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Universidade Federal do Rio de Janeiro


Centro de Filosofia e Ciências Humanas
Instituto de Filosofia e Ciências Sociais
Departamento de História

Os estudos sociais da ciência:


uma nova abordagem historiográfica acerca
das origens da ciência moderna.

Gustavo Lourenço Jorge Guimarães

Rio de Janeiro
2009

1
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Gustavo Lourenço Jorge Guimarães


Orientador: Carlos Ziller Camenietzki

Os estudos sociais da ciência:


uma nova abordagem historiográfica acerca
das origens da ciência moderna.

Monografia submetida ao corpo docente


do Departamento de História da UFRJ,
como parte dos requisitos necessários
para obtenção do grau de Bacharel.

2
3

FICHA CATALOGRÁFICA

GUIMARAES, Gustavo, 1987.


Os estudos sociais da ciência: uma nova abordagem historiográfica
acerca das origens da ciência moderna. Orientação de Carlos Ziller
Camenietzki. Rio de Janeiro: UFRJ, 2009.

Palavras-chave:
1. História da Ciência
2. Filosofia da Ciência
3. Ciência Moderna

3
4

Agradecimentos

Agradeço a todos aqueles que estiveram envolvidos direta ou


indiretamente na confecção deste trabalho.
À minha família, principalmente minha mãe, que leu este trabalho e fez
algumas recomendações.
Á Mariana, companheira de todas as horas, sempre me incentivando no
que quer que seja e mestre nas correções ortográficas.
Agradeço aos amigos da graduação, que tornaram a faculdade bem
mais prazerosa e agradável. Além disso, Davi Bonela e Arthur Caser fizeram
observações inteligentes neste trabalho, deixando aqui sua marca.
Ao meu Flamengo, prestes a ganhar mais um título, que fornece
constantemente alegria ao meu viver e mais emoção aos meus finais de
semana.
Mais que agradecer, devo e dedico este trabalho ao professor Carlos
Ziller, mestre e amigo, pessoa que admiro e que deixou uma marca indelével
na minha formação intelectual.

4
5

Resumo

A monografia procura discutir os temas relevantes apresentados pela


corrente historiográfica surgida na década de 1980, denominada estudos
sociais da ciência. Nossa intenção é de fazer uma apresentação preliminar
desta bibliografia e em seguida, mostrar como ela se diferenciou e se
distanciou do debate anterior a respeito das origens da ciência moderna. Além
disso, procuraremos mostrar como as escolhas teórico-metodológicas e as
conclusões às quais chegam estes estudos alteram significativamente a própria
maneira de se compreender o que vem a ser o conhecimento científico, a sua
correlação com outros tipos de conhecimento e com aspectos políticos e
sociais dos Estados modernos.

Palavras-chave:

História da Ciência; Filosofia da ciência; Ciência Moderna.

5
6

Índice

Introdução ________________________________________p.7

Um panorama geral acerca da ciência moderna _________p.13

Internalismo x Externalismo: duas distintas perspectivas


metodológicas _____________________________________p.26

Os estudos sociais da ciência: uma nova abordagem _____p.41

Conclusão _________________________________________p.62

Bibliografia ________________________________________p.64

6
7

INTRODUÇÃO

A história da ciência é uma disciplina que vem sofrendo diversas


alterações nas últimas décadas. Publicações realizadas a partir dos anos 70 e
80 modificaram substancialmente o eixo analítico dos historiadores que se
dedicam a investigar as relações entre o conhecimento científico e a
sociedade.
A inserção dos sociólogos no debate, sem dúvida, resultou em uma
ampliação das discussões. O surgimento da sociologia da ciência, nos anos 20,
trouxe novas categorias epistemológicas para o estudo da disciplina. Houve
uma aproximação muito produtiva entre as duas disciplinas e uma troca
bastante profícua que contribuiu para o avanço das pesquisas em diversas
áreas ainda pouco exploradas da história do pensamento científico. 1
A sociologia da ciência até a década de 70 abordava o tema colocando a
produção do conhecimento como algo necessariamente atrelado às condições
de produção da sociedade. Desta maneira, a ciência apenas servia de suporte
a interesses político-ideológicos provenientes de certos grupos sociais. Esta
concepção influenciou consideravelmente as correntes historiográficas acerca
da história da ciência.
Em uma época que assistiu à segunda guerra mundial e à guerra fria, é
compreensível que a produção acadêmica tenha sido marcada pela concepção
de que o Estado e os interesses sociais controlam o desenvolvimento do
pensamento científico. Nas obras dos anos 50 e 60, fica evidente a importância
dada pelos estudiosos à tecnologia de guerra desenvolvida pelos Estados
nacionais, e como a militarização marcou o conhecimento científico durante a
guerra fria. 2
Desta maneira, a visão da ciência como uma entidade que está sempre
sendo “utilizada” pela sociedade ou pelo Estado para seus próprios interesses

1
BEN-DAVID, Joseph. Introdução, in: Sociologia da Ciência. Editora da Fundação Getúlio
Vargas. Rio de Janeiro, 1975.

Destaca-se a obra de BERNAL, J.D, Ciência na História. Esta obra será bastante discutida
posteriormente. Além de Bernal, inclui-se aqui também HESSEN, Boris, Las raíces
socioeconomicas de la mecanica de Newton.

7
8

marcou a visão de um grande grupo de especialistas que se dedicaram ao


estudo da disciplina entre os anos 40, 50 e 60. Esses pesquisadores não
admitiam um movimento interno do pensamento científico que para eles era
totalmente condicionado por interesses político-ideológicos, econômicos e
sociais.
Os autores que defendiam esta concepção foram denominados
“externalistas”, porque, segundo eles, a ciência variava conforme demandas
externas a ela própria. Assim, o seu movimento era condicionado de fora para
dentro, ou seja, atendia a problemas e questões surgidos na sociedade e
trabalhava em função deles.
Segundo o pensamento externalista, o conhecimento científico estaria
inteiramente voltado para a sua aplicação prática, para resolver problemas
concretos colocados no âmbito do social:

A ciência está destinada a proceder de acordo com o bom senso do


homem e com os conhecimentos práticos, já que... a influência, directa e
profunda da sociedade sobre a ciência faz-se sentir no passado e
continua a ser visível no presente. 3

Porém, esta concepção não era unânime entre os pesquisadores, já que


muitos deles criticavam a influência social sobre o pensamento científico,
admitindo assim uma autonomia da ciência com relação à sociedade.
Este grupo de pesquisadores ficou conhecido como “internalismo” e,
grosso modo, advogava um movimento interno do pensamento científico, que
se guiava sem um condicionamento político-ideológico definido, mas de acordo
com as preocupações da própria comunidade científica e com o apoio de seus
pressupostos.
A corrente internalista pressupunha uma conexão entre filosofia e
conhecimento científico, onde a primeira guiava as concepções da segunda.
Para estes historiadores, a ciência era essencialmente theoria, e possuía uma
história própria, desvinculada do restante da sociedade.

3
BERNAL, J.D. Ciência na História. Livros Horizonte. Lisboa, 1965, p.1330-1332.

8
9

Assim, o debate historiográfico acerca da história da ciência anterior à


década de 1970 foi basicamente polarizado entre o grupo externalista, que
acreditava que a sociedade moldava a ciência, e o internalista, que se
posicionava a favor de um isolamento entre sociedade e ciência, como se esta
última possuísse uma dinâmica inerente à própria pesquisa. 4
Nos anos 1970 e 80, ocorreu uma grande modificação no eixo analítico
da historiografia da ciência, entrando progressivamente em declínio os modelos
epistemológicos calcados nas concepções internalista e externalista. A nova
historiografia trazia a tona outras questões, mas, principalmente, se fundava
em novos pressupostos, sendo o mais importante aquele que assegurava que
ciência e sociedade não eram entidades distintas, mas que uma era intrínseca
à outra. Esse pressuposto modificou o rumo das pesquisas científicas mais
profundamente a partir da década de 80.
Em 1971, foi fundada nos Estados Unidos a revista Science Studies,
que, em 1975, mudaria seu nome para Social Studies of Science. Ali,
começaram a aparecer publicações que modificariam a discussão
historiográfica sobre o tema e abririam outros múltiplos caminhos para a
pesquisa histórica.
Os estudos sociais da ciência aproximavam ainda mais a sociologia e a
história, abrindo caminho para o estudo das condições de produção do
conhecimento científico, focalizando os atores envolvidos, analisando suas
histórias particulares e associando o trabalho científico ao lugar social do
agente. Assim, travaram-se discussões não apenas sobre o conhecimento
científico estabelecido, mas sobre como este conhecimento foi internalizado
pela sociedade, problematizando uma relação de causa e efeito que era
inerente à historiografia anterior, mais especificamente à externalista.
A abundância de novos trabalhos surgidos no bojo dos estudos sociais
da ciência torna impossível um trabalho de monografia sobre a totalidade de
trabalhos e questões levantadas por esta corrente historiográfica recente.
Assim, pretendemos focalizar neste presente trabalho como esta nova
historiografia abordou a ciência moderna no seu surgimento, mais
especificamente nos séculos XVI e XVII, através de três livros, sendo estes:

4
Ver SHAPIN, Steven. Discipline and bounding: The history and sociology of science as seen
through the externalism-internalism debate. In: Science History Publications. 1992.

9
10

Galileu Herético, de Pietro Redondi; Galileo Courtier: The practice of science in


the culture of absolutism, de Mario Biagioli; e El leviathan y la bomba de vacío:
Hobbes, Boyle y la vida experimental, de Steven Shapin e Simon Schaffer.
Assim, a monografia procura discutir - através da discussão bibliográfica
dos livros acima citados - os temas relevantes apresentados pela corrente
historiográfica denominada estudos sociais da ciência. Nossa intenção é de
fazer uma apresentação preliminar desta bibliografia, e em seguida, mostrar
como ela se diferenciou e se distanciou do debate anterior a respeito das
origens da ciência moderna.
Além disso, procuraremos mostrar como as escolhas teórico-
metodológicas e as conclusões às quais chegam estes estudos alteram
significativamente a própria maneira de se compreender o que vem a ser o
conhecimento científico, a sua correlação com outros tipos de conhecimento e
com aspectos políticos e sociais dos Estados modernos.
No capítulo 1, faremos um panorama geral da ciência moderna,
problematizando algumas discussões e situando o leitor na dinâmica do
pensamento científico moderno. A bibliografia específica sobre história da
ciência moderna é vasta. Paolo Rossi é autor que merece importância
significativa. No seu livro O nascimento da ciência moderna na Europa, Rossi
problematiza a questão das universidades como único centro de pesquisa
científica. No próximo capítulo, mostraremos porque ele afirma que a ciência
moderna nasceu fora das universidades, muitas vezes em polêmica com elas.
Eugenio Garin é um autor que também será discutido neste capítulo.
Suas pesquisas influenciaram consideravelmente a historiografia da era
moderna. Através dos livros Ciência e vida civil no renascimento e
Renascimento e Revoluções, Garin insiste na não-separação entre os diversos
“campos de estudo” nos séculos XVI e XVII. A ciência não existia
autonomamente em relação à filosofia, à gramática, à religião. Todos os níveis
do saber interpenetravam-se, não podendo assim, o estudo do pensamento
científico, ser desvinculado dos aspectos religiosos e filosóficos da idade
moderna.
Ilustraremos esta discussão através da exposição breve da teoria
heliocêntrica, e das suas implicações para o debate intelectual moderno de
uma forma mais ampla. A questão da revolução científica da idade moderna

10
11

também será um tema analisado no próximo capítulo. Este conceito é causa de


inúmeras controvérsias entre os pesquisadores de história da ciência moderna.
Alguns não acreditam em uma revolução científica, alegando que o
conhecimento científico moderno buscou suas raízes na escolástica medieval.
Na margem oposta, encontram-se os historiadores e cientistas sociais
que acreditam em uma forte ruptura entre o pensamento moderno e o
medieval. Para estes autores, os limites do conhecimento se alteraram de
forma significativa durante os séculos XVI e XVII, assim como se alteraram
também os esquemas de pensamento medievais.
No capítulo 2, discorreremos longamente sobre o debate entre o grupo
internalista e o grupo externalista, tentando apontar o que realmente estava em
jogo nesta discussão e analisando as principais premissas defendidas por
ambos os grupos. Tentaremos deixar claro que as visões opostas foram
deixadas de lado pela historiografia posterior, porém, os debates realizados no
bojo desta discussão permanecem atuais e estão longe de ser esquecidos.
A seguir, no capítulo 3, entraremos no nosso objeto de estudo
propriamente dito, e apresentaremos os estudos sociais da ciência e sua
importância para a historiografia e a sociologia da ciência, assim como os
principais pontos teóricos envolvidos nas análises desse grupo e os livros
escolhidos para serem trabalhados, que foram citados acima.
É necessário também explicar a utilização do conceito de ciência que se
faz no presente trabalho. Devemos destacar de imediato que a ciência nos
séculos XVI e XVII é algo bem diferente daquela que existe nos dias atuais. A
separação entre os diversos campos de estudo foi tarefa realizada
posteriormente, mais especificamente durante o século XIX, quando se cunhou
o conceito de ciência tal qual o conhecemos atualmente5. Desta maneira,
quando pensamos em ciência moderna, necessariamente temos que levar em
conta diversos outros campos do saber que se vinculam diretamente a ela.
Utilizamos, assim, o conceito de uma forma bastante ampla, afastando-o
tanto de uma abordagem pragmaticamente tecnológica, ou seja, da ciência
como técnica, como pesquisa que visa a um fim especificamente prático, mas
também do conceito de ciência como essencialmente teoria, como se as

5
Para um debate acerca do conceito de ciência ver: HENRY, John. A revolução científica e as
origens da ciência moderna. Jorge Zahar Editor. Rio de Janeiro. 1998.

