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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS


FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
CURSO DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO

AS AVENTURAS E DESVENTURAS DOS ALUNOS


DA ESEF/UFPEL: Um olhar sobre a formação do
professor de Educação Física

MARCELO SILVA DA SILVA

Pelotas, RS, Brasil

Novembro de 2002
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
CURSO DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO

AS AVENTURAS E DESVENTURAS DOS ALUNOS


DA ESEF/UFPEL: Um olhar sobre a formação do
professor de Educação Física

Por

MARCELO SILVA DA SILVA

Dissertação apresentada à Universidade Federal de Pelotas,


sob a orientação da Profª. Dr.ª Márcia Ondina Vieira Ferreira
e co-orientação da Profª. Dr.ª Maria Isabel da Cunha, como
parte das exigências do Programa de Pós-graduação em
Educação, Linha de Pesquisa Ensino e Formação de
Professores, para obtenção do Título de Mestre em Ciências
(M. S.).

Pelotas
Rio Grande do Sul - Brasil
Novembro de 2002
Universidade Federal de Pelotas
Faculdade de Educação
Programa de Pós-Graduação em Educação

A Comissão Examinadora, abaixo assinada,


APROVA a Dissertação de Mestrado

AS AVENTURAS E DESVENTURAS DOS ALUNOS


DA ESEF/UFPEL: Um olhar sobre a formação do professor
de Educação Física

elaborada por
MARCELO SILVA DA SILVA

como requisito parcial para aquisição do grau de


Mestre em Educação

Comissão Examinadora:

___________________________________
Prof.ª Dr.ª Márcia Ondina Vieira Ferreira
(Orientadora)
FaE/UFPel

__________________________________
Prof.ª Dr.ª Maria Isabel da Cunha
(Co-orientadora)
PPGEd/UNISINOS

__________________________________
Prof.ª Dr.ª Mari Margarete dos Santos Forster
PPGEd/UNISINOS

__________________________________
Prof.ª Dr.ª Eliane Ribeiro Pardo
ESEF/UFPel

Pelotas, 22 de novembro de 2002


Silva, Marcelo S. da
As aventuras e desventuras dos alunos da ESEF/UFPEL: um olhar sobre a
formação do professor de Educação Física/Marcelo S. da Silva. -- Pelotas:
PPGEd/UFPEL, 2002.
103 p.; 29 cm.

“Dissertação apresentada como requisito parcial para aquisição do grau de mestre


em educação. Curso de pós-graduação em Educação. Orientadora Dr.ª Márcia
Ondina Vieira Ferreira. Co-orientadora Dr.ª Maria Isabel da Cunha.”

I. Formação de Professores Educação Física II. Título

CDD 378.170 281 4 CDU 378.22:796(043)

Catalogação na fonte: Rosane Koschewitz CRB 10/819


Dedicatória

Quem foi que disse que eu escrevo para as elites?


Quem foi que disse que eu escrevo para o bas-fond?
Eu escrevo para a Maria de Todo o Dia.
Eu escrevo para o João Cara de Pão.
Para você, que está com este jornal na mão...
E de súbito descobre que a única novidade é a poesia,
O resto não passa de crônica policial – social – policial.
E os jornais sempre proclamam que “a situação é crítica”!
Mas eu escrevo é para o João e a Maria,
Que quase sempre estão em situação crítica!
E por isso as minhas palavras são quotidianas como o
[pão nosso de cada dia
E a minha poesia é natural e simples como a água bebida
[na concha da mão.

Mario Quintana
À minha mãe e ao meu pai, dedico esta dissertação,
pela possibilidade e apoio que me deram de estudar
e construir este conhecimento.
AGRADECIMENTOS

Agradeço, em primeiro lugar, a professora Maria Isabel da Cunha pelas


contribuições fundamentais à elaboração deste estudo.
As alunas, hoje professoras, de Educação Física que se dispuseram à
participar, contando suas histórias e respondendo aos meus questionamentos.
A professora Márcia Ondina Vieira Ferreira, minha orientadora, e aos
professores com quem convivi até hoje, pelo conhecimento e exemplo.
Ao meu primo Cristiano, um grande amigo em diferentes momentos da
minha caminhada.
A Júlia, Diva, Céres, Silvana, Sandro e Cristian, colegas de bons
momentos e também de momentos difíceis, que nos fizeram crescer e
aprender muito.
A Sandra pela paciência com minhas horas diante do computador.
E as diferentes pessoas que de alguma forma passaram em minha vida, e
eu na delas, e que deixaram marcas em quem sou hoje.
UFPEL MARCELO SILVA DA SILVA DISSERTAÇÃO M.S. 2002
SUMÁRIO

RESUMO ................................................................................................... I
ABSTRACT .............................................................................................. II
1. A ORIGEM DO ESTUDO: ONDE TUDO COMEÇOU ......................................10
1.1. UM POUCO DE MINHA TRAJETÓRIA ...................................................................................10
1.2. AS ORIGENS DO ESTUDO ....................................................................................................12
1.3. O UNIVERSO A DESVELAR: A PROBLEMÁTICA EM QUESTÃO .......................................15
1.4. ALGUMAS ANOTAÇÕES SOBRE O PROCESSO METODOLÓGICO...................................17
2. UM POUCO DE HISTÓRIA NÃO FAZ MAL A NINGUÉM ..............................23
2.1. EDUCAÇÃO FÍSICA: UM OLHAR HISTÓRICO .....................................................................23
2.2. PRÁTICA DE ENSINO E EDUCAÇÃO FÍSICA ......................................................................29
2.3. A HISTÓRIA RECENTE: ESPAÇO, TEMPO E SUJEITOS DESTA PESQUISA ...................32
3. SER OU NÃO SER PROFESSOR? EIS A QUESTÃO.....................................39
3.1. PROFISSÃO, PROFISSIONALIZAÇÃO, PROLETARIZAÇÃO E PROFESSORES ...............42
4. SABERES E INTUIÇÕES NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES ...............47
4.1 OS SABERES E A FORMAÇÃO ..................................................................................................49
4.2 INTUIÇÕES DOCENTES E A FORMAÇÃO .................................................................................53
5. DE HISTÓRIAS E FALAS ..........................................................................................57
5.1 A FORMAÇÃO INICIAL E OS SABERES DOCENTES ...............................................................57
5.2 CARACTERÍSTICAS DOS SABERES DOCENTE E A FORMAÇÃO INICIAL .............................59
6. CONCLUSÕES... AINDA QUE PROVISÓRIAS..................................................82
6.1 A FORMAÇÃO INICIAL................................................................................................................82
6.2 EXPERIÊNCIAS E VIVÊNCIAS SIGNIFICATIVAS ......................................................................84
6.3 IMPORTÂNCIA DESSAS VIVÊNCIAS NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES............................86
6.4 AINDA HÁ MUITO POR ONDE SE AVENTURAR .......................................................................89
ANEXO I.......................................................................................................................................91
ANEXO II .....................................................................................................................................93
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................95
II

RESUMO
Dissertação de Mestrado
Programa de Pós-graduação em Educação
Universidade Federal de Pelotas

AS AVENTURAS E DESVENTURAS DOS ALUNOS DA ESEF/UFPEL:


Um olhar sobre a formação do professor de Educação Física.

Este trabalho é fruto de uma caminhada que busca entender como as


experiências vividas durante o Curso de Licenciatura em Educação Física (EF)
contribuem na construção dos Saberes e da Profissionalização Docente. A
principal referência que me levou às idéias que aqui exponho estão localizadas no
período em que prestei vestibular para Educação Física e durante minha
experiência como aluno e posteriormente como professor. A escolha desse Curso
teve muito a ver com o que desejava fazer, os professores sempre me
provocaram um grande fascínio, principalmente, os professores de Educação
Física. A medida em que iniciei a lecionar no ensino superior maior passou a ser
minha curiosidade sobre como o Curso contribui para elaboração dos Saberes
Docentes e na construção da Profissionalização dos futuros professores. Para
realizar esse estudo elegi como referencial de análise os conceitos de Profissão e
Semiprofissão abordados, principalmente, a partir de Enguita (1990; 1991) e o
conceito de Saberes Docentes trabalhado por Tardif (1991; 1996; 2002).
Metodologicamente optei por utilizar princípios da pesquisa etnográfica, técnicas
de entrevista semi-estruturada e estudo das narrativas, buscando garantir a voz
das minhas interlocutoras e priorizando os aspectos qualitativos na sua análise. O
trabalho se desenvolveu a partir da escolha aleatória de cinco (05) alunas-
professoras, que estavam concluindo o estágio curricular, a Prática de Ensino.
Através de um exercício de memória e de uma entrevista, que enfocou as
principais experiências e vivências por elas identificadas, realizei a análise do
estudo onde pude concluir, então, que a formação inicial das professoras
contribuiu na elaboração de alguns saberes e na construção inicial de uma
identidade profissional, destacando a importância das experiências práticas, de
exercício da atividade docente ou de observação da mesma, bem como a
dificuldade do conjunto do Curso em reconhecer e valorizar as trajetórias dos
seus alunos e suas diferentes vivências.

Palavras Chave: Formação de Professores; Saberes Docentes;


Profissionalização Docente; Trabalho Docente.
III

ABSTRACT

Dissertation for the Master Degree


Post-Graduation Program in Education
Federal University of Pelotas

THE ADVENTURES AND ADVERSITIES OF ESEF/UFPEL STUDENTS:


A look on the formation of the Physical Education teacher.

This work is the result of a long journey that tries to understand how the
experiences of the Physical Education Course contribute to build the Teaching
Knowledge and Professionalization. The main references, which led me to the
ideas I explain here, are from the time I made the entrance examination for
Physical Education, and resulted from my experience as a student, and as a
teacher. I chose this course because it had provided everything I wanted. The
teachers had always fascinated me, especially Physical Education teachers. At
the moment I started to teach at the university, my curiosity on how the Course
contributes to the elaboration of the Teaching Knowledge and to build the
upcoming teachers’ professionalization became bigger. In order to carry out this
study, I chose the Profession and Semi-Profession approach from Enguita
(1990; 1991) and the concept of Teaching Knowledge developed by Tardif
(1991; 1996; 2002). The selected methodology was based on the principles of
the ethnographic research, interview techniques as semi-structure and the
study of narratives, in an attempt of ensuring my interlocutors voice and of
prioritizing the qualitative aspects of their analysis. The work started with the
randomized choice of five (05) students - teachers, who were concluding the
Teaching Practices, that is, the curricular period of training. Through an
exercise of memory and an interview, which focused the main experiences
identified by them, I carried out the analysis of the study and could conclude
then, that the initial formation of the teachers contributed to the elaboration of
some knowledge and to start building a professional identity, highlighting the
importance of the practical experiences, the teaching activity or its observation,
as well as the difficulties of the Course as a whole to recognize and value the
trajectories of its students and their different experiences.

Key Words: Teacher formation; teaching knowledge; teaching


professionalization; teaching work.
I

AS AVENTURAS E DESVENTURAS DOS ALUNOS DA


ESEF/UFPEL: UM OLHAR SOBRE A FORMAÇÃO DO
PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA.

Somos o que fazemos, mas somos, principalmente,


o que fazemos para mudar o que somos.
(Eduardo Galeano)

1. A ORIGEM DO ESTUDO: ONDE TUDO COMEÇOU

1.1. Um pouco de minha trajetória

Escrever sobre minha trajetória pode ser um exercício um tanto quanto


difícil, principalmente pela parcialidade com que vemos a nossa própria
história, não só pelo limite de percepção que temos, da realidade em que
estamos inseridos, mas também pelas subjetividades presentes no nosso
olhar. Neste caso, em especifico, a necessidade faz com que eu decida
arbitrariamente o que contar e o que não contar, a fim de que possa descrever
melhor o que estou me propondo a estudar, e porque estou me propondo a
estudar.
Como afirma Santos

hoje sabemos ou suspeitamos que as nossas trajetórias de


vida pessoais e coletivas (enquanto comunidades científicas) e
os valores, as crenças e os prejuízos que transportam são a
prova íntima do nosso conhecimento, sem o qual as nossas
investigações laboratoriais ou de arquivo, os nossos cálculos
ou os nossos trabalhos de campo constituiriam um
emaranhado de diligências absurdas sem fio nem pavio (1995,
p. 53).

Com certeza muitas são as ligações que me levaram às idéias que aqui
exponho, mas creio que a origem principal, se é que posso eleger uma, está no
período em que prestei vestibular para Educação Física. A escolha deste Curso
11

teve muito a ver com o que eu desejava fazer, talvez uma certa vocação para
ser professor e com a imagem do professor que gostaria de ser. Admirava
alguns dos meus professores pela forma como agiam, como se posicionavam,
a maneira como davam as suas aulas, a importância que tinham para o nosso
futuro, além da amizade que construíam com os alunos. Os professores
sempre me provocaram um grande fascínio, principalmente os professores de
Educação Física, talvez pela questão da liberdade muito mais presente nas sua
aulas ou, então, pela importância dada ao nosso corpo, a nossa expressão nas
aulas, ao contrário das outras disciplinas onde a tendência era a padronização
dos atos e dos gestos, onde dificilmente poderíamos ser diferentes.
Às vezes a ausência desse professor, a sua falta de compromisso,
aquele seu deixar jogar sem nenhum objetivo maior me desmotivava das aulas
de Educação Física, mas, por outro lado, muitas vezes o empenho de outros
professores, o seu interesse, o conhecimento que de certa forma estava
implícito nas aulas, fizeram com que eu escolhesse este Curso de Licenciatura.
Depois de ingressar na Faculdade procurei me envolver em muitas
atividades, tanto de ensino como de pesquisa e extensão, privilegiando,
sempre, a questão da escola, especialmente a formação inicial dos
professores, pois percebia ali uma possibilidade de questionar mais a prática
pedagógica da Educação Física. Pretendia conhecer mais sobre a construção
dos professores, tentando entender como se poderia trabalhar dentro de uma
visão mais crítica da realidade, com uma compreensão mais consciente do
papel social do educador.
Meu interesse pelo ensino superior nunca me fez abandonar os
estudos da escola básica, porque seria impossível falar de formação de
professores sem conhecer a realidade concreta do seu espaço de atuação.
Devido a esse interesse e entusiasmo, durante meu estágio curricular - Prática
de Ensino -, optei por ter duas turmas de alunos, ao invés de uma, como seria
o normal. Essa foi uma das melhores experiências que tive durante a minha
graduação, ainda que já tivesse participado de outras atividades ligadas ao
ensino. Trabalhar dentro da escola e acompanhar o seu cotidiano, lidando com
os problemas diários foi uma ótima oportunidade de formação.
Esta trajetória me qualificou para fazer parte do corpo docente da
Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal de Pelotas –
12

ESEF/UFPel - durante o período de junho de 1996 a abril de 1997, na condição


de professor substituto do Departamento de Desporto. Essa oportunidade foi
um estímulo para ampliar minha reflexão e interesse para com a Educação
Física escolar e a formação de professores.

1.2. As origens do estudo

Estando em contato constante com alunos do Curso, de Licenciatura


em Educação Física, durante o período de 1991 a 1999, percebi uma grande
ansiedade, por parte destes, em relação à Prática de Ensino. Muitos deles
demonstravam uma grande insegurança no momento de entrar em contato
com a escola.
Muitas vezes os alunos chegavam ao final do Curso, prestes a assumir
suas turmas na Prática de Ensino, com uma gama enorme de dúvidas a
respeito de questões didático-metodológicas, tais como qual seria o papel do
professor de Educação Física, o que se deve ensinar, como se pode ensinar,
quais os conteúdos da Educação Física na escola, entre outras. Além de
inúmeras questões político-filosóficas relacionadas aos direitos e deveres de
um profissional de Educação Física, ou seja, o que é ser um profissional, qual
deve ser o comprometimento com as questões sociais que se dão ao seu
redor, quais são os valores ético-morais que permeiam as ações cotidianas, e
assim por diante.
É claro que não se espera que os alunos estejam prontos ao final do
Curso. Mesmo entendendo que a lógica que, em geral, preside o currículo dos
cursos de graduação é a que parte do pressuposto de que primeiro o aluno tem
de ter os conhecimentos gerais (absorvendo o conhecimento já produzido),
para depois aplicar estes conteúdos (Projeto pedagógico da UFPel, 1991, p.
19). Lógica esta, fundamentada na compreensão de que o aprendizado se dá
pela transmissão dos conhecimentos por parte do professor e no registro e
acumulo dessas informações por parte dos alunos que depois deverão aplicá-
los.
Como destaca Cunha
13

Neste nível de ensino [superior], ainda é muito presente a


influência da concepção positivista do conhecimento e é ela
que preside a prática pedagógica, incluindo o currículo.
Exemplo disso é a forma linear como é organizado o
conhecimento acadêmico: do geral para o particular, do teórico
para o prático, do ciclo básico para o ciclo profissionalizante. A
idéia que sustenta essa concepção afirma que, primeiro, o
aprendiz precisa dominar a teoria para depois entender a
prática e a realidade (1998, p. 28).

