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Novembro de 2002
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
CURSO DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO
Por
Pelotas
Rio Grande do Sul - Brasil
Novembro de 2002
Universidade Federal de Pelotas
Faculdade de Educação
Programa de Pós-Graduação em Educação
elaborada por
MARCELO SILVA DA SILVA
Comissão Examinadora:
___________________________________
Prof.ª Dr.ª Márcia Ondina Vieira Ferreira
(Orientadora)
FaE/UFPel
__________________________________
Prof.ª Dr.ª Maria Isabel da Cunha
(Co-orientadora)
PPGEd/UNISINOS
__________________________________
Prof.ª Dr.ª Mari Margarete dos Santos Forster
PPGEd/UNISINOS
__________________________________
Prof.ª Dr.ª Eliane Ribeiro Pardo
ESEF/UFPel
Mario Quintana
À minha mãe e ao meu pai, dedico esta dissertação,
pela possibilidade e apoio que me deram de estudar
e construir este conhecimento.
AGRADECIMENTOS
RESUMO ................................................................................................... I
ABSTRACT .............................................................................................. II
1. A ORIGEM DO ESTUDO: ONDE TUDO COMEÇOU ......................................10
1.1. UM POUCO DE MINHA TRAJETÓRIA ...................................................................................10
1.2. AS ORIGENS DO ESTUDO ....................................................................................................12
1.3. O UNIVERSO A DESVELAR: A PROBLEMÁTICA EM QUESTÃO .......................................15
1.4. ALGUMAS ANOTAÇÕES SOBRE O PROCESSO METODOLÓGICO...................................17
2. UM POUCO DE HISTÓRIA NÃO FAZ MAL A NINGUÉM ..............................23
2.1. EDUCAÇÃO FÍSICA: UM OLHAR HISTÓRICO .....................................................................23
2.2. PRÁTICA DE ENSINO E EDUCAÇÃO FÍSICA ......................................................................29
2.3. A HISTÓRIA RECENTE: ESPAÇO, TEMPO E SUJEITOS DESTA PESQUISA ...................32
3. SER OU NÃO SER PROFESSOR? EIS A QUESTÃO.....................................39
3.1. PROFISSÃO, PROFISSIONALIZAÇÃO, PROLETARIZAÇÃO E PROFESSORES ...............42
4. SABERES E INTUIÇÕES NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES ...............47
4.1 OS SABERES E A FORMAÇÃO ..................................................................................................49
4.2 INTUIÇÕES DOCENTES E A FORMAÇÃO .................................................................................53
5. DE HISTÓRIAS E FALAS ..........................................................................................57
5.1 A FORMAÇÃO INICIAL E OS SABERES DOCENTES ...............................................................57
5.2 CARACTERÍSTICAS DOS SABERES DOCENTE E A FORMAÇÃO INICIAL .............................59
6. CONCLUSÕES... AINDA QUE PROVISÓRIAS..................................................82
6.1 A FORMAÇÃO INICIAL................................................................................................................82
6.2 EXPERIÊNCIAS E VIVÊNCIAS SIGNIFICATIVAS ......................................................................84
6.3 IMPORTÂNCIA DESSAS VIVÊNCIAS NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES............................86
6.4 AINDA HÁ MUITO POR ONDE SE AVENTURAR .......................................................................89
ANEXO I.......................................................................................................................................91
ANEXO II .....................................................................................................................................93
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................95
II
RESUMO
Dissertação de Mestrado
Programa de Pós-graduação em Educação
Universidade Federal de Pelotas
ABSTRACT
This work is the result of a long journey that tries to understand how the
experiences of the Physical Education Course contribute to build the Teaching
Knowledge and Professionalization. The main references, which led me to the
ideas I explain here, are from the time I made the entrance examination for
Physical Education, and resulted from my experience as a student, and as a
teacher. I chose this course because it had provided everything I wanted. The
teachers had always fascinated me, especially Physical Education teachers. At
the moment I started to teach at the university, my curiosity on how the Course
contributes to the elaboration of the Teaching Knowledge and to build the
upcoming teachers’ professionalization became bigger. In order to carry out this
study, I chose the Profession and Semi-Profession approach from Enguita
(1990; 1991) and the concept of Teaching Knowledge developed by Tardif
(1991; 1996; 2002). The selected methodology was based on the principles of
the ethnographic research, interview techniques as semi-structure and the
study of narratives, in an attempt of ensuring my interlocutors voice and of
prioritizing the qualitative aspects of their analysis. The work started with the
randomized choice of five (05) students - teachers, who were concluding the
Teaching Practices, that is, the curricular period of training. Through an
exercise of memory and an interview, which focused the main experiences
identified by them, I carried out the analysis of the study and could conclude
then, that the initial formation of the teachers contributed to the elaboration of
some knowledge and to start building a professional identity, highlighting the
importance of the practical experiences, the teaching activity or its observation,
as well as the difficulties of the Course as a whole to recognize and value the
trajectories of its students and their different experiences.