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práticas científicas apenas girassem em torno de debates metodológicos e


filosóficos.
Consideramos, desta maneira, que a ciência se apresenta como uma
entidade está ligada a condições históricas específicas e complexas.
Concordamos com a definição da Enciclopedia Italiana, de 1994, que define a
palavra ciência como:

Il fenomeno ´scienza´, se esaminato dal punto de vista storico, non può certo essere
descritto solo en termini di teorie o statuti di cerificazione e falsificazione: la scienza
moderna si presenta infatti come um fenomeno economico, politico, instituzionale,
etico e sociale di notevole complessità. 6

As palavras ciência, conhecimento científico, filosofia natural e


conhecimento serão expostas no trabalho sem uma problematização profunda.
Sabemos que o uso destes conceitos está longe de ser o ideal, mas
esperamos que este anacronismo não se torne demasiado confuso a ponto de
prejudicar a compreensão do presente trabalho.

Um panorama geral acerca da ciência


moderna
6
CORSI, Pietro. Enciclopedia Italiana di scienze, lettere ed arti. Instituto della enciclopedia
italiana. Roma, 1994, p.679.

12
13

Neste primeiro capítulo, procuraremos introduzir alguns temas referentes


ao conhecimento científico moderno, mais especificamente dos séculos XVI e
XVII. Achamos necessária a inclusão deste capítulo, mesmo tendo o trabalho
de monografia presente preocupações essencialmente teóricas a respeito do
estudo da história da ciência.
A apresentação de algumas discussões correntes entre os
pesquisadores que analisaram a ciência moderna, localizará melhor o leitor nos
debates que seguirão e o colocará em uma posição favorável para
compreender as questões mais significativas a respeito do nosso objeto de
estudo.
As mudanças que se verificavam no que a historiografia comumente
denomina de Idade Moderna eram várias. No campo religioso, Lutero colocava
em xeque o poder da Igreja através da publicação das 95 teses; no campo
social, se assistia a ascensão de um novo grupo no interior das cidades, que
ficou conhecido como burguesia; na esfera econômica, as grandes navegações
traziam riquezas para a Europa e a descoberta de terras até então
desconhecidas causavam enorme impacto nas concepções antes
estabelecidas a respeito do homem e do mundo.
A ciência moderna não possui necessariamente relação de causa e
efeito – segundo nossa visão – com essas mudanças gerais na vida social,
econômica e política da Europa. Entretanto, a reviravolta intelectual moderna
também não é uma mudança que fica restrita ao campo dos cientistas, mas
representa uma mudança muito mais significativa na forma geral dos homens
enxergarem a si mesmos e o mundo no qual vivem.

Não foi tarefa simples selecionar uma discussão para ilustrar o


conhecimento científico moderno. Sabemos que abundam biografias e textos

13
14

sobre os chamados pilares do pensamento moderno, por isso traremos a tona


um assunto muito debatido durante os séculos XVI e XVII, relacionando-o com
alguns aspectos mais gerais da vida intelectual da época, tentando demonstrar
como a religião não pode ser separada do conhecimento científico moderno,
mas na verdade faz parte dele.
Em 1543, um astrônomo polonês chamado Nicolau Copérnico publica A
Revolução dos Orbes Celestes, na qual defende diversas posições bastante
originais. Dentre elas, a de que a Terra girava em torno do Sol, que se
localizava perto do centro do universo e de que os astros giravam de forma
perfeita, circular e uniforme.
A teoria copernicana, assim como boa parte das teorias modernas, se
erigia sem uma observação regular e sistemática. Este é inclusive um dos
temas a ser desmistificado aqui, ou seja, o de que a ciência moderna foi
calcada na observação. Essa retórica que permeou a história da ciência até o
início do século XX parece ter chegado ao fim. O conhecimento moderno se
calcou em princípios de abstração matemáticos, e podemos dizer que
representou muito mais uma ciência indutiva do que empírica, ao contrário do
saber escolástico-aristotélico:

A ciência aristotélica, precisamente porque fundada sobre a percepção sensível e


realmente empírica, concordava melhor com a experiência comum do que a de Galileu
e Descartes. 7

A observação levava firmemente à negação da teoria copernicana. Uma


pessoa situada em qualquer ponto da Terra não via a Terra se mexendo, mas
sim o Sol, passando de leste a oeste. Assim, a ciência aristotélica, que era a
principal fonte de verdade no mundo medieval baseava-se na observação clara
e simples do sujeito em relação ao objeto:

A observação e a experiência não desempenharam senão um papel de reduzida


importância na edificação da ciência moderna. Poderia-se dizer, até, que elas
constituíram os principais obstáculos que a ciência encontrou em seu caminho. 8
7
KOYRÉ, Alexandre. Sobre a influência das concepções filosóficas na evolução das teorias
científicas. Revista da Faculdade de Educação de São Paulo, pp.55-70. 1979.
8
KOYRÉ, Alexandre. Uma experiência de medida. In: Estudos de história do pensamento
científico. Editora Forense universitária. Rio de Janeiro, 1991.

14
15

Não havia porque duvidar do movimento solar e do não-movimento da


Terra. Sob qualquer ponto de observação, a verdade apontava na direção
contrária à teoria copernicana. Retichus, principal discípulo de Copérnico,
afirmava sobre o mestre:

Desde hacía tiempo se había dado cuenta de que para que las observaciones
pudieran ser correctamente interpretadas exigían unas hipótesis que alteraban todas
las ideas que se tenían acerca del orden de los movimientos y de las esferas; ideas
que hasta aquel entonces se habían discutido, tenido como válidas, aceptadas e
creídas como verdaderas; las hipótesis mencionadas contradecían a nuestros
sentidos. 9

Desta maneira, Copérnico não foi levado a sério nos anos iniciais da
publicação da sua obra, pois ele ia de encontro à respeitada teoria aristotélica
em relação à astronomia. Copérnico partia de uma imaginação a priori para
depois construir um raciocínio em cima dela. Segundo o próprio autor, ele não
possuía meios de comprovar suas teorias:

É próprio do astrônomo compor a história dos movimentos celestes..., e, se não puder


de modo nenhum descobrir as suas leis ou hipóteses verdadeiras, conceber ou
imaginar quaisquer outras a partir das quais, segundo os princípios da geometria,
esses movimentos se possam calcular com exactidao, tanto em relação ao futuro
como ao passado. 10

Assim, não possuindo uma argumentação convincente a favor das


hipóteses que propagava, Copérnico foi acolhido com ceticismo pelos
astrônomos e filósofos modernos, partidários em sua maioria da concepção
geocêntrica de Aristóteles e Ptolomeu.
A teoria copernicana foi desenvolvida posteriormente por Galileu Galilei,
que introduziu diversos cálculos matemáticos na demonstração da centralidade

9
VERNET, Juan. Astrología y astronomía en el renacimiento. El acantillado. Madrid. 2000,
p.49.

10
COPÉRNICO, Nicolau. A Revolução dos Orbes celestes. Fundação Calouste Gulbenkian.
Lisboa. 1984, p.1.

15
16

do Sol, conseguindo assim ampliar o prestígio desta teoria, que passou a ser
mais respeitada entre os cientistas.
Por sua vez, Johannes Kepler negou o movimento circular dos corpos
celestes advogado por Copérnico, substituindo-o por formas elípticas, que
segundo ele, explicavam de maneira mais satisfatória o movimento geral das
orbes. Matemático exemplar, Kepler foi discípulo de Tycho Brahe, que criou um
sistema de mundo no qual a Terra estava fixa no centro do Universo, mas os
planetas e outros astros giravam em torno do Sol, que por sua vez girava em
torno da Terra.
Estes avanços nas teorias astronômicas deram origem a dois problemas
fundamentais que afetariam os sistemas de pensamento mais gerais do
conhecimento científico. Em primeiro lugar estava a questão da finitude do
universo, posição esta que era defendida amplamente na Europa, que acolhia
as idéias aristotélicas a respeito da astronomia.
A invenção do telescópio por Galileu criou sérios problemas para os
filósofos que acreditavam em um mundo finito e ordenado. Afinal de contas, se
a distância entre o Sol e a Terra é bem menor do que a distância entre a Terra
e algumas estrelas, como saber se não existe nada além da esfera das estrelas
fixas? Como saber exatamente se não há uma infinidade de mundos, como
propagou Giordano Bruno? Como falar que algo é infinito, se apenas Deus o
pode ser?
A dissolução do cosmo corresponde à destruição da idéia de um mundo
finito, com estruturas rigidamente ordenadas, onde o céu e a terra são
entidades totalmente distintas. Durante as descobertas astronômicas
modernas, essa idéia se alterará, sob a fusão das leis terrenas e cosmológicas.
Desta maneira, as leis matemáticas também poderiam explicar os
acontecimentos celestes. Segundo Koyré, essa é a mais profunda mudança
realizada pelo espírito humano:

A substituição do cosmo finito e hierarquicamente ordenado do pensamento antigo e


medieval por um universo infinito e homogêneo, implica e impõe a reformulação dos
princípios básicos da razão filosófica e científica. 11
11
KOYRÉ, Alexandre. Introdução. In: Estudos de história do pensamento científico. Editora

Forense universitária. Rio de Janeiro, 1991.

16
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Além desta questão fundamental para a ciência moderna, surgia outra


igualmente importante: como lidar com a questão da queda dos corpos? A
explicação aristotélica defendia que a Terra era o centro do universo e
portanto, o lugar natural para onde pendiam todas as coisas. Se o Sol
passasse a ser o centro do universo, então como explicar porque os corpos
caíam e não subiam? Seriam estas questões que levaram posteriormente Isaac
Newton a formular a lei da gravitação universal e a declarar: "Se enxerguei
longe, foi porque me apoiei nos ombros de gigantes". Certamente os
astrônomos modernos eram alguns desses gigantes.
As proposições de novos sistemas de mundo eram reflexos de um
conhecimento científico que não mais se calcava na observação pura e
simples, mas inseria a matemática no conhecimento da natureza de uma forma
jamais vista antes. Buscando suporte nos autores antigos, os cientistas
modernos se distanciavam do saber medieval no sentido de que o homem
moderno não era mais apenas um ser contemplativo do mundo, mais sim um
ser que interpretava o mundo e o explicava com base no seu conhecimento.

A ciência moderna não nasceu no campo da generalização de observações empíricas,


mas no terreno de uma análise capaz de abstrações, isto é, capaz de deixar o nível do
sentido comum, das qualidades sensíveis e da experiência imediata. O instrumento
principal que a tornou possível... foi a sua matematização. 12

A tentativa de matematização do mundo não pode ser afastada de uma


perspectiva mítica a respeito do mesmo. A não-separação entre astronomia e
astrologia é bastante simbólica de como a visão de mundo propagada pela
ciência moderna não se afasta do saber alquimista, do pensamento medieval,
mas ao contrário, muitas vezes se utiliza de argumentos mágicos para
sustentar suas hipóteses.
Além disso, tentaremos demonstrar ao longo desta monografia como a
ciência moderna nunca pretendeu se erguer – ao contrário do que muitos
afirmam – contra um saber eclesiástico medieval. A Igreja, longe de ser uma
instituição tipicamente conservadora e obsoleta, contribuiu imensamente para o

12
ROSSI, Paolo. O nascimento da ciência moderna na europa. EDUSC. Bauru, 1991, p.34.

17
18

debate científico moderno, e para comprovar isto basta dar uma pequena
olhada na biografia de alguns filósofos modernos para rapidamente nos darmos
conta de que estas pessoas estavam intimamente ligadas à instituição
eclesiástica e que esta nunca agiu contra o pensamento científico moderno,
nem pode ser representada como obscurantista, mas pelo contrário sempre
contribuiu para o debate e para a discussão de aspectos ligados ao mundo
natural e metafísico.

O local de surgimento da chamada ciência nova não foram as


universidades, ainda seguidoras do pensamento aristotélico. Na verdade, a
ciência moderna nasce fora das universidades e pode-se dizer, em oposição a
estas. Isto porque o saber tradicional propagado pelas universidades não era
afeito a mudanças intelectuais, e estas tiveram que ocorrer em outros lugares,
principalmente nas cortes européias e nas sociedades científicas. Segundo
Hessen, autor que exploraremos mais pormenorizadamente no próximo
capítulo:

La ciência nueva surge como ciência extrauniversitaria, en lucha com las


universidades. La lucha entre la ciência universitária y la extrauniversitaria, esta última
al servicio de las demandas de la burguesia em ascenso, es um reflejo, em el campo
de la ideologia, de la lucha de clases entre la burguesia e el feudalismo. 13

Mesmo não concordando com a abordagem de Hessen, pois para nós


as discussões científicas não têm ligação com a luta de classes, é inegável que
a chamada “nova ciência” não possuía lugar no ambiente acadêmico
universitário. Veremos, no capítulo 3, durante a discussão do livro de Mario
Biagioli, como as cortes européias se tornaram um importante local de
produção e discussão das teorias científicas durante os séculos XVI e XVII.
13
HESSEN, Boris. Las raíces socioeconômicas de la mecánica de Newton. . In N. I. Bukharin,

et al. Science at the Crossroads: Papers from the Second International Congress of the History

of Science and Technology. Londres. 1931, p.34.

18
19

Além das cortes, nas quais os cientistas se mantinham sob a tutela de


importantes nobres ligados ao poder real, as sociedades científicas também
ocuparam importante lugar na produção do conhecimento científico moderno.
O surgimento em 1660 da Royal Society em Londres, e em 1666 da Academie
Royale dês Sciences, em Paris, suscitaram diversos debates de importantes
assuntos científicos. Uma destas discussões será analisada no capítulo 3,
discussão esta realizada entre Boyle e Hobbes. Sobre os locais de produção
da ciência moderna, Rossi afirma:

A ciência moderna nasceu fora das universidades, muitas vezes em polêmica com
elas e, no decorrer do século XVII e mais ainda nos dois séculos sucessivos,
transformou-se em uma atividade social organizada capaz de criar as suas próprias
instituições. 14

Desta maneira, no século XVII se criam locais específicos para a


realização do saber científico, não laboratórios de pesquisa, mas academias
científicas, onde longamente se discutiam variados aspectos acerca do mundo
natural e onde eram apresentadas inovações técnicas e formulações teóricas.
Foram estes locais que deram origem ao conhecimento científico moderno,
principalmente o conhecimento experimental.