Nessa perspectiva não se toma a dúvida como o ponto de partida para


a leitura da realidade, desconsiderando o que diz Freire, quando afirma que, a
prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento
dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer (1997, p. 47),
portanto torna-se indispensável o movimento entre prática-teoria-prática. Essa
lógica positivista acaba definindo a prática como a comprovação da teoria e
não como sua fonte desafiadora, localizando-se, quase sempre, no final dos
cursos, em forma de estágio (CUNHA, 1998, p. 28).
A lógica curricular predominante nos nossos dias, especialmente na
área de Educação Física, valoriza, ainda, a preocupação com a acumulação de
conhecimentos de forma mecânica, muitas vezes a-histórica e não reflexiva.
Em síntese, os alunos são formados, no sentido de forjados ao molde, ao
modelo, com poucas possibilidades de se tornarem profissionais críticos e
reflexivos, tanto na sua vivência profissional, quanto no seu dia-a-dia, enquanto
cidadãos. Ainda assim é preciso ter claro que o conhecimento se transforma
constantemente e, assim como ele, estamos constantemente em um processo
de re-estruturação de nossas crenças e convicções, portanto, sujeitos a
rupturas de maior ou menor intensidade com a lógica dominante.
Na perspectiva tradicional do conhecimento científico, há um
pressuposto de que a construção de saberes se dá de forma piramidal, onde
parte-se do mais fácil para o mais difícil, do elementar para o complexo, do
teórico para o prático criando-se uma dicotomia entre o pensar e o executar.
Essa lógica se evidencia na organização dos conteúdos dentro das grades
curriculares, dos cursos de graduação, onde as disciplinas teóricas são as
disciplinas iniciais da base de formação, e as disciplinas práticas como o ápice,
a conclusão da formação. Entre essas a que culmina na formação do professor
14

de Educação Física encontra-se a Prática de Ensino de 1º e 2º grau. Em


princípio, este é o espaço de prática, onde o aluno deve demonstrar a sua
capacidade de executar os conhecimentos teóricos que acumulou ao longo do
Curso.
Ao observarmos empiricamente a experiência dos alunos na disciplina
Prática de Ensino percebemos uma série de situações comuns a quase todos
eles. Em geral suas aulas apresentam uma forte presença de elementos da
pedagogia tradicional, onde o aluno é visto como quem ouve, repete e executa,
enquanto o professor é o detentor do conhecimento. Outro aspecto que
percebemos é a pouca criatividade e capacidade para resgatar determinados
conteúdos da Educação Física dentro do ambiente escolar por parte dos
estagiários.
Talvez sejam estes alguns sinais de que os alunos não estejam
suficientemente preparados para elaborar uma compreensão do que é ser
professor, articulando os seus saberes e a sua identidade, ou para enfrentar a
realidade da escola. Assim sendo acabam por reproduzir uma série de valores
já hegemônicos nas aulas de Educação Física tradicionais.
Acreditamos, portanto, que através do estudo das experiências e
vivências dos alunos da disciplina de Prática de Ensino de 1º e 2º graus da
ESEF/UFPel, poderemos melhor entender os pontos significativos da formação
inicial dos alunos deste Curso e, também, desvelar a visão dos concluintes
quanto à sua formação e como eles foram se construindo professores ao longo
de suas trajetórias. O objetivo é problematizar questões que venham subsidiar
a discussão sobre a formação de professores na área de Educação Física
Escolar e o papel destes enquanto educadores.
É importante lembrar que o curso de Educação Física, assim como
outras Licenciaturas, estrutura-se - até o momento que acompanhei o Curso -
em uma proposta fragmentada de conhecimento onde teoria e prática
apresentam-se como momentos distintos de aprendizagem. Privilegia-se, em
geral, a teoria em detrimento dos conhecimentos práticos, sendo que a Prática
de Ensino está no final do Curso, possuindo um grande número de pré-
requisitos. A Prática de Ensino é entendida como depositária das expectativas
de articulação entre os saberes teóricos e os saberes da prática.
15

O Curso de Educação Física da UFPel se propõe formar professores


que possuam saberes, conhecimentos e competência técnica que permitam
uma atuação nos campos da educação formal e não formal e ainda
desenvolvam atitudes éticas, reflexivas, críticas, inovadoras e democráticas
(Catálogo dos cursos de graduação da UFPel, 1996, p. 29), tendo, ainda, claro
o seu papel social e suas possibilidades de atuação enquanto educadores.
Diante dessa intencionalidade, cabe então, perguntar: o Curso tem
conseguido alcançar o seu objetivo? É nessa perspectiva que começo a
problematizar a formação inicial dos alunos da ESEF/UFPel.

1.3. O universo a desvelar: A problemática em questão

Para problematizar a Educação Física é importante lembrar que ao


longo de sua história ela tem se construído sobre uma concepção dualista de
conhecimento e tem reforçado, muitas vezes, formas autoritárias de ensino,
contribuindo para alienação ao invés da emancipação dos sujeitos envolvidos
no seu processo. A preocupação com a formação inicial dos professores desta
área é importante pois é nesse espaço que se constróem muitos dos saberes
dos futuros professores.
A formação acadêmica não é o único local de construção do professor,
mas certamente é um dos fundamentais, onde se pode meramente reproduzir
ou iniciar algumas rupturas no modo de perceber o conhecimento, a ciência, a
docência e a própria organização dos cursos de formação.
Essas observações provocam a seguinte problemática: Quais as
experiências e vivências que os alunos do Curso de Licenciatura em Educação
Física apontam como significativas para a construção de seus saberes e
profissionalização docente?
A partir dessa questão estabelece-se a necessidade de encontrar
formas de dialogar com os alunos sobre a sua formação a fim de desvelar os
elementos explicativos para a problemática. A alternativa encontrada desdobra
o problema inicial na forma de questões, como as que explicito abaixo.
16

Relativas às experiências
- Quais foram as experiências acadêmicas mais significativas
apontadas pelos estudantes? Qual a sua natureza? Qual a sua origem?
Envolvem mais conteúdos específicos? Se relacionam com os processos
metodológicos? Têm bases nas relações afetivas com os professores?
Referem-se às experiências incluídas no currículo formal? Têm ligação com
pesquisa ou com extensão? Relacionam-se com outras experiências vividas
fora do ambiente acadêmico?
Relativas às influências
- Como estas experiências relatadas são percebidas como influentes
na “performance” atual do aluno-professor? Que saberes eles identificam como
sendo construídos a partir delas? Que outras influências também são
identificadas como importantes? Tiveram elas papel decisivo na Prática de
Ensino? Que saberes precisariam ser melhor trabalhados para que os alunos-
professores cumprissem suas tarefas?
Relativas aos saberes docentes
- Os saberes identificados pelos alunos como próprios e adequados ao
exercício da docência conferem com os achados em outros estudos? Como
podem ser explicitados? Que relação têm com o contexto de sua produção?
Que inferências poderiam ser construídas para realimentar as reflexões sobre a
proposta de formação do curso de Licenciatura da ESEF/UFPel?
Tendo como ponto de partida estas questões busquei um olhar singular
da realidade desvendada a partir da visão dos alunos que vivenciaram a
disciplina Prática de Ensino. Procurei absorver dos seus relatos e de suas
narrativas, através da entrevista e do exercício da memória pedagógica1, as
experiências positivas e as dificuldades encontradas durante a formação inicial
e como elas interferiram na construção dos seus saberes docentes.
A escolha da Prática de Ensino respalda-se no fato que essa disciplina
contempla duplamente um aspecto de fundamental importância para a
compreensão da formação de professores que é, segundo Cunha, o fato da
sala de aula ser
17

...o lugar privilegiado onde se realiza o ato pedagógico escolar.


Para ela afluem as contradições do contexto social, os conflitos
psicológicos, as questões da ciência e as concepções
valorativas daqueles que compõem o ato pedagógico: o
professor e os alunos. Estudar o que acontece e,
especialmente porque acontece na sala de aula, é tarefa
primeira daqueles que se encontram envolvidos com a
educação de professores e comprometidos com uma prática
pedagógica competente (1996, p. 23 - 24).

É na Prática de Ensino que geralmente os alunos exercem pela


primeira vez a docência, vivenciando o cotidiano da sala de aula e tomando
decisões pedagógicas. Entretanto são ainda alunos da graduação, dividindo-se
entre estes dois papéis e espaços de formação.
A preocupação em partir da visão dos alunos esteve alicerçada no fato
de querer analisar as suas expectativas frente às possibilidades concretas da
realização da prática docente. Para tanto foi preciso entender que a leitura que
o aluno fez de si mesmo e de suas expectativas e realizações esteve envolta
por valores, conhecimentos e saberes, que se manifestaram constantemente
através de sua vida cotidiana (CUNHA, 1996).
Toda a preocupação com o aluno enquanto sujeito participante na
construção do conhecimento justifica-se pela compreensão de que o professor
não é um ser de múltiplas personalidades, mas sim, um indivíduo permeado
por diferentes influências provenientes da família, da sociedade, da escola, da
mídia, etc. Essas influências se manifestam na sua vida cotidiana e,
conseqüentemente, na sua prática pedagógica.

1.4. Algumas anotações sobre o processo metodológico


A narração dá conhecimento, outorga compreensão à realidade;
O escrito explica a vida.
(CERVERÓ, 1995, p. 166)

Para pontuar um pouco o processo metodológico que utilizei neste


trabalho é preciso antes tecer algumas considerações. Sempre que me
indagava sobre como melhor proceder para conseguir chegar mais próximo
possível do fenômeno que me propus a estudar, deparava-me com a seguinte

1
Memória pedagógica refere-se às narrativas que os participante da pesquisa foram provocados a fazer,
recuperando suas histórias de vida, em especial, as experiências de aprendizagem escolar.
18

problemática: como tentar identificar questões sobre a formação inicial dos


alunos do Curso de Educação Física, partindo das experiências deles enquanto
alunos? Tudo indicava que era preciso levar em consideração os relatos das
suas histórias pessoais, e ainda, conseguir fazê-lo através de uma metodologia
que sistematizasse melhor os dados investigados. O desafio foi aproveitar ao
máximo as experiências desses alunos, seus relatos, suas narrativas e suas
histórias vividas durante a graduação.
Essas preocupações me acompanharam durante todo o estudo e foram
auxiliando a procura de caminhos para expressar a necessidade de navegar
entre as teorias e entre os métodos, que me permitissem ousar sem esquecer
do rigor com o conhecimento e com a sua produção.
Para tal, inspirei-me na fala de Santos, quando afirma que

cada método é uma linguagem e a realidade responde na


língua em que é perguntada. Só uma constelação de métodos
pode captar o silêncio que persiste entre cada língua que
pergunta. Numa fase de revolução científica como a que
atravessamos, essa pluralidade de métodos só é possível
mediante uma transgressão metodológica (1995, p. 48).

A busca de pesquisas e estudos que auxiliassem nessa construção


foram importantes nesse teorizar sobre os caminhos a seguir.
Duas preocupações foram primordiais. Uma dizia respeito à
necessidade de encontrar uma forma de captar o maior número de elementos
que pudessem reconstituir a formação inicial dos alunos que iriam ser
estudados, partindo inicialmente das experiências que eles vivenciaram na
disciplina de Prática de Ensino. A segunda foi encontrar uma maneira de dar
voz a esses alunos, deixar que eles, através dos seus próprios relatos,
conseguissem (re)construir as suas trajetórias dentro do Curso, tentando
identificar como ela contribuiu, ou não, para a formação da profissionalidade
docente e a construção dos seus saberes2.

2
Acredito, assim como Nóvoa, que a construção de uma Profissionalidade Docente envolve três grandes
dimensões, e alguns saberes específicos, inclusive os saberes da experiência. As dimensões que Nóvoa
relaciona para a formação de professores são (1) o desenvolvimento pessoal (produzir a vida do
professor), (2) o desenvolvimento profissional (produzir a profissão docente) e (3) o desenvolvimento
organizacional (produzir a escola) (1992a, p. 15).
Em relação ao saber docente Tardif et alii, afirma que este, na verdade, se compõe de vários saberes
provenientes de diferentes fontes. Esses saberes são: saberes das disciplinas, saberes curriculares,
19

A primeira preocupação encaminhou-me ao método etnográfico, cujos


princípios pareciam os mais adequados para alcançar o pretendido. Este
método, segundo André (1995), encontra-se fundamentado no pensamento
filosófico da fenomenologia e se desenvolveu na antropologia como uma de
suas tendências.
A etnografia, para os antropólogos, possui dois sentidos: (1) um
conjunto de técnicas para coletar dados sobre os valores, hábitos, crenças,
práticas e comportamentos de um grupo social; e (2) um relato escrito
resultante do emprego dessas técnicas (1995, p. 27).
A etnografia é a tentativa de descrição da cultura (1995, p. 19), como
diz André. Transportando esse foco de interesses dos antropólogos para a
educação podemos dizer que a ênfase dos estudos nessa área são os
processos educativos. Sendo assim o que se tem feito - a nível de pesquisa
educacional - é uma adaptação da etnografia à educação, o que leva a concluir
que terminamos por fazer estudos do tipo etnográfico e não etnografia no seu
sentido estrito (ANDRÉ, 1995, p. 28).
A pesquisa etnográfica caracteriza-se também pelo papel dado ao
pesquisador. Para André, neste método, o pesquisador é o instrumento
principal na coleta e análise dos dados, pois os dados são mediados pelo
instrumento humano, o pesquisador (1995, p. 28). Sendo assim torna-se
possível uma constante avaliação da metodologia que se está aplicando,
podendo corrigir rumos quando necessário.
Além disso a pesquisa etnográfica favorece a ênfase no processo e
não somente no produto. Ou seja, os resultados finais do estudo não são o
objeto único do trabalho; o desenvolvimento deste, em geral, produz mais
descobertas do que as inicialmente esperadas. Outra peculiaridade é a sua
preocupação com o significado, com a maneira e com a forma com que a
realidade é percebida pelos sujeitos do grupo estudado. É com esta
preocupação que o método pressupõe um trabalho de campo. O pesquisador
aproxima-se de pessoas, situações, locais, eventos, mantendo com eles um
contato direto e prolongado (ANDRÉ, 1995, p. 29).

saberes profissionais e saberes da experiência (1991, p. 216). Nos capítulos III e IV aprofundarei cada um
destes conceitos.
20

Até aqui muitas das minhas expectativas pareciam estar sendo


contempladas, mas meu intento era descobrir como tornar os interlocutores da
pesquisa sujeitos participativos desse processo. Apesar da ênfase dada aos
sujeitos e às suas práticas na pesquisa que utiliza-se de princípios do método
etnográfico era necessário reforçar a maneira de fazer com que os alunos
contassem e (re)contassem suas histórias, e com isso, pudessem dar novos
significados às suas experiências durante a formação, criando, ou recriando as
suas identidades de professores.
O caminho que encontrei para contemplar essa expectativa foi através
da utilização das narrativas como uma estratégia investigativa da pesquisa.
Como Connelly & Clandinin percebi que os seres humanos são organismos
contadores de histórias, organismos que, individual e socialmente, vivem vidas
relatadas. O estudo das narrativas, portanto, é o estudo da forma como os
seres humanos experimentam o mundo (1995, p. 11).
A utilização dos relatos e narrativas pareceu-me adequada ao tipo de
experiências que me propus realizar. Os alunos, a partir do que vivenciaram na
disciplina de Prática de Ensino, tiveram que relatar, de forma oral e escrita,
suas experiências, suas impressões sobre estas e, a partir daí, relembrar suas
trajetórias durante a formação no Curso.
Se a narrativa é uma forma de caracterizar os fenômenos da
experiência humana, nada mais apropriado do que a utilização dela para que
os alunos relatassem as suas experiências durante a formação inicial que
vivenciaram.
As investigações narrativas, de acordo com Cannelly & Clandinin
(1995), sofrem algumas críticas devido à compreensão de que suas análises só
se preocupariam em abordar os indivíduos. Esta interpretação, para eles, não é
correta. As abordagens das narrativas também podem estar sociologicamente
preocupadas com grupos e com a formação dentro de um contexto. Neste caso
em específico, a intenção não foi fazer uma análise psicológica dos indivíduos,
mas sim, uma reflexão coletiva sobre o seu processo da formação profissional,
durante o curso de graduação.
Outro aspecto importante no estudo a salientar no processo de
investigação foi a interação que construí com os sujeitos durante a pesquisa. A
relação de igualdade, atenção mútua, propósitos e intenções compartidos
21

(HOGAN citado por CONNELLY & CLANDININ, 1995, p. 19) são tipos de relações
que influenciam o processo de pesquisa. Como já havia explicitado, uma de
minhas preocupações era dar voz aos interlocutores da pesquisa e essa
possibilidade exigiu, principalmente, o sentimento de igualdade entre os
participantes. Estes precisaram sentir-se animados e autorizados a contar suas
histórias, algo que em geral não acontece em outras propostas (CONNELLY &
CLANDININ, 1995, p. 20).
A partir deste referencial segui os passos abaixo descritos para
concretizar a investigação:

4 No final do segundo semestre de 1997 expus aos alunos do Curso de


Licenciatura Plena em Educação Física, matriculados na disciplina de Prática
de Ensino de 1º e 2º grau, a proposta deste estudo e solicitei a eles que
deixassem um endereço ou telefone para um posterior contato. Após esse
primeiro momento efetuei alguns encontros com os alunos que inicialmente se
dispuseram a participar da pesquisa – ao todo vinte alunos responderam ao
convite.
4 Dos vinte que demonstraram interesse em participar restaram cinco
alunas. A escolha destas alunas se deu de forma aleatória, definida
principalmente pela disponibilidade e interesse em participar do trabalho. Após
algumas conversas iniciais optei por incluir todas as cinco alunas que
concordaram em contar suas histórias e suas experiências durante a formação
na Faculdade, em especial durante o Estágio - Prática de Ensino.
4O instrumento de coleta de dados inicialmente utilizado com as
participantes da pesquisa foi um Exercício de Memória (Anexo I), no qual elas
puderam contar um pouco mais sobre suas histórias e trajetórias de vida e,
também, sobre suas experiências durante o Curso de Graduação.
4 O passo seguinte foi a realização de entrevistas (Anexo II) a fim de
complementar a coleta dos dados. Esse terceiro momento teve grande
importância pois possibilitou uma releitura por parte das entrevistadas daquilo
que haviam vivido durante a sua formação no Curso de Educação Física. É
importante ressaltar que devido a uma série de dificuldades, essas entrevistas
foram realizadas somente durante o ano de 1999. Este fato certamente
influenciou na leitura que as entrevistadas fizeram de sua formação, pois
22

tomaram um distanciamento da experiência da Prática de Ensino e todas, já


como professoras formadas, exerciam ou exerceram, algum tipo de atividade
profissional. Este fato não foi desconsiderado e será melhor analisado durante
as reflexões sobre os depoimentos das alunas.
A análise e interpretação dos dados deu-se concomitantemente ao
levantamento dos mesmos, possibilitando reelaborações constantes da
pesquisa, bem como do referencial teórico utilizado.
Esses foram basicamente os passos vivenciados na investigação.
Para compreender o objeto de estudos foi preciso aprofundar
teoricamente algumas questões conceituais sobre a Educação Física e a
construção do conhecimento do professor.
Começarei relatando historicamente um pouco sobre a origem da
Educação Física, sua construção e os pensamentos que a influenciaram,
definindo melhor qual a concepção de Educação Física, de ensino, de estágio,
dos alunos, do período e do Curso de que estou falando.
23

2. UM POUCO DE HISTÓRIA NÃO FAZ MAL A NINGUÉM

2.1. Educação Física: um olhar histórico

A Educação Física enquanto campo científico ou área autônoma do


conhecimento pode ser considerada como um fenômeno recente, tendo em
vista que no final do século XIX ela ainda era entendida como um ramo das
ciências médicas, encarada como forma de adestramento dos corpos e
também como instrumento de higienização destes.
Para compreender melhor esse fenômeno recorremos a Soares que,
sobre a origem da Educação Física, afirma:

...é durante o século XIX que se elaboram os conceitos básicos


sobre o corpo e sobre sua utilização enquanto força de
trabalho; é na Europa e em especial na França, que se
consolidam neste período o Estado burguês e a burguesia
enquanto classe, criando condições objetivas para que as suas
próprias contradições de classe no poder apareçam, e seja
inevitável o reconhecimento da existência de seu oponente
histórico - a classe operária (1994, p 9).

