença no comércio internacional se faz por via da energia,


matérias primas e indústrias da defesa e em que o investimento directo e de carteira
dos investidores anglo-saxónicos tem sido predominante desde o inicio da sua
transição para a economia de mercado.

Figura 2

ZONAS MONETÁRIO/CAMBIAIS NA ECONOMIA MUNDIAL PÓS 1999

ZONA
EURO

EUA

JAPÃO

ZONA
DÓLAR

OUTRAS
ECONOMIAS ECONOMIAS
ECONOMIAS EMERGENTES DA
CHINESAS ENERGÉTICAS
ÁSIA E AMÉRICA DO GOLFO
LATINA

Em 2000, após a passagem à terceira fase da UEM a economia mundial podia ser dividida
em três grandes realidades a nível monetário/cambial, ilustradas na Figura 2:

57
Informação Internacional

• uma zona dólar onde se inclui os EUA, as “Economias Chinesas” (entendidas a este
nível como integrando a República Popular da China, Hong Kong, Taiwan e
Singapura) e outras economias emergentes da Ásia/Pacífico; a Arábia Saudita e as
outras economias energéticas do Golfo; o México e grande parte da América Latina;

• uma economia “refém” da zona dólar – o Japão – que importa matérias primas e
energia denominadas em dólares; exporta produtos industriais para o interior da zona
dólar – nomeadamente para os EUA, “Economias Chinesas” e economias emergentes
da Ásia Pacífico; e importa cada vez mais componentes e outros produtos intermédios
das economias asiáticas da zona dólar; e exporta capitais para os EUA e, Economias
Chinesas e outras economias emergentes da Ásia/Pacífico;

• a zona Euro que integra as economias da Europa Continental e três das economias
da Europa Atlântica – Holanda, Irlanda e Finlândia – deixando de fora o Reino Unido,
a Suécia e a Suíça; a Rússia não tem ainda uma posição definida entre a zona dólar e
a zona Euro – irá exportar cada vez mais energia para a “zona Euro” –
nomeadamente Alemanha, França e Itália – e depende dos empréstimos da
Alemanha; mas no seu interior circula um grande volume de dólares.

Os EUA detêm uma posição central na economia mundial devido, em primeiro lugar à sua
centralidade no ”Mundo do Pacífico” e em segundo lugar à sua relação tradicional com a(s)
Europa(s) e a América Latina, quer ao nível do investimento directo, quer do comércio; essa
posição central pode apreciar-se ao observar os seguintes aspectos:

• os EUA beneficiaram com a Emergência das Economias não só porque quase


todas as economias com estas características, situadas na Ásia/Pacífico ou na
América Latina se enquadram na “zona dólar” gerando um fluxo de capitais a curto
prazo que se dirige para os EUA sob a forma de aquisição de títulos do Tesouro em
que se concretizam as reservas cambiais desses países mas também porque
integraram algumas delas na dinâmica da sua mutação tecnológica associando-as ao
fornecimento de “hardware” e “software” para o seu sector de TI (vd. Taiwan,
Singapura, Malásia e Índia);

• os EUA beneficiaram com a Internacionalização das Empresas, não tanto pelo que
investiram no exterior, já que são há muito a mais “multinacionalizada” das economias
desenvolvidas, mas porque a dotação de bases produtivas nos próprios EUA é a
tarefa primeira e de maior importância para as empresas japonesas e europeias que
se internacionalizam, quer o façam por investimento directo de raiz, por aquisições e
fusões ou por alianças estratégicas;

• os EUA beneficiaram com a Mutação Tecnológica porque são eles que comandaram
a revolução da convergência e da Internet e se colocaram em posição excelente nas
tecnologias da banda larga, graças ao enorme investimento realizado pelos
operadores de redes de comunicação e audiovisual, e é neles que mais se tem
desenvolvido a aplicação comercial das descobertas da genética, e mais
recentemente da genómica.

58
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

Os EUA estão no centro do processo de Globalização das Poupanças, graças ao seu


“modelo de capitalismo” que lhes dá vantagens únicas:

• um sistema financeiro cada vez mais estruturado em torno dos mercados de capitais,
o que associado à própria dimensão da economia americana lhes dá uma
profundidade e liquidez sem igual a nível mundial, e que graças à competição nele
existentes gera inovações financeiras susceptíveis de atrair uma gama cada vez mais
diversificada de investidores, fim das separação entre bancos comerciais e de
investimento e das proibições dos bancos negociarem em títulos por conta própria;

• um sistema de pensões em que têm expressão dominante os regimes de


capitalização, quer sob a forma de planos ocupacionais geridos por fundos de
pensões constituídos em torno de entidades empregadoras e de planos individuais de
poupança que estimularam o crescimento dos “mutual funds”;

• um intenso mercado de controlo das empresas, que torna os EUA no principal foco de
Fusões &Aquisições a nível mundial;

• um sistema de financiamento da inovação baseado no papel do capital de risco, na


possibilidade de fundos de pensões e dos bancos de investimento canalizarem fundos
para o fornecimento de capital de risco e no papel dos mercado de capitais,
nomeadamente através das IPO e da formação do Nasdaq;

• um sistema de ensino superior de alta qualidade, competitivo, com forte


financiamento privado, tradição de ligação às empresas e exercendo o capaz de
alargar a sua base de recrutamento à escala mundial, com destaque para os jovens
das “economias emergentes”;

• uma fiscalidade que não penaliza os ganhos de capital face a outras fontes de
rendimento derivada da posse de activos financeiros (vd. juros e dividendos) e desse
modo estimula a orientação das poupanças para o investimento em acções, e das
grandes fortunas para os fundos de capital de risco.

Na década de 90 os EUA puderam adicionalmente beneficiar com a Globalização pelo


diferencial de crescimento que obtiveram face ao Japão- a braços com um longo período de
estagnação/recessão que se seguiu à implosão da bolha especulativa nos mercados
imobiliário e de acções em 1989/90 e à Europa, envolvida num processo de consolidação
orçamental de grandes proporções exigido pela preparação para a UEM e pela aplicação de
uma política monetária inspirada pelas exigências alemãs decorrentes da reunificação que
se traduziram numa década de crescimento lento e sempre estimulado pelo exterior nos
momentos de crescimento mais rápido

E a partir de 1998 os EUA, se ajudaram decisivamente a travar o generalização e


aprofundamento da crise das “Economias Emergentes”, também beneficiaram dela, já que
grandes volumes de capitais em fuga das “Economias Emergentes” acorreram em massa ao
mercado accionista dos EUA, contribuindo para a subida dos títulos da Tecnologia, Media e
Comunicações.

59
Informação Internacional

2. 1985-1998 – TRÊS CONFIGURAÇÕES DO “MUNDO DO PACÍFICO”

O tipo de interacções entre as Entidades que integram o que se designou por “Mundo do
Pacífico” tem vindo a evoluir, no contexto dos atributos básicos de cada uma das Entidades
e do tipo de funções que desempenham na matriz dos fluxos de capitais que o atravessam.
Identificaram-se três subperíodos:

• 1985 a 1990 – correspondendo à formação das articulações chave do “Mundo do


Pacífico”;

• 1991 a 1994 – correspondendo na aparência a uma interrupção nas articulações mas


traduzindo a estruturação de padrões mais complexos de circulação de capitais;

• 1995 a 1998 – correspondendo a uma fase que se poderia definir como sendo de
“Febre da Ásia”, terminada com a crise financeira e cambial de 1997/8.

2.1. 1985 a 1990 – Formação das articulações chave do “Mundo do Pacífico”

Neste período assistiu-se a um forte crescimento mundial quer nas Economias


Desenvolvidas quer em Emergência (neste caso centrado nos que apresentavam
especializações industriais) não interrompida pelo “crash” na bolsa de New York em 1987;
ao mesmo tempo que os riscos da inflação se deslocaram dos bens e serviços para os
activos financeiros e para os excessos de endividamento privado ou público que essa
“inflação dos activos” permitiu.

No que respeita às grandes economias do “Mundo do Pacífico” há que registar, de forma


sintética:

• EUA – Travagem gradual das despesas com a defesa, mas manutenção de elevados
défices orçamentais, em redução até 1987 mas agravados de novo após esta data;
compressão do investimento, levando ao crescimento do saldo financeiro do sector
privado; dólar competitivo, não impedindo queda da parte de mercado das
exportações dos EUA; redução do peso relativo do défice da balança corrente;
impacto da desregulamentação do sector bancário – as “Savings and Loans
Associations” aumentam dramaticamente a sua exposição ao sector imobiliário;

• Japão – forte crescimento do endividamento privado, devido a um processo maciço


de investimento das empresas em torno dos nós estruturantes da especialização
internacional do Japão; prosseguimento do esforço de consolidação orçamental;
política monetária abertamente expansionista, reforçada depois do “crash” da Bolsa
de N.Y em 1987; formação duma “bolha especulativa” com base no preço da terra;

• China e “Economias Chinesas” – consolidação da “abertura” económica; forte


crescimento nas províncias costeiras; inicio de uma revolução industrial na China
assente nas fabricas de aldeia e vila; expansão das “redes de negócio chinesas” com
base no “exterior” da China;

60
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

• Arábia Saudita – mudança radical da política petrolífera em 1986 – prosseguimento


do objectivo de quota de mercado, sem atenção aos preços; interrupção posterior
devido ao efeito brutal em termos de queda de preços do petróleo; aprofundamento
das dificuldades orçamentais.