Com certeza muitas são as ligações que me levaram às idéias que aqui
exponho, mas creio que a origem principal, se é que posso eleger uma, está no
período em que prestei vestibular para Educação Física. A escolha deste Curso
11
teve muito a ver com o que eu desejava fazer, talvez uma certa vocação para
ser professor e com a imagem do professor que gostaria de ser. Admirava
alguns dos meus professores pela forma como agiam, como se posicionavam,
a maneira como davam as suas aulas, a importância que tinham para o nosso
futuro, além da amizade que construíam com os alunos. Os professores
sempre me provocaram um grande fascínio, principalmente os professores de
Educação Física, talvez pela questão da liberdade muito mais presente nas sua
aulas ou, então, pela importância dada ao nosso corpo, a nossa expressão nas
aulas, ao contrário das outras disciplinas onde a tendência era a padronização
dos atos e dos gestos, onde dificilmente poderíamos ser diferentes.
Às vezes a ausência desse professor, a sua falta de compromisso,
aquele seu deixar jogar sem nenhum objetivo maior me desmotivava das aulas
de Educação Física, mas, por outro lado, muitas vezes o empenho de outros
professores, o seu interesse, o conhecimento que de certa forma estava
implícito nas aulas, fizeram com que eu escolhesse este Curso de Licenciatura.
Depois de ingressar na Faculdade procurei me envolver em muitas
atividades, tanto de ensino como de pesquisa e extensão, privilegiando,
sempre, a questão da escola, especialmente a formação inicial dos
professores, pois percebia ali uma possibilidade de questionar mais a prática
pedagógica da Educação Física. Pretendia conhecer mais sobre a construção
dos professores, tentando entender como se poderia trabalhar dentro de uma
visão mais crítica da realidade, com uma compreensão mais consciente do
papel social do educador.
Meu interesse pelo ensino superior nunca me fez abandonar os
estudos da escola básica, porque seria impossível falar de formação de
professores sem conhecer a realidade concreta do seu espaço de atuação.
Devido a esse interesse e entusiasmo, durante meu estágio curricular - Prática
de Ensino -, optei por ter duas turmas de alunos, ao invés de uma, como seria
o normal. Essa foi uma das melhores experiências que tive durante a minha
graduação, ainda que já tivesse participado de outras atividades ligadas ao
ensino. Trabalhar dentro da escola e acompanhar o seu cotidiano, lidando com
os problemas diários foi uma ótima oportunidade de formação.
Esta trajetória me qualificou para fazer parte do corpo docente da
Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal de Pelotas –
12
Relativas às experiências
- Quais foram as experiências acadêmicas mais significativas
apontadas pelos estudantes? Qual a sua natureza? Qual a sua origem?
Envolvem mais conteúdos específicos? Se relacionam com os processos
metodológicos? Têm bases nas relações afetivas com os professores?
Referem-se às experiências incluídas no currículo formal? Têm ligação com
pesquisa ou com extensão? Relacionam-se com outras experiências vividas
fora do ambiente acadêmico?
Relativas às influências
- Como estas experiências relatadas são percebidas como influentes
na “performance” atual do aluno-professor? Que saberes eles identificam como
sendo construídos a partir delas? Que outras influências também são
identificadas como importantes? Tiveram elas papel decisivo na Prática de
Ensino? Que saberes precisariam ser melhor trabalhados para que os alunos-
professores cumprissem suas tarefas?