É nesse contexto em que se explicitam as relações de poder e os


conflitos de classe que a Educação Física3 se estabelece. Durante o período a
burguesia emergente preocupa-se em desenvolver um novo homem, um
homem que possa sustentar a nova ordem, uma nova economia, um novo
modo de produção.

É nessa perspectiva que podemos entender a Educação Física


como a disciplina necessária a ser viabilizada em todos as
instâncias, de todas as formas, em todos os espaços onde
poderia ser efetiva a construção desse homem novo: no
campo, na fábrica, na família, na escola (SOARES, 1994, p 12).

A Educação Física torna-se a solução e a cura para a indolência, a


letargia, para os males físicos, mentais e morais do homem. Converte-se em

3
No decorrer deste tópico veremos que os termos Ginástica, Cultura Física, Adestramento Físico, entre
outros poderão ser utilizados como sinônimos de Educação Física principalmente em citações de autores.
24

uma das alternativas para construir homens saudáveis, dóceis e aptos a


suportar longas jornadas de trabalho. Ela passa então a integrar o discurso
médico, pedagógico e familiar.
Juntamente com o ideário da revolução burguesa, desenvolve-se na
sociedade uma concepção de mundo permeada, dentre outros, por valores
positivistas, que percebem os indivíduos principalmente como seres anátomo-
fisiológicos, descritos e explicados meticulosamente pela ciência - que
influenciou a lógica da sociedade daquele momento em diante. Nesse período
a ciência condicionou fortemente a direção da Educação Física fortalecendo a
sua legitimação. Era necessário algo que lhe conferisse respeitabilidade e o
discurso do homem biológico explicável pela experimentação lhe dava o status
necessário para ser aceita pela comunidade científica.
O desenvolvimento da Educação Física acompanhou o processo de
higienização e moralização da sociedade, necessário ao progresso urbano e
industrial.
O desenvolvimento da sociedade burguesa, com a exploração da força
de trabalho e a expansão da industrialização, provocaram um gigantesco
crescimento urbano e, juntamente com ele, um crescimento da população
marginalizada do processo chamado de civilizatório. Esse contingente
marginalizado proliferava e começava a ameaçar duplamente a burguesia no
poder, de um lado pela organização da classe operária e, de outro, pelo
surgimento de epidemias que começavam a atingir os ricos (SOARES, 1994,
p16).
Tornou-se então necessário uma moralização sanitária, para combater
os vícios e a imoralidade das classes populares. Foi preciso garantir a estas
não somente melhores locais para viver, não somente saúde, mas também
educação higiênica. Este discurso que historicamente foi incorporado à
Educação Física, percebendo-a como um dos instrumentos capazes de
promover uma assepsia social, de viabilizar esta educação higiênica e de
moralizar os hábitos (SOARES, 1994, p16 - 17).
O discurso da neutralidade científica possibilitou o fortalecimento de
uma cultura de dominação, difundindo idéias, crenças e valores de que as
diferenças individuais e as diferenças sociais são condições naturais e
plenamente justificáveis através de proposições científicas.
25

A Educação Física prestou-se, neste período, justamente, para


comprovar essas diferenças e para provar que hábitos higiênicos e
disciplinados são a única maneira de manter a ordem natural, impedindo que
degradações possam abalar o progresso4 da sociedade.
Nesse período a sociedade era vista como um organismo explicável
através das regras básicas das ciências naturais, especificamente as
biológicas.

Regras estas que passam a ser universalizadas para o estudo


do humano, e a Educação Física será a expressão de uma
visão biologizada e naturalizada da sociedade e dos indivíduos.
Ela incorporará e veiculará a idéia da hierarquia, da ordem, da
disciplina, da fixidez, do esforço individual, da saúde como
responsabilidade individual (SOARES, 1994, p. 20).

O Brasil era um país de características econômicas totalmente


agropecuárias até aproximadamente o final do século XIX. Na economia
brasileira predominavam os grandes latifúndios - lavouras de cana-de-açúcar,
plantações de café, grandes criações de gado - e, por isso, também se
caracterizava pela mão de obra escrava. Esse perfil dava ao país um quadro
populacional de praticamente metade de sua totalidade composta por escravos
negros, quadro esse que se manteve até por volta de 1850 (SOARES, 1994).
Com o advento do movimento abolicionista uma grande população de
escravos transformou-se na massa de trabalhadores livres que o país
começava a necessitar durante o seu processo de industrialização e
transformação em Estado com pretensões capitalistas. A transformação da
mão de obra escrava em assalariada evidenciou graves problemas, entre eles
a falta dos conhecimentos mínimos para o exercício das novas atividades
econômicas (SOARES, 1994, p. 89). A alternativa foi o incentivo para que
viessem os imigrantes europeus, aumentando, assim, a população dos centros
urbanos. A falta de estrutura básica nas cidades favoreceu o surgimento das
grandes epidemias exigindo medidas sanitárias e de infra-estrutura urbana. Por
outro lado instalou-se o embrião do movimento operário, que se organizou no

4
“Ordem’ e “progresso” é o binômio essencial do positivismo...“ A constituição do positivismo se
fundamenta nesse lema projetando todas as pesquisas e todo modo de ser na reconstrução da civilização
ocidental...” Antônio Carlos Bergo, apud Soares, 1994. p 25.
26

pressuposto do conflito entre capital e trabalho, especialmente, com o inicio da


industrialização.
A Educação Física aparece no país colada, pois, aos ideais eugênicos
de regeneração e embranquecimento da raça, figurando em congressos
médicos, em propostas pedagógicas e em discursos parlamentares (SOARES,
1994, p. 25).
A preocupação com o melhoramento do povo brasileiro pode ser
traduzida como a tentativa de construir o novo homem, o futuro construtor do
novo país e que, apesar disso, deveria se conformar com sua natureza inferior,
com seu destino pré-determinado de ser eternamente dominado, tendo é claro,
que ser educado/adestrado por instrumentos científicos que aprimorassem
tanto seus aspectos físicos como seus aspectos morais, sem deixá-lo esquecer
do seu lugar na sociedade.
A Educação Física, particularmente a escolar, é propagada
principalmente através do pensamento pedagógico de nomes representativos
da época, como Rui Barbosa e Fernando Azevedo. Foi este discurso médico-
higienista, de forte presença no Brasil republicano, e em alguns momentos o
discurso militar, como demonstra Melo5, que fomentaram a implementação da
Educação Física nas escolas.
Melo destaca que dentro do desenvolvimento da Educação Física no
Brasil percebe-se uma divisão dualista entre aqueles que pensam e aqueles
que executam, entre aqueles que se preocupavam com o desenvolvimento
científico e aqueles que aplicavam as descobertas deste campo na prática
(1995). Ele ainda demonstra a relação dos militares com a formação dos
professores de Educação Física, pois, desde a origem das escolas militares
observava-se uma preocupação com a aplicação de exercícios físicos
associados à noção de disciplina.
Para Melo a influência de militares na origem da formação dos
profissionais da Educação Física fica exemplificada no fato da

...nomeação tanto do mestre de Esgrima Antônio Francisco da


Gama, em 1858, como do contra mestre de ginástica Pedro

5
Segundo Melo durante o surgimento da Educação Física no Brasil percebe-se a influência de militares
como os primeiros instrutores de aulas de educação física, e também primeiros professores de cursos de
formação para Professores de Educação Física. (Melo, 1995, p 103 - 115)
27

Guilhermino Meyer, em 1860, ambos para a Escola Militar,


responsável na época pela formação do oficialato do Exército.
A valorização da prática sistematizada de exercícios físicos
estava ligada à manutenção da boa forma do combatente, mas
também à crença de sua utilidade na disciplinarização da tropa.
(1995, p. 104)

Posteriormente estes oficiais formados pelas Escolas Militares


tornavam-se instrutores das próprias escolas militares, além de também
atuarem em clubes e instituições particulares e alguns, futuramente, como
professores nos cursos de formação de professores de Educação Física.
De maneira mais clara o fenômeno da escolarização da Educação
Física se daria por volta da década de 20 deste século, como afirma Gebara.

A gênese da Educação Física no Brasil sofreria, já no início do


século XX, com a introdução dos esportes modernos. Os
desportos, introduzidos no Brasil por diferentes formas,
indústrias, Associação Cristã de Moços, Escolas Superiores,
grupos de imigrantes, viriam crescentemente compor o
universo conceitual definido pelo termo ‘Educação Física’.[...] A
escolarização da Educação Física no Brasil significou tanto a
explicitação de um projeto educacional quanto a elaboração de
um conjunto de leis voltadas para a implementação da prática
obrigatória da Educação Física nas escolas brasileiras. Com
relação ao projeto educacional moldado pelos textos de
Fernando de Azevedo, sua configuração tornar-se-ia mais clara
durante os anos 30, quando a Educação Física foi tomada
como processo auxiliar na construção da nacionalidade
brasileira. Por outro lado, no nível legislativo, marcado
permanentemente pela obrigatoriedade, fica clara a existência
de um projeto legislativo precedente ao projeto pedagógico,
interferindo no próprio conteúdo da disciplina, isolando-a do
contexto das outras disciplinas, que compuseram os currículos
escolares (1993, p. 21 - 22).

Como é possível ver, a Educação Física como disciplina escolar


caracterizou-se desde o início por uma identidade diferenciada das demais
disciplinas escolares, principalmente no nível legislativo e administrativo.
Exemplo disso é o fato de que, em 1929, a partir de um decreto do Ministério
da Guerra cria-se o Conselho Superior de Educação Física com sede no
Ministério da Guerra, o qual exerceria a função de centralizar, coordenar e
fiscalizar todas as atividades referentes aos desportos e a Educação Física no
país (CASTELLANI FILHO, 1994, p. 74 -75).
28

Podemos perceber que, ao contrário das outras disciplinas escolares, a


Educação Física não se regia pela Associação Brasileira de Educação -ABE-
criada em 1924 no Rio de Janeiro (CASTELLANI FILHO, 1994, p. 74), criando
assim o que Gebara define, já descrito acima, como um distanciamento, ou
isolamento da Educação Física das outras disciplinas.
Ainda ligado a esta questão está o fato do surgimento da Divisão de
Educação Física (DEF) - do Ministério da Educação e da Saúde - que, segundo
Melo foi o primeiro órgão especializado governamental no nível federal, que
seria responsável por sistematizar e regulamentar a partir de então todo o
processo de formação profissional, bem como contribuir para a excelência
dessa formação (MELO, 1995, p. 111). Esse fato contribuiu para o
fortalecimento da separação da Educação Física das outras disciplinas, assim
como, para separar ainda mais os professores que ministravam aulas de
Educação Física, daqueles que regulamentavam os conteúdos e os métodos a
serem utilizados, reforçando o dualismo teoria e prática.
Esse quadro dicotômico presente na formação dos futuros professores
de Educação Física é provavelmente uma, entre outras, das causas da
desvalorização dos seus conhecimentos dentro do ambiente escolar. A
distinção entre os professores das disciplinas teóricas e os professores das
disciplinas práticas na formação dos primeiros cursos de Educação Física6
reforçava a desvalorização dos conhecimentos presentes nas aulas práticas
tornando-as, de um modo geral, em um espaço de simples ativismo corporal.
Dentro desta lógica é compreensível que a Educação Física escolar
tenha vindo a ocupar um papel auxiliar na formação dos sujeitos, sendo
entendida principalmente como forma de adestramento e disciplinarização dos
alunos, através dos exercícios físicos dirigidos e do sistema de organização
das aulas. Para Taffarel (apud BORGES, 1998, p. 25),

trata-se da Educação Física entendida como atividade prática


que, no Brasil, nas quatro primeiras décadas do século XX, foi
marcadamente influenciada pelos Métodos Ginásticos

6
Segundo Melo com a aprovação do regimento interno, em 1941, ficava referendada uma distinção clara
entre cadeiras teóricas, onde se situava a cadeira de História, e cadeiras práticas. Deve-se observar que
os professores das cadeiras teóricas deviam atender a algumas exigências dispensadas para os das
cadeiras práticas. Além de terem nível superior, a grande parte das cadeiras teóricas somente poderia ser
ocupada por médicos. (MELO, 1997, p. 739).
29

Europeus e pela Instituição Militar responsável pela formação


de profissionais na área, até aproximadamente 1939. Esta
formação delineou para a época um perfil do profissional de
Educação Física que o diferenciou dos demais profissionais do
magistério.

Diferença esta que fica evidente, nas palavras de Borges (1998, p. 25),
uma vez que, no mesmo período em que foi criada a Escola Nacional de
Educação Física e Desporto (ENEFD), em 1939, havia sido criada a Faculdade
Nacional de Filosofia (EnFi), que compreendia as seções de Filosofia, Letras,
Pedagogia e uma seção especial de Didática. Os alunos que completassem o
curso ordinário de três anos e, após, concluíssem o curso de didática, de um
ano, recebiam o diploma de licenciados. Ficava clara a distinção entre a
formação dos licenciados nas diferentes áreas e a habilitação dos profissionais
de Educação Física.
Os conhecimentos provenientes da Educação Física, por um longo
período de sua história, e talvez ainda hoje, têm um espaço secundário e uma
importância diferenciada na formação escolar dos alunos, tendo em vista uma
futura vida do trabalho. Percebe-se nas escolas uma secundarização da
importância da aula de Educação Física em relação às outras disciplinas; ela é
uma atividade que normalmente substitui a falta de alguma outra disciplina, que
prepara os alunos para as atividades cívicas - desfiles e apresentações - mas
que não possui um conhecimento próprio e fundamental na formação do aluno.
Se historicamente a Educação Física diferenciava-se das demais
licenciaturas em relação a sua formação mais voltada ao desenvolvimento
físico dos alunos é oportuno entender um pouco melhor como se constituiu e
qual foi o papel que a Prática de Ensino, Estágio Supervisionado, teve nos
cursos de formação de professores.

2.2. Prática de Ensino e Educação Física

Piconez afirma que Prática de Ensino mesmo, tendo sua origem da


década de 1930, passou a ser objeto de preocupação, principalmente com
relação ao estágio curricular, a partir da reforma universitária institucionalizada
pela Lei 5.540/68 (1991, p. 17).
30

Em 1962, dois pareceres foram aprovados pelo Conselho Federal de


Educação (CEF): o Parecer n.º 296/62, que relacionou o elenco de matérias
pedagógicas - Psicologia da Educação envolvendo adolescência e da
aprendizagem; elementos de Administração Escolar e Prática de Ensino, sob a
forma de Estágio Supervisionado - para os Cursos de Licenciaturas; e o
Parecer n.º 298/62, que fixou o currículo mínimo dos Cursos superiores de
Educação Física, no qual apareciam, além da matéria Pedagogia, no lugar da
disciplina Metodologia da Educação Física e do Desporto, as matérias
pedagógicas de acordo com o Parecer n.º 296/62.
Legalmente a Prática de Ensino, na forma de Estágio Supervisionado,
passou a fazer parte do currículo dos Cursos de Educação Física a partir do
Parecer n.º 298/62, mas efetivamente os Cursos continuaram a apresentar
diferenças em relação aos demais Cursos de Licenciatura.
Somente em 1968, o diretor da Divisão de Educação Física do
Ministério de Educação e Cultura (DEF/MEC) constituiu um grupo de trabalho,
a fim de colaborar com a revisão dos currículos de Educação Física. Em 1969,
o CEF emitiu a Resolução n.º 69/69 e o Parecer n.º 894/69 que prevêem o
currículo mínimo para os Cursos de formação de professores de Educação
Física com as respectivas cargas horárias das disciplinas e, finalmente, no
mesmo ano, o CEF, por meio do Parecer n.º 672/69, fixa as matérias
pedagógicas comuns a todas as licenciaturas (BORGES, 1998, p. 28).
Na observação de Faria Júnior, citado por Borges (1998, p. 28)

Somente assim, com sete (7) anos de atraso em relação à


legislação (Parecer n.º 292/62 do CEF) e com trinta (30) anos,
de fato, em relação às demais licenciaturas, matérias
pedagógicas como Didática, Prática de Ensino, Psicologia, etc.,
foram efetivamente incluídas nos currículos de Educação
Física, aproximando a formação deste profissional da dos
demais.