O principal processo geoeconómico que envolveu o “Mundo do Pacífico” foi a


internacionalização da economia do Japão, em resposta à valorização do yen, tendo como
contrapartida a formação de uma gigantesca “bolha especulativa” , assente na “explosão” do
preço da terra. Um processo complementar foi o “contra – choque” petrolífero de 1986 no
qual a Arábia Saudita alterou a sua estratégia energética levando a uma baixa muito
acentuada do preço do petróleo.

Em meados da década de 80 generalizou-se um processo de desregulamentação e


liberalização em vários sistemas financeiros nacionais – destacando-se o do EUA, Reino
Unido e Japão – que alterou em profundidade as condições de concorrência dos bancos.
Este processo, desenrolando-se no contexto de desinflação, determinou uma forte procura
de aplicações com maior rendibilidade embora com maior risco. Esteve na origem da
concessão de financiamentos bancários maciços ao sector imobiliário, à escala mundial
(“Febre do Imobiliário”), materializando o primeiro ciclo global deste sector.

No que respeita à circulação internacional de capitais forma-se a primeira configuração do


“Mundo do Pacífico”:

• O Japão obtém excedentes comerciais com os EUA, as “Economias Chinesas” e


outras “Economias Emergentes” da Ásia Pacífico e “recicla” estes excedentes
mediante investimento directo e de carteira nos EUA, nas economias da Ásia/Pacífico
e também na Europa;

• os investidores institucionais japoneses adquirem volumes maciços de títulos do


tesouro dos EUA; as empresas do sector exportador realizam investimentos directos
em larga escala nos EUA e na Ásia/Pacífico (em economias da “zona dólar”) e
também na Europa (com destaque para as economias atlânticas – Reino Unido e
Holanda) e os bancos japoneses internacionalizam-se, marcando forte presença no
mercado do euro-dólar.

Em termos de liquidez internacional verificou-se um forte crescimento induzido pela


dinâmica de internacionalização da economia japonesa.

Em termos cambiais o aspecto central foi alta do yen, que desde 1985 até 2000 se situará
numa tendência de valorização real (Gráfico 1).

61
Informação Internacional

Gráfico 1

TAXA DE CÂMBIO REAL DO JAPÃO

Fonte: “Japanese Bonds – The Other Bubble”, Smither´s &Co Ltd, Report nº 115, September 2000.

Este período foi marcado por um conjunto de acontecimentos de âmbito internacional, de


que se destacaram os Acordos do Plaza (1985) e do Louvre (1987) – destinados a travar a
valorização do dólar e a controlar a sua descida – e a crise bolsista de 1987, que não teve
consequências graves a nível real.

2.2. 1991 a 1994 – Uma interrupção nas articulações existentes ou a estruturação de


padrões mais complexos de circulação de capitais?

Este período foi marcado por um conjunto de acontecimentos: recessões no Japão, EUA,
Reino Unido, Suécia e suas diferentes saídas (1991/92); “guerra comercial” EUA – Japão
(1992/1995) crise do mercado obrigacionista em 1994 e crise cambial e financeira do México
(1994).

Em termos de crescimento mundial assistiu-se a uma quebra explicável pelas recessões de


91/92 ocorridas nos países desenvolvidos, a que se seguiu uma retoma localizada nos EUA
e Reino Unido a partir de 1992, mas durante este período assistiu-se, após 1991, a um
rápido crescimento nas Economias Emergentes, marcando o inicio de uma fase em que
passaram a ter um papel mais pronunciado no crescimento mundial.

Neste período teve inicio uma longa fase de estagnação/recessão da economia do Japão;
uma década de expansão ininterrupta da economia dos EUA e uma fase prolongada de
contracção fiscal e de política monetária de combate à inflação na Europa; enquanto

62
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

prosseguia a destruição maciça da renda petrolífera acumulada pelos principais


produtores/exportadores do Golfo (vd. guerras Irão/Iraque e do Golfo), no contexto de baixos
preços do petróleo.

No que se refere às grandes economias do “Mundo do Pacífico”, salientam-se os seguintes


aspectos:

• EUA – política monetária expansionista na maior parte do período; gestão da crise


das “Savings and Loans Associations“ e das dificuldades generalizadas do sector
bancário; forte crescimento da liquidez (1990/94); inicio da consolidação orçamental;
prosseguimento do “boom” bolsista iniciado em 1982; acessos de fraqueza do dólar;
interrupção da política monetária expansionista em 1994; primeiro “soft landing” da
economia americana;

• Japão – política monetária expansionista ao longo do período; sucessão de estímulos


fiscais sem eficácia; papel crucial desempenhado pelo “2º Orçamento” (FILP) e pelas
suas fontes de financiamento – saldo da segurança social e serviços financeiros
postais; crise na banca e outras instituições financeiras; “recusa” por parte dos
investidores institucionais japoneses de compra de títulos do Tesouro dos EUA, após
elevadas perdas cambiais;

• China – sobre-aquecimento da economia;

• Ásia Pacífico – forte crescimento das economias emergentes e em industrialização


rápida;

• México – crise financeira e cambial de1994; foi uma crise de liquidez, ao contrário da
crise de 1982 que fora uma crise de solvabilidade e foi também uma crise de sobre-
consumo, associada ao colapso de um mecanismo de crescimento não inflacionista
centrado na manutenção de um peso sobre – valorizado; assistiu-se à posterior
flutuação do peso; esta crise desencadeou a primeira das grandes intervenções do
FMI realizadas na década de 90 em socorro de “economias emergentes”;

• Arábia Saudita – recuperação da quota de mercado do petróleo, devido ao aumento


de produção a seguir à guerra do Golfo; mas agravamento da posição financeira do
Estado, levando à redução dos activos no exterior e ao forte crescimento da dívida
pública interna;

Durante este período a Europa funcionou em contra – ciclo dos EUA, assegurando uma
desincronização na economia mundial que reduziu tensões inflacionista e criando
oportunidades de colocação de capitais aos investidores institucionais dos EUA (diferencial
de taxas de juro – mais elevados na Europa – com um aparente baixo risco de câmbio,
devido ao funcionamento do Sistema Monetário Europeu).

Em termo de transformações dos sistemas financeiros salientam-se:

63
Informação Internacional

• A reabsorção das dificuldades do sector bancário nos EUA e a consolidação nos EUA
de um novo tipo de sistema financeiro e de um novo tipo de internacionalização
financeira, tendo como centro os investidores institucionais e os fundos mobiliários;

• prosseguimento da crise no sistema financeiro japonês sem que se desencadeassem


transformações estruturais;

• Corrida generalizada às obrigações – “Febre das Obrigações”.

No que respeita à circulação internacional de capitais podem destacar-se os seguintes


aspectos:

• Manutenção da posição central do Japão na formação dos excedentes comerciais no


“Mundo do Pacífico” – obtenção de excedentes com os EUA e com as “Economias
Chinesas” sendo que estas obtinham, por sua vez, excedentes comerciais com os
EUA;

• forte crescimento dos investimentos directos (por parte do Japão, Coreia do Sul e
Taiwan) e de carteira (por parte dos EUA e Reino Unido) nas economias do México,
Chile e Ásia/Pacífico; influxos de capitais que neste último caso (e ao contrário do
México) não serviram para financiar défices correntes mas para aumentar as reservas
cambiais;

• redução drástica do investimento do Japão em títulos do tesouro dos EUA; mudança


no mecanismo de reciclagem dos défices americanos – com redução da reciclagem
directa pelos investidores institucionais, empresas e bancos japoneses, e predomínio
de uma reciclagem indirecta, sob a forma de investimento a médio e longo prazo nas
“economias emergentes” da Ásia/Pacífico;

• forte crescimento do investimento de carteira de investidores institucionais e de


grandes empresas dos EUA, nomeadamente em obrigações; acompanhada pela
diversificação geográfica de carteiras por parte dos fundos de pensões (sendo de
referir os fluxos em direcção à Europa);

• aquisição maciça de títulos de curto prazo dos EUA pelas “economias emergentes” da
Ásia/Pacífico, em consequência de um rápido crescimento, com acumulação de
reservas.

Neste período verificou-se um forte aumento da liquidez a nível mundial resultante da


coincidência de políticas monetárias expansionistas nos EUA (até Fevereiro de 1994) e no
Japão.

Em termos cambiais registou-se uma alta do yen e uma desvalorização do dólar (esta na
continuação de um movimento iniciado em 1985); e assistiu-se à generalização na
Ásia/Pacífico de regimes cambiais tendo como âncora o dólar e utilizados para combater a
inflação; sub-avaliação das moedas asiáticas face ao yen e às moedas europeias.