Procuraremos agora discutir o alcance das inovações que ocorreram no


âmbito do pensamento científico na sociedade de uma maneira mais geral. Em
outras palavras, tentaremos analisar até que ponto as teorias científicas
modernas se concatenaram com uma revolução mais profunda na maneira de
pensar e agir dos europeus setecentistas.
Para nos ajudar na discussão, traremos à tona o conceito muito debatido
pelos historiadores da ciência de “Revolução Científica”. A utilização ou
negação deste conceito implica em sérias conseqüências para o debate acerca
da ciência moderna, já que o conceito de revolução aplicado às mudanças
intelectuais modernas, nos leva a crer que o pensamento científico não apenas

14
ROSSI, idem, p.10.

19
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revolucionou a si próprio, mas interferiu e modificou diversos aspectos da


maneira de pensar dos homens modernos.
A questão básica a se perguntar é se houve uma continuidade ou uma
ruptura da ciência moderna em relação ao saber medieval, e em até que ponto
as teorias modernas se distanciaram deste saber a ponto de se poder chamar
de revolução, ou não, as mudanças intelectuais geradas pelas novas teorias
científicas.
A.C. Crombie foi o principal autor, dentre os poucos, que defenderam a
tese da continuidade da ciência moderna em relação ao saber medieval.
Resumidamente falando, Crombie advogava que os métodos da ciência
experimental foram criadas ainda no século XIII e que o conhecimento
científico moderno não significou uma ruptura com o saber escolástico
medieval, pois as concepções mágicas a respeito do universo não foram
abolidas dos pressupostos envolvidos nas pesquisas.
Justiça seja feita, a tese continuísta representou uma importante
vertente na historiografia da ciência. Isto porque a tentativa de se olhar para a
ciência moderna sem tentar enxergar um nascimento da nossa ciência atual é
um trabalho pouco praticado pelos historiadores. A grande maioria deles ainda
continua por tentar identificar nos pensadores modernos os pilares do
pensamento contemporâneo, por vezes negligenciando aspectos mágicos, que
se faziam amplamente presentes na filosofia natural moderna:

“Na defesa da centralidade do Sol, Nicolau Copérnico invoca a autoridade de Hermes


Trismegisto. Por sua vez, William Gilbert se refere a Hermes e a Zoroastro,
identificando a sua doutrina do magnetismo terrestre com a tese da animação
universal. Francisco Bacon, por outro lado, na sua teoria das formas, é fortemente
condicionado pela linguagem e pelos modelos presentes na tradição alquimista.
Johannes Kepler é um profundo conhecedor do Corpus Hermeticum.(...) Tycho Brahe
vê na astrologia uma aplicação legítima da sua ciência(...) Nas páginas da obra “De
motu cordis de William Harvey, dedicadas à exaltação do coração como “Sol do
microcosmo”, ecoam os temas da literatura solar e hermética dos séculos XV e XVI.
(...)Também na concepção newtoniana do espaço como sensorium Dei foram
ressaltadas influências das correntes neo-platônicas e da cabala judaica. Newton não

20
21

só lia e resumia textos alquimistas, mas dedicou muitas horas da sua vida em
pesquisa do tipo alquimista.” 15

Podemos dizer que a tese continuísta, até certo ponto, constitui uma
negação de algumas tentativas maniqueístas de se fazer história com os olhos
totalmente voltados para o tempo presente, negando veementemente aspectos
inerentes à cultura da época. Negando uma revolução científica na Idade
Moderna, os continuístas têm o mérito de não se deixarem levar por uma visão
que busca reconstruir a ciência moderna como as origens da nossa, posição na
qual se exalta de forma muitas vezes exagerada e inadequada seu caráter
racionalista e cético.
Do outro lado, foram muitos os historiadores que advogaram que de fato
houve uma revolução científica. Tentaremos separá-los em dois grupos, para
facilitar nossa compreensão a respeito das mudanças que o conhecimento
científico trouxe para o mundo moderno, mesmo sabendo que às vezes estes
grupos se interpenetram e concordam entre si.
Em um lado do grupo, colocaremos fundamentalmente os internalistas
(no próximo capítulo falaremos mais sobre eles) Alexandre Koyré e Thomas
Kuhn. Os agruparemos juntos apenas sob a lógica de tornar nossa explicação
mais palatável ao leitor, mesmo sabendo que seus pontos de vista não são
necessariamente idênticos.
Koyré considera Revolução Científica uma mudança essencialmente
filosófica e conceitual no campo teórico do conhecimento. Desta maneira,
Revolução Científica seria apenas uma alteração no padrão epistemológico de
uma época, alterando assim os próprios pressupostos envolvidos na busca do
conhecimento científico.

O empirismo puro não conduz a parte alguma. As grandes revoluções, embora


naturalmente assentadas na descoberta de fatos novos, são fundamentalmente
revoluções teóricas. 16

15
ROSSI, Paolo. O nascimento da ciência moderna na Europa, Editora EDUSC, Bauru, SP,
1991, p.59-61.

16
KOYRÉ, Alexandre. As origens da ciência moderna.. In: Estudos de História do Pensamento
Científico. Editora Forense universitária. Rio de Janeiro, 1991, p.77.

21
22

Thomas Kuhn afirma que uma Revolução Científica acontece quando há


uma “exaustão” intelectual, ou seja, quando um paradigma vigente se torna
incapaz de responder a certas questões. Desta maneira, surge uma crise na
comunidade científica, que busca então uma mudança de pressupostos, com
vistas a resolver os novos problemas teóricos.

As revoluções científicas iniciam-se com um sentimento crescente,


também seguidamente restrito a uma pequena subdivisão da comunidade
científica, de que o paradigma existente deixou de funcionar adequadamente
na exploração de um aspecto da natureza. 17

O tema principal deste conceito de revolução científica é filosófico e


deriva de uma abordagem internalista, considerando que o pensamento
científico e as comunidades científicas (no caso de Kuhn) atuariam de forma
desvinculada do restante da sociedade. Desta maneira, a Revolução Científica
seria uma quebra de paradigmas, que não sendo mais suficientes para resolver
questões propostas de ordem teórica, levariam a uma reformulação
epistemológica do saber filosófico-científico.
No outro grupo se encontrariam Eugenio Garin e Paolo Rossi, que
concordavam com Koyré quanto ao fato da Revolução Científica ser
essencialmente uma revolução filosófica. No entanto, Garin não a limita
somente ao campo teórico, afirmando que ela foi “uma revolução no modo de
pensar o relacionamento entre o homem e o mundo, impondo uma forma
18
radicalmente nova de se chegar às coisas”.
Neste sentido, o termo Revolução Científica é entendido aqui como uma
mudança conceitual no plano epistemológico, mas também como uma
reviravolta nas relações entre os homens entre si e entre os homens e a
natureza.

17
KUHN, Thomas. A estrutura das revoluções científicas. Editora Perspectiva. São Paulo,
1978, p.126.

18
GARIN, Eugenio. Ciência e vida civil no renascimento. UNESP. São Paulo, 1994, p.180.

22
23

Podemos perceber que neste segundo caso a revolução científica tem


um alcance bem mais largo, já que implica além de mudanças no plano teórico
do conhecimento, uma diferença da própria posição dos homens no mundo e
da adesão de uma nova visão de mundo na filosofia natural. Nas palavras de
Garín a respeito da teoria galileana, o alcance desta revolução é amplo e não
se limita ao meio científico:

“[A filosofia de Galileu] não se tratava da aceitação de uma hipótese astronômica, mas
sim da adesão a uma visão de mundo que concluía uma série de tomadas de
posições ocorridas certamente fora de um terreno rigorosamente científico, e que no
19
entanto foram determinantes para o progresso da ciência.”

Para Garín e Rossi, a principal característica da revolução científica foi a


alteração dos limites do conhecimento humano. Neste sentido, o conhecimento
científico moderno redefiniu as relações entre o homem e a natureza,
ampliando o alcance das pesquisas científicas através de uma destruição dos
pressupostos que guiavam as concepções aristotélicas medievais.
Assim sendo, rompendo com as principais verdades estabelecidas pelo
conhecimento escolástico, a ciência moderna foi capaz de inventar um novo
homem, ciente das suas limitações perante a força divina da natureza, mas
capaz de elaborar teorias universais sobre a mesma, utilizando a matemática
como principal ferramenta para a compreensão do mundo.
O filósofo moderno não é mais o filósofo medieval, sentado em sua
cátedra, contemplando o mundo ao seu redor e tentando explicá-lo com base
nas suas verdades aristotélicas, mas antes o investigador das leis do homem e
da natureza, que filosofa sobre o mundo, mas também age ativamente sobre
ele. Essa caracterização é uma retomada do papel dos filósofos na antiga polis
grega e contraria o filósofo contemplativo, metafísico.

A uma filosofia que é leitura e comentário de uma verdade captada na sua substancia,
que se esclarece e desenvolve apenas nos seus pormenores, opõe-se uma filosofia
que é procura múltipla, discussão, análise do fazer, pluralidade de concepções do
mundo e da vida, multiplicidade, variação .20

19
GARÍN, Eugenio. Ciência e vida civil no renascimento. UNESP. São Paulo, 1994, p.151.

23
24

Assim, a filosofia moderna nasce de certa maneira através da


redescoberta e reinterpretação da filosofia antiga e também do filósofo antigo:

A revolução cultural que acompanhara o regresso maciço dos filósofos antigos não
alterava apenas as relações entre as disciplinas, nem incidia apenas nas instituições.
Desenhava uma imagem diferente do teórico, do filósofo, apresentando-o como
aquele que reflete criticamente sobre as suas próprias experiências e que, para além
de teorizar, age. 21

È importante ressaltar que Garín e Rossi, mesmo defendendo a tese da


ruptura, ou seja, se posicionando a favor do conceito de revolução científica,
não menosprezam alguns aspectos continuístas entre o saber medieval e o
moderno, como por exemplo a presença constante de explicações mágicas e
religiosas para embasar argumentos científicos. Porém, o novo conhecimento
alterou significativamente a posição do saber e seus métodos de investigação.
A ciência moderna, segundo Rossi:

Tratou-se de uma rejeição que pressupunha uma mudança radical de quadros


mentais e de categorias interpretativas e que implicava uma nova consideração da
22
natureza e do lugar do homem na natureza.

Outra mudança considerável no conhecimento científico moderno foi a


valorização das artes mecânicas, consideradas no mundo medieval como um
conhecimento “menor” e desprezadas claramente em favor das artes liberais,
consideradas nobres. O cientista possuía um papel ativo no mundo, e as artes
mecânicas, que inventavam instrumentos e transformavam a realidade, eram
agora parte integrante do conhecimento:

20
GARÍN, Eugenio. O filósofo e o mago, in: O homem barroco. Editora Presença. Lisboa, 1995,
p. 127.
21
Idem, p.133.

22
ROSSI, p.39. 1991.

24
25

A defesa das artes mecânicas contra a acusação de indignidade, bem como a recusa
de fazer coincidir o horizonte da cultura com o horizonte das artes liberais e as
operações práticas com o trabalho servil implicavam na realidade o abandono de uma
imagem milenar de ciência, isto é, implicavam o fim de uma distinção entre o conhecer
o fazer. 23

Desta maneira, podemos perceber como o conhecimento científico


moderno estabeleceu uma nova relação entre o sujeito e o objeto, entre o
homem e a natureza, e consequentemente, entre os homens entre si. A
destruição de antigos pressupostos e a criação de outros, longe de atingir
meramente o debate teórico-filosófico, alterou toda uma estrutura mental,
redefinindo padrões de comportamento e relações humanas.
A alteração dos limites do conhecimento possibilitava a investigação de
antigos objetos redefinidos a partir de novas hipóteses. O cientista, o
intelectual, sendo considerado ser ativo, não possuía apenas o papel de
explicar e de compreender, mas principalmente, o de fazer e transformar.

Internalismo x Externalismo: duas distintas


perspectivas metodológicas

Os conceitos externalismo e internalismo foram cunhados por Merton


ainda na década de 30. Mesmo que nessa época, a disciplina conhecida como

23
Idem, p.44.

25
26

história da ciência fosse ainda incipiente, as discussões já pareciam apontar


para duas linhas de pesquisas opostas e a princípio excludentes, ainda que
posteriormente ambas fossem reconhecidas como importantes, e assim
tornadas complementares. 24
A discussão entre estas duas idéias parece ter afetado de maneira
significativa não apenas os estudo relativos a história da ciência, mas também
pesquisas relacionadas com disciplinas como a epistemologia científica e a
sociologia do conhecimento.
As atenções dos historiadores pela história da ciência se intensificaram
na década de 1950. Seria interessante, como fez Shapin em A revolução
científica, enfatizar o caráter político do debate. O início da Guerra Fria dá
origem a uma guerra velada em busca de uma supremacia tecnológica. O
investimento em pesquisas científicas nunca foi tão grande, pois o Estado
nunca necessitou como nessa época de um respaldo que vinha do
conhecimento científico.
É possível afirmar que os trabalhos marxistas da década de 1940 e
1950, assim como o contexto no qual estes trabalhos apareceram foram
determinantes para a separação epistemológica entre internalismo e
externalismo. 25
O clima de tensão atingiu também o debate teórico da recém-constituída
disciplina. Como não levar em consideração uma guerra tecnológica, um
momento de tensão imensa ao formular teorias a respeito do conhecimento
científico? Em outras palavras, como falar de ciência na década de 1950, sem
vinculá-la diretamente a técnica, como se uma fosse o espelho da outra e
somente existisse para sua causa?
Os debates a respeito das relações sociais da ciência foram
relacionados à questão prática de planificá-la. A corrente britânica formada por
escritores externalistas como Boris Hessen e J.D. Bernal mobilizaram a
epistemologia da ciência clamando por um controle governamental sob as
pesquisas científicas. A ciência havia se tornado uma grande força nas

24
Pelo menos para Shapin, que em seu artigo de 1992, analisa o interesse da discussão
internalismo/externalismo para a história da ciência, defendendo a tese de que suas questões não foram de
maneira alguma superadas e assim, retoma o debate historicizando o conceito de ciência, considerando-a
como prática cultural e política de um período.
25
Ver SHAPIN, Steven. Discipline and bounding: The history and sociology of science as seen
through the externalism-internalism debate. In:Science History Publications. 1992.