Além da introdução recente da Prática de Ensino, nos Cursos de


Licenciatura, observamos também que

o caráter complementar, ou mesmo suplementar, conferido à


Prática de Ensino/Estágio Supervisionado, ou ainda, no dizer
de Azevedo, uma teoria colocada no começo dos cursos e uma
prática colocada no final deles sob a forma de Estágio
31

Supervisionado constituem a maior evidência da dicotomia


existente entre teoria e prática (PICONEZ, 1991, p. 17).

Dessa forma incluiu-se nos cursos de formação de Educação Física


aquele que seria o momento privilegiado, momento de aplicar o que foi
aprendido durante o curso e demonstrar que o aluno está pronto, apto a se
formar. Além disso a Prática de Ensino passou a ser o espaço, às vezes
exclusivo, onde os alunos deveriam construir as pontes entre os
conhecimentos específicos e a aplicação prática destes no ambiente escolar,
através da Didática a da Metodologia de Ensino.
Para Piconez, o ideário educacional em torno da Prática de Ensino
ligou-se a um momento histórico em que se acreditava que esta atividade fosse
concebida como um espaço privilegiado na luta para a melhoria na formação
dos professores e, conseqüentemente, atingir-se-ia melhorias qualitativas do
ensino (1991, p. 18-19).
Obviamente não estou afirmando que ao longo dos anos o caráter, o
papel e a forma do estágio curricular foram os mesmos. Com certeza as
diferentes teorias que permeavam a formação de professores e as concepções
de aprendizagem influenciaram na sua constituição.
Piconez, analisando alguns autores que estudaram as tendências da
prática dos professores ou as correntes e abordagens de ensino e da
Pedagogia, destaca ter encontrado

... ora o predomínio de pressupostos teóricos políticos e


ideológicos; ora de concepções diferenciadas de mundo,
escola, prática docente, cujas formulações de categorias
teóricas foram aproveitadas também nos textos oficiais, muitas
vezes também priorizando, numa perspectiva individualista e
psicológica, a eficiência do ensino; ora os temas didáticos,
priorizando objetivos, metodologia de ensino, avaliação e
questões sobre planejamento; ora esboçando-se nas fontes do
materialismo dialético com uma pedagogia do consenso ou do
conflito; identificando, através da pesquisa participante,
concepções reprodutivistas ou de “conhecimento sistemático”
das classes populares; ou, ainda, destacando alternativas
críticas de transformação revolucionária das relações sociais e
de produção escolar.(1991, p. 19)

O curso de Educação Física, da ESEF/UFPel, o objeto deste estudo,


tem vivido diferentes momentos desde a sua criação. Alguns registros, como os
32

de Würdig (1998), têm sido referências importantes para a compreensão desta


trajetória.

2.3. A história recente: espaço, tempo e sujeitos desta pesquisa

A Prática de Ensino tem sido vista nos, diferentes períodos históricos


do Curso, de licenciatura, como um momento decisivo da formação do
estudantes. É no estágio que os estudantes experimentam o espaço da sala de
aula, vivendo a duplicidade de papéis, ora como alunos, ora como professores.
A partir do depoimento dos alunos Würdig (1998) constata que, para muitos
deles, este foi o local privilegiado para discutir as dúvidas e angústias
acumuladas ao longo do Curso.
Essa expectativa já os acompanhava durante os semestres que
antecediam o estágio e essa condição era fácil de perceber na fala dos alunos,
nas discussões pelos corredores e também durante a disciplina de Metodologia
do Ensino, no 7º semestre do Curso, anterior à Prática de Ensino.
A disciplina de Metodologia do Ensino era, normalmente, ministrada
pelo mesmo professor responsável pela Prática de Ensino articulando as duas
experiências. Na Metodologia do Ensino construía-se um projeto de ensino que
buscava superar a idéia de uma prática desprovida de fundamento e reflexão e,
no semestre seguinte, o projeto de ensino era desenvolvido no estágio.
Nem sempre, porém, foi assim. Diferentes professores que ministraram
a disciplina ao longo da história da ESEF/UFPel, imprimiram distintas
concepções. Würdig resgatando suas memórias durante o estágio de
conclusão do curso, em 1985, trouxe os seguintes elementos:

A lente que enxergava os estagiários ainda estava muito ligada


no modelo de técnico desportivo e não no de professor... Ao
mesmo tempo em que [eu] propunha uma outra forma de
ensinar a Educação Física na escola, devia cumprir com um
ritual formal e de nítida conotação tecnicista do estágio que
enfatizava a separação entre a forma e conteúdo, valorizando
muito mais a forma. Tudo era controlado: o rígido plano de aula
com os objetivos comportamentais, a divisão da aula em
tempos que deveriam ser cumpridas a risca, a correta ordem
de desenvolvimento dos exercícios, a explicação, a
33

demonstração, a execução e a correção dos movimentos. O


perfil do professor de Educação Física estava pautada na sua
capacidade de controlar os alunos e fazê-los executarem os
movimentos padronizados dos desportos. (1998, p. 05 - 06)

Nesse depoimento fica visível o quanto as concepções de Educação


Física e de professor que permeavam o Curso em um determinado período
histórico, influenciavam a concepção prática que estava presente no estágio.
Continuando seu relato, Würdig, analisando o momento em que retorna
à ESEF como professor, em 1991, narra que

havia um desinteresse pelo trabalho na escola e todo um


direcionamento do Curso, dos professores e de uma grande
parcela de alunos pelo espaço não formal da academia, dos
clubes, das clínicas, do treinamento. O estágio, no final do
curso, era uma mera aplicação de atividades, técnicas e
métodos (uma transposição mecânica) numa escola com uma
turma de alunos. Era só aplicar umas “aulinhas” e concluir o
curso (1998, p 12 - 13).

Estas narrativas mostraram como diferentes visões de estágio, e


mesmo, de professores permearam o curso da ESEF/UFPel. Provocaram
ainda, a necessidade de entender um pouco mais da história deste Curso e,
através dela, melhor compreender a realidade.
O Curso foi criado pela Portaria n.º 121/71/UFPel e, em sua primeira
fase (1967 a 1977) compreende os processos de fundação até seu
reconhecimento. O momento de sua criação coincide com o período de
expansão da Educação Física nas universidades brasileiras e do desporto de
rendimento como principal influência da Educação Física no espaço escolar.
Würdig afirma que

a iniciativa de criar uma Escola Superior de Educação Física -


ESEF originou-se no Conselho Municipal de Desporto, no final
dos anos 60. Entre 1969 e 1971 foram realizadas uma série de
atividades para que fosse viabilizada a criação da Escola
Superior de Educação Física em 1971. O curso, no entanto,
passou a funcionar em 1973 e somente foi reconhecido em
1977 (1998, p. 46).

A criação da ESEF/UFPel justificava-se, para Würdig, pela proposta,


descrita no Relatório final de 1969:
34

1- Atender a uma exigência legal do decreto-lei n.º 705/69 que


tornou obrigatório “a prática da Educação Física em todos os
níveis e ramos de escolarização, com predominância esportiva
no ensino superior”;
2- Suprir a deficiência “quantitativa e qualitativa” de professores
de Educação Física em Pelotas e em toda zona Sul do Estado.
[...];
3- Possuir o apoio das autoridades locais e da opinião pública
através da imprensa. O Conselho Municipal de Desporto - CMD
constatou que praticava-se muito pouco esporte em Pelotas,
com exceção do futebol, em grande parte, pela ausência de
profissionais técnicos especializados. Neste sentido,
ressaltava, que um dos cursos a ser oferecidos pela ESEF era
o de “Técnica Desportiva”;
4- Haver um grande número de candidatos interessados em
cursar a ESEF e só existir, na época, uma única escola
superior para formar professores de Educação Física em Porto
Alegre - RS.
(ESCOLA SUPERIOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DE PELOTAS, 1969, p. 01 - 06)

Por esta justificativa percebe-se que o Curso surgiu a partir da


necessidade de formar Professores de Educação Física para atuar nos
diferentes níveis de escolarização e também da necessidade de Técnicos
Desportivos para difundirem os desportos na região. Evidencia-se, também, a
precariedade na formação dos professores de Educação Física que vinham
atuando nas escolas naquele período.

Existia uma preocupação com o trabalho desenvolvido pelos


professores que atuavam no espaço escolar. No entanto havia
uma necessidade de profissionais especializados em Pelotas e
em toda região Sul que estimulassem e desenvolvessem a
prática desportiva (WÜRDIG, 1998, p. 48).

Inicialmente as disciplinas que constituíram a primeira grade curricular


do Curso eram basicamente as mesmas do currículo mínimo estipulado pela
Resolução n.º 12/70 do Conselho Federal de Educação7, acrescidas apenas
das disciplinas de Organização da Educação Física e dos Desportos. O Curso

7
De acordo com a Resolução n.º12/70 o currículo mínimo dos cursos de Educação Física deveria
contemplar matérias básicas (Biologia, Anatomia, Fisiologia, Cinesiologia, Biometria e Higiene) e
profissionais (Socorros Urgentes, Ginástica, Rítmica, Natação, Atletismo, Recreação e Matérias
Pedagógicas de acordo com o Parecer n.º 672/69). Acrescido a estas matérias os alunos deveriam
escolher 2 desportos da lista a ser oferecida para o título de Técnico Desportivo.
35

formaria Licenciados em Educação Física e Técnico em Desporto, sendo


obrigatório ao técnico incluir no seu currículo dois desportos.
A estrutura curricular do Curso, que manteve-se até metade da década
de 80, era predominantemente de base biológica e técnica e praticamente não
diferenciava o professor do técnico desportivo em Educação Física. Como
registra Würdig, em 1986 ocorreu uma reforma curricular que alteraria o tempo
de duração, a carga horária, as disciplinas, o campo de atuação e o perfil do
profissional (1998, p. 49).
Esse período foi pródigo em discussões em torno do currículo mínimo
dos curso de Educação Física, que acabaram originando a Resolução n.º 03/87
que possibilitou a opção aos Cursos de formarem Bacharéis e/ou Licenciados
em Educação Física, a partir de um currículo mínimo baseado no perfil destes
profissionais, bem como sugerindo uma parte de Formação Geral e outra de
Aprofundamento de Conhecimentos.

Nesse sentido o curso [da ESEF/UFPel] incorporou no seu


currículo uma parte geral e especifica da qual faziam parte as
disciplinas obrigatórias e uma parte de aprofundamento de
conhecimentos com as disciplinas eletivas. O propósito destas
últimas disciplinas era “...além de atender os interesses dos
alunos e as necessidades do mercado” (grifo do autor),
permitir a constante atualização do currículo.
Coincidentemente ou não, na lista de disciplinas eletivas
não figurava nenhuma direcionada para o âmbito escolar
(grifo do autor) (WÜRDIG, 1998, p. 49).

Esta reforma curricular pretendia também incentivar a pesquisa e a


pós-graduação, além de ampliar as atividades extra-curriculares por meio dos
projetos de extensão e pesquisa a serem desenvolvidos nas disciplinas de pré-
estágios, ampliar a atuação do profissional tanto para a educação formal como
para a não formal e definir um perfil profissional.
A proposta era formar um profissional mais eclético e não mais
somente um professor para atuar a partir da 5º série. O discurso da época
pregava a necessidade de um ...egresso de formação generalista, a nível de
licenciatura plena, com aprofundamento em campo de conhecimento que
atenda às suas potencialidades e áreas de interesse.[...] e que atenda
[também] as diversas demandas atuais do mercado de trabalho (WÜRDIG, 1998,
p. 50).
36

A reforma curricular do Curso da ESEF/UFPel antecipou, em parte, os


encaminhamentos posteriormente dados pela Resolução n.º 03/87. Já em
relação ao perfil do profissional que o Curso deveria formar, a ênfase do
discurso localizava-se no licenciado generalista mas, na prática, o que
aconteceu foi um incremento da grade curricular, priorizando a formação do
técnico desportivo e ampliando o campo de atuação para o espaço não
escolar, a fim de atender o mercado de trabalho. Estabeleceu-se uma confusão
na definição do perfil do profissional a ser formado no Curso reforçando a crise
profissional dos professores.
De certa forma, as alterações ocorridas na reforma curricular
evidenciaram a disputa pela hegemonia no perfil do Curso, entre aqueles que
apoiavam uma perspectiva de Educação Física ligada à saúde e à aptidão
física (enfoque biológico e psicológico) e o grupo que apoiava-se na sociologia
e na psicopedagogia e ainda naqueles que entendiam a Educação Física
enquanto componente da cultura corporal (TAFFAREL, citada por WÜRDIG, 1998,
p. 53).
Em 1992 houve um enxugamento desse currículo que, basicamente,
reduziu a carga horária, reorganizou as disciplinas e eliminou o termo Técnico
em Desportos do nome do Curso.
Segundo o Colegiado de Curso, devido à reforma de 1986, em que o
Curso passou de 3 para 4 anos, houve um inchaço excessivo da carga horária
curricular, que não foi acompanhado pela ampliação do quadro docente. Estas
condições dificultavam a discussão do projeto pedagógico da ESEF e a própria
capacitação dos docentes produzindo um novo enxugamento da grade
curricular.

Esta alteração curricular aparentemente procurou resgatar,


através da licenciatura, a formação do professor, tecendo uma
certa crítica a formação biológica e técnica (sem abrir mão
desta) em favorecimento de uma formação mais pedagógica.
Porém, para efetivar tal intenção apenas reduziu a carga
horária do curso, reorganizou disciplinas e desresponsabilizou-
se pela formação do técnico desportivo [...] além disso, não
fizeram parte do processo de alteração curricular estudos que
aprofundassem a formação de professores e o entendimento
de currículo que transcendesse as disciplinas que compõem a
grade curricular (WÜRDIG, 1998, p. 54).
37

Nesse período instalaram-se, no campo da Educação Física,


discussões sobre: a Regulamentação da Profissão; a retomada e
fortalecimento do discurso da atividade física como sinônimo de saúde
(tendência de ênfase biológica); o surgimento da área de personal trainer; o
crescimento do mercado das academias decorrente de uma política cultural de
culto ao corpo, entre outras.
O Curso, após esta alteração curricular, mais precisamente no período
de 1994 a 1998, caracterizou-se pelo grande número de professores
substitutos devido, principalmente, ao afastamento para capacitação
profissional de vários professores titulares.
Esse foi o contexto que, basicamente, sustentou a formação dos
sujeitos dessa pesquisa. Foram alunos que sofreram as conseqüências de um
currículo pouco experimentado, que continha as contradições da área e da
época. Foram alunos de professores transitórios e, muitas vezes, pouco
experimentados na tarefa docente.
A partir desse período de mudanças, inclusive Legal, com a
implementação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional –
LDBEN Lei Federal n.º 9394/96 – o curso passa a se reestruturar enquanto
licenciatura. A nova LDB (9394/96) em seu Artigo 65 prevê a inclusão de, no
mínimo, 300 horas de Prática de Ensino na formação docente, reforçando a
necessidade dos Cursos ofertarem momentos de prática profissional aos seus
discentes.
De certa forma o Curso da ESEF/UFPel já realizava essa oferta,
alterando pouco sua estrutura para contemplar a nova legislação. Talvez o que
pode ser questionado nesse período é qual a concepção de Prática de Ensino
que estava colocado no currículo, que espaço estava destinado a essa Prática,
e qual seu papel na formação dos docentes?
É difícil afirmar com exatidão quais foram as principais mudanças
originadas a partir da nova legislação em relação a concepção de Prática no
Curso de Educação Física, ao menos uma coisa podemos constatar, o
momento de sua realização permanecia ao final do Curso e o seu papel, ainda,
permanece para muitos como o local privilegiado da prática em contraposição a
teoria encontrada ao longo da Graduação.
38