Relativas aos saberes docentes
- Os saberes identificados pelos alunos como próprios e adequados ao
exercício da docência conferem com os achados em outros estudos? Como
podem ser explicitados? Que relação têm com o contexto de sua produção?
Que inferências poderiam ser construídas para realimentar as reflexões sobre a
proposta de formação do curso de Licenciatura da ESEF/UFPel?
Tendo como ponto de partida estas questões busquei um olhar singular
da realidade desvendada a partir da visão dos alunos que vivenciaram a
disciplina Prática de Ensino. Procurei absorver dos seus relatos e de suas
narrativas, através da entrevista e do exercício da memória pedagógica1, as
experiências positivas e as dificuldades encontradas durante a formação inicial
e como elas interferiram na construção dos seus saberes docentes.
A escolha da Prática de Ensino respalda-se no fato que essa disciplina
contempla duplamente um aspecto de fundamental importância para a
compreensão da formação de professores que é, segundo Cunha, o fato da
sala de aula ser
17
1
Memória pedagógica refere-se às narrativas que os participante da pesquisa foram provocados a fazer,
recuperando suas histórias de vida, em especial, as experiências de aprendizagem escolar.
18
2
Acredito, assim como Nóvoa, que a construção de uma Profissionalidade Docente envolve três grandes
dimensões, e alguns saberes específicos, inclusive os saberes da experiência. As dimensões que Nóvoa
relaciona para a formação de professores são (1) o desenvolvimento pessoal (produzir a vida do
professor), (2) o desenvolvimento profissional (produzir a profissão docente) e (3) o desenvolvimento
organizacional (produzir a escola) (1992a, p. 15).
Em relação ao saber docente Tardif et alii, afirma que este, na verdade, se compõe de vários saberes
provenientes de diferentes fontes. Esses saberes são: saberes das disciplinas, saberes curriculares,
19
saberes profissionais e saberes da experiência (1991, p. 216). Nos capítulos III e IV aprofundarei cada um
destes conceitos.
20
(HOGAN citado por CONNELLY & CLANDININ, 1995, p. 19) são tipos de relações
que influenciam o processo de pesquisa. Como já havia explicitado, uma de
minhas preocupações era dar voz aos interlocutores da pesquisa e essa
possibilidade exigiu, principalmente, o sentimento de igualdade entre os
participantes. Estes precisaram sentir-se animados e autorizados a contar suas
histórias, algo que em geral não acontece em outras propostas (CONNELLY &
CLANDININ, 1995, p. 20).
A partir deste referencial segui os passos abaixo descritos para
concretizar a investigação:
3
No decorrer deste tópico veremos que os termos Ginástica, Cultura Física, Adestramento Físico, entre
outros poderão ser utilizados como sinônimos de Educação Física principalmente em citações de autores.
24
4
“Ordem’ e “progresso” é o binômio essencial do positivismo...“ A constituição do positivismo se
fundamenta nesse lema projetando todas as pesquisas e todo modo de ser na reconstrução da civilização
ocidental...” Antônio Carlos Bergo, apud Soares, 1994. p 25.
26
5
Segundo Melo durante o surgimento da Educação Física no Brasil percebe-se a influência de militares
como os primeiros instrutores de aulas de educação física, e também primeiros professores de cursos de
formação para Professores de Educação Física. (Melo, 1995, p 103 - 115)
27
6
Segundo Melo com a aprovação do regimento interno, em 1941, ficava referendada uma distinção clara
entre cadeiras teóricas, onde se situava a cadeira de História, e cadeiras práticas. Deve-se observar que
os professores das cadeiras teóricas deviam atender a algumas exigências dispensadas para os das
cadeiras práticas. Além de terem nível superior, a grande parte das cadeiras teóricas somente poderia ser
ocupada por médicos. (MELO, 1997, p. 739).