26
27

sociedades modernas e era mesmo um mecanismo de poder e de controle


sobre a verdade. 26
A polarização entre externalismo e internalismo parece ter sido, e aqui
estamos de acordo com Shapin, fruto de ideais políticos no interior da história
da ciência. Não podemos menosprezar o contexto no qual o debate se deu e a
associação entre materialismo e externalismo. O próprio Bernal serve de
modelo exemplar. Cientista britânico, admitia e reclamava por uma ciência
atrelada aos interesses sociais e políticos do Estado.
A associação entre ciência e técnica é aqui uma questão a ser discutida.
Não fugiremos deste ponto, mas deixamo-la um pouco mais para a frente. A
primeira coisa a ser dita é que o debate entre internalismo e externalismo no
campo da epistemologia da ciência foi mesmo um debate que envolveu uma
forte carga político-ideológica, polarizada entre duas tendências mutuamente
excludentes.
Questões mais complexas também se colocam no interior deste debate.
A oposição entre indivíduo e sociedade, por exemplo, muito comum na
sociologia dos anos 1950, tem um papel central na discussão
internalismo/externalismo, já que a primeira exacerba o papel do indivíduo nas
teorias científicas, enquanto para a última o cientista ocupa apenas um papel
secundário, submerso nas estruturas sociais.
A oposição indíviduo/sociedade, ou estrutura/evento, parece ser
importante para a compreensão da diferença significativa dos dois extremos. A
tendência de opor o comportamento individual, e da relativa independência que
este possuía frente aos mecanismos de regulação social, do indivíduo preso
frente às estruturas que o cercam é também o debate de um movimento interno
da ciência e de forças que regulam e dominam as práticas científicas.
A divisão entre o não-cognitivo (sociedade) e o cognitivo (ciência) nunca
foi sistematicamente defendida pelos historiadores da ciência, mas nós
arriscamos dizer que na corrente internalista, a ciência possuía um caráter
autônomo, afastado da sociedade, enquanto na corrente externalista, a
sociedade é que moldava e decidia os rumos das pesquisas científicas.

26
SHAPIN, Steven. Social history of truth: Civility and science in seventeenth-century. England.
The University of Chicago Press. Chicago, 1994.

27
28

Mesmo que a polarização extrema tivesse vida curta no âmbito da


história das ciências, ela marcou significativamente o debate posterior, mesmo
que suas posições opostas tenham sido totalmente abandonadas e alijadas do
interior do debate. Pode-se dizer que já em meados da década de 60 surgiram
diversas tentativas de superação das correntes internalismo/externalismo. Uma
década depois o debate já estava de vez superado e era possível o surgimento
dos Estudos Sociais da Ciência, que com suas novas abordagens, foi capaz de
introduzir diversos novos métodos, objetos e principalmente, conclusões no
estudo da história da ciência.

Segundo o cientista social Joseph Ben-David, externalismo foi a corrente


intelectual que associou diretamente os progressos científicos a demandas
econômicas e sociais, colocando assim o campo científico como diretamente
subordinado a interesses estratégicos.
Os intelectuais desta corrente que teve como principais expoentes os
autores J.D. Bernal, Ciência na História e Boris Hessen, Las raíces
socioeconomicas de la mecanica de Newton, foram definidos por Ben-David
como:

“[Indivíduos] ansiosos para aplicar a ciência no progresso do bem-estar social,


[pois] usaram argumento histórico e comparativo para mostrar que o desenvolvimento
da ciência tinha sido sempre determinado pelas necessidades da economia, e que a
subordinação da ciência aos desígnios do bem-estar era tão exeqüível como útil para
27
a ciência e a sociedade em geral”

Bernal, autor o qual já mencionamos acima um par de vezes, escreveu


Ciência na História, a grande obra-prima da corrente externalista. Possuindo
quatro volumes e mais de mil páginas, este denso livro faz um balanço de toda
a história da ciência, que segundo Bernal, é a história dos inventos científicos,
ou seja, das descobertas científicas postas em prática.

27
BEN-DAVID, Joseph. Introdução, in: Sociologia da Ciência. Editora da Fundação Getúlio
Vargas. Rio de Janeiro, 1975, p.8.

28
29

O autor enxerga a ciência como uma entidade que está sempre sendo
“utilizada” por interesses políticos ou sociais. A relação entre ciência e
sociedade é abordada de maneira utilitarista. O conhecimento científico gera
tecnologia e a teoria é criada em função da prática, ou seja, a ciência serve a
interesses que são externos a ela mesma. Desta maneira, o desenvolvimento
do pensamento científico deve ser estudado a partir da sociedade e da política,
pois são estas que ditam e regem o movimento daquela:

Devemos ter sempre em mente que a ciência só se completa quando se


seguem as indicações que nos dá; a ciência não é apenas uma questão de
pensamento, mas de pensamento continuamente posto em prática e continuamente
revivificado pela prática.28

Compreende-se portanto da onde se origina o conceito “externalismo”.


São os externalistas aqueles que pressupõem que a história da ciência se
move através de causas externas a ela própria e que esta é apenas um
instrumento político que serve a causas específicas de poder, através da
associação estreita entre técnica e ciência.
Esta associação advém de uma idéia de práxis para qualificar a ciência.
Esta idéia está totalmente em desacordo com a concepção internalista, como
veremos a seguir, mas é importante ressaltar que segundo os externalistas, o
conhecimento científico pode ser caracterizado como o conhecimento que
advém da práxis, da necessidade. O conhecimento não é criado por si só, pois
não possui objetivo nem causa inerente a si mesmo, mas é sim extrínseco ao
seu próprio movimento. As causas e os efeitos da história da ciência tem que
ser buscados fora dela própria, ou seja, no estudo da sociedade e da política:

O que é importante reter aqui é que a experiência prática comum constitui como que
um magneto de interesse científico e o progresso da ciência pode ser seguido em
termos de campos sucessivos e mutáveis de interesse geral, econômico e técnico. 29

Assim sendo, fica claro que segundo esta concepção a ciência está
sujeita meramente a interesses externos. A ciência aqui deve ser encarada

28
Idem, p.29.
29
Idem, p.49.

29
30

como algo que serve a outrem, e não como algo que se move por si só. Já
enfatizamos o caráter político da discussão e a este ponto já deve ter ficado
claro que a ciência segundo a teoria externalista é praticamente uma
cooptação do conhecimento para fins práticos.

O cientista não tem, praticamente, qualquer controle sobre o uso que a


sociedade faz do trabalho que sai das suas mãos. 30

Em outras palavras, é a prática que determina quais pesquisas devem


ser ou não desenvolvidas. Não submergida em debates teóricos, mas voltada
para o bem-estar social ou político, a ciência tem um papel fundamental na
sociedade, ou seja, o de fortalecer o poder do Estado e de proporcionar frutos
para a sociedade de uma maneira geral:

Na ciência, mais do que em qualquer outra instituição humana, é necessário investigar


o passado para poder compreender o presente e controlar o futuro. 31

Neste trecho, percebe-se a concepção teleológica de Bernal a respeito


da história da ciência. Para o autor, a ciência, assim como a sociedade, move-
se em uma direção, apontando para o porvir. O conhecimento científico é
assim, cumulativo e progressivo. Neste caso, não existe ciência que não esteja
voltada para a resolução de problemas práticos, de questões específicas que
se colocam de maneira urgente para a resolução dos problemas gerais. A
utilidade da ciência é prática, e cabe ao Estado organizá-la, mantendo-a sob a
sua esfera e apontando para um futuro. A ciência age como motor do
progresso, a serviço da sociedade.

Tanto os maiores como os menores períodos criadores na ciência e na tecnologia


aparecem na história como acessórios de grandes movimentos sociais, econômicos e
políticos... é necessário ter em conta os factores materiais e os ideológicos, se
quisermos compreender perfeitamente as relações entre a ciência e a sociedade
sempre em evolução. Não há sociedade que possa viver sem recurso à ciência,
necessária às suas forças produtivas. 32
30
Idem, p.11.
31
Idem, p.1287.
32
Idem, p. 1275-1287.

30
31

Bernal clama pela intervenção estatal nas pesquisas científicas. Em uma


época de guerra tecnológica, corrida armamentícia, o conhecimento científico
ocupava um lugar-chave no mundo da política, e era necessário que assim se
atrelasse ao Estado em uma tentativa de impor seu modelo político, seu projeto
de governo.
A ciência é assim entendida como chave para o progresso, não só como
uma tentativa de entender o mundo e elaborar teorias sobre ele, mas também
de como modifica-lo através da técnica. No externalismo, parece não existir
diferenciação entre técnica e ciência, mas não é bem assim.
Isto se dá porque a ciência, segundo Bernal, influencia a história de dois
modos: primeiro, “através das modificações que introduz nos métodos de
produção”; e segundo, “pelo impacto que as suas descobertas e idéias
exercem sobre a ideologia do período.” A ciência, não sendo somente técnica,
possui um caráter verdadeiramente ideológico. 33
Já Boris Hessen teve objetivos mais modestos, não desejando escrever
uma história total da relação entre ciência e sociedade, mas deixou sua marca
na história da ciência através da investigação do trabalho de Newton,
estudando as “causas” que o levaram a desenvolver suas teorias no campo da
física.
Para o autor, Isaac Newton era um expoente no pensamento moderno, e
este era tipicamente burguês. A ascensão da burguesia nos séculos XVI/XVII é
vista como determinante para a compreensão do pensamento científico que se
desenvolveu na Europa setecentista:

Hemos llegado a la conclusión de que esta temática era determinada, em lo


fundamental, por las tareas econômicas y técnicas que la burguesia em ascenso
colocaba em um primer plano. 34

Ao analisar o surgimento da ciência moderna, Hessen atenta para o


grave conflito que existia na época entre burguesia e Igreja. A burguesia,
desejosa de mudanças, considerava o conhecimento científico como possuindo

33
Idem, p.1287.
34
HESSEN, Boris, Las raíces socioeconomicas de la mecanica de Newton.???

31
32

um papel central na sua estratégia de ascensão. Já a Igreja, que desde o início


do período medieval possuía o monopólio do saber, não estava aberta a
mudanças no campo intelectual, e lutou para manter a sua posição de
prestígio.
Longe de exaltar o indíviduo, ou seja, a genialidade de Newton, como
fazem muitos historiadores da ciência, Hessen afirma que este foi tipicamente
um produto do seu tempo. Fazendo uma conexão entre marxismo e história da
ciência, o autor se propõe a:

Utilizar el método del materialismo dialético y la concepción del proceso histórico


creada por Marx para analizar la gênesis y el desarollo de la obra de Newton, en
35
relación com la época em la cual este vivió y trabajó.

A burguesia em ascensão desejava legitimar-se através de um


conhecimento racional do mundo, através de uma ciência que conseguisse
explicar o mundo natural através de teorias matemáticas. A mecânica de
Newton é a matematização do universo, a subordinação da crença mágica
medieval acerca das coisas à uma racionalidade burguesa que desejava
colocar o homem no centro das explicações acerca da natureza.
Mesmo assim, Newton não desprezou de forma alguma o divino da sua
concepção de universo. Mas o divino para Newton era o criador, o primum
móbile do universo. Deus criou o mundo a sua imagem e semelhança, ou seja,
perfeito, distribuindo os elementos de forma ordenada e coerente.
Talvez neste ponto resida a diferença fundamental entre o pensamento
newtoniano e o pensamento cartesiano. Isto porque para Newton a matéria
necessitava de um movimento exterior a ela mesma para adquirir movimento.
Já a filosofia cartesiana não admite causa sobrenatural, sendo assim a matéria
a única substância, o único fundamento do conhecimento.
Esta diferenciação é a chave para a compreensão do conceito de
inércia. A negação do materialismo cartesiano, a afirmação de que o
movimento não é inerente a matéria, trazia diversas implicações a teoria
newtoniana. Nas palavras de Hessen,

35
Idem, p.40.

32
33

Newton no se limitaba a la concepción física del espacio, también brindaba uma


concepción filosófica-teológica. 36

Newton, segundo Hessen, foi o filho mais célebre que a burguesia criou.
Suas teorias contidas no Principia foram determinantes para a consolidação de
uma visão de mundo burguesa, ao mesmo tempo mecânica e teológica, natural
e divina. Sua negação do materialismo e da incredulidade cartesiana eram
fundamentais para a afirmação de um novo saber, ao mesmo tempo racional e
divino. O afastamento entre o conhecimento científico e a teologia só se daria
um século depois, com os iluministas. Ao contrário do que muito se pensa, o
pensamento moderno não rompeu com as crenças mágicas medievais, mas
isto é assunto para mais tarde.
Por ora, basta destacar que Newton foi movido por forças sociais que
estavam muito além dele. Em outras palavras, se não fosse Newton a
desenvolver tais teorias, outra pessoa o faria. A concepção externalista
consiste exatamente em negar veementemente o papel do indivíduo na
elaboração das suas teorias. As forças sociais que agem sobre o indivíduo são
muito maiores do que eles próprios:

Los grandes hombres, a pesar de su genialidad, solo formulan y resuelven, em


cualquier campo, aquellas tareas que el desarrollo histórico de las fuerzas productivas
y de las relaciones de producción de su época les plantean.37

As concepções materialistas de Bernal e Hessen a respeito da história


da ciência não levam em consideração o indivíduo, pois este não possui um
papel claro na teoria marxista seguida pelo autores. O indivíduo perde-se frente
as estruturas que o soterram e o deixam sem poder de escolha. Esta é a
concepção de história da ciência do autor, ou seja, uma história claramente
determinista e estruturalizante.