Esse breve resgate histórico da Educação Física e do Curso da


ESEF/UFPel procurou revelar algumas inquietações, principalmente, sobre a
constituição do campo científico e do perfil do profissional que o Curso vem
buscando formar.
Percebe-se que na área acadêmica existe pouca clareza relativa ao
perfil do profissional de Educação Física. Este fato tem contribuído, entre
outras coisas, para a fragilização deste campo do conhecimento no espaço
escolar. Em alguns momentos está presente o perfil do professor/técnico
desportivo, com o papel de fazer emergir talentos esportivos. Em outros,
assume-se que o professor deve aplicar modelos, executar o planejamento e
contribuir para o desenvolvimento psicomotor dos alunos. Esta nebulosidade
traz conseqüências ao currículo e à formação dos estudantes.
Vale ressaltar, também, que temos vivido, nos últimos anos uma
evidente e crescente desvalorização da carreira do magistério em geral, o que
leva os alunos a se questionarem sobre suas condições e perspectivas, quer
como profissional de Educação Física, quer como professor. Cabe então
perguntar sobre as possibilidades do Curso de formar educadores, tendo em
vista a fragmentação das disciplinas, a descontextualização dos conteúdos e a
falta de um projeto político-pedagógico que organize esta formação.
Esta crise do campo do magistério não se apresenta somente na
Educação Física, mas sim no campo da docência em geral. Sendo este mais
um elemento significativo para a análise desse trabalho trarei algumas
reflexões sobre a profissionalização docente e as condições de exercício e
formação para o magistério.
39

3. SER OU NÃO SER PROFESSOR? EIS A QUESTÃO

A profissionalização dos professores, especialmente os de Educação


Física, tem apresentado um quadro de crise, vivendo um processo polêmico
devido, principalmente, às mudanças no papel da escola, da educação e dos
professores na sociedade atual.
Com as alterações presentes no mundo do trabalho e com a crise
paradigmática da ciência moderna8, as concepções de ensino e aprendizagem
vem passando por uma reestruturação, o que tem feito com que os professores
também necessitem reformular as suas compreensões e capacidades para
ensinar e aprender. A espantosa velocidade e quantidade de informações a
que estamos expostos a todo o momento, o advento da microeletrônica e da
informática9, as novas tecnologias, a introdução do computador na escola, o
mundo do “não-trabalho” e a globalização da economia mundial são alguns dos
temas que direta ou indiretamente têm influenciado as reformas no ensino de
diversos países.
Com certeza todas essas questões estão presentes, em maior ou
menor grau, nas reformulações do ensino brasileiro. Uma delas, porém, tem
tido especial importância para as reflexões que se seguem: a reestruturação do
mundo do trabalho na sociedade atual e a sua influência na profissionalização
docente.
Alguns autores como Nóvoa (1992a); TARDIF E LESSARD (1991); Lahaye
(1991); Cabrera & Jiménez (1991), têm demonstrado a necessidade de que se
estude o papel do professor enquanto profissional responsável pelos processos
de ensino/aprendizagem e também pela produção dos saberes sociais, tendo
em vista as mudanças no mundo do trabalho.
Este debate vem apresentando dois principais ângulos de análise. O
primeiro, centrado nas relações da sociedade com a escola e o segundo
voltado para a relação dos professores com as mudanças no mundo do

8
São hoje muitos e fortes os sinais de que o modelo de racionalidade científica - dominante - [...]
atravessa uma profunda crise. [...] A crise do paradigma dominante é o resultado interativo de uma
pluralidade de condições (SANTOS, 1995, p. 23-24).
9
A esse respeito ver: Schaff, Adam, 1995.
40

trabalho e a influência dessas mudanças na construção das suas capacidades,


qualidades e competências.
Na relação sociedade/escola é possível observar a emergente
necessidade de mudanças na forma como a escola se articula ao mundo do
trabalho, exigindo o repensar das qualidades necessárias ao futuro
cidadão/trabalhador, como alguém que deve ter uma capacidade reflexiva,
poder de decisão e domínio de determinadas tecnologias imprescindíveis para
a atuação no mercado profissional.
É importante salientar que estas condições nem sempre se apresentam
da mesma maneira em todos os locais ou tempos. As condições de uma escola
que atende em uma comunidade pequena no interior do Brasil, por exemplo,
não são, necessariamente, as mesmas exigidas para uma escola de um
grande centro urbano. Outra questão importante a considerar diz respeito às
condições necessárias para desenvolver uma concepção de ensino que
repense o papel social da escola na transmissão e construção de valores e
saberes, mesmo reconhecendo o peso das determinações de mercado,
fortemente presentes na conjuntura atual.
O segundo fator que está estimulando o debate sobre a
profissionalização docente refere-se a relação da organização do mundo do
trabalho, com suas novas exigências para a formação dos indivíduos, e a
influência dessas mudanças na construção das capacidades, qualidades e
competências dos professores, além da reformulação do seu papel dentro da
escola e da sociedade.
O questionamento da validade dos saberes que os professores
constróem e partilham com os alunos através da sua prática, além da busca
por uma nova e maior autonomia profissional na elaboração e execução da
suas atividades de trabalho, em vista das novas formas de controle e regulação
impostas pelo Estado e pela sociedade, tem dado outras perspectivas a
compreensão de professor/profissional e, em decorrência, de sua formação.
Nóvoa, expressando-se sobre a construção da imagem dos
professores em Portugal, identifica um dualismo na identidade da categoria dos
profissionais/professores.
41

Ao longo do século XIX consolida-se uma imagem do professor,


que cruza as referências ao magistério docente, ao apostolado e
ao sacerdócio, com humildade e a obediência devidas aos
funcionários públicos, tudo isso envolto numa auréola algo mística
de valorização das qualidades de relação e de compreensão da
pessoa humana. Simultaneamente, a profissão docente impregna-
se de uma espécie de entre-dois, que tem estigmatizado a história
contemporânea dos professores: não devem saber demais, nem
de menos; não se devem misturar com o povo, nem com a
burguesia; não devem ser pobres, nem ricos; não são (bem)
funcionários públicos, nem profissionais liberais, etc. (1992a, p.
16).

Apesar das peculiaridades de cada país é possível identificar nesta


análise algo muito semelhante ao caso brasileiro: os professores parecem
divididos entre uma idéia de vocação e a busca por uma identidade de
profissional docente.
Essa preocupação com a (re)construção de uma identidade profissional
pelos professores torna-se ainda mais pertinente considerando a afirmação de
Nóvoa sobre a influência do Estado na construção da docência como atividade
profissional. Segundo ele o professorado constituiu-se profissão graças à
intervenção e o enquadramento do Estado, que substituiu a Igreja como
entidade de tutela do Ensino (1992a, p. 16). Essa afirmação é importante,
principalmente por que se entende o momento atual do Brasil, de influência
política neoliberal, onde o Estado cada vez mais tenta eximir-se do
compromisso com o público. Por outro lado, porém, procura aumentar o seu
controle impondo avaliações externas e exigências de qualidade, justificadas
pela lógica de que “quem não é competente não vence no mercado de
trabalho”. Dentro desta conjuntura é que se tem dado o contínuo processo de
proletarização da atividade docente.
42

3.1. Profissão, profissionalização, proletarização e professores

Do ponto de vista sociológico muito se tem estudado sobre o conceito


de profissão e de profissionalização. Diversos são os autores que discutem
essa questão como por exemplo Elliot, Bergen, Etzioni, Freidson, todos
encontrados em Guerrero (1996).
Sobre a questão da profissionalização do magistério mais
especificamente é possível citar autores como Cunha & Leite (1995), Oliveira;
Pucci & Sguissardi (1991), Guerrero (1996) e Enguita (1990) etc.
Entre os autores que têm estudado a formação de professores - Nóvoa
(1995) e Popkewitz (1995) por exemplo – encontra-se referências também dos
aspectos da docência enquanto profissão e, na maioria das análises, o
conceito de grupo profissional e profissionalização que predomina é aquele
que, segundo Cabrera & Jaén (1991) o consideram como tradicional ou
convencional, classificando a docência como uma semiprofissão (1991, p. 192).
A compreensão desta perspectiva exige uma ampliação de seu
significado frente aos demais grupos profissionais. Procurando esclarecer este
conceito, Enguita utiliza a idéia de que em um sentido estrito, um grupo
profissional é um coletivo auto-regulado de pessoas que trabalham diretamente
para o mercado em uma situação de privilégio monopolista (1990, p. 149).
Estes grupos não estão submetidos a trabalhos assalariados, nem à regulação
externa; são protegidos por um sistema legal e possuem o monopólio de
determinados bens e serviços, o que se pode chamar de exercício liberal da
profissão. Entretanto, hoje em dia, pode-se encontrar também inúmeros
profissionais liberais que trabalham como assalariados em instituições públicas
e privadas, desfrutando, entretanto, dos mesmos privilégios, benefícios e
direitos próprios de seu status profissional. Nesta situação podemos citar, como
exemplos clássicos, os médicos e advogados que trabalham em instituições
públicas e que mantém suas características de profissionais liberais.
Para melhor delimitar o conceito de profissão ENGUITA aponta, para ela,
cinco características: competência, vocação, licença, independência e auto
regulação. Uma profissão só existe quando possui um saber próprio e quando
43

este conhecimento é reconhecido como privilégio de um determinado grupo


profissional. Ai podem estar as características de competência e vocação. Por
licença pode-se entender também este reconhecimento público acrescido do
reconhecimento e regulamentação legal para o exercício da profissão.
Independência e auto-regulação são as características relativas à autonomia
do grupo frente ao seu público - clientela - e às organizações privadas e
públicas. Além da sua capacidade de auto regular seus membros, através de
um código ético e deontológico, exercem sua capacidade de resolver conflitos
internos.
Quanto mais fortes são estas características dentro de um grupo
profissional maior será sua autonomia, seu prestigio e reconhecimento público
e, conseqüentemente, maior seu poder de reivindicação frente ao Estado. No
caso do magistério atualmente sofremos o processo inverso, pois cada vez
mais os professores perdem seu prestigio, sua autonomia, e suas condições se
deterioram levando à contestação de sua competência. Para Cunha & Leite
não é difícil entender as inter-relações entre as causas e os efeitos desse
desgaste. Ao mesmo tempo em que o aviltamento dos salários leva à uma
desqualificação dos quadros, este acaba levando à aquele, gerando um certo
circulo vicioso, talvez não de forma mecânica, mas com certeza pleno de
influências reciprocas (1995; p. 132).
Ao que parece todo esse processo se desencadeou a nível mundial de
maneira bastante similar tendo em vista a análise do processo de
proletarização definido por Law & Ozga, citados em Guerrero, que afirma terem
passado os professores por um processo que esmagava a sua autonomia,
como conseqüência da eliminação de sua qualificação e de sua exclusão das
funções intelectuais do trabalho e pelo reforço no controle da gestão e
execução de suas atividades (1996, p. 175).
Entre a proletarização e a profissionalização dos grupos ocupacionais
existe uma variedade de ocupações que apresentam características de ambos
os extremos. A estas ocupações constituem o que é chamado no jargão
sociológico de semiprofissões (ENGUITA, 1990, p. 150).
Para Etzioni, citado por Guerrero (1996, p. 171), as semiprofissões são
aquelas que não preenchem todas as características necessárias para que
uma ocupação seja considerada como uma profissão. São ocupações que
44

contam com uma menor formação, um menor status, e uma menor autonomia
em comparação às profissões plenamente constituídas. Na análise de Guerrero
o conceito de Etzioni se assemelha muito ao que Weber chama de profissões
heterônomas ou subordinadas, pela sua carência de autonomia (1996, p. 171).
Se por um lado a desvalorização dos docentes está justamente ligada
ao fato da proletarização da sua atividade - e isto implica uma desvalorização
dos seus saberes - por outro, a perspectiva dos professores tentarem se
aproximar das profissões liberais não parece ser a solução para o seu
problema. Popkewitz salienta que profissão é uma palavra de construção
social, cujo conceito muda em função das condições sociais em que as
pessoas a utilizam (1992a, p. 38), e por isso devemos ter cuidado ao
assimilarmos acriticamente o discurso da profissionalização.
Popkewitz problematiza as reformas atuais levadas a efeito nos
Estados Unidos da América quando consideram que o profissionalismo trará
um maior prestígio social, melhores condições de trabalho e de remuneração,
graças à conquista de privilégios profissionais semelhantes aos que existem no
direito ou em medicina (1992a, p. 39 - 40). A história dessas profissões
demonstra que elas fizeram de seus serviços um meio de troca para a
obtenção de prestígios, poder e estatuto econômico, sendo que os seus
serviços não eram tão altruístas como pareciam ser, nem os interesses
profissionais tão neutros quanto se proclamavam ou quanto se pretendia que
os seus clientes acreditassem (HUGHES, citado por POPKEWITZ, 1992a, p. 40).
A assimilação do ideário da profissionalização representa também a
identificação de valores e construções históricas que não parecem estar
presentes na atividade docente, assim como, ao mesmo tempo, nos instiga a
exigir para a categoria dos professores uma maior autonomia, integridade e
responsabilidade.

É necessário que os professores adquiram maiores


competências em relação ao desenvolvimento e
implementação do currículo, pois as sociedades modernas
exigem práticas de ensino que valorizem o pensamento crítico,
a flexibilidade e a capacidade de questionar padrões sociais,
isto é, requisitos culturais que têm implicações na autonomia e
responsabilidade dos professores. No entanto, falar de
profissionalismo, integridade e responsabilidade sem tomar em
consideração as relações estruturais que configuraram o
45

ensino é perder de vista a forma como a atividade educativa foi


determinada historicamente (POPKEWITZ, 1992a, p. 40).

Estas considerações apontam para a complexa situação dos


professores na atualidade. A desvalorização, desqualificação e a intensificação
do seu trabalho têm levado à uma perda de autonomia na estruturação e
execução das suas atividades, causando também a deslegitimação social da
suas qualificações, o que leva a pensar em quais as possibilidades, e como
construir a autonomia da categoria, resgatando o reconhecimento social da
importância da atividade docente na sociedade.
Talvez, pensando a formação de professores como uma construção
que envolve três grandes dimensões - como aponta Nóvoa - e alguns saberes
específicos, inclusive os saberes da experiência, seja possível identificar
possibilidades para a formação de uma nova profissionalidade docente.
As dimensões que Nóvoa relaciona para a formação de professores
são (1) o desenvolvimento pessoal (produzir a vida do professor), (2) o
desenvolvimento profissional (produzir a profissão docente) e (3) o
desenvolvimento organizacional (produzir a escola) (1992a, p. 15).
Para este autor,

a formação deve estimular uma perspectiva crítico-reflexiva,


que forneça aos professores os meios de um pensamento
autônomo e que facilite as dinâmicas de autoformação
participativa. Estar em formação implica um investimento
pessoal, um trabalho livre e criativo sobre os percursos e os
projetos próprios, com vistas à construção de uma identidade,
que é também uma identidade profissional. [...] Urge, por isso,
(re)encontrar espaços de interação entre as dimensões
pessoais e profissionais, permitindo aos professores apropriar-
se dos seus processos de formação e dar-lhes um sentido no
quadro das suas histórias de vida.
A formação não se constrói por acumulação (de cursos, de
conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um
trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de
(re)construção permanente de uma identidade pessoal. Por
isso é tão importante investir na pessoa e dar um estatuto ao
saber da experiência (1992a, p. 25).

Compreendendo, então, o professor como alguém que domina um


determinado conhecimento que lhe é próprio e partindo do pressuposto de que
46

esse conhecimento é construído na sua práxis10, percebe-se que não se trata


de mobilizar a experiência apenas numa dimensão pedagógica, mas também
num quadro conceptual de produção de saberes (NÓVOA, 1992a, p. 25).

10
A práxis é “...a concepção que integra em uma unidade dinâmica e dialética a prática social e sua
pertinente análise e compreensão teórica, a relação entre a prática, a ação e luta transformadoras e a
teoria que orienta e ajuda a conduzir à ação. É a unidade entre pensamento e ação que permite assumir
conscientemente o papel histórico que cada homem está chamado a exercer” (HURTADO, 1992, p. 45).
47

4. SABERES E INTUIÇÕES NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

O Curso de Formação de Professores de Educação Física, assim como


outras Licenciaturas, precisa repensar sua lógica de formação, problematizar
sua organização, seu currículo, o conteúdo das disciplinas, entre outras coisas,
sob o risco de continuar reforçando práticas fragmentadas,
descontextualizadas, que não propiciam a reflexão e que naturalizam uma série
de dicotomias - teoria/prática, natural/cultural, natural/artificial, mente/matéria,
coletivo/individual, sujeito/objeto, e outras. Ao contrário, seu esforço precisa ser
o de apontar para construção de uma concepção de autoformação contínua
nos e dos conhecimentos; para necessidade de uma atitude de protagonismo
na construção dos saberes; para necessidade da valorização e do diálogo
entre os diversos saberes que compõem o saber docente - principalmente a
valorização dos saberes da experiência.
Para Tardif et alii, o saber docente se compõe, na verdade, de vários
saberes provenientes de diferentes fontes. Esses saberes são: saberes das
disciplinas, saberes curriculares, saberes da formação profissionais e saberes
da experiência (1991, p. 216). A existência desses múltiplos saberes dá origem
a um saber plural, o saber do professor.
Sendo o conhecimento uma produção histórica, é importante lembrar
que, o saber do professor inscreve-se, como todo conhecimento novo, em um
conhecimento já existente e por isso a transmissão e a produção de
conhecimentos são dois pólos complementares e inseparáveis (TARDIF et alii,
1991, p. 216). E, além disso, por ser a atividade docente uma atividade que se
produz entre o professor e os alunos, esta torna-se bastante singular,
necessitando de decisões momentâneas e únicas, onde o professor precisa
decidir sobre que caminhos tomar, sobre qual exemplo utilizar ou qual a melhor
forma de agir. Essas decisões, até certo ponto, contém um forte componente
intuitivo que, se acompanhado de um referencial teórico certamente terá mais
chance de adequação.
Essas intuições docentes, em alguns casos, constituem-se em um
certo grau de improvisação apresentada nas práticas e nas fala dos
48

professores, como salienta Mena Barreto em sua análise sobre a formação de


professores leigos:

O que tento registrar é uma certa predisposição, uma visão


mesma de que o trabalho do professor pode fundamentar-se
na improvisação, deixando de lado as teorias que podem nos
auxiliar em matéria de educação. “Experimentamos e, se dá
certo, levamos adiante” afirmam muitas professoras. Parece
que em matéria de educação há uma certa desvalorização ou
descrença dos professores em relação às teorias que de
alguma forma tentam explicar essa realidade. (2001, p. 85)

Para a autora parece haver, em alguns momentos, uma certa ausência


de intencionalidade ou uma aparente casualidade entre o que o professor sabe
e o que faz enquanto tal (2001, p. 86).
Por outro lado, Sacristán, salienta que

O mundo da ação pedagógica não é o mesmo da técnica


(techne), no qual regras fixas regulam ações para conseguir
metas, tampouco pertence à um mundo totalmente
determinado por leis e estruturas externas (1999, p. 59).