64
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

1994 – A QUEDA NO MERCADO DE OBRIGAÇÕES

Durante o ano de 1993 os EUA seguiram ainda uma política monetária "de facilidade",
traduzida em taxas de juro de curto prazo baixas, inserida nos esforços para apoiar o sistema
bancário americano, duramente atingido, no final dos anos 80 e início da década de 90, pelas
quebras em mercados tão importantes como o imobiliário. No final desse ano o excesso de
liquidez traduzira-se numa corrida à aquisição de títulos nos mercados estrangeiros,
contribuindo para que se gerasse, a nível global, uma euforia nos mercados de obrigações.
De acordo com John Plender (vd. Financial Times, 23 de Dezembro de 1994) a actuação de
instituições e investidores dos EUA foram determinantes nessa corrida às obrigações e,
dentro destas, aos títulos estrangeiros:
• o processo de desinflação nos anos 90, não antecipado por muitos investidores não
institucionais, penalizou os detentores de activos a curto prazo, reduzindo os
rendimentos que podiam esperar, há medida que as taxas nominais de curto prazo
foram descendo, como a política monetária pretendeu; muitos depositantes do sistema
bancário americano decidiram então transferir as suas poupanças para os fundos
mútuos mobiliários, que geriam carteiras de obrigações de longo prazo ou de acções, e
que ofereciam rendimentos muito superiores; há medida que as cotações dos títulos
americanos subiam, e em paralelo desciam os seus "yields", esses fundos iniciaram
uma procura sistemática de oportunidades no exterior; enquanto isto acontecia, os
fundos de pensão, por sua vez, lançaram-se num processo de diversificação geográfica
das suas carteiras de títulos, contribuindo igualmente para as aquisições de obrigações
no estrangeiro;
• nos EUA os bancos comerciais, atingido por uma acumulação de crédito mal parado,
utilizou as possibilidades de pagar depósitos a taxas mais baixas para investir em
obrigações de longo prazo com rendimentos superiores, nomeadamente obrigações de
Tesouro; os bancos de investimento orientaram-se, por seu lado, para um reforço das
actividades de transacção de títulos de longo prazo, por sua própria conta;
• os "hedge funds" e os tesoureiros de grandes empresas endividaram-se a curto prazo
para investir em obrigações do tesouro, com destaque para obrigações em moeda
estrangeira (ex: obrigações públicas europeias) com elevados rendimentos, bem como
em instrumentos derivados (na suposição de que o ano de 1994 assistiria a uma
quebra do yen).
Pode, pois, dizer-se que vários operadores americanos contribuíram para a alta verificada nos
mercados de obrigações, a nível mundial, mas que essa corrida às obrigações foi apoiada
num forte endividamento a curto prazo, aproveitando o nível das respectivas taxas de juro nos
EUA.
Durante o ano de 1994 assistiu-se ao colapso nas cotações das obrigações de vários países,
que acompanhou o aumento dos respectivos “yields”. De entre as várias explicações que
foram dadas para esse colapso retiveram-se algumas, apontadas no artigo já referido de John
Plender:
• a alteração na política monetária dos EUA, iniciada com o aumento das taxas de juro
de curto prazo, decidido pelo FED em Fevereiro, e prosseguida nos meses seguintes;
esta alteração levou a um movimento de venda rápida de obrigações, nomeadamente
por parte dos operadores que detinham vultuosas carteiras de obrigações de longo
prazo financiadas a curto prazo; por parte de operadores que se enganaram
redondamente quanto à evolução das cotações do dólar e do yen, e quanto as políticas
monetárias na Europa, e que se desfizeram em pouco tempo de quantidades maciças
de obrigações de Governos europeus; por parte de investidores institucionais com

65
Informação Internacional

importantes carteiras de "obrigações garantidas obrigações garantidas colateralmente


por hipotecas"; (conhecidas nos EUA por CMO), obrigações cujo prazo de maturidade
evolui com o comportamento das taxas de juro do mercado, dado o facto de as
hipotecas que Ihe servem de base serem normalmente de juro fixo; esses investidores
para fazer face ao aumento das carteiras de CMOS, que se seguiu ao aumento das
taxas de juro, a partir de Fevereiro, tiveram que se desfazer de obrigações do Tesouro
a cinco e dez anos;
• existência de distorções substanciais ao que se pode considerar ser o padrão de base
actual dos fluxos de capitais a nível mundial, caracterizado por saídas de capitais do
Japão, (que em 1993 registou um excedente de transacções correntes de 131 biliões
de dólares), em direcção aos EUA, que nesse ano registaram um défice corrente de
109 biliões; ora, enquanto os EUA, não obstante este défice, aumentaram rapidamente
as suas exportações de capitais, nomeadamente pela acção dos investidores
institucionais e dos "hedge funds", o Japão "recusou-se" a funcionar como fornecedor
de capitais a longo prazo, bastando recordar que em 1987, quando as instituições
japonesas desempenhavam plenamente o seu papel de financiadoras dos EUA
adquiriram 137 biliões de dólares de títulos de longo prazo americanos' enquanto no
ano de 1994, e até Julho, haviam adquirido apenas 8 biliões; para explicar esta
reticência não se pode deixar de referir os gigantescos prejuízos cambiais que esses
investidores acumularam durante anos, devido as flutuações do dólar; o contexto das
tensões comerciais com os EUA, que se repercutiram na valorização do yen em relação
ao dólar; e o novo regime das companhias de seguros do Japão que penaliza a
detenção de obrigações estrangeiras, em relação as domésticas; sendo assim, o
financiamento da balança de base dos EUA passou a depender de financiamentos
bancários a curto prazo e da aquisição de dólares pelos Bancos Centrais de outros
países, a título de reservas, o que não pode deixar de contribuir para a volatilidade nos
mercados das obrigações e dos câmbios;
• a percepção, por parte dos mercados, de que a economia mundial poderia estar a
entrar num período em que, ao crescimento continuado de um grupo numeroso de
países em desenvolvimento, se viria acrescentar uma retoma generalizada nos países
desenvolvidos, perspectivando uma fase de expansão e de grande procura dirigida ao
"pool" mundial de poupanças; se se recordar que as taxas de juro de longo prazo
permaneceram anormalmente elevadas durante a recessão e se aproximam já dos
máximos verificados durante a fase próspera dos anos 80, alguns analistas previram
um intensificar da competição, entre investidores privados e Governos, pelo que
consideram ser recursos financeiros escassos a nível mundial (vd. a continuada quebra
das taxas de poupança nas economias industrializadas e os baixos níveis relativos de
poupança característica de alguns países, hoje em crescimento, da América Latina);
• um aumento dos "riscos de crédito", não só circunscrito aos países em
desenvolvimento, como a vários países industrializados, sendo de recordar que nos 15
anos até 1992 o endividamento público, em proporção do PIB, cresceu de 21,2% para
36,75% nos países da OCDE, (apontando esta organização para níveis de 43,9°/0 em
1995), com a agravante destes valores não incluírem a parte sem cobertura financeira
esperada dos sistemas públicos de pensões de alguns países; os mercados podiam
recear que os Governos, acabassem por enveredar pelas vias da inflação interna ou da
desvalorização das suas moedas.
Fonte: “Informação Internacional – 1994”, Departamento de Prospectiva e Planeamento (DPP)

66
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

2.3. 1995-1998 – O “Mundo do Pacífico” e a “Febre da Ásia”

Este período foi marcado por um conjunto de acontecimentos – crise financeira e cambial do
México (1995); crise das economias emergentes da Ásia (1997/98) e de outras regiões
(1998/9); recessão no Japão (1998); reforço do “bull market” nos EUA, etc..

Neste período assistiu-se a um forte crescimento à escala mundial, centrado nos EUA (e
Reino Unido) e nas “economias emergentes”, com destaque para as asiáticas, tendo sido
interrompido em 1998 com a crise verificada nestas economias, que no entanto foi
rapidamente travada.

De 1995 a 1998 as grandes economias do “Mundo do Pacífico” foram caracterizadas pelos


seguintes processos:

• EUA – Um ”boom” de investimento em torno do desenvolvimento das novas


tecnologias de telecomunicações/Internet e da generalização dos equipamentos
informáticos em toda a economia; uma forte crescimento na mobilização de capital de
risco em torno de um leque variado de tecnologias (microelectrónica, fotónica,
genética); uma melhoria substancial na poupança pública, com a inversão dos saldos
orçamentais que passaram a ser positivos; e numa forte atractividade sobre capitais
oriundos do exterior;

• “Economias Emergentes” da Ásia/Pacífico – Um “boom” de investimento


alimentado pelos níveis muito elevados de poupança doméstica dessas economias e
pelo fluxo de capitais externos oriundos da própria da Ásia /Pacífico (Japão, Coreia do
Sul e Taiwan e Hong Kong); dos EUA, e da Europa, embora sob formas diferenciadas
(investimento directo, investimento de carteira e empréstimos bancários);

• Japão – retoma breve do crescimento em 1996, interrompido pouco depois, em


consequência da alteração da política orçamental num sentido de redução do défice;
papel chave no financiamento indirecto e directo dos dois “booms“ de investimento
atrás referidos, por via dos empréstimos bancários a longo prazo às Economias
Emergentes da Ásia e dos empréstimos a curto prazo a investidores dos EUA, através
do mecanismo do “yen carry arbitrage” que funcionou entre 1995 e finais de 1998, na
sequência da política de “taxa de juro zero” seguida internamente.

Neste período a Europa, em crescimento lento na fase de preparação para a 3ª fase da


UEM, participou activamente no financiamento do “boom” de investimento dos EUA, por via
do investimento directo em larga escala e pelo crescimento do peso de activos em dólares
nas carteiras dos investidores institucionais europeus (dado que muitas das empresas dos
EUA são hoje verdadeiras empresas globais, são considerados como investimentos globais
e sendo assim as “carteiras” dos investidores institucionais europeus têm vindo a aumentar
a sua parte de acções de empresas dos EUA); além dos seus bancos terem fornecidos
créditos em larga escala às “Economias Emergentes” da Ásia/Pacífico.

Em termos de sistemas financeiros assinale-se o Big Bang no sistema financeiro japonês


(1997/2003) no contexto de um sector bancário duramente atingido pelos impactos do

67
Informação Internacional

“rebentar” da “bolha” especulativa; e a rápida internacionalização dos sectores financeiros


das “economias emergentes”.