29
Diferença esta que fica evidente, nas palavras de Borges (1998, p. 25),
uma vez que, no mesmo período em que foi criada a Escola Nacional de
Educação Física e Desporto (ENEFD), em 1939, havia sido criada a Faculdade
Nacional de Filosofia (EnFi), que compreendia as seções de Filosofia, Letras,
Pedagogia e uma seção especial de Didática. Os alunos que completassem o
curso ordinário de três anos e, após, concluíssem o curso de didática, de um
ano, recebiam o diploma de licenciados. Ficava clara a distinção entre a
formação dos licenciados nas diferentes áreas e a habilitação dos profissionais
de Educação Física.
Os conhecimentos provenientes da Educação Física, por um longo
período de sua história, e talvez ainda hoje, têm um espaço secundário e uma
importância diferenciada na formação escolar dos alunos, tendo em vista uma
futura vida do trabalho. Percebe-se nas escolas uma secundarização da
importância da aula de Educação Física em relação às outras disciplinas; ela é
uma atividade que normalmente substitui a falta de alguma outra disciplina, que
prepara os alunos para as atividades cívicas - desfiles e apresentações - mas
que não possui um conhecimento próprio e fundamental na formação do aluno.
Se historicamente a Educação Física diferenciava-se das demais
licenciaturas em relação a sua formação mais voltada ao desenvolvimento
físico dos alunos é oportuno entender um pouco melhor como se constituiu e
qual foi o papel que a Prática de Ensino, Estágio Supervisionado, teve nos
cursos de formação de professores.
7
De acordo com a Resolução n.º12/70 o currículo mínimo dos cursos de Educação Física deveria
contemplar matérias básicas (Biologia, Anatomia, Fisiologia, Cinesiologia, Biometria e Higiene) e
profissionais (Socorros Urgentes, Ginástica, Rítmica, Natação, Atletismo, Recreação e Matérias
Pedagógicas de acordo com o Parecer n.º 672/69). Acrescido a estas matérias os alunos deveriam
escolher 2 desportos da lista a ser oferecida para o título de Técnico Desportivo.
35
8
São hoje muitos e fortes os sinais de que o modelo de racionalidade científica - dominante - [...]
atravessa uma profunda crise. [...] A crise do paradigma dominante é o resultado interativo de uma
pluralidade de condições (SANTOS, 1995, p. 23-24).
9
A esse respeito ver: Schaff, Adam, 1995.
40
contam com uma menor formação, um menor status, e uma menor autonomia
em comparação às profissões plenamente constituídas. Na análise de Guerrero
o conceito de Etzioni se assemelha muito ao que Weber chama de profissões
heterônomas ou subordinadas, pela sua carência de autonomia (1996, p. 171).
Se por um lado a desvalorização dos docentes está justamente ligada
ao fato da proletarização da sua atividade - e isto implica uma desvalorização
dos seus saberes - por outro, a perspectiva dos professores tentarem se
aproximar das profissões liberais não parece ser a solução para o seu
problema. Popkewitz salienta que profissão é uma palavra de construção
social, cujo conceito muda em função das condições sociais em que as
pessoas a utilizam (1992a, p. 38), e por isso devemos ter cuidado ao
assimilarmos acriticamente o discurso da profissionalização.
Popkewitz problematiza as reformas atuais levadas a efeito nos
Estados Unidos da América quando consideram que o profissionalismo trará
um maior prestígio social, melhores condições de trabalho e de remuneração,
graças à conquista de privilégios profissionais semelhantes aos que existem no
direito ou em medicina (1992a, p. 39 - 40). A história dessas profissões
demonstra que elas fizeram de seus serviços um meio de troca para a
obtenção de prestígios, poder e estatuto econômico, sendo que os seus
serviços não eram tão altruístas como pareciam ser, nem os interesses
profissionais tão neutros quanto se proclamavam ou quanto se pretendia que
os seus clientes acreditassem (HUGHES, citado por POPKEWITZ, 1992a, p. 40).
A assimilação do ideário da profissionalização representa também a
identificação de valores e construções históricas que não parecem estar
presentes na atividade docente, assim como, ao mesmo tempo, nos instiga a
exigir para a categoria dos professores uma maior autonomia, integridade e
responsabilidade.