36
Idem, p.56.
37
Idem, p.72.

33
34

Entende-se como internalismo o grupo intelectual que pensa a


ciência como uma entidade separada e que age autonomamente com relação
ao resto da sociedade. Possuindo Alexandre Koyré e Thomas Kuhn como seus
principais expoentes, o internalismo associa o pensamento científico ao
filosófico, superestimando o poder da teoria para a formulação de hipóteses
epistemológicas, negligenciando a relação entre conhecimento científico e
sociedade.
Segundo Joseph Ben-David, o que define esta corrente é a crença de
que “a ciência seja isolada da influência social externa, pois o que os cientistas
fazem e o modo como fazem é determinado por suas próprias tradições.”
Assim:

Embora a ciência seja concebida aqui como a atividade de um grupo humano, este grupo é tão
efetivamente isolado do mundo exterior que as características de diferentes sociedades, nas
quais os cientistas vivem e trabalham, podem, para certos efeitos, não ser levadas em
consideração. 38

Alexandre e Koyré e Thomas Kuhn, mesmo que agrupados aqui como


internalistas, são autores que possuem diferenças básicas na interpretação do
pensamento científico na história, como ficará claro rapidamente no debate que
segue.
Koyré analisa a história da ciência a partir da sua dinâmica interna. A
abordagem internalista do autor deriva de uma tentativa de se compreender o
movimento das descobertas científicas através dos pressupostos filosóficos
que embasam o conhecimento científico. Muito se fala acerca da influência do
pensamento científico sobre a evolução das concepções filosóficas, mas o
contrário sempre foi pouco explorado pelos historiadores e filósofos da ciência.
A sua tentativa é, pois, recuperar o papel do pensamento filosófico na
elaboração das teorias científicas.
Para o autor, a ciência é essencialmente theoria, ou seja, ela está
subordinada ao conhecimento filosófico, aos pressupostos teóricos. Mais do
que isso, para uma compreensão da história da ciência, é necessário o estudo
das condições intelectuais de cada época. O conhecimento científico é uma

38
BEN-DAVID, 1975, p.17-18.

34
35

derivação do saber filosófico, e não se orienta para a práxis, para o mundo


social, mas sim possui uma dinâmica interna que precisa ser estudada por si
própria.

É o pensamento, o pensamento puro e sem mistura, e não a experiência e a


39
percepção dos sentidos, que constitui a base da ciência.

Koyré analisa o mundo das idéias como se fosse algo inteiramente


deslocado do restante da sociedade. O cientista de Koyré é como alguém que
vive em um plano diferenciado do mundo social. Os eventos e a estrutura
social pouco importam para a evolução do conhecimento científico. As idéias e
os pressupostos que guiam as matrizes científicas são colocadas em um nível
acima das próprias descobertas científicas. Importa aqui menos o resultado do
que as causas que levaram ao resultado:

O empirismo puro não conduz a parte alguma, as grandes revoluções


científicas, embora naturalmente assentadas na descoberta de fatos novos, são
fundamentalmente revoluções teóricas, cujo resultado... foi a aquisição de uma nova
concepção de realidade. 40

Levando em consideração apenas o plano das idéias, Koyré realiza uma


espécie de filosofia da ciência, buscando uma historicidade, que segundo o
autor, é própria do seu movimento interno. A preocupação central do autor é
filosófica, e não histórica. Buscando os pressupostos que guiam as pesquisas
científicas, Koyré enxerga o conhecimento científico como um debate de idéias
contrárias. Seu interesse é muito mais no debate teórico do que nas
implicações práticas do conhecimento científico. Mesmo não negando estas
implicações práticas, o autor parece não estar interessado nelas, e assim todos
seus trabalhos se situam em debates teórico-epistemológicos.
O mérito de Koyré é mostrar como o conhecimento científico, longe de
ser algo estático e inerte, vem a tona através de implicações teóricas que não
podem ser negligenciadas. Sua tentativa de unir a filosofia e a ciência é
deveras interessante, pois coloca em pauta a escolha de certos pressupostos
39
KOYRÉ, 1991, p.187.
40
Idem, p.77.

35
36

para o aparecimento de teorias científicas. Desta maneira, o autor retira o


conceito de objetividade científica do bojo da sua explicação, para chamar a
atenção de que todo conhecimento científico é, a priori, realizado a partir de
certas escolhas subjetivas.

Na história do pensamento científico, sobretudo em suas épocas mais


fecundas e críticas... é impossível separar o pensamento filosófico do pensamento
científico, que se influenciam e condicionam mutuamente. Isolá-los é condenar-se a
nada compreender da realidade histórica. 41

Assim, gostaríamos apenas de acrescentar de que para Koyré a ciência


é a constante busca da verdade, é a investigação pura da natureza e do mundo
que nos cerca:

A ciência, a ciência de nossa época, como a dos gregos, é essencialmente


theoria, busca da verdade, e por isso ela sempre teve e sempre terá uma vida própria,
uma história intrínseca, e é somente em função de seus próprios problemas, de sua
própria história, que ela pode ser compreendida por seus historiadores. 42

Thomas Kuhn, como já dissemos, se afasta consideravelmente das


posições defendidas por Koyré. Há quem defenda que o autor não se encaixe
como historiador da ciência internalista. Neste trabalho, defenderemos visão
oposta pelos argumentos que a seguir apresentaremos.
Para debater o pensamento kuhniano, escolhemos o seu livro mais
importante e que sem dúvida mais marcou a historiografia da ciência, “A
estrutura das revoluções científicas”. Neste livro, Kuhn esboça sua teoria geral
a respeito da história da ciência e de como o conhecimento científico é
produzido.
Os conceitos-chave da teoria de Kuhn são sem dúvidas os conceitos de
paradigma e de comunidade científica. Pelo conceito de paradigma, Kuhn
compreende um sistema de pensamento geral que guia os cientistas na
escolha dos seus objetos e no encaminhamento das suas pesquisas. O
paradigma reinante é aquele que orienta o trabalho dos cientistas e impõe um
41
Idem, p.302.
42
Idem, p.377.

36
37

corpo de regras metodológicas e teóricas que se ligam a própria natureza da


pesquisa científica.
Não existe conhecimento científico que prescinda da teoria. Mas a teoria
aqui não significa aliar a filosofia à ciência, como faz Koyré. A abordagem de
Kuhn é severamente pragmática: é a ciência feita pelos cientistas nos
laboratórios, como se estes existissem em um mundo ideal, e pouco fossem
afetados por implicações extrínsecas a eles próprios.
A noção de comunidade científica é uma superestimação da decisão dos
cientistas na realização das suas teorias. O autor coloca os cientistas como
árbitros exclusivos da realização das suas próprias teorias. A sociologia da
ciência de Kuhn é praticamente uma sociologia das comunidades científicas,
onde o paradigma reinante orienta as pesquisas e define os métodos a serem
seguidos:

A competição entre segmentos da comunidade científica é o único


processo histórico que realmente resulta na rejeição de uma teoria ou na
adoção de outra. 43

Desta maneira, “comunidade científica” representa um determinado tecido


social completamente autônomo dos outros, uma estrutura no interior da qual
realizam-se e resolvem-se os debates que possuem relação com a ciência. Em
suma, ela é uma espécie de configuração de cunho social que se situa fora da
sociedade.
O corpo teórico e metodológico da ciência, que o autor chama de
paradigma, limita os assuntos os quais a comunidade científica irá tratar,
excluindo outros do seu campo. O objeto é, assim, determinado pela teoria. O
cientista, envolto em uma ordem paradigmática (conceitos, teorias,
metodologias, instrumentos) é o principal e único agente da realização das
suas pesquisas.
“Paradigma” é a base cognitiva na qual se ancoram as pesquisas de
determinada ciência ou especialidade. A quebra do paradigma, suscitado pelo
43
KUHN, Thomas. A estrutura das revoluções científicas. Editora Perspectiva. São Paulo,

1978, p.27.

37
38

aparecimento de uma série de questões e problemas os quais o paradigma


reinante não consegue resolver, é a definição de Kuhn para revolução
científica.
Kuhn divide o desenvolvimento da ciência em ciência normal e revolução
científica. Durante os períodos de ciência normal, os cientistas trabalham
normalmente sob a égide do paradigma reinante, ampliando sua aplicabilidade
e desenvolvendo pesquisas no interior deste paradigma. No entanto, quando
surge algum problema colocado nas pesquisas científicas, e o paradigma
reinante não é capaz de resolvê-lo, a ciência normal entra em crise, levando
inevitavelmente a debates internos das comunidades científicas acerca de qual
paradigma deve ser seguido:

Na escolha de um paradigma não existe critério superior ao consentimento da


44
comunidade relevante.

Neste período, considerado como um período de transição, novos


paradigmas se confrontam até que as comunidades científicas decidam por
aquele que melhor resolve os novos problemas colocados pela pesquisa
científica. Após esse período de relativa instabilidade, um novo paradigma é
escolhido, e tornado assim reinante, e a ciência volta ao seu estado “normal”:

As revoluções científicas iniciam-se com um sentimento crescente, também


seguidamente restrito a uma pequena subdivisão da comunidade científica, de que o
paradigma existente deixou de funcionar adequadamente na exploração de um
aspecto da natureza, cuja exploração fora anteriormente dirigida pelo paradigma.
Tanto no desenvolvimento político como no científico, o sentimento de funcionamento
defeituoso, que pode levar à crise, é um pré-requisito para a revolução. 45

Assim sendo, podemos observar que as revoluções científicas nada tem a


ver para Kuhn com uma mudança intelectual geral na sociedade. Longe disso,
o que as definem é apenas uma mudança de pressupostos teóricos e
metodológicos no trabalho das comunidades científicas.

44
Idem, p.128.
45
Idem, p.126.

38
39

Esta concepção limitada acerca do alcance do conhecimento científico é


suficiente para podermos enquadrar Kuhn na esfera do internalismo. Mesmo
que aqui o cientista seja influenciado por questões extrínsecas a ele próprio, no
caso o paradigma, Kuhn coloca muita ênfase na questão das comunidades
científicas e de como as revoluções científicas apenas afetam aos próprios
cientistas, não possuindo conexão com outros âmbitos da sociedade de uma
forma geral, como exemplificado a seguir:

Embora o mundo não mude com uma mudança de paradigma, depois dela o
46
cientista trabalha em um mundo diferente.

Neste ponto já deve ter ficado claro como as concepções internalistas de


Kuhn e Koyré se distanciam consideravelmente. Enquanto Kuhn tem uma
abordagem pragmática da história da ciência, fechando os cientistas em
comunidades praticamente isoladas da sociedade, Koyré se propõe a aliar
filosofia e ciência, buscando através da história das idéias o desenvolvimento
científico e intelectual do pensamento científico.
Ambas abordagens colocam em segundo plano a influência social sob a
prática científica, cada uma a sua maneira. Assim sendo, para os internalistas o
movimento do conhecimento científico é inerente a ele mesmo e suas causas
são intrínsecas, possuindo desta maneira uma lógica e uma dinâmica internas
próprias.

46
Idem, p.157.

39
40

Os estudos sociais da ciência: uma nova


abordagem

Distanciando-se consideravelmente das concepções internalistas e


externalistas, a vertente historiográfica e sociológica que ficou conhecida como
Estudos Sociais da Ciência trouxe durante os anos 1970/80 uma nova
abordagem acerca das práticas científicas, modificando os pressupostos e os
objetos da história da ciência e chegando à conclusões diferenciadas dos
estudos anteriores.
Já dissemos na introdução, e repetiremos mais uma vez que o objetivo
da monografia – contido no presente capítulo – não é o de fazer um balanço
dessa historiografia, muito menos o de traçar uma história da mesma. Longe de
citar todos os autores que se encaixam nessa bibliografia, procuraremos neste
capítulo situar algumas abordagens metodológicas, identificando o que de novo
estava sendo proposto por esses autores.
É importante enfatizar que a discussão centrada no dualismo
internalismo/externalismo foi totalmente suplantada da sociologia da ciência

40
41

com o surgimento destes novos estudos. Na década de 1980, havia poucos


pesquisadores produzindo sob a lógica de um grupo ou do outro. Assim,
mesmo que as proposições dos dois grupos tenham influenciado o debate
posterior, seus pontos de vista extremos foram afastados da discussão. 47
Selecionamos três livros para nos sentirmos mais à vontade no sentido
de esmiuçar alguns objetos propostos pelos estudos sociais da ciência, bem
como de discutir algumas proposições e alguns exemplos de forma mais
aprofundada. Pensamos que os livros escolhidos ilustram bem a discussão que
queremos propor e isso foi suficiente para nossa escolha. Por isso mesmo, me
antecipo às críticas, já dizendo que o critério utilizado foi totalmente arbitrário,
mesmo o recorte acerca da Idade Moderna tendo sido levado em conta.
Os livros escolhidos – como antecipado na introdução – foram Galileu
Herético, de Pietro Redondi; Galileo Courtier: The practice of science in the
culture of absolutism, de Mario Biagioli; e El leviathan y la bomba de vacío:
Hobbes, Boyle y la vida experimental, de Steven Shapin e Simon Schaffer.
Porém, antes de partir para a discussão propriamente dita dos livros em
questão, gostaria de pontuar rapidamente alguns caminhos da “nova
historiografia” que concernem à alguns temas da história da ciência,
justificando assim a enorme importância dessa corrente não só para a
disciplina, mas para o conhecimento de uma forma mais ampla. Talvez
voltemos na discussão dos textos à alguns pontos, mas para este trabalho, faz-
se necessário sublinhar o que significativamente mudou nas pesquisas
históricas e sociológicas e nas abordagens teórico-metodológicas.
Primeiramente, e para nós o mais importante, os estudos sociais da
ciência acabam com a distinção entre ciência e sociedade. Definindo o conceito
de ciência como “conhecimento institucionalizado”, os autores dessa corrente
acreditam que toda sociedade produz conhecimento e que este situa-se
inerentemente no interior de alguma sociedade.
Estes estudos criaram um interesse da disciplina em analisar melhor as
relações pessoais e sociais que se formam no espaço dos cientistas,
desvendando como a produção do conhecimento é marcada por tensões, e

47
No artigo de 1992, mencionado anteriormente, Shapin reconhece a importância do debate
internalismo/externalismo para a história da ciência.