Neste período os fluxos de capitais característicos do “Mundo do Pacífico” e da sua inter-


relação com a Europa foram os que se ilustram na Figura IV:

• Um défice corrente dos EUA mantido em torno dos 2%, acompanhado por saídas de
capitais a longo prazo – investimento directo e investimento de carteira – este último
associado à diversificação de carteira dos investidores institucionais – a exigir
volumes elevados e sustentados de financiamento externo;

• uma entrada sustentada de capitais a longo prazo na economia americana, com um


peso crescente de investimento directo internacional (nomeadamente associado às
F&A) e de investimento de carteira dirigido a obrigações e acções de empresas, com
destaque para os fluxos originários das duas “Europas” – continental e atlântica; ao
mesmo tempo que se assistiu a um perda de peso das aquisições de obrigações do
tesouro, no conjunto do financiamento do défice da BTC;

• um papel crucial das entradas de capitais a curto prazo na economia americana, com
origem na Ásia – empréstimos bancários oriundos do Japão e aquisição de títulos do
tesouro de curto prazo pelos bancos centrais das “economias emergentes” da Zona
dólar (como forma de materialização do volume crescente de reservas cambiais);

• um enorme fluxo de capitais – investimento directo, investimentos de carteira,


empréstimos a curto prazo e empréstimos a longo prazo – dirigido para as
“Economias Emergentes” da Ásia Pacífico (“Febre da Ásia”); o Japão e a Europa
forneceram crédito, os EUA forneceram investimento de carteira e o Japão e a
“economias chinesas” mais evoluídas forneceram investimento directo;

De 1995 a 1997 assistiu-se a um forte crescimento da liquidez internacional, na sequência


da saída da crise do México e da política de taxa de juro “zero” no Japão.

Este foi um período de procura maciça de activos financeiros denominados em dólares


(emitidos nos EUA) ou acessíveis por meio do dólar (emitidos nas “Economias Emergentes”
integradas na zona dólar), associados aos dois “booms“ de investimento referidos;
provocando uma forte procura da moeda americana como moeda veículo nos mercados de
capitais.

Em termos cambiais, e em consequência destes fluxos, o período é caracterizado pela


valorização contínua do dólar em relação ao yen; pelo funcionamento até 1997 de regimes
cambiais nas “Economias Emergentes” da Ásia/Pacífico que tornaram mais rígida a ligação
ao dólar das suas moedas nacionais; e posteriormente às crises cambiais de 1997/8.

68
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

Figura 3

FLUXOS DE CAPITAIS NO “MUNDO DO PACÍFICO” E COM A EUROPA – 1995/1998

MÉXICO/ E.U.A.
VENEZUELA

“EUROPAS”

JAPÃO

NOVAS
CHINA E
ECONOMIAS
ECONOMIAS
INDUSTRIALI-
EMERGENTES
ZADAS

ARÁBIA
SAUDITA E
GOLFO

Fluxos Comerciais (seta indicando acumulação de excedentes)

Fluxos de Investimento Directo e de Investimento de Longo Prazo

Fluxos Públicos de Capitais a Curto Prazo (bancos centrais)

Fluxos Privados de Capitais a Curto Prazo (empréstimos bancários e aquisição de títulos)

Fonte: Direcção de Serviços de Prospectiva, Departamento de Prospectiva e Planeamento (DPP), 1999

69
Informação Internacional

2.4. 1998/99 – Crise e Recuperação Asiática

A crise cambial e financeira das “economias emergentes” da Ásia/Pacífico – que atingiu de


modo muito menos pronunciado as “Economias Chinesas” – foi acompanhada em 1998 e
1999 por grandes mudanças nos fluxos de capitais no “Mundo do Pacífico”:

• Uma retirada rápida e maciça de capitais das “economias emergentes” da Ásia que se
precipitaram sobre os mercados financeiros dos EUA, contribuindo para acelerar o
processo de alta das acções, no segmento mais especulativo das “Tecnologias da
Informação/Comunicações/Internet”;

• um forte aumento no défice corrente dos EUA, que funcionou plenamente como
“consumidor de última instância” do “Mundo do Pacífico”, absorvendo o aumento de
exportações das economias asiáticas – nomeadamente de “hardware” electrónico –
por via do seu “boom” interno de investimento e consumo privado;

• uma redução nos fluxos de capitais a curto prazo do Japão em direcção aos EUA, em
virtude da actuação das autoridades nipónicas que travaram o funcionamento do “yen
carry arbitrage”; a rápida recuperação nas balanças correntes das economias
asiáticas mais atingidas pela crise permitiu, no entanto, a retoma dos fluxos de
capitais a curto prazo originados nos bancos centrais dessas economias, que
procuraram rapidamente reforçara as suas reservas cambiais para afazer face a
eventuais crises futuras;

• um aumento dos fluxos de capitais a longo prazo (investimento directo internacional e


investimento de carteira) oriundos da Europa, com destaque para os da recém
formada zona Euro, que tiveram nesta fase um papel crucial no financiamento do
défice corrente dos EUA (nota: e por via deste na estabilização das economias
asiáticas);

• um forte aumento dos fluxos de capitais japoneses em direcção aos activos em


moedas europeias que iriam integrar a zona Euro, como manifestação de um desejo
de diversificação face ao dólar.

Em termos cambiais este período foi caracterizado por:

• Uma forte desvalorização nominal de várias moedas asiáticas em relação ao dólar –


destacando-se a excepção da República Popular da China – sem que o dólar tenha
deixado de ser a moeda de referência;

• uma valorização do yen face ao dólar – que travou a recuperação japonesa e


desincentivou a colocação de capitais japoneses no exterior; esta valorização teria
sido desejada pela administração americana, em resposta à exigência nesse sentido
feita pelas autoridades chinesas como contrapartida da não desvalorização da sua
moeda nacional.

70
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

JAPÃO, FEVEREIRO DE 1999 – O PÂNICO NO MERCADO DAS OBRIGAÇÕES

Em Setembro de 1998 o rendimento das Obrigações do Governo Japonês (JGB) a 10 anos atingiu
o valor de apenas 0,695%, um mínimo histórico.Com base nestes valores de rendimento, e na
elevação correspondente nas cotações das obrigações, o governo japonês parecia confiante em
que poderia aumentar substancialmente a emissão de obrigações do governo no ano fiscal que
começava em Abril de 1999, para financiar um programa de redução de impostos e um défice
orçamental record de 80 mil biliões de yens, com que esperava estimular uma economia em plena
recessão; bem como de obrigações garantidas pelo Governo para financiar o plano de
recapitalização do sistema bancário decidida em 1998 (já que o Banco Central se recusara a
assumir o custo do financiamento total desse plano, através da concessão de créditos directos à
Deposit Insurance Corporation).
Mas o governo estivera ele próprio por detrás dessa redução dos rendimentos, por via da compra
maciça de obrigações realizada pelo Trust Bureau Fund, do Ministério das Finanças, com base em
financiamentos obtidos junto dos Serviços Financeiros Postais, compras essas que elevaram as
cotações e reduziram os rendimentos. Ora o Trust Bureau Fund deparava-se nos anos seguintes
com uma potencial crise de liquidez, já que cerca de metade dos depósitos existentes nos Serviços
Financeiros Postais se encontram em contas a dez anos, com elevadas remunerações, e que
expiram em 2000 e 20001, não havendo nenhuma certeza de que os aforradores mantivessem as
suas poupanças no serviços postais.
O anúncio feito nos últimos dias de 1998 de que, por essa razão, o Trust Bureau Fund poderia ter
que cancelar novas aquisições em larga escala de obrigações do governo desencadeou uma
pânico de venda, que levou a uma quebra pronunciada nas cotações das obrigações e a uma
correspondente elevação do rendimento dos 0,695% de Setembro de 1998 para 1,9% no final
desse ano. Esta elevação das taxas de juro de longo prazo fez recear pelo êxito do programa de
relançamento por vai fiscal , por três razões principais:
• Um valor de 1,9% para os rendimentos de obrigações de longo prazo, ao ocorrer num
contexto deflacionário (redução nos preços de 2% ao ano), implicava taxas de juro real
elevadas que forneciam poucos estímulos para consumir ou para investir;
• A queda nas cotações das obrigações agravaria, no curto prazo, a situação financeira dos
bancos que dispunham de volumosas carteiras de obrigações, em que se passariam a
verificar elevadas menos valias; esta degradação da situação financeira aumentaria a
relutância dos bancos em conceder crédito ao sector empresarial, exactamente num período
de recessão;
• Uma elevação dos rendimentos das obrigações alongo prazo no mercado doméstico de
obrigações, faria reduzir o diferencial face aos mercados americanos e europeu, o que
poderia desencadear uma regresso de capitais e uma correspondente valorização do yen,
que atingiria as exportações japonesas.
Na altura surgiram várias propostas para tentar “segurar” o mercado obrigacionista:
• Diversificar as maturidades das obrigações do governo, mediante a emissão de obrigações
de médio prazo, por forma reduzir a pressão sobre as de longo prazo;
• aumentar as compras de obrigações do governo de longo prazo no mercado secundário, por
parte do Banco Central e/ou aumentar a oferta de obrigações de curto prazo, que o Banco
Central eventualmente pudesse adquirir directamente, sem resistências;
• fazer aceder directamente aos mercados de capitais as Agências do Governo, como a
Housing Loan Corporation, até agora financiadas pelo Trust Bureau Fund, mediante a
titularização em larga escala da sua carteira de empréstimos;
• acordar com os EUA uma compra maciça, por parte das autoridades americanas, de
obrigações do governo japonês de longo prazo.