SACRISTÁN chama a atenção de que não temos o controle prévio da


experiência e o conhecimento sobre nossas ações, pois estas realizam-se
entre seres com liberdade, além de se darem em um contexto que não é
neutro, portanto, fruto de um processo de construção.
Esse processo, ainda que contingente, não é desprovido de
racionalidade.

A racionalidade atribuível aos seres humanos em suas ações


é, pois, uma racionalidade imperfeita, mas perfectível, uma
imperfeição inevitável, como estabelecia o pensamento de
Aristoteles. Agimos em situações incertas, sem saber aonde
conduzem exatamente nossas ações; o grosso da ação se
projeta em termos de risco, de incerteza, de confusão (1999,
p.59).
49

4.1 Os saberes e a formação

Para localizar aquelas experiências consideradas significativas, pelas


professoras que participaram da pesquisa, foi preciso, antes de mais nada,
entender melhor a que se referem esses saberes.
Em um texto recente, Tardif (2002) procura, a partir dos estudos que
vêm sendo realizados no campo dos saberes docentes, compreender mais
aprofundadamente esse saber profissional. Segundo ele uma perspectiva
epistemológica e ecológica do estudo do ensino e da formação para o ensino
permite conceber uma postura de pesquisa que leva ao estudo dos saberes
docentes tais como são mobilizados e construídos em situações de trabalho.
Os trabalhos realizados de acordo com essa perspectiva mostram que os
saberes docentes são temporais [1º característica], plurais e heterogêneos [2º
característica], personalizados e situados [3º característica], e que carregam
consigo as marcas do seu objeto, que é o ser humano [4º característica]
(TARDIF, 2002).
Dessas quatro características procurarei nesse ponto, me ater mais a
segunda, que trata de compreender da pluralidade dos saberes dos
professores, oriundos da formação profissional, das disciplinas acadêmicas,
das matérias curriculares e da experiência profissional.
Os saberes da formação profissional são, para Tardif et alii (1991), o
conjunto dos saberes transmitidos pelas instituições de formação dos
professores. De forma genérica, referem-se aos conhecimentos ou saberes
pedagógicos - didática, estrutura e funcionamento do ensino, metodologias -
articulados com os saberes das ciências humanas e das ciências da educação.
Englobam o que Gauthier et alii denominam de saber das ciências
pedagógicas (1998, p. 31), um saber adquirido durante a sua formação
dizendo respeito à escola e ao processo educacional. É um saber que qualifica
a profissionalização do professor.
Os saberes das disciplinas referem-se aos conhecimentos que são
difundidos e selecionados pelas instituições universitárias e de formação
docente. Correspondem aos diversos campos científicos e emergem da
50

tradição cultural e dos grupos sociais produtores de saberes. Gauthier et alii,


salientam que o professor, geralmente, não produz esse saber mas, para
ensinar, utiliza-se do conhecimento produzido pelos pesquisadores, ainda que,
tanto a escola como os docentes, imprimam no conteúdo uma série de
transformações, fazendo com que na prática este não seja um saber disciplinar
propriamente dito, mas sim um saber da ação pedagógica (1998).
Os saberes curriculares são aqueles que apresentam-se na forma de
programas escolares que os professores devem aprender e aplicar.
Correspondem aos discursos, objetivos, conteúdos e métodos pelos quais a
escola categoriza e apresenta os saberes sociais que ela definiu e selecionou
como modelo da cultura erudita (TARDIF et alii, 1991, p. 220).
E, finalmente, os saberes da experiência que referem-se aos
conhecimentos específicos produzidos pelos professores no seu trabalho
cotidiano. São saberes construídos na experiência e por ela validados; fazem
parte da prática docente individual e coletiva dos professores sob a forma de
habitus e de habilidade, de saber fazer e de saber ser (TARDIF et alii, 1991, p.
220).
Sobre esse saber construído e validado na experiência cotidiana
Gauthier et alii identificam duas possibilidades: (1) o saber experiencial,
construído individualmente pelo professor no interior de sua sala de aula, fruto
de julgamentos privados, que ao longo do tempo compõem uma espécie de
jurisprudência composta de truques, de estratagemas e de maneiras de fazer
que, apesar de testadas, permanecem em segredo e (2) o saber da ação
pedagógica, que nada mais é que o saber experiencial dos professores a
partir do momento em que se torna público e que é testado através das
pesquisas realizadas em sala de aula.
Além destes saberes acima abordados, Gauthier et alii identificam mais
um saber ao qual eles denominam de saber da tradição pedagógica. Este
saber surge a partir do século XVII fruto de uma “tradição pedagógica”, de uma
nova maneira de fazer a escola. Essa tradição pedagógica é, segundo os
autores, o saber dar aulas que transparece numa espécie de intervalo da
consciência. Nessa perspectiva, cada um tem uma representação da escola
51

que o determina antes mesmo de ter feito um curso de formação de


professores (1998, p. 32).
Entendendo o saber docente como o produto da mobilização de vários
saberes concordo, então, com Gauthier et alii de que, o conjunto destes
saberes formam uma espécie de reservatório no qual o professor se abastece
para responder a exigências específicas de sua situação concreta de ensino
(1998, p. 28).
Do ponto de vista da profissionalidade docente é importante salientar
que, o saber da ação pedagógica é fundamental a profissionalização do ensino,
tendo em vista que ele constitui um dos fundamentos da identidade profissional
do professor (GAUTHIER et alii, 1998, p. 34).
Tardif et alii (1991), analisando a relação dos professores com seus
saberes, chega a conclusão de que em geral, tem se mantido uma postura de
agentes transmissores, depositários ou objeto de saberes e não de produtores
de um saber ou de saberes.
Para superar esta lógica, é preciso entender melhor como se dá essa
construção dos saberes docentes, identificar e resgatar estes saberes no
processo de formação inicial e continuada dos professores a fim de valorizar a
atividade docente como produção de saberes.
Se o professor é detentor de um saber e esse saber se constrói ao
longo de sua vida, durante sua formação e no cotidiano da sua prática, esse é
um saber que deve ser reconhecido e valorizado pelos próprios professores
para que possam compreender sua atividade como uma profissão.
No caso da Educação Física talvez uma das dificuldades para fazer
esta discussão esteja no fato dela estar alicerçada em alguns dualismos na
origem do seu conhecimento. Essas dicotomias, ao longo da sua história, têm
contribuído para criar uma certa ambigüidade em relação à identidade do
profissional da área: não sabemos se somos professores - educadores - ou se
somos treinadores, bacharéis, instrutores. Essa indefinição parece estar
contida no entre-dois que Nóvoa11 propõe referindo-se à construção da

11
Nóvoa refere-se a um entre-dois ao qual a profissão dos professores parece ter se impregnado ao longo
da história contemporânea: não devem saber demais, nem de menos; não se devem misturar com o povo,
nem com a burguesia; não devem ser pobres, nem ricos; não são (bem) funcionários públicos, nem
profissionais liberais (Nóvoa 1992a, p. 16). Sobre esse ponto refiro-me de forma mais aprofundada no
capítulo III, página 19.
52

profissão docente. Por uma questão de prestígio e valorização social, os alunos


parecem não querer se identificar com a imagem do professor, preferindo muito
mais, a imagem do profissional liberal que atua em outros espaços que não a
escola. Provavelmente porque, ao mesmo tempo em que os espaços escolares
para a Educação Física são desvalorizados (baixos salários, prédios precários,
falta de equipamentos, etc.), a sociedade de consumo valoriza os espaços
alternativos de culto ao corpo da “geração saúde” (academias, escolas de
dança, etc.).
Outro fenômeno que parece auxiliar nesse processo de desqualificação
e desvalorização dos saberes dos professores de Educação Física é a super-
valorização de conhecimentos produzidos em laboratórios altamente
especializados e incluídos diretamente na formação acadêmica dos alunos,
que reforça o dualismo teoria e prática induzindo ao consumo de
conhecimentos científicos prontos e acabados em detrimento dos
conhecimentos da experiência. Estes conhecimento são produzidos, em geral,
por especialistas que estão distantes do meio escolar.
Levanto esta problemática pois entendo que o curso de formação de
professores de Educação Física deve valorizar, além dos conhecimentos
construídos pelos especialistas da área, também aqueles provenientes das
experiências dos professores no seu espaço de trabalho, assim como dos
alunos ao longo do Curso, principalmente aqueles oriundos de experiências
significativas da formação.
O grupo de estudos canadense CRIFPE – Centre de Recherche
Interuniversitaire sur la formation et la profession enseignante -, do qual fazem
parte Maurice Tardif e Clermont Gauthier, tem procurado, ao longo de seus
estudos, aprofundar os seus conhecimentos sobre os saberes docentes e o
papel destes saberes na formação dos professores.
O trabalho de Tardif & Gauthier12 (1996) e, recentemente, Gauthier et
alii (1998), dedica-se, cada vez mais, a melhor delimitação do conceito de
saber utilizado nos estudos e pesquisas. Para os autores, não podemos cair no
erro de considerarmos todo o conhecimento ou toda ação dos professores

12
Este livro foi traduzido em 2001 pela editora Artmed com o titulo Formando professores
profissionais: Quais estratégias? Quais competências.
53

como um saber. É necessário uma certa “racionalidade” como exigência para o


uso do termo. E essa “exigência de racionalidade”, que

...restringe a noção de saber aos discursos e ás ações cujos


sujeitos estão em condições de apresentar uma justificação
racional. Quando falamos de saber englobamos, assim, os
argumentos, os discursos, as idéias, os juízos e os
pensamentos que obedecem a exigência de racionalidade, ou
seja, as produções discursivas e as ações cujo agente é capaz
de fornecer os motivos que as justificam (GAUTHIER et alii,
1998, p. 336 - 337).

Portanto é possível afirmar que o docente possui um saber quando ele


consegue argumentar sobre as suas ações de maneira fundamentada e
racional, explicitando as suas razões e os motivos que o levaram a esta ação.
O saber, nessa concepção, baseada na capacidade de argumentação
e retórica, para GAUTHIER et alii, possui algumas vantagens sobre outras
concepções, entre elas, a de não impor aos sujeitos (no caso os professores)
um modelo preconcebido de racionalidade. Em conseqüência, evitamos
submeter o saber dos agentes ao modelo demasiado rígido das ciências
naturais. O saber dos professores pode ser racional sem ser um saber
científico (1998, p. 337).
Outro aspecto importante sobre a concepção de saber é compreender
que este é, antes de tudo, o resultado de uma produção social e, enquanto tal,
está sujeito às revisões e às reavaliações que podem mesmo ir até a refutação
completa (GAUTHIER et alii, 1998, p. 339). Nessa perspectiva é preciso substituir
a idéia de verdade pela idéia de validação. Um saber seria válido graças à sua
capacidade de persuadir e não graças a um absoluto percebido como verdade.

4.2 Intuições docentes e a formação

Seguindo o percurso teórico eleito para embasar este estudo, é


possível afirmar que o saber docente está fundado em uma pluralidade de
saberes contidos em um reservatório, no qual o professor se abastece para
construir alternativas as exigências das situações de ensino. Cabe, porém,
ressaltar que nem todo conhecimento ou ação do professor pode ser
considerado um saber.
54

Somente aqueles que contemplem a uma certa exigência de


racionalidade se caracterizariam como um saber. Surge então uma questão;
como denominar aquelas ações instantâneas, as decisões de momento, ou as
atitudes tomadas de forma intuitiva pelo professor dentro da sua sala de aula?
As improvisações apresentada por BARRETO (2001), as elaborações práticas
construídas a partir da experiência vivida, as ações decididas na incerteza,
podem ser consideradas um saber?
A idéia do professor não poder estar consciente todo o tempo em todas
suas ações e de não poder agir racionalmente o tempo todo, para Borges
(1998) contrabalança, de certa forma, a questão da exigência de racionalidade
colocada pelo grupo CRIFPE. Mas, com certeza, não descarta a necessidade
dessa exigência para delimitar o que é um saber.
Já Gauthier et alii chamam a atenção para o aspecto contingente da
prática docente. Para eles é preciso levar em consideração que o repertório de
conhecimentos positivos provenientes da pesquisa científica [sobre o ensino]
não deve ocultar-nos a realidade singular de uma sala de aula, fazer-nos
perder de vista a complexidade da realidade escolar, complexidade essa que
não poderia caber num enunciado geral, mesmo que fosse científico (1998. p.
351). As decisões dentro da sala de aula envolvem dimensões éticas, políticas
e relacionais que só parcialmente são apreendidas pela ciência, colocando ao
professor a necessidade de uma constante reflexão sobre a sua prática,
revendo e validando ações e atitudes construídas continuamente no processo
de ensino.
Para Sacristán

o mundo da ação pedagógica [...] é o da praxis aristotélica


descoberta pelos sujeitos, na qual o raciocínio prático leva a
encontrar a ação moralmente informada a cerca do que é
conveniente a cada momento. Este é um conhecimento que
não se compõe de regras, mas de princípios aplicados com
sabedoria (phonesis). (1999, p. 59)

Aceitar a intuição docente não significa resumir a competência docente


a uma mera capacidade de agir segundo a intuição, chegando a uma relação
de negação do saber (GAUTHIER et alii, 1998, p. 22), mas sim salientar de forma
55

didática, a necessidade de problematizar de onde provem essas respostas


dinâmicas tomadas sem um processo reflexivo mais demorado e como a
formação utiliza-se, ou não, dessas experiências.
Segundo Sacristán

há aqui uma característica contraditória dos fenômenos


educativos: são ações de reprodução que levam ao seu lado a
possibilidade de criação, enquanto são guiadas por projetos
que dão unidade a complexas concatenações de ações, ou por
motivos ou fins específicos que guiam uma ação concreta.
Definir este espaço aberto ao possível, não dado pela
natureza, nem fechado pelo contexto, é a missão mais difícil
dos professores, das políticas educativas e das táticas de
inovação exata. [...] O conhecimento prévio poderá recordar-
nos, previnir e aconselhar a partir daquilo que já foi feito, mas
não determinar. (1999, p. 61)

O aluno do Curso de licenciatura, atuando no seu estágio curricular


enfrenta uma gama de decisões a tomar. É preciso questionar até que ponto
estas decisões estão permeadas por experiências construídas ao longo do
Curso e até que ponto essas experiências foram significativas para a formação
da sua profissionalidade. Como o aluno está construindo esse seu savoir-faire,
o seu saber fazer?
Esse debate sobre os saberes profissionais docentes, assim como
sobre as intuições docentes - como estou chamando -, ainda é um debate
inicial, principalmente dentro da Educação Física. Portanto é necessário a
intensificação de esforços e maiores aprofundamentos para delimitar melhor o
campo de estudos.
As noções aqui exploradas sobre os saberes e as intuições servirão
para auxiliar a compreensão das experiências significativas durante o Curso e o
papel delas na formação da profissionalidade das professoras que participaram
da pesquisa.
Assim como, para Gauthier et alii, os saberes nos quais os professores
se apoiam dependem diretamente das condições sociais e históricas nas quais
eles exercem sua prática (1998, p. 343), acredito que as experiências práticas,
localizadas social e historicamente, relativas ao ensino vividas pelas alunas
durante o seu Curso de formação, podem propiciar interessantes elementos
56

para a compreensão do papel dessa formação acadêmica na construção dos


saberes e da profissionalidade docente.
57

5. DE HISTÓRIAS E FALAS

5.1 A formação inicial e os saberes docentes

Ao começar este capítulo gostaria de relembrar um elemento do


contexto vivenciado pelas professoras da pesquisa no Curso de formação
inicial. No período em que cursaram a ESEF/UFPel o quadro de professores
efetivos da Faculdade era bastante resumido, pois muitos estavam fora
cursando mestrado ou doutorado. Conseqüentemente o número de professores
substitutos foi grande, o que de certa forma, interferiu na qualidade de algumas
disciplinas.
Essa foi a opinião de duas entrevistadas, ratificada pelas outras
professoras, quando manifestavam uma certa insatisfação em relação ao
Curso, apontando a fragmentação dos conteúdos, a descontextualização das
disciplinas e a ambigüidade de identidade, ora o direcionamento do Curso para
escola, ora para o campo da academia ou do clube.
Mesmo sem reduzir o quadro da formação inicial a uma relação
mecânica com a prática dos professores substitutos, reconhece-se que, de
certa forma, o fato destes professores substitutos possuírem uma recente
experiência no ensino superior pode ter agudizado alguns problemas do Curso
de formação.
Construo essa afirmação a partir do entendimento de Tardif (2002),
sobre a temporalidade dos saberes do professor. Sua análise sobre as
pesquisas no campo dos saberes docentes possibilita afirmar que os saberes
do professor possuem um forte componente temporal, no sentido de que são
utilizados e se desenvolvem no âmbito de uma carreira, isto é, de um processo
de vida profissional de longa duração do qual fazem parte dimensões
identitárias e dimensões de socialização profissional, bem como fases e
mudanças (TARDIF, 2002, p. 262).
Considerando esse sentido da temporalidade que Tardif apresenta é
possível afirmar que a prática dos professores substitutos pode ter apresentado
algumas fragilidades pelo fato de ser uma prática recente e em adaptação a
58

uma estrutura estranha aos profissionais em questão, ao menos, enquanto


professores.
Para contextualizar minha análise, além deste aspecto saliento um
outro elemento importante e comum as cinco professoras respondentes: a
grande expectativa e tensão que viveram em torno da Prática de Ensino.
Esse pode ser um ponto interessante, que serve de sensibilização a
esta análise, pois, na minha história como aluno da Faculdade de Educação
Física e, posteriormente, como professor substituto, vivi e acompanhei esta
tensão nos estudantes ao se aproximar o final do Curso. Esta tensão esteve
presente na experiência das professoras que participaram da pesquisa e que, a
partir dela, puderam refletir sobre alguns dos motivos que a geraram, algumas
deficiências do Curso na construção e articulação dos diferentes saberes
docentes.
Cabe também referir que no processo de análise dos dados, nesse
estudo, parti da leitura e categorização dos depoimentos e das narrativas das
professoras participantes, identificando as vivências e experiências
consideradas por elas significativas, ou seja, aquelas que marcaram de alguma
forma as suas trajetórias, antes do Curso de Graduação ou durante o Curso, e
a relação entre o que era proposto pela faculdade e o que era vivido como
significativo no espaço de trabalho.
O espaço investigativo deu-se no cruzamento dos elementos
encontrados com o referencial teórico sobre os saberes docentes trabalhados
ao longo do estudo, e com outros referenciais disponíveis no momento de
análise. Para melhor compreensão procurei descrever os elementos
observados a partir das quatro características dos saberes profissionais dos
professores, propostos por Tardif (2002).
59