41
42

que uma gama de possibilidades limitadas se apresenta para definir o que


pode ou não ser conhecido pelo homem.
Longe de ser apenas uma trivialidade, este pressuposto alterou todo o
rumo de pesquisas no campo e apresentou limites totalmente distintos para a
disciplina da história da ciência. Isto porque insistindo na não-separação entre
sociedade e ciência, sujeito e objeto, estrutura e evento, estes autores colocam
em jogo diversos objetos que eram desprezados ou esquecidos pela
historiografia anterior.
Ao redefinir o conceito de ciência como algo que não se diferencia da
sociedade, os estudos sociais da ciência se propõem a estudar o conhecimento
científico como uma prática cultural, como algo que é inerente ao mundo social
e que faz parte dele. Por isso, não havia mais porque perguntar se a ciência
era autônoma em relação à sociedade ou se era influenciada por esta,
simplesmente porque uma entidade era intrínseca a outra.
Partindo da conceituação de ciência como prática cultural, os problemas
fundamentais envolvidos na pesquisa apontavam então para: 1) as tensões
envolvidas na discussão acerca do conhecimento e de como este é
institucionalizado, em detrimento de outros e passa a ser chamado de
conhecimento científico; 2) a análise dos meios sociais nas quais os agentes
envolvidos na questão estavam presentes e de como estes meios influenciam o
estabelecimento do conhecimento científico; e 3) a interconexão entre a ciência
e de diversos aspectos da sociedade, já que esta é uma prática cultural, e
como tal, está envolta em uma série de questões que transcendem a mera
busca pela verdade, associando assim poder e conhecimento.
Assim, a redefinição do conceito de ciência leva a uma aproximação da
história da ciência com outras disciplinas, enriquecendo a discussão e fugindo
de um debate que se situava entre quem era contra e quem era a favor da
autonomia do conhecimento. Os estudos sociais da ciência recuperam o papel
do agente, não do agente isolado, mas sim do social, mostrando que existem
outros interesses que cercam a ciência que não são apenas “puros”:

42
43

Naturally, truth is not “outside of power”; it is not “the reward of free espirits”, or
the child of protracted solitude. Truth is produced and maintained in what
Foucault called “regimes”, each with its “general politics of truth”. 48

Assim, podemos ver - e espero que ao final do presente capítulo se


possa compreender melhor – que a tentativa das novas abordagens giravam
em torno da re-significação da idéia de ciência, aproximando-a dos contextos
nas quais ela surgiu, apontando-a como um leque de práticas culturais que
visavam a explicação, mas principalmente o controle do mundo natural, e que
diversos interesses estavam e estão em jogo quando o assunto é
conhecimento científico.

É quase impossível ler Galileo Courtier: The practice of science in the


culture of absolutism, de Mario Biagioli, sem pensar na sociologia de Norbert
Elias. Utilizando o caso de Galileu Galilei como exemplo, Biagioli aplica a teoria
da interdependência do sistema de patronagem para explicar o nascimento da
ciência moderna.
Associando o pensamento científico a condições específicas
proporcionadas em um espaço micro-sociológico, o autor utiliza Galileu como
exemplo, destacando sua atuação na corte dos Médici em Florença, e
concluindo que seu trabalho como cientista não pode ser dissociado do fato
dele passar maior parte da sua vida na corte. Criticando as abordagens que
buscaram separar o Galileu cortesão do Galileu cientista, Biagioli faz um
inteligente caminho ao recuperar a dimensão histórica do conhecimento
científico moderno, trabalhando com a questão social do pensamento galileano
e analisando-o com base nas próprias estratégias interpessoais do filósofo.
Biagioli examina o fato de um matemático como Galileu ter se tornado
filósofo da corte dos Médicis em uma época na qual a matemática era vista
como conhecimento menor, subordinado à filosofia e à teologia. Não era
qualquer matemático que chegava a ocupar o posto de uma importante corte
48
SHAPIN, Steven. A social history of truth: Civility and science in seventeenth-century
England. The University of Chicago Press. Chicago, 1994, p.36.

43
44

européia setecentista. Assim, o autor faz um exame minucioso da relação entre


a atuação de Galileu na corte e suas teorias científicas, mostrando que o
prestígio social de Galileu foi o principal motivo que garantiu a publicação e a
divulgação dos seus trabalhos intelectuais.
A novidade do livro de Biagioli reside, dentro escola teórica dos estudos
sociais da ciência, na associação entre o conhecimento científico e o lugar que
este conhecimento é produzido. O autor não enxerga Galileu como um
intelectual em estado puro, ou seja, como um indivíduo afastado das
estruturas, tampouco o coloca como subordinado às determinações da vida
social na corte, mas traça um complexo esquema associando as teorias
defendidas pelo autor e o enorme sucesso com o qual foram recebidas às
estratégias assumidas por Galileu no interior do sistema de patronagem da
corte.
As universidades no século XVII – como já dissemos no capítulo 1 –
eram lugares onde o conhecimento filosófico estava fortemente associado ao
aristotelismo e ao pensamento escolástico. Um matemático como Galileu
possuía remotas chances de lecionar como filósofo em uma universidade
européia, principalmente defendendo as posições polêmicas que ele defendia.
Falamos brevemente das cortes européias como lugar de produção de
conhecimento durante a Idade Moderna, e Galileo Courtier serve sem dúvida
para fortalecer e ratificar esta idéia:

The court contributed to the cognitive legitimation of the new science by


providing venues for the social legitimation of its practitioners. 49

A importância da patronagem na produção do conhecimento científico


moderno é o ponto central do livro. Tendo alcançado o posto de filósofo da
corte de Florença, Galileu não publicava seus trabalhos a partir puramente de
sua genialidade, muito menos isolado do mundo no qual vivia. Ao contrário do
que muitos pesquisadores defenderam, Galileu não era um homem simples
que representava forças progressistas em oposição a aristocracia cortesã. Esta

49
BIAGIOLI, Mario. Galileo Courtier: the practice of science in the culture of absolutism. The
University of Chicago Press. Chicago, 1993, p.2.

44
45

imagem idealizada não permite a nós captar o complexo processo envolvido na


produção do conhecimento ao nos confrontar com um dualismo tendencioso e
maniqueísta.
Leitores familiarizados com a teoria de Elias sabem que as próprias
regras de etiqueta das cortes européias eram uma forma de sustentar e
fortalecer as relações interpessoais entre os nobres. Galileu não podia se
separar em duas pessoas, de um lado o Galileu cortesão e do outro, o Galileu
cientista. Considerando isto, faz-se necessária a compreensão da vida pessoal
de Galileu e suas relações na corte para explicar o desenvolvimento das suas
idéias e a publicação dos seus escritos. Segundo a lógica de Biagioli, não
bastava ser inteligente, nem ter boas idéias, para se tornar um filósofo
respeitado em uma corte européia, como era Galileu ou Kepler, mas sim –
utilizando-se de uma linguagem durkheimiana - participar de maneira
inconsciente e coercitiva de um complexo sistema de regras e comportamentos
que os fazia galgar posições no mundo cortesão:

I think it would be useful to suspend for a moment the natural belief that Galileo,
Kepler, and Clavius earned their titles simply because of the quality of their
scientific work, and to consider, instead, that they also gained scientific
credibility because of the titles and patrons they had. 50

As cortes promoviam duelos científicos, nos quais um filósofo desafiava


outro com o qual ele discordava das idéias apresentadas. Biagioli recorre
bastante a esses duelos científicos, mostrando que eles eram constantes e
duravam várias horas, nas quais teorias apresentadas eram expostas e
defendidas sob os olhos de vários importantes membros da Corte, que se
divertiam e adoravam os “duelos”. Galileu foi presença constante nestes
duelos, e obteve sucesso na maioria deles, o que explica o respeito que a
teoria copernicana obteve com ele no seio da aristocracia florentina. Estes
duelos também eram - de certa maneira - um intercâmbio entre produtores do
conhecimento e incentivavam a produção intelectual nas cortes, como explica o
autor:

50
Idem, p.59.

45
46

Networks of aristocratic and princely patronage played a crucial role in early


modern scientific life. They allowed for communications among scientists,
framed their socioprofesional ethos, provided parameters to distinguish
legitimate from ilegitimate practitioners, gave them acess to social status and
credibility, and fostered, publicized and legitimate their debates. 51

A legitimação do pensamento de Galileu é oriunda do sistema de


patronagem. Foi no ambiente de corte que ele viveu, e foi neste na qual ele
publicou seus trabalhos e foram para os cortesãos que ele leu e discutiu suas
teorias. Foram seus “patrões” que legitimaram e deram suporte às suas
pesquisas, ou seja, a sua vida intelectual não pode ser distanciada das suas
relações interpessoais.
É importante ressaltar que o caso de Galileu é apenas utililizado como
exemplo. Assim como Galileu, diversos outros intelectuais modernos também
trabalharam em diferentes cortes européias e fizeram parte do sistema de
patronagem envolvido nelas:

Although the court was not a scientific academy, it was an institution that
could offer social legitimation which, in turn, could help establish the credibility
of mathematicians-turned-philosophers. 52

Desta maneira, Biagioli traz para o interior da história da ciência alguns


objetos que estavam fora da sua margem, por exemplo a influência das
relações interpessoais na elaboração do conhecimento científico. Antes
polarizado entre internalismo e externalismo, a história da ciência não se
permitia pensar que o conhecimento científico fosse uma prática realizada
dentro da própria fonte de poder das monarquias européias.
Além disso, os debates científicos eram fontes de prestígio para os
intelectuais, que se respeitavam sem a necessidade de terem que concordar
entre si. O sistema de patronagem e as cortes foram partes fundamentais da
produção do conhecimento científico moderno e estão inseridos na sua lógica.

51
Idem, p.74.
52
Idem, p.156.

46
47

Porém, na minha opinião, a maior contribuição de Biagioli para a


historiografia da ciência é apresentar o conhecimento científico como algo que
intrinsecamente envolve uma relação de poder, que não existe fora do sistema
de etiquetas, como nos explica Elias. Na verdade, as práticas científicas
realizadas no interior da corte eram uma busca por prestígio e legimitimação e
envolviam interesses que pairavam fora da filosofia natural. Ao se referir às
práticas científicas, Biagioli afirma:

Power did not existe outside these practices(as their independent cause; rather
it was constituted by them. 53

Apresentando o conhecimento como uma prática cultural, Biagioli nos


incita a pensar que a ciência não é produzida para a sociedade, nem fora dela,
mas sim é produzida nela, e a tem inerentemente nos valores que defende.
Nem mais nem menos.

Galileu herético, de Pietro Redondi, contesta diversas verdades


presentes na historiografia corrente a respeito do julgamento de Galileu Galilei.
Redondi não está, ao contrário de Biagioli, interessado no lugar que o filósofo
ocupava na corte, tampouco com suas teorias científicas, por mais que ambas
as coisas tenham estreita relação com o assunto que ele quer tratar.
Na verdade, o livro em questão refaz e esmiúça as duas acusações
proferidas contra Galileu pelo Tribunal do Santo Ofício, e altera
significativamente abordagens clássicas a respeito do assunto. Analisando o
julgamento de Galileu de uma forma nunca vista antes, Redondi discute o
movimento científico moderno com base nas aspirações da época, mostrando
o que estava em jogo no pensamento galileano e o que realmente preocupava
a Igreja nas idéias proferidas pelo filósofo.
A maioria dos estudos anteriores à Galileu herético não hesitaram em
explicar a condenação de Galileu com base nas suas pesquisas voltadas a
53
Idem, p.2.