71
Informação Internacional

1999 - A ATRACÇÃO DOS MERCADOS FINANCEIROS AMERICANOS SOBRE OS


INVESTIDORES INTERNACIONAIS

A atracção dos mercados financeiros dos EUA sobre os investidores externos, e em especial
a atracção exercida pelos títulos privados está patente no facto de no ano de 1999 as
aquisições de obrigações e acções por não residentes terem atingido os 338 biliões de
dólares, ou seja o equivalente a 96% do défice na BTC. A Figura permite analisar a evolução
do peso dos não residentes nos três segmentos do mercado de títulos norte – americano –
incluindo agora as obrigações do Tesouro. Podendo destacar-se os seguintes aspectos:
• Nos mercados de títulos do tesouro assistiu-se a uma redução do stock total da dívida
no montante de 71, 6 biliões de dólares, em virtude da canalização de parte dos
excedentes orçamentais para esse fim; tal redução tornou possível que, não obstante
os não residentes terem sido vendedores líquidos destes títulos em 9,6 biliões de
dólares, a sua parte no conjunto se tenha mantido relativamente estável;
• nos mercados de acções, e em consequência das aquisições maciças de acções
próprias pelas empresas americanas, assistiu-se a uma redução no total de acções
cotadas de cerca de 68 biliões de dólares; os investidores não residentes adquiriram 96
biliões de dólares de acções, situando-se logo a seguir em importância às aquisições
dos “mutual funds” (123 biliões de compras); e se os investidores externos detêm
apenas 9% do total das acções cotadas, em termos de fluxos seriam largamente
responsáveis pelo comportamento recente de índices como o S&P 500 ou do Nasdaq ;
• nos mercados de obrigações de empresas, os não residentes adquiriram cerca de 35%
do total das novas emissões (ou seja 157 biliões de dólares), muito acima do sector
segurador americano, com 71 biliões de dólares.
O relatório anual da UNCTAD “Trade and Development Report 2000”, no seu capítulo “The
Current Global Recovery and Imbalances in a Long Term Perspective” comentava esta
evolução nos seguintes termos:
• No passado os excessos de poupança do resto do mundo eram balanceados pelo
excesso de despesa do Governo dos EUA e a procura de activos denominados em
dólares era satisfeita com a emissão de obrigações do Tesouro. Actualmente é o sector
privado dos EUA que suporta o crescimento mundial e dado que o Governo gera um
excedente orçamental a procura de activos em não pode ser satisfeita com um
aumento da oferta de títulos do tesouro, sem risco, mas exige a emissão de títulos pelo
sector privado dos EUA;
• uma questão crucial é a de saber se os investidores externos que procuram antes de
mais a liquidez e a segurança estarão igualmente dispostos a deter títulos privados de
maneira permanente; enquanto as acções das empresas internet ocuparem o centro da
atenção, a perspectiva de realização rápida de ganhos de capital pode compensar o
maior risco em relação aos títulos do tesouro e o dólar poderá transformar-se na
“moeda veicular” das transacções internacionais de acções; a tendência para listar
muitas empresas das economias emergentes em Nova Iorque para ter garantias de
liquidez, reforça a tendência para o dólar se tornar na “moeda veicular” no mercado
global de acções;
• no entanto dado que a dívida privada não é uma substituta perfeita dos títulos do
Tesouro, o aumento do excedente orçamental dos EUA pode aumentar a fragilidade da
situação corrente e aumentar a probabilidade de um “hard landing” para o dólar. Nesse
caso as perspectivas globais dependerão do modo como for gerida a coordenação de
políticas monetárias entre os EUA, a Europa e o Japão.

72
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

2.4.1997/1998 – Crise Asiática

A crise cambial e financeira das "economias emergentes" da Ásia/Pacífico – que atingiu de


modo muito menos pronunciado as "Economias Chinesas" – foi acompanhada em finais de
1997 e 1998 por grandes mudanças nos fluxos de capitais no "Mundo do Pacífico":

• Uma retirada rápida e maciça de capitais das "economias emergentes" da Ásia que
se precipitaram sobre os mercados financeiros dos EUA, contribuindo para acelerar o
processo de alta das acções, no segmento mais especulativo das "Tecnologias da
Informação/Comunicações/lnternet";

• um forte aumento no défice corrente dos EUA, que funcionou plenamente como
"consumidor de última instância" do "Mundo do Pacífico" absorvendo o aumento de
exportações das economias asiáticas - nomeadamente de "hardware" electrónico -
associado ao seu "boom" interno de investimento;

• uma redução nos fluxos de capitais a curto prazo do Japão em direcção aos EUA, em
virtude da actuação das autoridades nipónicas que travaram o funcionamento do "yen
carry arbitrage";

• um forte aumento dos fluxos de capitais japoneses em direcção aos activos em


moedas europeias que iriam integrar a zona Euro, como manifestação de um desejo
de diversificação face ao dólar;

Um aumento dos fluxos de capitais a longo prazo em direcção aos EUA e com origem na
Europa (investimento directo internacional e investimento de carteira), por razões que se
prendem com três processos:

• a "corrida" à aquisição/fusão com empresas inovadoras dos EUA, por parte das
empresas europeias de Tecnologias de Informação e das Indústrias da Saúde;

• a internacionalização das grandes empresas europeias de sectores mais tradicionais


(automóvel, material eléctrico, químicas, alimentares e bebidas) que para ganharem
dimensão mundial têm que ter uma forte presença no mercado americano;

• a corrida dos bancos europeus às operações mais rendíveis e de maior risco nos
EUA, a recomposição das carteiras dos investidores institucionais europeus por forma
a reduzir a sub-representação dos títulos americanos, e os movimentos de F&A de
bancos, seguradoras e fundos de investimento europeus nos EUA.

Em termos cambiais este período foi essencialmente caracterizado por:

• Uma forte desvalorização nominal de varias moedas asiáticas em relação ao dólar -


destacando-se a excepção da República Popular da China - sem que o dólar tenha
deixado de ser a moeda de referência.

73
Informação Internacional

FACTORES QUE CONTRIBUIRAM PARA A CRISE ASIÁTICA DE 1997/8

Num relatório do Banco Mundial, publicado no primeiro trimestre de 1998, Guiilermo Perry,
economista principal do Banco Mundial para a América Latina apontava quatro factores chave que
teriam contribuído decisivamente para a vulnerabilidade das economias asiáticas que entraram em
crise a partir de meados de 1997 e, cinco causas que teriam estado na origem desses factores. Os
quatro factores foram, na síntese do Financial Times de 17 de Março de 1998, os seguintes:
• uma acumulação de dívida externa de curto prazo, excedendo as reservas cambiais, o que
tornou essas economias vulneráveis a ataques especulativos;
• a obtenção de vultuosos empréstimos em moeda estrangeira, sem o correspondente
"hedging", por parte quer do sistema bancário, quer de grandes empresas, que limitou, a
partir de certa altura, a margem de manobra das autoridades para procederem a uma
desvalorização atempada, sem colocar o sector privado sob grande pressão financeira;
• elevados níveis de divida por parte das empresas e "carteiras" de empréstimos de baixa
qualidade, por parte dos bancos, que se traduziram numa vulnerabilidade de uns e outros
perante a eventual elevação de taxas de juro ou de abrandamentos significativos do nível de
actividade; esta circunstancia adicionou-se à anterior, no sentido de restringir a margem de
manobra das autoridades para responder aos ataques especulativos;
• uma vulnerabilidade mais tradicional do sector externo, resultante de várias das economias
se terem defrontado com valorizações das suas moedas (nota: arrastadas pela valorização
do dólar desde meados de 1995, dólar com que as moedas de vários desses países
estavam alinhadas), tendo tal processo arrastado um abrandamento das receitas de
exportação e contribuído para elevados ou crescentes défices de transacções correntes.
No que respeita às causas a que se puderam ficar a dever estes factores de crise, Guiilermo Penry
aponta cinco:
• a existência, nos sistemas financeiros dessa economias de "incentivos" a comportamentos
privados contrários ao interesse público, materializando a figura de "moral hazards'', entre os
quais a existência explícita ou implícita de esquemas de seguro dos depositantes,
contribuindo para que banqueiros e investidores tenham corrido os riscos de um sobre –
investimento em activos financeiros;
• a existência, nalguns países, de formas de "capitalismo clientelar" que contribuíram para
ocultar a natureza não lucrativa de transacções;

• um quadro regulamentar e mecanismos de supervisão do sistema financeiro laxista,


agravada por uma falta de informação credível sobre as actividades dos bancos;

• regimes de cambio rígidos que levaram a uma percepção, por parte de investidores e outros
actores de que o risco de desvalorização era pequeno, ao mesmo tempo que como se
referiu anteriormente, a ligação a um dólar em apreciação, fez reduzir as exportações;

• processos de liberalização a nível financeiro e das contas de capital externas parciais e mal
sequenciados, levando a uma redução das restrições à obtenção de empréstimos no
exterior, ao mesmo tempo que eram mantidas restrições à propriedade estrangeira sobre
entidades do sector bancário doméstico.

74
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

3. 2000 - 2005: A CAMINHO DE UMA NOVA CONFIGURAÇÃO NO "MUNDO DO


PACÍFICO"?