5.2 Características dos saberes docente e a formação inicial

Os autores que me acompanharam nesse estudo apontam quatro


características do saber profissional do professor, conforme pontuei
anteriormente. Retomei cada uma delas como referência para a análise dos
dados desse estudo.
A primeira característica afirma que os saberes dos professores são
temporais, em três sentidos: (1) primeiro, em relação à história de vida,
principalmente de vida escolar e a imagem de professor que construímos ao
longo dessa trajetória influenciando a formação do saber profissional; (2) o
segundo sentido é que os primeiros anos de experiência profissional são
fundamentais para construção de crenças e algumas referências profissionais;
(3) e por último, o sentido de que o saber profissional do professor é construído
ao longo da sua carreira, isto é, da sua trajetória profissional (TARDIF, 2002).
Os saberes profissionais dos professores são temporais no sentido de
que são construídos historicamente. Temos uma longa história de vida
vivenciada na escola e essas experiências compõem uma das referências na
construção do perfil profissional dos professores.
Os depoimentos das professoras respondentes evidenciaram essa
característica, principalmente no seu primeiro sentido, ao ponto de duas delas
afirmarem que a trajetória escolar e a relação com alguns professores
influenciou decisivamente sua escolha do Curso e a construção de sua imagem
como professora.
Uma delas afirmou que sua postura atual como professora, sua prática
em sala de aula e sua identificação com determinadas concepções
pedagógicas estão diretamente relacionadas com as práticas de alguns
professores de Educação Física que lhe deram aula ao longo do segundo grau.

... Em minhas andanças ainda no 2º grau, a vontade de ser


professora surgiu, vinculada ao gosto pela Educação Física, ao
afeto existente em relação a alguns professores desta
disciplina. Mas a paixão interesse, irá se proliferar, quando
entro para o grupo de dança da escola.
60

Ao mesmo tempo as experiências vividas enquanto aluna não são


somente positivas ou boas, as recordações ruins, negativas da prática de
alguns professores também foram referência de como não ser.

... Hoje digo sem medo, sou professora. O que acredito é que
anteriormente o que acontecia comigo é que ao dizer sou
professora ou assumir corporalmente esta postura implicava
em ser autoritária, ser diretiva, abuso de poder... tudo aquilo
que me causou nojo. Com certeza reflexo claro translúcido de
alguns professores que tive ao longo da vida.

É interessante destacar que Cunha (1996, p. 159-160), em suas


conclusões sobre as influências significativas na formação dos professores
participantes do seu estudo destacava a referência dos ex-professores. Em
muitos casos esta influência se manifestava na tentativa de repetir atitudes
consideradas positivas. Em outras, há o esforço de fazer exatamente o
contrário do que faziam os ex-professores considerados negativamente, assim
como nossas participantes da pesquisa.
Ainda nesta perspectiva, do saber que é construído ao longo da história
de vida, todas elas evidenciaram, de maneira muito forte, uma relação afetiva
pela escola, ou, pelo menos, por alguns espaços e momentos vivenciados,
como o grupo de dança ou a equipe esportiva.
Uma das professora no exercício da memória pedagógica fez a
seguinte afirmação:

As palavras falaram-me da escola, falaram que assim como eu,


elas também não gostavam da escola. Disseram que preferem
ficar nas caixas do que ficar apenas sendo copiadas por alunos
que tem potencial para muito mais do que isso. Realmente, eu
não gostava de ir para a aula, achava muito chato ficar um
turno inteiro copiando coisas do quadro, fazendo exercícios,
escutando os professores, ficar sentada todo esse tempo, que
tortura. Preferia ficar brincando com os meus amigos do que ir
para a escola, mas existiam alguns espaços na escola que
satisfaziam essa minha inquietação, por exemplo as aulas de
61

Educação Física, de Educação Artística, de Trabalhos


Manuais.

Ao mesmo tempo que ela afirmava não gostar da escola, deixava clara
a referência em um tipo de escola que mantém os alunos sentados,
escrevendo, sem fala, nem movimento. Pareceu entender, porém, que uma
outra escola é possível, que recupera o lúdico, as brincadeiras, jogos,
atividades artísticas, manuais e corporais. Essa concepção de escola irá
perpassar toda sua formação e fazer parte das suas preocupações no estagio.
Este interesse por crianças e pelo lúdico está muito presente na sua história
escolar, permanecendo em sua formação e no inicio de sua prática profissional,
caracterizando bem este primeiro sentido da temporalidade.
Esse gostar de brincar, de jogar, de dançar, a preocupação com o
corpo e o movimento, além de ser um dos elementos que levou as professoras
respondentes da pesquisa para o Curso de Educação Física é também um
elemento central na construção das suas práticas e fundamental na formação
do saber-ser e saber-fazer.
Quanto ao segundo sentido dado à temporalidade, que se refere a
importância dos primeiros anos de exercício profissional na construção de
crenças e referências, não podemos percebê-lo claramente nas narrativas das
respondentes, tendo em vista que estamos explorando o período do estagio
curricular, em geral, a primeira experiência docente dos estudantes.
Ao falar sobre ela afirmam que o estágio, apesar do seu significado na
formação, distância muito o aluno do contexto da escola. Os estagiários quase
não convivem com os demais professores e com a direção da escola, pois,
normalmente, chegavam na escola apenas para dar as aulas.
Mesmo assim afirmam não ter tido problemas com os demais
professores ou com a estrutura organizacional da escola. Na prática a
estagiária vai à escola, tem sua turma, dá sua aula, mas não se insere no
cotidiano da escola.
A dinâmica diária da escola, os seus problemas e contextos, os
tensionamentos externos à escola não chegam a ser apreendidos pelos alunos.
No estágio a realidade é apreendida parcialmente muito diferente da situação
que acontece no momento em que o professor realmente assume uma
62

atividade profissional na escola.


O estágio não possibilitou, segundo as alunas, vivências do cotidiano
escolar. A própria relação com a direção ou com outros professores
praticamente não existiu; não houve participação em outros espaços da escola,
no planejamento, nas discussões ou decisões sobre o cotidiano. A única
atribuição das estagiárias era trabalhar durante o período das aulas de EF.

... nunca participei de um Conselho de Classe, nunca fui


convidada. Me dava bem com o pessoal da Educação Física,
não me lembro de ter falado com mais ninguém da escola.

... não tinha relação com a estrutura da escola... a professora


titular da turma saiu de licença e fiquei sozinha. Não havia
apoio nenhum da escola, o estagiário ia lá dava sua aula, ia
embora.

A realidade do estágio, além do pequeno tempo de duração,


impossibilita a apropriação das questões do cotidiano da escola, constituindo-
se, apenas, como um período de inicio da construção dos saberes profissionais
do futuro professor.
A lógica da formação universitária, assim como a organização da
escola tradicional, reforça a compreensão de que a aprendizagem se dá pela
acumulação de conhecimento reunidos ao longo do tempo e que, depois,
podem ser aplicados no exercício profissional.
Nessa concepção o estágio é entendido como um espaço privilegiado
onde o aluno deverá aplicar aquilo que apreendeu durante o Curso, e esse
será o principal critério de sua aprovação. Essa perspectiva gera ansiedade
nos alunos, pois imaginam que devem dar conta de tudo o que gostariam ou
acreditam que deveriam desenvolver com seus alunos. Crêem que precisam
aplicar o que estudaram ao longo do Curso e acabam encontrando situações e
conflitos para os quais não se sentem preparados.
Pimenta, a partir das pesquisas de Piconez, 1991; Pimenta, 1994;
Leite, 1994, afirma que,

em relação à formação inicial, os cursos de formação tem


63

desenvolvido um currículo formal com conteúdos e atividades


de estágio distanciados da realidade das escolas, numa
perspectiva burocrática e cartorial que não dá conta de captar
as contradições presentes na prática social de educar, pouco
contribuindo para formação de uma identidade profissional
docente (1998, p. 162).

Segundo as entrevistadas, na Faculdade se criava um imaginário de


que o estágio seria um momento terrível, turmas com excesso de alunos,
escolas sem material, alunos problemáticos, etc. além de ser um momento de
avaliação - onde era preciso colocar tudo o que foi aprendido em prática, quem
não conseguisse não seria uma boa professora!
Ao longo da graduação fica distante a idéia de que o saber do
professor é construído ao longo de uma carreira, em sua trajetória profissional,
terceiro sentido da temporalidade dado por Tardif (2002).
Para os autores o conhecimento é construído e não adquirido ou
simplesmente acumulado ao longo da formação universitária, portanto é
preciso romper com a idéia de que o aluno sai pronto do curso de Formação.
A carreira define em muito os saberes dos professores, o cotidiano
profissional vai demandar e construir muitos dos seus saberes, formular e
reformular algumas convicções, reforçar e modificar outras. O diálogo com os
outros professores, a estrutura e a organização da escola, vai influenciar na
formação da identidade do professor.
No caso desse estudo foi difícil evidenciar esse sentido em sua
plenitude, por tratar-se de uma análise da formação inicial de estudantes do
Curso de Licenciatura Plena em Educação Física.
Ainda assim alguns elementos trazidos de suas experiências, da forma
como planejavam suas aulas e como buscavam solucionar os problemas
encontrados, de certa forma apontavam para o entendimento das afirmações
anteriores.
Ao perguntar, às nossas respondentes, quais foram as principais
referências que embasaram a hora de planejar suas aulas no estágio, as
respostas foram bem diversas: experiências anteriores; exemplo de planos de
aulas de professores da faculdade; subsídios diversos; trocas de experiências
com os colegas de estágio e com os alunos. Apesar da diversidade de
referências todas efetuavam algum tipo de planejamento a partir de
64

experiências vivenciadas anteriormente.


Um dos elementos mais interessantes em relação a construção do
saber profissional surgiu quando comentaram como solucionavam os
problemas ou dificuldades encontradas durante a realização de suas aulas.
Todas procuravam fazer mediações e dialogar com os alunos. Entretanto
algumas delas afirmaram ter mais dificuldade em construir proposta de trabalho
com a participação dos seus alunos.

... procurava conversar com eles, e as vezes o que acontecia é


que alguns não faziam a aula. Quando insistia em realizar
minha proposta a resistência era maior ... eles queriam jogar
futebol, porque jogavam todo os dias. Tentava explicar porque
não poderíamos jogar sempre.

Esse processo de mediação encontrado pelas professoras


respondentes aproxima-se à compreensão de Cunha et alii quando descreve a
mediação como o espaço das relações que envolvem o professor, aluno e
conhecimento (2001, p.76). A maioria delas ao deparar-se com as dificuldades
de contemplar suas expectativas e concepções, desenvolver um conteúdo e a
falta de motivação dos alunos diante de algumas propostas procurou
alternativas para minimamente desempenhar o seu papel de professora. Sendo
a mediação a construtora de pontes que permitem as travessias dos
aprendizes (CUNHA et alli, 2001, p.77), nesse caso percebesse que as
participantes da pesquisa buscavam contribuir nessas travessias ao mesmo
tempo que encontravam suas próprias pontes enquanto alunas/professores.
Entre as professoras que afirmaram ter tido mais facilidade de efetivar
sua proposta de aula, houve uma que salientou a importância de ter, ao longo
do seu estágio, o acompanhamento constante da professora titular da turma a
quem recorria sempre que encontrava algum problema. Elas conversavam
sobre os acontecimentos, sobre as dificuldades e sobre como realizar as
atividades com mais possibilidade de êxito.

... ela era muito legal! ... sempre deu aula de ginástica na
AABB, e trabalhava já fazia um tempão só com 4º série lá na
65

escola, ela era muito acessível, a gente trabalhava e ela me


dizia porque não tinha dado certo, ela me dizia isso não
funcionou por isso, isso e isso, isso funcionou por que tu fez
assim, aquilo tu vai passa sempre. A gente sempre conversava
depois da aula...

Isso a ajudou muito, pois a professora da turma já acompanhava os


alunos há algum tempo. Ela assistia as aulas e depois conversava sobre o que
havia acontecido. Essa troca de experiência possibilitou uma certa
tranqüilidade para a estagiaria porque discutia com a professora as dificuldades
da aula e isso a ajudava no enfrentamento das atividades diárias.
Esse processo acontecia depois da aula em discussões com a
professora quando tudo era muito recente e significativo para a estagiária. Essa
é uma condição nem sempre possível com o professor universitário que orienta
o estágio. Muitas vezes o estudante só o encontra passado alguns dias de sua
prática docente o que torna mais complexo o processo de reflexão sobre a
experiência vivida.
Essa situação aparece como reflexo da lógica que, em geral, preside a
estrutura dos Cursos de Licenciatura pensados na perspectiva de que o
aprendiz precisa dominar a teoria para depois entender a prática e a realidade
[...] definindo a prática como comprovação da teoria e não como sua fonte
desafiadora (CUNHA, 1998, p. 28). Em parte devido a esta lógica o Curso opta
por não partir da prática, do vivido, como elemento gerador da dúvida, da
reflexão e do conhecimento, tendo sua estrutura voltada para as cadeiras
teóricas durante a maior parte da formação e localizando a prática ao final da
formação, onde resta poucas possibilidades dos orientadores do estágio
dialogarem com o conjunto dos alunos.
A exemplo disso as outras professoras entrevistadas não tiveram esse
relacionamento constante com os professores responsáveis pelas classes
assumidas. Ainda assim, elas procuravam, como alternativa para solucionar os
problemas, conversar entre elas mesmas ou com o coordenador do estágio
quando possível. Discutiam as aulas e os problemas que enfrentavam
coletivamente na busca de novas possibilidades.
Para uma das respondentes no estágio não foi difícil encontrar
66

soluções aos problemas e conflitos surgidos. Um dos motivos dessa facilidade,


na avaliação dela, foi o conjunto de experiências diferentes que havia vivido
durante os pré-estágios e os projetos que participou durante a formação na
Faculdade. Trabalhou com meninos e meninas de rua, e em alguns projetos de
modalidades esportivas, bem como com Educação Física para portadores de
necessidades especiais.

... desde o 2º semestre trabalhei com Educação Especial e em


pré-estágios... sempre procurei vivenciar prática com teoria e
quando acabou os pré-estágios eu continuei trabalhando...
trabalhei com os meninos e meninas de rua... foi uma
experiência jóia, por que é um grupo difícil. Trabalhar com
meninos e meninas de rua é muito difícil por isso quando eu fui,
na Prática de Ensino, para o colégio, me lembrou muito o
trabalho com os meninos e meninas porque era um colégio de
periferia. Todo mundo dizia “esse colégio é difícil de trabalhar”
e para mim foi barbadinha. Lembrava do trabalho com os
meninos de rua e me senti motivada. Quem trabalha com
meninos e meninas de rua, trabalha com qualquer aluno, até
porque eu não tinha muito material na escola e isso não me
dava medo.

As experiências práticas vividas ao longo do curso aparecem como


outro elemento significativo percebido entre todas as respondentes. As
professoras entrevistadas apontaram a experiência nos pré-estágios, as aulas
que davam fora da Faculdade e a vivência com projetos envolvendo crianças
como significativas na formação.

... trabalhar durante o Curso fazendo um estágio em uma


escola me ajudou bastante no pensar a profissão, pensar como
atuar, as coisas que vinham acontecendo dentro das aulas...
quando tu te distancias da realidade das disciplinas da ESEF,
então percebes o pouco respaldo que elas te dão para dar
aula.