47
48

corroborar a teoria heliocêntrica de Copérnico. A Igreja, muitas vezes vista


como salvaguarda das trevas e obstáculo aos avanços da ciência condenou
Galileu porque ele afirmava que a Terra se movia ao redor do Sol. Será?
Segundo Redondi, não foi nada disso. Na verdade, a teoria heliocêntrica
já era aceita como hipótese, ou seja, como algo que poderia ser utilizado como
pressuposto científico, mas não havia como ser provada. Em seu primeiro
julgamento, Galileu foi questionado por Roberto Bellarmino, cardeal do Tribunal
da Inquisição, se havia como ele provar suas afirmações copernicanas a
respeito da centralidade do Sol. A resposta é curta e negativa. Galileu
realmente não havia como comprovar o heliocentrismo.
Assim, a teoria copernicana é condenada pela Inquisição, não por
ameaçar algum alicerce fundamental da Igreja, mas simplesmente porque era
considerada falsa, ou seja, porque não era apoiada por nenhum fundamento
teológico ou matemático inquestionável. Já o movimento do Sol tinha por base
a experiência cotidiana e a observação empírica, como já dissemos antes. O
geocentrismo não era um dogma fundamental da Igreja Católica, mas apenas
uma característica do pensamento aristotélico considerada irrefutável pela
escolástica.
Não é novidade que diversos padres e cardeais aderiram a teoria
heliocêntrica, mesmo tendo essa sido condenada como falsa. A condenação da
teoria copernicana não pode ser vista de maneira alguma como uma
condenação religiosa contra o desenvolvimento da ciência. Este absurdo é
proferido aos montes quando o assunto é a condenação de Galileu e ainda
entrava um debate sério a respeito do assunto.
Assim como Copérnico propôs a centralidade do Sol, houve filósofos que
propuseram o sistema lunar, no qual os planetas e o Sol giravam ao redor da
lua, e outros que propuseram diversos outros sistemas de mundo. Sabemos
que a teoria de Tycho Brahe, na qual o Sol girava ao redor da Terra e os
planetas em volta do Sol, por exemplo, gozou de muito mais sucesso dentre os
filósofos do século XVII do que a teoria heliocêntrica, até porque Tycho Brahe
era um dos grandes astrônomos da Europa e apresentara cálculos
significativamente precisos do seu sistema de mundo.
Resolvido o primeiro problema, a seguir, desmitificar a condenação de
Galileu, negando o heliocentrismo como fator principal do seu julgamento,

48
49

podemos dizer que o principal motivo da condenação foram suas idéias


contidas no livro Saggiatore, essas sem dúvida polêmicas e extremamente mal-
vistas pela Igreja Católica.
Para este autor, o que estava em jogo era a incompatibilidade entre a
filosofia contida no Saggiatore, publicado em 1623 e o dogma eucarístico, que
havia sido reafirmado e considerado o mais importante de todos pelo Concílio
de Trento.
Desde seus primeiros escritos, Galileu havia mostrado uma certa
simpatia por algumas doutrinas atomísticas, que ele adquiriu através da leitura
de alguns filósofos gregos defensores de semelhante suposição a respeito da
constituição do universo, principalmente Demócrito e Lucrécio.
No Saggiatore, Galileu sistematizou suas crenças atomísticas,
defendendo teorias corpusculares a respeito dos fenômenos sensíveis, com a
exceção do movimento do som, para o qual ele reservava teorias do campo
ondulatório. Pois bem, defendendo a idéia atomística para lidar com fenômenos
como o calor, a luz e a estrutura dos sólidos, Galileu relegava a segundo plano
aspectos qualitativos da matéria, considerados acidentes, como odor, sabor e
cor.
Segundo Galileu, estes acidentes derivam apenas de uma sensação
estimulada por partículas (ele não usa a palavra átomo, mas mínima), que
estimula os corpos a ter tal ou qual sensação. Simplificando a explicação,
Galileu defendia uma teoria corpuscular, afirmando que as qualidades
sensíveis eram totalmente subordinadas à mínima, ou seja, à estrutura
atomística dos corpos.
Ora, se as qualidades do corpo, ou seja, suas características sensíveis,
só se modificam mediante uma mudança na própria matéria do corpo, aí sim há
um grande problema para o dogma eucarístico. Se o pão não se transforma
efetivamente em corpo de Jesus e o vinho no seu sangue, como se explicaria a
transubstanciação e a verdade fundamental reafirmada pelo concílio de
Trento?

Trento proclama com certeza filosófica a presença real de Cristo na hóstia: é o


imenso privilégio de saber e de compreender que Deus vem à Terra, em

49
50

virtude de uma fórmula sacramental, e que é visível para os homens,


reencarnado como Cristo sob espécies eucarísticas. 54

A eucaristia envolvia uma discussão teológica a respeito da alma


(substância) e do corpo (aparência) pois, segundo a lógica cristã, a eucaristia
era o sacramento que por excelência afirmava a presença de Cristo na Terra,
através da transubstanciação real do pão no seu corpo e do vinho no seu
sangue. Assim, a aparência permanecia igual (pão e vinho), mas a substância
se modificava, passando a ser o próprio corpo e sangue divinos.
O dogma católico partia assim do pressuposto inquestionável de que a
substância pode se modificar enquanto a aparência permanece a mesma, ou
seja, o corpo pode permanecer igual na mudança da alma que o anima. A
transubstanciação não era simbólica, mas real, pois efetivamente Cristo descia
dos céus e se fazia presente em toda sua divindade, em toda sua unidade e
onipotência. Considerando a importância teológica do sacramento eucarístico,
o Concílio de Trento considerou a transubstanciação como um dos principais
dogmas da Igreja:

Com efeito, o que é o pão? É o corpo de Cristo. E em que se transformam aqueles


que o recebem? No corpo de Cristo; não muitos corpos, mas um só corpo. De fato, tal
como o pão é um só apesar de constituído por muitos grãos, e estes, embora não se
vejam, todavia estão no pão, de tal modo que a sua diferença desapareceu devido à
sua perfeita e recíproca fusão, assim também nós estamos unidos reciprocamente
entre nós e, todos juntos, com Cristo. 55

Além do mais, cabe destacar que o movimento protestante negou a


transubstanciação, explicando a eucaristia através da consubstanciação, onde
a presença do corpo e sangue de Cristo seria apenas simbólica e não
corresponderia a uma mudança real das qualidades do alimento, pois esta só
aconteceria mediante uma mudança também da aparência.
Desta maneira, percebe-se que em uma época de reformas religiosas,
defender uma teoria atomista a respeito dos corpos seria embasar o argumento

54
REDONDI, Pietro. Galileu herético. Companhia das Letras. São Paulo, 1991, p.368.
55
Homilias sobre a I Carta aos Coríntios, 24, 2: PG 61, 200; cf. Didaké, IX, 4: F. X. Funk, I, 22; S.
Cipriano, Epistula LXIII, 13: PL 4, 384.

50
51

luterano de que a substância está subordinada a aparência e isto era (e ainda


é) considerado pecado mortal dentro da filosofia católica.
A acusação real de Galileu pode ser mal compreendida por nós, que
estamos tão afastados de discussões teológicas e assim, dificilmente somos
capazes de compreender a complexidade do debate. Em 1632, entretanto, o
que chocou algumas pessoas foi a acusação pública que o matemático-filósofo
sofreu de defender o copernicanismo, teoria esta já aceita na Europa
setecentista. Descartes, por exemplo, ficou surpreso com o aparente motivo da
condenação de Galileu:

“Foi, em outros tempos [a teoria do movimento da Terra], censurada por algum


cardeal, mas me parecia ter ouvido dizer que, posteriormente, não se impedia que ela
fosse ensinada publicamente, inclusive em Roma”. 56

Assim, sugerindo que Galileu não foi condenado pelo copernicanismo,


mas por suas teorias físicas atomistas, Redondi alega que como alta figura da
sociedade – como ficou claro na discussão do Biagioli – e protegido pelo
próprio papa Urbano VIII, Galileu teve um julgamento de fachada, acusado
publicamente de adesão ao copernicanismo, mas na prática de adesão ao
atomismo.
Condenado na prática por uma coisa e publicamente por outra, Galileu
foi obrigado a retirar suas afirmações a respeito do heliocentrismo, por serem
consideradas falsas, e a nunca mais defender teorias atomísticas relativas à
constituição da matéria. Sua pena de prisão pérpetua domiciliar foi meralmente
formal, já que na época do julgamento, Galileu já não estava bem de saúde e
assim, não viu problemas em ficar encerrado em seu suntuoso palácio na corte
de Florença. Galileu morreu com todas as honras religiosas, como um homem
cristão de fé exemplar. Foi enterrado na Basílica de Santa Croce, onde também
estavam Michelangelo e Maquiavel. A punição do Santo Ofício é analisada por
Redondi:

56
ADAM, C.; TANNERY, P. Oeuvres de Descartes. Paris, Librairie Philosophique J. Vrin, 1969,
V. 1, p. 271.

51
52

No século XVII, com uma complexidade de cálculo político e uma


fenomenologia psicológica que hoje nos escapam, a razão de Estado e a razão
da fé faziam constantemente recorrer a punições dissimuladas, mascaradas,
para evitar escândalos e assegurar a consolação do povo de Deus. Essa arte
da dissimulação, arte da prudência, primeira virtude política e religiosa do
poder, nunca ou quase nunca deixa provas. 57

Desta maneira, a questão fundamental de Galileu Herético é, a nosso


ver, apresentar um debate teológico importantíssimo para o século XVII ao qual
não foi dada praticamente nenhuma atenção na historiografia acerca da história
moderna relacionando-o com a condenação de Galileu.
Para nós, homens do século XXI, é muito mais fácil explicar a história
com base nas nossas próprias crenças e olhar para trás tentando enxergar o
nosso passado, aquilo que motivou o que somos hoje. O resultado disto é que
às vezes acabamos esquecendo que as motivações de cada época são muito
particulares, e desta maneira, discussões importantes no passado acabam
sendo negligenciadas por não fazerem sentido para nós.

Como explicar aos homens católicos do século XVII que hoje não entendemos suas
paixões especulativas e preferimos olhar para outro lugar, porque elas nos
embaraçam, na medida em que somos descendentes de Galileu e, passado tanto
58
tempo, nos tornamos todos, católicos e laicos, modernos carolas científicos.

Em vez de nos dobrarmos para compreender o passado, por vezes


acabamos por dobrar o passado afim de melhor compreender-nos. A tentativa
de Redondi é contrariar esta lógica do senso comum e apresentar uma história
humanizada, onde as escolhas dos agentes se baseiam em alternativas
específicas dos aspectos culturais e sociais envolvidos. Cabe ao historiador a
decomposição desse processo e a apresentação do objeto levando em conta
todas as tensões envolvidas na produção do conhecimento científico.

57
REDONDI, Pietro. Galileu herético. Companhia das Letras. São Paulo, 1991, p.364.
58
Idem, p.368.

52
53

A discussão incitada por Steven Shapin e Simon Schaffer, em El


leviathan y la bomba de vacío: Hobbes, Boyle y la vida experimental é
extremamente útil para a compreensão de algumas proposições realizadas no
bojo dos estudos sociais da ciência. Remontando uma polêmica pouco
conhecida entre Hobbes e Boyle, os autores analisam as tensões presentes no
estabelecimento do método experimental na ciência moderna, problematizando
sua aplicação no conhecimento da natureza.
O livro explora o debate entre Boyle e Hobbes a respeito da existência
ou não do vácuo por volta dos anos 60 e 70 do século XVII. Para Schaffer e
Shapin, esta discussão colocou em lados opostos a questão central do
experimentalismo como verdade pura para o conhecimento científico. O
problema é que o discurso “vencedor” influenciou de tal maneira a
historiografia, que Hobbes deixou de ser visto como um filósofo natural, sendo
apenas lembrado pela filosofia política do contrato social contida no Leviatã. A
intenção dos autores é reapresentá-lo como um importante filosófo natural,
recuperando assim suas proposições filosóficas a respeito do conhecimento
científico.
Mais do que isso, poderíamos dizer que a intenção dos autores é romper
com a aura de auto-evidência que permeia a via experimental de produzir
conhecimento, através da defesa de que o método científico pressupõe uma
forma de organização social e está atrelado a convicções políticas e morais.
Mais uma vez vemos aqui como os estudos sociais da ciência desprezaram o
caráter isolado do conhecimento científico, propondo uma associação entre
diversos elementos envolvidos e inerentes à sua produção.
O método experimental constitui hoje parte integrante de quase todas as
ciências. Sua eficácia é pouco discutida, já que o experimento é considerado
como prova irrefutável da eficácia de uma dada teoria, que é comprovada a
partir da apreensão imediata da verdade. Desta maneira, o experimento é
considerado como um espelho fiel da natureza, como uma comprovação
verdadeira que se faz de uma hipótese sem intermédio humano.

Nada es tan dado como um hecho. En el lenguaje cotidiano, tanto como en la filosofia
de la ciencia, la solidez y la permanência de los hechos reside em la ausencia de

53
54

agencia humana en su aparición... [los hechos] son considerados como el resultado


pasívo de sostener um espejo frente a la naturaleza. Aquello que los hombres hacen,
ellos mismos pueden deshacerlo, pero lo que la naturaleza hace ningún hombre
59
puede disputarlo.

As academias científicas, surgidas no fim do século XVII, representaram


uma salvaguarda dos métodos experimentais na filosofia natural. Estas
academias realizavam experimentos em seus salões e proclamavam verdades
universais que não eram passíveis de refutação, porque os experimentos
apontavam para elas. O mundo natural estava sendo exposto aos olhos dos
homens, e os homens acreditavam que poderiam conhecê-lo através das
novas invenções.
Os instrumentos inventados durante os séculos XVI e XVII, como o
telescópio e o microscópio eram alvos de fascinação, compreendidos como
artifícios mecânicos que potencializavam os sentidos humanos. Agora, podiam-
se ver coisas que a olho nu não estavam diante de nós. Um importante
membro da Royal Society, afirmava entusiasmado em 1665 que:

Hay poco que esperar del progreso de la teoria natural, si no es por médio de
aquellos instrumentos que se emplean para ampliar nuestra percepción de las
evidencias sensibles, cuya insuficiência nos impide progresar em la via de la
ciência y nos obliga a imperfectas hipótesis y tímidas conjecturas.60

Para a filosofia experimental, realizada no interior das novas academias,


o conhecimento científico era absoluto, resultado direto da apreensão imediata
do objeto. Desta maneira, os experimentos produziam um conhecimento
imparcial, objetivo e verdadeiro acerca da natureza e não eram passíveis de
discordância.
Como contraponto ao método alquimista - no qual o conhecimento era
privilégio de poucas pessoas e as verdades eram guardadas como segredo -
as comunidades experimentais relatavam seus inventos através de revistas.

59
SHAPIN, Steven; SCHAFFER, Simon. El leviathan y la bomba de vacío: Hobbes, Boyle y la
vida experimental. Universidad Nacional de Quilmes Editorial. Buenos Aires, 2005, p.54.
60
Idem, p.71. Glanvill, Scepsis Scientifica, “to the royal society”, pp 54-55.1665.

54
55

Essa literatura buscava chamar outros cientistas e intelectuais para fazer parte
da “comunidade experimental”. Para provar o caráter público destas
sociedades, seus membros realizavam sessões abertas, onde qualquer um
poderia entrar e ver com seus próprios olhos os experimentos sendo
realizados. Segundo esta lógica, para se realizar um experimento bastava
apenas uma pessoa, mas para validá-lo eram necessárias várias, com a
condição que estas fossem qualificadas para cumprir tal missão.