3.1 1999 - da euforia a uma inevitável "aterragem" da economia dos EUA

O ano de 1999 foi um ano de crescimento rápido a nível mundial, em contraste com o
anterior. No "Mundo do Pacífico" - as economias asiáticas recuperaram de modo
surpreendente da recessão/abrandamento de 1998, a economia dos EUA manteve elevadas
taxas de crescimento e os produtores da OPEP, liderados pela Arábia Saudita mudaram de
estratégia e conseguiram obter em poucos meses uma forte elevação dos preços do
petróleo, o que alterou, favoravelmente as perspectivas económicas da Rússia. Analisando
mais em detalhe:

• EUA - A "febre da Internet" atinge o seu auge, com muitas das empresas do Nasdaq
a atingirem valorizações astronómicas, e o índice no seu conjunto a descolar
completamente do índice representativos de indústrias mais tradicionais (Dow Jones);
sucedem-se os IPO (Quadro I), intensificam-se a compras, por valores elevadíssimos,
de empresas "jovens" dominando tecnologias consideradas de alto potencial, por
parte das grandes empresas de Tl americanas e europeias; a elevada rendibilidade
geral das empresas americanas estimula um número cada vez maior de F&A, com
destaque para s que são promovidas por iniciativa de empresas da Europa;

Quadro 1

A “FEBRE DA INTERNET" - A VALORIZAÇÃO DOS IPO NO


PERIODO 1996/2000

ANOS NÚMERO DE IPO FUNDOS RETORNO SOBRE O


MOBILIZADOS PREÇO DA OFERTA
(mil milhões de (%)
dólares)

1996 505 58 23

1997 390 52 24

1998 247 45 37

1999 486 93 276

2000 406 97 -18

Fonte: www.ipo-fun.com

• Japão - A economia foi alvo de mais um pacote de estímulo fiscal no inicio do ano de
1999 e parece iniciar um lento regresso ao crescimento; cresce o endividamento do
sector público e surgem as primeiras manifestações de exaustão do modo de
financiamento dessa dívida, que caracterizou a década de 90 (vd. CAIXA sobre crise
das obrigações); o dinamismo do sector empresarial concentra-se num sector

75
Informação Internacional

exportador ligado às tecnologias da informação com crescimentos de 12% ao ano e


substanciais melhorias de produtividade, "puxado" claramente pela dinâmica da
economia dos EUA, com quem se reforçam as complementaridades; a bolsa de
Tóquio anima-se com a entrada de capitais do exterior que se dirigem às empresas
deste sector;

• Economias Asiáticas em Crise - de modo surpreendente a Coreia do Sul, e em


menor escala a Tailândia, Malásia, Indonésia, iniciam a retoma económica assente no
aumento das exportações (com destaque para as do sector electrónico que se
dirigiram aos EUA), e na desposa pública; a contracção profunda das importações,
graças à queda da procura interna, e em menor escala, o acréscimo das exportações
deram origem a uma rápida obtenção de excedentes comerciais que facilitaram a
reconstituição das reservas cambiais; o que contribuiu par aumentar a confiança nas
moedas, facilitando a redução das taxas de juro; a alteração na política monetária, em
conjunto com uma expansão fiscal, acabou por contribuir para a retoma económica;

• China - foi menos atingida pela crise de 1997/98 devido à sua menor integração nos
mercados internacionais de capitais (manutenção da inconvertibilidade da moeda
nacional ao nível das contas de capital) e ao fraco recurso à divida de curto prazo;
não obstante o da economia chinesa abrandou em 1998, com uma retracção da
procura interna e externa, reforçando-se os sinais de deflação e de excessos de
capacidade; face a esta conjuntura o Governo aplicou uma política orçamental
expansionista e prosseguiu na via de maior integração na economia global mediante o
acordo alcançado com os EUA, que Ihe abriu a porta à adesão à OMC; os sectores
favoráveis ao prosseguimento das reformas económicas internas obtiveram uma
vitória;

• Arábia Saudita e México - A queda brusca dos preços do petróleo em 1998, agravou
as dificuldades financeiras nos países produtores, e conduziu à decisão saudita de
reforçai a capacidade de influência da OPEP nos mercados, por via do
estabelecimento de acordos de limitação da produção extensivos a produtores não
membros da OPEP, como o México.

Em termos de fluxos de capitais, os principais movimentos deste ano de 1999 referem-se a:

• Um aumento do défice corrente dos EUA, assente no aumento do défice comercial


com a Ásia e a Europa e numa súbita degradação nos rendimentos de capitais;
acompanhado por um aumento dos fluxos de capitais a curto prazo dirigidos aos EUA,
sob a forma de compras de títulos do tesouro, nomeadamente por parte dos bancos
centrais das "economias chinesas" e da Coreia do Sul;

• uma alteração substancial dos fluxos protagonizados pelo Japão - redução dos
financiamentos bancários a curto prazo aos EUA e às economias emergentes da
Ásia: entradas de capitais externos no mercado de acções japonês, dirigidas às
empresas do sector das tecnologias da informação; aumento significativo das
emissões de obrigações em yens, por parte de não residentes (vd. Empresas

76
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

americanas e também europeias), reinicio de investimento directo japonês nos EUA,


liderado pelas empresas do sector das Tecnologias da Informação;

• um papel crucial das entradas de capitais oriundas da Europa (investimentos directos


e investimentos de carteira) para fazer face aos défices correntes dos EUA, num
período de travagem na entrada de capitais japoneses; a constituição da zona Euro,
ao suprimir o risco de cambio no seu interior aumentou a disponibilidade dos bancos,
investidores institucionais e grandes empresas para o investimento fora dela, não
obstante a incerteza cambial que necessariamente acompanhou os primeiros passos
do Euro.

Em termos cambiais assinalam-se no ano de 1999:

• Uma valorização do yen face ao dólar - que travou a recuperação japonesa e


desincentivou a colocação de capitais japoneses no exterior; esta valorização teria
sido desejada pela administração americana, em resposta à exigência nesse sentido
feita pelas autoridades chinesas como contrapartida da não desvalorização da sua
moeda nacional;

• uma continuada desvalorização do Euro face ao dólar e ao yen, neste último caso
alimentada pelo início da rápida redução nas carteiras de activos em Euro
constituídas por investidores japoneses antes da passagem à 3a fase da UEM,
redução essa devida à desvalorização da moeda europeia face ao dólar.

Em Setembro de 1999 o Federal Reserve Bank dos EUA endurece a política monetária,
iniciando o que pretende ser uma "aterragem suave" da economia americana depois da
euforia verificada em 1999.

Durante 2000, a continuação dos fluxos de capitais da zona Euro para os EUA permitiu
financiar o aumento do défice corrente dos EUA com a Europa (aumento do défice comercial
e redução dos rendimentos de capitais em dólares, devido à desvalorização do Euro) e parte
do aumento do défice comercial com a Ásia, enquanto a acumulação de reservas cambiais
por parte das economias asiáticas permitiu financiar o restante, libertando, pelo menos
temporariamente, a economia americana de pressões externas na fase inicial dessa
"aterragem".

O impacto de sucessivos aumentos das taxas de juro no mercado de acções e em particular


no mercado dos IPO, traduziu-se na queda verificada no Nasdaq que propiciou o registo de
valorizações bolsistas menos especulativas do que acontecera em 1999.

Mas no final de 2000 existiam ainda dúvidas sobre o desenlace final desta "aterragem".

77
Informação Internacional

1999 - A ATRACÇÃO DOS MERCADOS FINANCEIROS AMERICANO. SOBRE OS


INVESTIDORES INTERNACIONAIS

A atracção dos mercados financeiros dos EUA sobre os investidores externos, e em especial a
atracção exercida pelos títulos privados está patente no facto de no ano de 1999 as aquisições de
obrigações e de acções por não residentes terem atingido os 338 biliões de dólares ou seja o
equivalente a 96% do défice na BTC. Analisando a evolução do peso dos não residentes nos três
segmentos do mercado de títulos norte-americano – incluindo também as obrigações do Tesouro,
podem destacar-se os seguintes aspectos:
• Nos mercados de títulos do tesouro assistiu-se a uma redução do stock total da dívida no
montante de 71,6 biliões de dólares, em virtude da canalização de parte dos excedentes
orçamentais para esse fim; tal redução tomou possível que, não obstante os não residentes
terem sido vendedores líquidos destes títulos em 9,6 biliões de dólares, a sua parte no
conjunto se tenha mantido relativamente estável;
• Nos mercados de acções, e em consequência das aquisições maciças de acções próprias
pelas empresas americanas, assistiu-se a uma redução no total de acções cotadas de cerca
de 6cz biliões de dólares; os investidores não residentes adquiriram 96 biliões de dólares de
acções, situando-se logo a seguir em importância às aquisições dos "mutual funds"
(123 biliões de compras); e se os investidores externos detêm apenas 9% do total das
acções cotadas, em termos de fluxos teriam sido largamente responsáveis pelo
comportamento recente de índices como o S&P 500 ou o Nasdaq;
• Nos mercados de obrigações de empresas, os não residentes adquiriram cerca de 35% do
total das novas emissões (ou seja 157 biliões de dólares), muito acima do sector segurador
americano, com 7I biliões de dólares.
O relatório anual da UNCTAD "Trade and Development Report 2000", no seu capítulo The
Current Global Recovery and Imbalances in a Long Tern Perspective comentava esta evolução nos
seguintes termos:
• No passado, os excessos de poupança do resto do mundo eram balanceados pelo excesso
de despesa do Governo dos EUA e a procura de activos denominados em dólares era
satisfeita com a emissão de obrigações do Tesouro; actualmente é o sector privado dos
EUA que suporta o crescimento mundial, e dado que o Governo gera um excedente
orçamental, a procura de activos em não pode ser satisfeita com um aumento da oferta de
títulos do tesouro – sem risco – mas exige a emissão de títulos pelo sector privado dos EUA;
• uma questão crucial é a de saber se os investidores externos que procuram antes de mais a
liquidez. e a segurança estarão igualmente dispostos a deter títulos privados de maneira
permanente; enquanto as acções das empresas internet ocuparem o centro da atenção, a
perspectiva de realização rápida de ganhos de capital pode compensar o maior risco em
relação aos títulos do tesouro e o dólar poderá transformar-se na moeda veicular'` das
transacções internacionais de acções; a tendência para listar muitas empresas das
economias emergentes em New York para ter garantias de liquidez, reforça a tendência para
o dólar se tornar na `'moeda veicular" no mercado global de acções;.
No entanto dado que a divida privada não é uma substituta perfeita dos títulos do Tesouro, o
aumento do excedente orçamental dos EIJA pode aumentar a fragilidade da situação corrente e
aumentar a probabilidade de um "hard landing” para o dólar. Nesse caso as perspectivas globais
dependerão do modo como for gerida a coordenação de políticas monetárias entre os EUA, a
Europa e o Japão.