10
A práxis é “...a concepção que integra em uma unidade dinâmica e dialética a prática social e sua
pertinente análise e compreensão teórica, a relação entre a prática, a ação e luta transformadoras e a
teoria que orienta e ajuda a conduzir à ação. É a unidade entre pensamento e ação que permite assumir
conscientemente o papel histórico que cada homem está chamado a exercer” (HURTADO, 1992, p. 45).
47
11
Nóvoa refere-se a um entre-dois ao qual a profissão dos professores parece ter se impregnado ao longo
da história contemporânea: não devem saber demais, nem de menos; não se devem misturar com o povo,
nem com a burguesia; não devem ser pobres, nem ricos; não são (bem) funcionários públicos, nem
profissionais liberais (Nóvoa 1992a, p. 16). Sobre esse ponto refiro-me de forma mais aprofundada no
capítulo III, página 19.
52
12
Este livro foi traduzido em 2001 pela editora Artmed com o titulo Formando professores
profissionais: Quais estratégias? Quais competências.
53
5. DE HISTÓRIAS E FALAS
... Hoje digo sem medo, sou professora. O que acredito é que
anteriormente o que acontecia comigo é que ao dizer sou
professora ou assumir corporalmente esta postura implicava
em ser autoritária, ser diretiva, abuso de poder... tudo aquilo
que me causou nojo. Com certeza reflexo claro translúcido de
alguns professores que tive ao longo da vida.
Ao mesmo tempo que ela afirmava não gostar da escola, deixava clara
a referência em um tipo de escola que mantém os alunos sentados,
escrevendo, sem fala, nem movimento. Pareceu entender, porém, que uma
outra escola é possível, que recupera o lúdico, as brincadeiras, jogos,
atividades artísticas, manuais e corporais. Essa concepção de escola irá
perpassar toda sua formação e fazer parte das suas preocupações no estagio.
Este interesse por crianças e pelo lúdico está muito presente na sua história
escolar, permanecendo em sua formação e no inicio de sua prática profissional,
caracterizando bem este primeiro sentido da temporalidade.
Esse gostar de brincar, de jogar, de dançar, a preocupação com o
corpo e o movimento, além de ser um dos elementos que levou as professoras
respondentes da pesquisa para o Curso de Educação Física é também um
elemento central na construção das suas práticas e fundamental na formação
do saber-ser e saber-fazer.
Quanto ao segundo sentido dado à temporalidade, que se refere a
importância dos primeiros anos de exercício profissional na construção de
crenças e referências, não podemos percebê-lo claramente nas narrativas das
respondentes, tendo em vista que estamos explorando o período do estagio
curricular, em geral, a primeira experiência docente dos estudantes.
Ao falar sobre ela afirmam que o estágio, apesar do seu significado na
formação, distância muito o aluno do contexto da escola. Os estagiários quase
não convivem com os demais professores e com a direção da escola, pois,
normalmente, chegavam na escola apenas para dar as aulas.
Mesmo assim afirmam não ter tido problemas com os demais
professores ou com a estrutura organizacional da escola. Na prática a
estagiária vai à escola, tem sua turma, dá sua aula, mas não se insere no
cotidiano da escola.
A dinâmica diária da escola, os seus problemas e contextos, os
tensionamentos externos à escola não chegam a ser apreendidos pelos alunos.
No estágio a realidade é apreendida parcialmente muito diferente da situação
que acontece no momento em que o professor realmente assume uma
62
... ela era muito legal! ... sempre deu aula de ginástica na
AABB, e trabalhava já fazia um tempão só com 4º série lá na
65
Que as palavras falem o que meu corpo é... e que meu corpo
seja as palavras. É isso que penso e tento diariamente viver
hoje em minha prática pedagógica. Que se construiu
inicialmente (prática de ensino) com muitas lágrimas, carregada
de um sentir-se impotente, fraco.
Este trabalho, ainda que fruto de uma certa caminhada, possui diversos
pontos que merecem ser aprofundados, qualificados, estudados,
principalmente as questões pertinentes ao universo da formação profissional
docente, mais especificamente sobre a formação dos professores de Educação
Física.
As conclusões que aqui apresento são significativas para confirmar
algumas questões já conhecidas sobre a formação de professores, trazer a
tona novos questionamentos e para descrever elementos que podem contribuir
na reflexão e qualificação dos cursos de formação, em especial os de
Educação Física.