Ningún hombre había de tener el derecho de establecer aquello que contaba cómo
conocimiento. El conocimiento legítimo estava garantizado como objetivo en la medida
que era producido por el colectivo, y acordado voluntariamente por aquellos que
componían el colectivo. 61

Porém, Shapin e Schaffer demonstram como o caráter público destas


sociedades era apenas aparente. Na prática, as sessões eram restritas a um
pequeno número de membros e as revistas eram escritas em uma linguagem
pouco acessível ao “senso comum”. Para se tornar membro, um cientista
deveria se submeter a uma série de regras e métodos para orientar a sua
pesquisa e deveria submeter seus resultados a critérios validados em conjunto
com outros membros.

La naturalización del conocimiento experimental dependía de la institucionalización de


las convenciones experimentales. 62

As proposições de Boyle, um dos fundadores da Royal Society, visavam


organizar o conhecimento científico dentro de um modelo puramente
experimental, separado de indagações metafísicas e particulares. Desta
maneira, ele limitava o campo do conhecimento e evitava o dissenso filosófico
no campo da ciência através da experimentação e da verificação.
Hobbes, por sua vez, negava a verdade deste método. Para ele, os
experimentos não podem ser uma apreensão direta da realidade natural;
primeiramente porque são criados através da ação humana visando verificar
uma dada hipótese e inerentemente possuem uma intermediação na sua
61
Idem, p.123.
62
Idem, p.124.

55
56

realização, que a significam; e em segundo porque o experimento não é um


método em si, mas sim um meio, ou seja, o objeto não existe por si só, mas é
produzido e alterado pelo sujeito.

Hobbes señaló que todos los experimentos conllevaban con ellos un conjunto
de presuposiciones teóricas involucradas en la construcción y el funcionamento
del aparato y que, tanto en principio como en la práctica, tales presupuestos
podían ser siempre desafiados. 63

Para Hobbes, importava menos o experimento em si, e mais as


hipóteses envolvidas nele. O experimento não era realizado sozinho e sem
causa alguma. Ele já partia de um conjunto de verdades estabelecidas a priori
pelos agentes envolvidos e assim, jamais poderia ser imparcial, muito menos
uma apreensão direta da realidade.

El hombre no tenía control sobre los efectos de la naturaleza, pero podía tenerlo en el
establecimiento de las definiciones y acordando nociones inteligibles de causa. 64

A filosofia era, na concepção hobbesiana do mundo natural, o


conhecimento mais puro que o homem poderia obter. A realização de
experimentos, com a ajuda de máquinas não poderia explicar os problemas
profundos envolvidos na busca pela verdade, na investigação científica.
Apenas o intelecto humano era capaz de penetrar nos mistérios da filosofia e
conhecer o mundo tal qual ele é:

Un catálogo de hechos, separado de la indagación causal y sin la estructura del


método correcto no significa nada: No podemos concluir de la experiencia ninguna
proposición universal. 65

Esta discussão foi sistematizada pelos autores em um episódio


específico, representado pela afirmação da existência do vácuo proferida por
Robert Boyle e negada por Thomas Hobbes. Este debate foi longo e

63
Idem, p.165.
64
Idem, p.153.
65
Idem, p.216.

56
57

apresentou diversos caminhos, mas procuraremos nos manter fiel ao nosso


trabalho, apresentando algumas abordagens teóricas de Shapin e Schaffer a
respeito das tensões presentes na produção do conhecimento científico
moderno.
Para a presente monografia, basta dizer que Boyle, por volta de 1660,
inventou uma máquina que supostamente provara a existência do vácuo.
Realizando alguns experimentos, Boyle comprovou a sua hipótese, o que
suscitou a negativa de Hobbes, que defendia a tese de que não existiam
vácuos no universo e que a bomba criada por ele permitia a entrada de ar e
não comprovava absolutamente nada.
A polêmica, que se estendeu durante anos, separou e definiu duas
posições distintas que transcenderam a esfera da viabilidade do método
experimental. Na verdade, o próprio método experimental, segundo Schaffer e
Shapin, já pressupunha uma série de questões que se conectavam com a
sociedade inglesa da época.
Em um período de instabilidade política - no qual o poder real havia sido
restabelecido após a República de Cromwell - as sociedades científicas
definiram os limites do conhecimento, limitando a ciência a um conhecimento
definido, estável, assim como deveria ser a ordem social. As próprias
academias se definiam em regras e convenções estabelecidas. A organização
intelectual pressupunha uma série de métodos estabelecidos, assim como a
organização política o fazia em respeito aos governados. Apenas era aceito
como membro da comunidade quem respeitasse as regras gerais que a
regiam.
Shapin e Schaffer tentam mostrar como a produção do conhecimento se
associa com aspectos políticos e depende de um contexto específico, de
aspectos morais e religiosos de uma dada sociedade, assim como se relaciona
com a organização e limitação do que é passível ou não de ser investigado ou
afirmado dentro de uma pesquisa científica.
Já dissemos que para Boyle a ciência experimental seria imparcial,
captando apenas o mundo natural tal como ele é. Hobbes, entretanto,
advogava que a filosofia era o conhecimento mais puro do homem e sua
apreensão somente era possível mediante a razão humana. Mais do que isso,
o conhecimento científico e filosófico não se movia em um terreno afastado das

57
58

convicções políticas e sociais, pois tinha o dever intrínseco de assegurar a paz


pública.
Enquanto que para Boyle o conhecimento bastava-se em si mesmo, na
concepção de Hobbes o conhecimento e a vida civil se entrelaçavam de
diversas maneiras, pois o estudo da natureza não se distanciava do estudo dos
próprios homens e dos seus assuntos:

La actividad científica, el papel del científico, y de la comunidad científica siempre han


sido dependientes: existen, son evaluadas y sostenidas em la medida que el Estado o
sus diversas agencias ven motivo para ella. 66

Assim, enquanto que para Boyle a discussão da existência do vácuo


apenas se tratava de um experimento científico, para Hobbes admitir a
existência do vácuo, de um vazio no universo, corroborava um discurso
religioso e fortalecia o poder da Igreja Católica em uma época em que esta era
inimiga do Estado absolutista inglês.
Afirmar a existência do vácuo seria, na visão de Hobbes, corroborar o
argumento do poder espiritual, pois a própria crença no vazio - uma crença que
transcende o mero objeto e se coloca no plano metafísico – era uma crença em
algo que transcende a filosofia natural e assim, está fora dos limites do
conhecimento humano. Afirmar semelhante suposição seria colocar em xeque
o poder temporal e espiritual exercido pelo Estado inglês, que havia se
separado da Igreja no século XVI e criado a Igreja Anglicana.
Shapin e Schaffer, ao recuperar a dimensão histórica da discussão
acerca do experimentalismo, recuperam também dois diferentes modos de se
enxergar a produção do conhecimento científico e como este deveria proceder
quanto aos seus critérios de validação. Enquanto que teoricamente Boyle via a
ciência como uma entidade autônoma, como um reflexo da natureza, Hobbes
proclamava por um conhecimento no qual pudessem ser assentadas as bases
para uma paz social, para um bem público. No seu contrato social, Hobbes não
admitia a presença da Igreja como entidade autônoma, mas apenas como
instituição subordinada ao Estado.

66
Idem, p.459.

58
59

Mesmo assim, podemos dizer que em uma época de muitas incertezas,


onde reinava na Inglaterra a instabilidade política, as concepções do método
experimental obtiveram mais sucesso. A inquietação filosófica e as posições
filosóficas de Hobbes não foram bem-vistas por uma sociedade que clamava
por ordem e coerência. Neste sentido, o experimentalismo definia claramente
seus limites e apresentava um programa onde a produção do conhecimento
tinha relativo consenso. Pode-se a partir de então, traçar uma diferença entre o
que era ciência, passível se ser comprovado, e aquilo que era apenas
especulação filosófica. Um conhecimento ordenado, assim como tinha que ser
a sociedade, como pregava o primeiro secretário da história da Royal Society,
em uma carta a Hobbes:

Esto[método experimental] debe ser considerado conocimiento, tal como lo veo, que
no inquieta la mente sino que la aquieta. 67

Não podemos nos furtar a explicitar a conclusão óbvia de que o


experimentalismo, na sua tentativa de organizar a ciência, possuía um projeto
de conhecimento que se adequava perfeitamente às demandas políticas da
sociedade inglesa. O projeto da Royal Society foi uma tentativa bem-sucedida
de unificação do saber, e sem dúvida envolvia caracteres propriamente
políticos na constituição de um conhecimento em consonância com a ordem
vigente.
Desta maneira, podemos ver como os autores, ao discutirem a produção
do conhecimento científico moderno, trazem à tona reflexões cruciais para a
nossa compreensão das práticas científicas, que necessariamente fazem parte
de um processo complexo da cultura e da organização social, pois os agentes
produtores do conhecimento são também agentes sociais e históricos.

Las soluciones al problema del conocimiento están incorporadas en las soluciones


prácticas dadas al problema del orden social, y diferentes soluciones prácticas al
problema del orden social involucran soluciones prácticas distintas al problema del
conocimiento. 68

67
Idem, p. 404. Oldenburg a Hobbes, 16 de junio de 1665, correspondencia vol 1, p. 74-75.
68
Idem, p.44.

59
60

Voltando à discussão, não pretendemos analisar pormenorizadamente


porque o projeto de Boyle e da Royal Society ganhou. Sabemos que a suposta
objetividade da ciência pregada pela comunidade experimental foi lentamente
impregnando todos os ramos do conhecimento, tanto natural como social e
atingiu seu limite com o positivismo, no século XIX.
Os experimentos científicos foram e ainda são considerados acima dos
argumentos humanos que o refutam, pois comprovam fielmente um fenômeno
da natureza. A concepção hobbesiana de associação entre conhecimento e
paz pública foi afastada de todos os manuais de ciências, e seu Leviatã foi
reduzido ao contrato social que aprendemos nas escolas como contribuição
máxima de Hobbes para o conhecimento.

Está por supuesto lejos de ser original señalar la íntima e importante relación
entre la forma de vida de la ciencia experimental y las formas políticas de las
sociedades liberales y pluralistas... Otras prácticas intelectuales fueron
condenadas y rechazadas porque fueron juzgadas inapropriadas (peligrosas)
para la organización política que emergió con la restauración. 69

Assim, pudemos vislumbrar as principais proposições acerca da


discussão entre Hobbes e Boyle colocada pelos autores que trazem a tona
questões de fundamental importância para a história da ciência. Além disso,
através deste debate vemos como ocorre a disputa entre teorias distintas e que
interesses se ligam à derrota de uma em relação à outra. As práticas científicas
não possuem um significado limitado ao campo da disciplina, mas abarcam
discussões que as transcendem e envolvem concepções e idéias distintas a
respeito dos homens e do mundo que os cerca.

69
Idem, p.463.

60
61

Conclusão

Procuramos discutir algumas proposições teóricas a respeito da


constituição do conhecimento científico, observando na maré dos estudos
sociais da ciência, o lugar efetivo que ele ocupa na ordem social. Tentamos
mostrar como as práticas científicas podem e devem ser compreendidas como
práticas culturais, como escolha e ao mesmo tempo, subordinação dos agentes
envolvidos.
À uma idéia absoluta de ciência, apresentamos uma visão crítica onde o
sujeito ocupa parte determinante, mostrando as tensões inerentes à elaboração
do conhecimento. É necessário excluir de uma vez por todas as oposições
entre sociedade e ciência, indivíduo e sociedade, sujeito e objeto, afim de
compreender as relações entre diferentes entidades que substancialmente
estão interligadas.
Desta maneira, nosso ponto é essencialmente um contraponto. Um
contraponto à visão geral que impregna a sociedade, representada pelo senso
comum, que enxerga a ciência como uma prática autônoma em si mesma, que
apresenta verdades inquestionáveis a respeito do mundo natural e que
representa – como herança direta do experimentalismo – o espelho da
realidade.

61
62

Parece que a concepção positivista a respeito do conhecimento


científico está amplamente presente no ideário comum. O século XIX, ao retirar
de vez o argumento religioso das ciências naturais, implantou em seu lugar
uma nova religião, tão dogmática quanto a anterior, embora menos mística e
metafísica.
Essa nova religião da modernidade é a própria ciência, recheada de
métodos incontestáveis, de pressupostos e conclusões inquestionáveis. Por
mais que em disciplinas teóricas e epistemológicas esta concepção já tenha
sido suplantada, ela permanece viva no discurso dos meios de comunicação e
dos grandes formadores de opinião que embalam o espírito acrítico médio que
predomina em nossas sociedades.
A história da ciência não pode mais ser vista como um enumerado de
pressuposições e conhecimentos empilhados um sob o outro, como se a
disciplina fosse um catálogo das inúmeras descobertas ocorridas no passado.
Por isto, cabe a todos retirar a singularidade da palavra (a Ciência) e introduzir
o plural (as ciências), admitindo de uma vez por todas que no conhecimento
científico a natureza não fala por si própria, mas apenas perante um
enumerado de operações que intermedeiam suas práticas.
Os estudos sociais da ciência tiveram também o mérito de historicizar a
ciência. E ao localizá-la, em meio a suas tensões e discussões, a conclusão
final e mais importante é deixar claro que como todas as práticas culturais, o
conhecimento científico é transitório. Só conseguiremos entender a
complexidade da questão através da tentativa de compreensão de nós
mesmos, que submergidos nesse mar de falsas idéias e opiniões, acabamos
sucumbindo a elas e nos isentando da busca do real conhecimento, que é
constantemente procura, pesquisa, e só pode ser conhecida pelos homens,
através do seu intelecto. Para terminar nosso trabalho, deixamos a citação de
Shapin e Schaffer que ilustram brilhantemente o nosso ponto de vista:

Ya no pueden darse por sentado por más tiempo ni nuestro conocimiento


científico, ni la constitución de nuestras sociedades, ni las concepciones tradicionales
acerca de las conexiones entre nuestro conocimiento y nuestra sociedad. En la
medida en que reconozcamos el caráter convencional y el estatuto artificial de
nuestras formas de conocimiento, nos ponemos en una posición en la cual nos

62
63

podemos dar cuenta que somos nosotros mismos, y no la realidad, los responsables
de lo que sabemos. El conocimiento, como el Estado, es el producto de la acción
humana. 70

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