78
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

3.2. Japão 2000-2005: Um multiplicador de riscos para a economia mundial ou um


factor de transformações profundas no "Mundo do Pacífico"?

Uma das maiores incertezas existentes quanto à evolução da economia mundial, e que está
associada à eventualidade de uma “aterragem turbulenta” nos EUA é a sua possível
coincidência com uma crise grave na economia do Japão, crise essas gerada antes de mais
por factores endógenos, mas multiplicável por uma evolução claramente negativa que se
venha a verificar nos EUA.

É comum afirmar-se que a estagnação/recessão do Japão durante a década de 90 é um


caso típico de colapso no valor dos activos financeiros, ocorrido com a implosão da "bolha
"especulativa, em 1989/199O, que arrastou o enfraquecimento do sistema bancário, a queda
no preço dos bens e a geração de uma procura interna privada (consumo e investimento)
sistematicamente deficiente.

Mas para se compreender melhor a gravidade da situação, comece-se por recordar que a
economia japonesa experimentou ao longo da década de 90 as consequências de três
processos, de natureza financeira, que se sucederam e interagiram uns com os outros.

Uma desarticulacão crescente entre o sector bancário e a "economia industrial"


privadas, antes e depois do rebentar da "bolha "especulativa

Esta desarticulação foi concretizada durante a década de 80, e nomeadamente durante o


período 1985/1999, e teve duas traduções principais:

• As grandes empresas do sector industrial exportador lançaram-se num processo


maciço de investimento de expansão das capacidades, no Japão e no exterior, num
número limitado de sectores - automóvel, mecânica, electrónica de consumo,
instrumentação - com o objectivo de obter uma posição de liderança a nível mundial
ou de modificar radicalmente a situação concorrencial, num contexto de alta do yen;
esse investimento foi financiado não a partir de fundos próprios das empresas (que
como era típico do "modelo "japonês apresentavam baixas rendibilidades crónicas)
mas de um endividamento maciço, no mercado de obrigações interno e internacional,
apoiando-se na valorização excepcional das suas acções durante a formação da
"bolha especulativa", para obter custos reduzidos para esse endividamento; a
concorrência entre Keiretsus, que era a forma dominante de concorrência empresarial
no Japão levou a uma corrida de todos eles ao investimento nos mesmos
sectores/produtos;

• os bancos viram desertar os seus grandes clientes industriais e defrontaram-se com


os primeiros passos de liberalização do sector, tendo mudado radicalmente os
destinos do seu crédito - do financiamento da indústria e do sector exportador dos
respectivos - os bancos lançaram-se em dois movimentos:

• financiaram em escala maciça, e no interior do Japão, a "economia baseada na


terra" - imobiliário, construção civil, infra-estruturas, redes de distribuição – tendo
contribuído decisivamente para uma explosão nos preços dos terrenos, que fizeram

79
Informação Internacional

valorizar os patrimónios das grandes empresas, que detinham importantes carteiras


de terrenos (facilitando por sua vez a valorização das sua acções); e das famílias
que detinham habitação própria;

• lançaram-se numa expansão internacional "todos os azimutes", ajudando a financiar


a partir dessa nova base de recolha de depósitos à escala mundial a própria
expansão das empresas industriais japonesas.

Após a implosão da "bolha especulativa", e durante a década de 90:

• Acumularam-se excessos de capacidade na indústria exportadora; e manteve-se até


muito tarde na década a recusa de realizar uma redução de capacidades levando ao,
aumento do endividamento das empresas, que se viram, entretanto, confrontadas
com o fim dos mecanismos de obtenção do crédito barato e com a súbita
desvalorização dos seus patrimónios, em consequência da queda nos valores das
acções e no preço da terra que acompanhou o rebentar da "bolha especulativa"; mas
ao longo da década de 90, o aumento substancial das amortizações permitiu manter
valores elevados para o "cash flow", o que tendo sido acompanhado por uma quebra
no investimento levou à formação de excedentes financeiros no sector das grandes
empresas, tomando estas relativamente independentes do crédito bancário;

• acumulou-se o crédito mal parado nos bancos, em consequência da desvalorização


maciça das garantias colaterais de muitos empréstimos e do excesso de capacidade
com proporções gigantescas nos sectores da "economia baseada na terra", que se
tinham tomado nos principais clientes domésticos dos bancos; o lento processo de
reabsorção desse crédito mal parado, mesmo depois da injecção maciça de fundos
públicos decidida em 1998, foi parcial, deixando os bancos vulneráveis a um
agravamento da situação financeira de entidades da "economia baseada na terra";
face ao declínio das taxas de juro, à redução das suas margens operacionais no
crédito, os bancos apoiaram-se na aquisição maciça de obrigações do governo para
obter rendimento e na valorização artificial da sua carteira de .acções para manter o
nível do seu capital próprio (devido à peculiaridade da legislação japonesa que
permitia que parte dessas carteiras fosse contabilizada como capital).

Uma articulação do sector financeiro público em torno da "economia baseada na


terra", como condição para salvar o sector bancário privado

A partir de 1992 sucedem-se os "pacotes" de estímulo fiscal à economia, sob a forma de


financiamento às obras públicas e à actividade de construção; de crédito directo e de
garantias de crédito às PME's desertadas pelos bancos privados, nomeadamente após a
recessão de 1998; e de reduções de impostos.

Acumulam-se os défices públicos e a dívida pública explicita (sem contar com a divida
implícita na segurança social) atinge em 2000 os 130% do PIB, o valor mais elevado entre
os países industrializados.

80
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

Mas graças ao papel central dos serviços financeiros postais, e à política agressiva de
captação de depósitos seguida por estes (recorde-se que desde 1991 ofereceram taxas de
juro fixas de 6,5% a cerca de 35 milhões de contas, num ambiente em que as taxas de juro
de curto prazo se aproximaram de zero, a partir de 1995) o governo pode contar com um
massa de depósitos semelhante à do sector bancário e inteiramente utilizável para o
financiamento do FILP, que canalizou esses fundo para os "pacotes" de estímulo fiscal para
a aquisição maciça de dívida pública, que assim permanecia sob controlo directo do
governo; os fundos de segurança social pública completaram os serviços financeiros postais
nesta dupla função.

O gigantesco investimento público realizado ao longo da década de 90, hoje tão criticado,
pela sua aparente irracionalidade, permitiu canalizar uma parte muito significativa da
poupança das famílias para manter em actividade um sector da construção civil/obras
públicas sobre-dimensionado e sobre endividado à banca, e para "segurar" o preço da terra,
com o objectivo de evitar um colapso do sector bancário privado. Em contrapartida de ter
deixado os serviços financeiros postais com uma carteira de aplicações de baixíssima
remuneração, ou de duvidoso retomo.

Uma alteração estrutural no sector financeiro privado e na estrutura de propriedade

A terceira grande mudança ocorreu a partir de 1996 com:

• lançamento do programa de liberalização e abertura do sector financeiro, conhecido


como Big Bang orientado para o desenvolvimento de um sistema financeiro com uma
mais forte componente de mercado de capitais e maior internacionalização, e com
maior competição entre as instituições;

• a decisão de reformar em profundidade o sistema de participações cruzadas entre


banco s e empresas de um mesmo Keiretsu, que havia permitido a estes, em tempos
normais, controlar as cotações das acções das suas empresas.

A primeira reforma veio reduzir ainda mais as possibilidades de lucro dos bancos nos seus
negócios tradicionais, num contexto em que permanecem sob a ameaça de novo crédito mal
parado se se acelerarem as falências na "economia baseada na terra"; e em que as novas
oportunidades que Ihe foram abertas pelo Big Bang só se poderão desenvolver plenamente
no dia em que o sistema de pensões tenha uma forte componente de contas poupança
individuais e em que as famílias se vejam obrigadas a procurar aplicações de muito maior
rendimento/valorização, proporcionadas nos mercados de capitais e não nos depósitos
bancários ou na compra de obrigações do Governo.

A segunda reforma precipitou, recentemente, a venda em larga escala das carteiras de


acções dos bancos1 (e das grandes empresas) sem que existissem mecanismos de

(1) Recorde-se que a legislação japonesa permitia que parte das carteiras de acções dos bancos seja
contabilizada como capital

81
Informação Internacional

mercado que facilitassem a aquisição dessas acções por parte das próprias empresas, o
que se traduziu numa queda nos índices bolsistas, tanto mais pronunciada quanto os
investidores externos se têm vindo a retirar da bolsa de Tóquio. Ora a queda do valor das
acções ameaça o capital dos bancos.