Essas conclusões, construídas, a partir das repetidas leituras e
resignificações do que desenvolvi até aqui, estão organizadas em três tópicos:
a formação inicial; as experiências e vivências significativas; e a importância
dessas vivências na formação de professores.
Anexo I
Um exercício de memória...
Ela e Outra...
Ela e Outra nasceram juntas, mas sem saber. Isto nunca foi dito a elas.
Sua instrução começou cedo. Ela, às vezes, ensinava à Outra; a Outra
regalava a Ela com versos. Sempre conversavam, tagarelavam, compunham
pequenos poemas, líricas semelhanças, alegres e travessas como o ar se
deixavam assombrar com os perfis do céu. Desenhavam, então, seus corpos
na areia confessando-se às ondas do mar.
A Voz chegou um dia e disse: à Escola! Qual duas mariposas em vôo
lunar, a rede conseguiu alcançar Ela. A Outra, mais leve, mais fugaz (nasceu
por último), não foi aprisionada e lhe nasceram as asas da palavra.
Ela aprendeu coisas: a sentar-se, a fazer ruído, a acostumar-se, a
obedecer, a esperar a Voz, a repetir, a dizer sim, a copiar, a calar.
Agora,
A Outra recortava palavras dos diários, palavras de todos os tamanhos e
as guarda em caixas. Na caixa azul, as neutras. Na caixa amarela, as tristes. E,
na caixa transparente, guarda as palavras que tem magia.
As vezes, a Outra abre as caixas e as põem de boca para baixo sobre a
mesa, para que as palavras se misturem da forma que desejaram.
Então as palavras lhe contam o que ocorre e anunciam o que ocorrerá.
“Poema de Eduardo Galeano Ventana sobre a palavra, adaptado por
Virgínia Ferrer no texto La crítica como narrativa de las crises de
formación.”
Em geral, apanhados que fomos pela rede da Voz, só conseguimos fazer
narrativas (quando conseguimos!), com os mesmos limites de Ela. Certamente
92
Anexo II
Roteiro de Entrevista
Legenda: ⌦ Pergunta Central (todas serão feitas.)
Pergunta Provocativa (poderão ou não serem feitas
entre as Perguntas Centrais. Tem caráter de orientar a entrevista
para que possamos estimular o entrevistado e também para
aprofundar as respostas. As perguntas necessariamente não
serão feitas da forma e na ordem em que estão descritas.)
Nome da entrevistada:___________________________________
Data da entrevista:____________
10- Como era sua relação com a estrutura da escola e com os outros
professores e direção?
12- Depois da experiência com a Prática de Ensino como ficou a tua visão
sobre o Curso de Educação Física?
15- Além do que já conversamos até aqui o que mais você gostaria de
dizer sobre o seu Curso?
95
Referências
CABRERA, Blas; JAÉN, Marta Jiménez. Quem são e o que fazem os docentes?
Sobre o “conhecimento” sociológico do professorado. Teoria & Educação,
Porto Alegre, n.º 4, p. 190 - 214, 1991.
CUNHA, Maria Isabel; MARSICO, Heloisa L.; BORGES, Flávia A.; TAVARES, Patricia.
Inovações pedagógicas na formação inicial de professores. In. FERNANDES,
Cleoni M. B.; GRILLO, Marlene. (Org.) Educação Superior: travessias e
atravessamentos. Canoas, RS: Ed. ULBRA, 2001. p.31 – 88.
KUNZ, Elenor. Educação Física: Ensino & Mudança. Ijuí: Editora Unijuí, 1991.
MELO, Victor Andrade de. Relação Teoria & Prática e Formação profissional na
Educação Física Brasileira: Apontamentos na história. Revista Motrivivência,
Florianópolis, n.º 8, Ano 7, p103 - 115, 1995.
MELO, Victor Andrade de. Porque devemos estudar História da Educação Física
e do Esporte nos cursos de graduação. In: CONBRACE, 10, 1997, Goiânia.
Anais...Goiânia, 1997. Volume I p. 738-744.