Por sua vez a continuação do aumento da dívida pública, se forçasse o governo a elevar os
rendimentos das obrigações para atrair as poupanças das famílias, levaria a uma queda nas
suas cotações, reduzindo o valor das volumosas carteiras de obrigações do governo,
detidas pelo sector bancário.

A situação actual apresenta-se como um "quebra cabeças", como se pode apreciar pelos
exemplos seguintes:

• O aumento do endividamento do Estado, como forma de, por intermédio da procura


pública compensar a deficiência da procura privada, no quadro nacional, tem limites
tanto maiores quanto não tem sido possível gerar um crescimento endógeno
suficiente para impedir a ocorrência de uma "armadilha da dívida";

• o investimento público que proporcionaria um maior potencial de crescimento é o que


se pudesse concentrar na consolidação de uma "economia baseada no
conhecimento" e numa "sociedade da informação", mas estes investimentos não só
competem com o destinados manter em flutuação a "economia baseada na terra",
como contribuem para a queda do preço da terra;

• a potencial contradição entre o interesse do governo em manter a maior margem de


manobra para lançar novos estímulos de base orçamental sem ter que aumentar os
rendimentos das obrigações e o interesse das famílias dos "baby boomers" que
precisam de obter valorizações muito maiores para as sua poupanças do que as
gerações anteriores aceitaram ter;

• a realização de uma transformação do sistema financeiro, no sentido de um sistema


baseado nos mercados de capitais, em simultâneo com a manutenção de um sector
bancário refém da "economia baseada na terra" e com a pretensão de manter as
poupanças das famílias disponíveis para a tomada de dívida do Estado é um factor de
risco elevado.

Donde resulta que a margem de manobra das autoridades japonesas para, contando só
com as suas actuações, impedirem a eclosão de uma crise e desencadearem um processo
de crescimento centrado numa "economia baseada no conhecimento" parece cada vez mais
estreito.

Ora, no caso de se concretizarem-se evoluções negativas nas duas maiores economias do


mundo em 2001 – com consequências graves no curto prazo – pode, mesmo assim,
conceber-se um cenário em que o resultado – para o conjunto do período 2000/2005 – fosse
uma profunda transformação na economia mundial, e em particular no "Mundo do Pacífico",
sob a forma de uma mais efectiva integração entre as economias dos EUA e do Japão (a

82
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

concretizar exactamente num período decisivo para a integração da China na economia


mundial, após a sua adesão à OMC).

Este cenário assentaria numa profunda transformação estrutural no Japão, e numa opção
clara por parte dos EUA no sentido do reforço dos laços privilegiados com o Japão, seu
principal aliado na Ásia. Assim:

• As famílias japonesas após perdas de património decorrentes da desvalorização de


activos verificada com a implosão da "bolha "especulativa e de uma década de baixos
rendimentos nas suas poupanças junto do sector bancário puderam contar com uma
única aplicação de alto rendimento e sem risco que foi, desde 1991, a colocação de
depósitos na caixa financeira postal a dez anos e à taxa fixa de 6,567o; sendo que em
2000 e 2001 essas aplicações chegam à maturidade; face à situação critica de várias
companhias de seguro de vida, às reduções de benefícios nos esquemas de pensões
das grandes companhias, e às incertezas do sistema público de segurança social,
num contexto de envelhecimento da população, as famílias vão precisar de poder
colocar as suas novas poupanças em aplicações com rendimentos muito superiores
aos que os depósitos ou as obrigações do governo podem proporcionar no Japão; as
melhores aplicações disponíveis no mundo encontram-se provavelmente junto do
sector empresarial dos EUA; desde que fosse suprimido ou drasticamente reduzido o
risco de cambio (nomeadamente o risco "secular" de valorização do yen face ao
dólar);

• o governo, preocupado com a situação a prazo do sistema de pensões do país


aceleraria a sua reforma, mediante a rápida introdução de um "pilar" em capitalização
baseado em contas individuais de poupança que contribuiriam para a criação de uma
forte sector de fundos mobiliários dispondo de total liberdade de colocação de capitais
no estrangeiro, regime que também se aplicaria às companhias de seguro de vida;

• a desarticulação das participações cruzadas entre empresas dos mesmos Keiretsu


far-se-ia num quadro em que parte dos excedentes financeiros das empresas seria
utilizado na aquisição de acções próprias, o que permitiria temporariamente evitar
uma quebra das cotações; ao mesmo tempo que a consolidação de um grupo de
empresas nas áreas das tecnologias de informação, fortemente ligadas à economia
dos EUA e com posição de liderança na transformação do Japão numa "sociedade da
informação" ofereceria uma oportunidade única para um grande fluxo de capitais do
exterior, nomeadamente por parte dos investidores institucionais dos EUA, que
contribuísse para uma rápida valorização no mercado de acções local, facilitando
posteriormente uma colocação maciça de títulos junto dos fundos mobiliários em que
os japoneses investiriam as suas novas contas individuais de poupança;

• o governo levaria a cabo uma drástica redução dos programas de investimento em


obras públicas lançados pelo Estado (com base no financiamento obtido até agora
junto da caixa financeira postal e da segurança social); esta opção lançaria uma crise
profunda na indústria da construção e no imobiliário, aumentaria o crédito mal parado
nos bancos; e tomaria imperiosa uma redução muito significativa na dimensão do

83
Informação Internacional

sector bancário actualmente existente, o que deveria facilitar a evolução muito mais
rápida para um sistema financeiro baseado no mercado de capitais; a valorização no
mercado bolsista permitiria, por seu lado, obter uma "almofada" de protecção neste
processo;

• o governo procederia à desarticulação do sector público financeiro, actualmente


organizado em função do financiamento do "2° Orçamento" – o FILP – e canalizaria
novos fundos públicos para apoio à reestruturação do sector bancário;

• o governo utilizaria a margem de que dispõe actualmente para aumentar os impostos


para iniciar uma processo de travagem, a prazo, do crescimento da dívida pública,
embora num ambiente de crescimento muito reduzido;

• os EUA procederiam a aquisições maciças de dívida pública japonesa, uma vez posto
em marcha o programa de reformas estruturais e de abertura, por intervenção do
Federal Reserve Bank que passaria deter yens como reservas cambiais – sob a forma
de obrigações a curto prazo.

O resultado de um processo desta natureza seria, no período 2000/2005:

• Uma nova contracção do crescimento económico japonês, mas por redução drástica
do peso da "economia baseada na terra" que trava o desenvolvimento, no Japão, de
uma "economia baseada no conhecimento", como a que existe nos EUA;

• uma “libertação” das poupanças domésticas, da tutela dos actuais sectores financeiro
público e privado, e uma sua reorientação para o financiamento do sector empresarial
mais ligado no Japão à criação da "sociedade da informação" e para o sector
empresarial dos EUA.

Nesta configuração os principais fluxos de capitais no "Mundo do Pacífico" seriam os fluxos


mútuos entre EUA e Japão e de ambos para as "economias chinesas" e para a economia
indiana.

BIBLIOGRAFIA

A “Informação Internacional” gostaria de agradecer a Smithers & Co o acesso a vários dos


estudos recentemente realizados sobre temas centrais da economia mundial, e em especial
para este texto o excelente estudo de

• PICKFORD, Derry e SMITHERS, Andrew – “The Japanese Bonds – The Other Bubble”
(report nº 151, de 29 de September de 2000)

A elaboração deste texto beneficiou também da consulta regular do “Monthly International


Review (MIR) da Lombard Street Research, e em especial dos estudos de Brian Reading e
Charles Dumas sobre a economia do Japão

• “Japanese Falling – Price Boom? – a Debate”, MIR, 21 de Agosto de 2000

84
O ”Mundo do Pacífico” – Fluxos de Capitais e Relações entre Moedas

Foi também de grande utilidade a consulta do:

• “Trade and Development Report, 2000” da UNCTAD

Para a elaboração deste texto foram também utilizados artigos publicados em números
anteriores do “Informação Internacional”, nomeadamente:

• “Dificuldades Conjunturais e Perspectivas de Longo Prazo na Economia Japonesa”


“Informação Internacional” Março – Abril 1994

• “O Dólar e os Fluxos de Capitais” “Informação Internacional” Maio – Junho 1994

• 1994 – Um Ano de Colapso nos Mercados Obrigacionistas” Informação Internacional”


Setembro-Outubro 1994

• “EUA/Japão – Acordo de Última Hora evita Sanções Comerciais” “Informação


Internacional” Setembro-Outubro 1994

• “A crise do Peso Mexicano” – Informação Internacional – Novembro 19947 Janeiro


1995

• “A economia Japonesa – Estagnação Prolongada ou Depressão?” – “Informação


Internacional” – Abril-Junho de 1995

• “ Mercados Cambiais – Tempestade na Primavera” “ Informação Internacional” Abril-


Junho 1995

• “EUA em socorro do Sistema Bancário japonês” “Informação Internacional” Outubro-


Dezembro 1995

• “Japão – Sistema Financeiro e Finanças Públicas – Que Evolução” – “Informação


Internacional” – Julho-Dezembro 1996

• “Nuvens sobre o Sudeste Asiático” “Informação Internacional” Abril-Junho 1997

• LUÍS, Ana Lúcia Matos “A Crise Asiática – Percursos, Impactos, Evoluções


Possíveis”, “Informação Internacional” Julho-Dezembro 1997

• ”Japão e EUA – no centro do “Sistema do Pacífico” e da Economia Mundial” –


“Informação Internacional” 1998

O número especial da Oxford Review of Economic Policy “Japanese Economy”, vol 16, nº 2
Summer 2000, foi também de grande utilidade.

85

S-ar putea să vă placă și