... acho que os pré-estagios foram fundamentais, eu fiz além


67

dos obrigatórios. Depois fiz um monte com crianças e um em


escola. Acho que como o Curso forma professores, é
fundamental ter essa vivência dentro da sala de aula.

Ainda assim, nem todas conseguiram estabelecer uma prática


satisfatória durante o estágio mesmo aquelas que traziam várias destas
experiências nas suas trajetórias. Inclusive três delas tiveram muita dificuldade
na relação com seus alunos, diferente do que tinham vivido em outros espaços
fora do estágio.

Que as palavras falem o que meu corpo é... e que meu corpo
seja as palavras. É isso que penso e tento diariamente viver
hoje em minha prática pedagógica. Que se construiu
inicialmente (prática de ensino) com muitas lágrimas, carregada
de um sentir-se impotente, fraco.

Parecia que vivíamos da Prática de Ensino, de tanto que


comentávamos nossas experiências, nossos erros, nossos
acertos, nossas dúvidas (e quantas foram, e ainda são!),
nossas angústias, o sentimento de impotência que muitas
vezes tomava conta. Eu me sentia pequena frente a toda
estrutura da escola, pequena, perto daquela idéia romântica de
mudar muitas coisas num curto espaço de tempo.

Parece que foram as vivências práticas no espaço da escola, na busca


de alternativas aos conflitos, que demandaram novos saberes e as fizeram
sentir a necessidade de recorrer ao diálogo, seja com os alunos, com seus
colegas ou com o coordenador do estágio, para efetivamente resignificar os
conhecimentos da formação inicial.
Para Pimenta é justamente no processo permanente de reflexão sobre
sua prática, mediatizada pela de outrem – colegas de trabalho, textos
produzidos por outros educadores, relatos de experiências, que o professor
elabora, em parte, o seu saber da experiência (1998, p. 166).
Analisando as vivências significativas, apontadas pelas professoras da
pesquisa, fica explícito que, no momento em que realizaram o estágio, as
68

experiências mais marcantes advindas da sua trajetória de formação, foram


aquelas que envolviam atividades práticas de exercício da atividade docente,
assim como atividades de pesquisa e extensão ou de participação no
Movimento Social, principalmente no movimento estudantil.
Atividades como pré-estagios, envolvendo crianças dentro ou fora do
espaço escolar, de observação e discussão da prática docente, vivências de
grupo dentro do movimento estudantil e do PET/ESEF13, bem como a
participação em seminários, congressos e encontros, estágios ou trabalhos
realizados na área da Educação Física, foram as experiências apontadas como
significativas pelas professoras. Essas experiências de complementação
curricular tiveram muita importância no momento da prática de ensino.

... as experiências [pré-estágios, participação no movimento


estudantil, aulas de dança e ginástica] permitiram um outro
olhar sobre as disciplinas dentro da sala de aula da ESEF.

...Vivi minha vida acadêmica de forma intensa, todos os


espaços que me era possível estar, lá estava eu. A vivência no
diretório acadêmico, como também a do PET foram
extremamente significativas para minha formação, ambos por
proporcionarem momentos de reflexão, questionamento,
aprendizado além, ou quem sabe, muito além da “formalidade
das disciplinas”.

Muitas foram as falas das professoras explicitando a importância das


experiências práticas de sala de aula, na escola, com crianças, para a
formação. Estas vivências podem ser relacionadas com o que os autores
descrevem como saberes da experiência, os quais, para Tardif (2002), são
Plurais e Heterogêneos - 2º Característica dos Saberes Docente - e possuem
três sentidos.
O primeiro sentido é que o saber do professor não provém de uma
única fonte pois não existe um único saber. O professor dispõe de diferentes
saberes oriundos de diferentes fontes e na sua prática profissional mobiliza

13 Programa Especial de Treinamento da CAPES.


69

estes diferentes saberes conforme suas necessidades.


Para Tardif et alii (1991) o saber plural é composto por diversos
saberes, entre eles, o saber das disciplinas, o saber curricular, o saber da
tradição pedagógica, também destacado por Gauthier et alii (1998), além do
saber da experiência.
O saber das disciplinas decorre dos conhecimentos acumulados
historicamente pelo homem e organizados no ensino em diferentes disciplinas
com conteúdos pré-determinados. Na Educação Física temos os
conhecimentos dos esportes como estruturante do currículo, ou seja, o
Basquetebol, o Andebol, o Voleibol, cada um desses com seus conteúdos,
fundamentos, formas de jogar, história, etc.
Na área pedagógica, também presente, estão as disciplinas
curriculares que articulam os conhecimentos de História da Educação,
Psicologia, Estrutura e Funcionamento do Ensino e as Metodologias do Ensino.
A questão principal é que, em geral, o ensino disciplinar da escola e da
graduação deixa a desejar, como se evidência no caso da formação das
professoras pesquisadas. A possibilidade de vivenciar experiências práticas, de
criar alternativas aos conflitos do espaço da aula não é tomado como questão
curricular, para onde precisariam ocorrer os saberes de todas as disciplinas de
formação. Na trajetória acadêmica das respondentes aparentemente não
apontou respostas sobre como ensinar os diferentes conhecimentos e os seus
conteúdos específicos? Que relações fazer entre os diferentes conhecimentos?
Qual o papel desses conhecimentos para a vida? Explicitando algumas
questões frágeis nessa formação acadêmica.
Os conhecimentos das disciplinas, assim como foram construídos
historicamente pelo homem, precisam ser resignificados para poderem ser
úteis e dar conta da prática em sala de aula. Além disso, existem saberes que
o professor e os alunos carregam consigo e outros dos quais vão se apropriar
ao longo das suas formações.
No caso dos professores, as suas vivências anteriores envolvendo
determinados conhecimentos, bem como sua bagagem cultural são elementos
fundamentais para que possa resignificar os conteúdos, e fazer relações entre
o seu saber e os saberes dos seus alunos.
O saber curricular é constituído basicamente pelos programas e
70

objetivos educacionais. Esses programas com seus objetivos, o discurso e a


proposta político-pedagógica da escola são elementos com os quais o
professor interage e influenciam a sua prática profissional. O saber das
disciplinas, o relacionamento entre o professor e os alunos, entre os próprios
professores e também com a direção da escola são mediados pelo saber
curricular.
O que foi possível constatar é que no momento do estágio curricular,
no caso desse estudo, os conhecimentos trabalhados nas disciplinas, o
conteúdo formal da grade curricular, os saberes das disciplinas e os saberes
curriculares não foram os elemento mais significativos apontados, pelo
conjunto das professoras respondentes, para o exercício da docência.

As experiências que vivenciei durante esses anos, foram de um


crescimento enorme para mim, principalmente aquelas ditas
extracurriculares [aqui a professora se refere,
fundamentalmente, as experiências práticas vividas dentro e
fora do curso]. E considero essa a melhor formação,
principalmente sob aspectos humanos, que podemos ter nesse
período que passamos na universidade. Uma formação que vai
muito, mas muito além da sala de aula!

... os aspectos metodológicos não me marcaram muito, o que


mais marcou foram as relações afetivas com o professor que
tinha no estágio, com os alunos... eu não aprofundei regras de
Futebol, sinceramente acho que não fez falta.

Retomando a proposta de Tardif et alii (1991), o depoimento das


professoras, valorizam, fundamentalmente os saberes da experiência, mesmo
que esses, desde a condição de estagiárias, fossem, ainda, iniciais.
Para os autores, esse é um saber em geral desconsiderado pelas
escolas e principalmente pelos centros de formação. É um saber construído
pelo professor no seu cotidiano através da sua prática.
Os professores em determinadas situações aprendem que podem agir
de uma certa maneira, que devem trabalhar de uma ou outra forma, mesmo
que ninguém tenha definido previamente para ele aquele padrão. São as
71

experiências ou vivências que o professor tem ao longo de sua trajetória de


vida, de sua formação e de sua prática que definem esse saber-fazer.
Gauthier et alii (1998), se referem ao saber da experiência como um
saber que pode ser caracterizado de duas formas: um saber experiencial que é
aquele construído individualmente pelo professor na sala de aula; e um saber
da ação pedagógica, que nada mais é que o saber experiencial de cada um a
partir do momento em que se torna público através de pesquisas realizadas em
sala de aula.
De certa forma poderíamos dizer que o saber experiencial tende a se
tornar um conhecimento válido à medida que é sistematizado e organizado,
passando a ser um conhecimento pedagógico público. Essas duas dimensões
que deveriam ser consideradas na formação inicial, raramente o são, e o saber
da experiência é pouco estudado e mesmo reconhecido durante o Curso.
Gauthier et alii (1998) ressaltam a necessidade de desmitificar a
concepção de que o saber da experiência seja um saber de menor importância,
de que o conhecimento cientifico está fora da sala de aula, de que o saber que
o professor constrói na sua prática profissional é menos válido do que o
conhecimento cientifico.
Na verdade os saberes envolvidos no processo de trabalho do
professor são diversos, alguns mais elaborados e sistematizados e outros mais
iniciais. O saber experiencial ou o saber da ação pedagógica diferenciam-se
unicamente pelo processo de sistematização e análise ao qual o conhecimento
do professor, construído no seu espaço profissional, é submetido. E esse
deveria ser basicamente o papel pedagógico da pesquisa.
Em outras palavras o saber da ação pedagógica é o saber experiencial
que passou por algum tipo de processo de estudo ou sistematização, que são
as características do conhecimento científico: o distanciamento, a análise, a
proposição de problemas que aquela prática apresenta e depois, a partir da
análise levantar elementos de possíveis generalizações.
O saber da sala de aula não tem se tornado um conhecimento cientifico
porque não costuma passar por um processo de organização, de
sistematização e de análise. A partir do momento em que elaboramos questões
sobre a cotidianeidade da sala de aula e fazemos reflexões e análises sobre
elas, pesquisando suas possibilidades e construção, começamos a constituir
72

um conjunto de elementos que podem servir de ponto de partida para a


produção de conhecimentos científicos sobre o saber docente.
Em síntese as maiores críticas ao Curso de formação feitas pelas
professoras respondentes foram relacionadas ao não reconhecimento do saber
da experiência. Para elas o Curso dedicava pouco tempo e pouca importância
as atividades de reflexão sobre a prática cotidiana da escola e sobre as
experiências que elas desenvolviam em espaços de prática. Destacaram a falta
de articulação entre as disciplinas e a falta de discussões sobre a finalidade e a
aplicabilidade dos conteúdos nelas desenvolvidos.
Chamou a atenção justamente o fato das professoras considerarem
pouco significativo as disciplinas acadêmicas que vivenciaram durante a
formação inicial, especialmente como suporte da ação cotidiana que
precisavam desenvolver na sala de aula.
Algumas delas criticaram as disciplinas do Curso, principalmente pela
falta de relação entre suas propostas. Para as professoras respondentes a
maioria das disciplinas foram trabalhadas de forma fragmentada, com um fim
em si mesmas, além de apresentarem conteúdos distantes da realidade.
Afirmaram também que, em geral, as disciplinas não buscavam relacionar os
conteúdos específicos a uma prática profissional.

... quando tu estás em sala de aula [disciplinas da graduação]


fica só vendo, “tem que fazer assim, tem que fazer assado”;
eram coisas que estavam nos livros, nos meus cadernos e eu
não conseguia ligar com a prática; até porque acho que às
vezes se tem pouca prática na universidade. As matérias não
te oferecem muita prática, só vai ter prática nos pré-estagios.
Quando eles acabam não tem mais prática, só no estágio... Por
isso foi muito importante prá mim, estar sempre participando de
um projeto de extensão; porque não se tem prática dentro das
disciplinas da universidade... e depois no final, a Prática de
Ensino, você cai de pára-quedas na escola.

O fato delas afirmarem como significativa essa experiência reforça a


conclusão de que alguns elementos formadores da prática profissional não
estão colocados como centralidade no currículo, não perpassam as disciplinas
73

do Curso, ou outros elementos do Ensino, localizando-os na extensão e/ou na


pesquisa universitária.
A possibilidade de conhecer e vivenciar um espaço político, de
contextualizar alguns conhecimentos da formação a partir de uma leitura de
mundo, conseguir extrapolar o universo da sala de aula e identificar algumas
contradições sociais maiores determinou, significativamente, a formação da
profissionalidade dessas professoras.
Parece que as nossas professoras respondentes que estiveram
envolvidas no movimento estudantil desenvolveram uma certa criticidade diante
do Curso, das disciplinas e dos professores da graduação, uma concepção
mais explicita sobre o papel do professor e sobre a experiência da Prática de
Ensino. Muitas delas participaram de momentos de discussão sobre a reforma
curricular promovidos pelo próprio diretório acadêmico.
É fundamental frisar que as conclusões que todas as cinco apontam
sobre o papel das disciplinas na formação são bastante semelhantes,
independentemente de outras experiências acadêmicas. Quando questionadas
sobre o que manteriam e o que mudariam no Curso responderam que
mudariam a relação das disciplinas umas com as outras e que deveria ser
aprofundado o conhecimento sobre a realidade, além de incluírem mais
atividades de vivência prática na escola.

... acho que deveria haver mais prática em escola, já que eu


estou fazendo uma licenciatura. Na escola e em outros lugares
porque a gente sabe que o nosso campo de trabalho não é só
escola.

... se o curso é voltado para escola porque eu vou aprender


determinados conhecimentos [faz referência a um conteúdo da
área de treinamento desportivo de alto rendimento], claro tem
coisas que temos que aprender pois vamos lidar com o corpo
das pessoas, mas precisam ter um significado mais voltado
para escola, para nossos alunos...

As falas da professoras explicitam uma contradição entre o que é


colocado como significativo e a lógica que preside o currículo dos Cursos de
74

graduação, estruturados de forma fragmentada, com uma concepção de


conhecimento positivista, entendido de maneira linear: do geral para o
particular, do teórico para o prático, do ciclo básico para o profissionalizante e
trabalhando com o conhecimento do passado, privilegiando o conhecimento
que a ciência já legitimou (CUNHA, 1998, p. 28).
Uma das professoras enfatiza que o Curso deveria ser um pouco mais
exigente enquanto para outra é necessário que as disciplinas possibilitem a
construção de relações entre o conhecimento e a realidade, o que demonstra
que as possibilidades de elaboração e apropriação do conhecimento através
das disciplinas, mesmo a partir de pontos de vista diferentes, não
contemplaram as expectativas dessas professoras.
Outra experiência marcante na formação de três das professoras
participantes desse estudo foi a passagem pelo Programa Especial de
Treinamento – PET. Os grupos PET funcionavam com a participação de doze
alunos selecionados que recebiam uma bolsa para estudos e para cumprirem,
além da carga horária regular 12 horas semanais de atividades especificas.
Estas deveriam envolver pesquisas, além da organização e participação em
eventos. O projeto caracterizava-se como uma iniciativa no sentido de constituir
futuros pesquisadores como uma iniciação aos mestrados, doutorados e
possível docência universitária.
A experiência no Grupo PET apareceu como significativa para as três
professoras que dela participaram pelos diferentes conteúdos discutidos, pela
ampliação da bibliografia que incluía diferentes autores, pela participação em
eventos e pelo estímulo à produções escritas por parte dos alunos.
Esse sentido da pluralidade do saber, de ser oriundo de diversas
fontes, mesclado de diferentes influências, perpassa os depoimentos e aponta,
inclusive, para o fato de que alguns saberes foram mais significativos do que
outros em função do momento e do contexto em que foram vivenciados. Por
exemplo, os conteúdos das diferentes disciplinas são importantes, pois são os
conhecimentos historicamente construídos e validados socialmente mas, no
cotidiano das professoras, eles tiveram de ser resignificados para que
pudessem ser trabalhados com os alunos. Elas mobilizaram outros saberes
para lidar com esse conhecimento e estes foram tão importantes quanto o
conhecimento disciplinar em si.
75

Essa constatação reforça a afirmativa de Tardif (2002) de que os


saberes dos professores são heterogêneos e variados, pois são ecléticos e
sincréticos. Os autores defendem que por mais que tenhamos convicções,
nunca conseguimos usar somente uma teoria, porque ela não é suficiente para
explicar a complexidade da realidade. No caso das professoras respondentes
foi difícil construir uma síntese que articulasse os diferentes referenciais
teóricos das suas práticas, provavelmente porque elas estavam vivendo um
estágio inicial de inserção na atividade profissional. Leva-se algum tempo para
construir uma síntese e essa não é uma caminhada linear. Há momentos de
coerência com uma determinada concepção e outros plenos de contradições,
sendo realmente eclético e sincrético.
De acordo com os autores citados, raramente o professor aplica uma
única teoria, uma concepção unitária da prática.
A visão de educação e de escola que as professoras apontaram
explicitaram diferenças, mas a busca de coerência entre as suas práticas e
essa visão foi um elemento comum para todas. Essa busca, em muitos
momentos, gerou alguns conflitos no enfrentamento da prática. Quando
discutimos as dificuldades encontradas durante o estágio três delas apontaram
como central a construção da relação educador-educando na sala de aula.
Essas professoras, ao iniciar o estágio, afirmavam defender com muita
convicção uma relação educador – educando não autoritária, de construção a
partir do diálogo. Entretanto, a medida que iniciaram o trabalho com seus
alunos perceberam as dificuldades em conciliar interesses, expectativas dos
envolvidos e reverter alguns casos de desmotivação dos alunos nas aulas de
Educação Física.
A dificuldade encontrada para resolver determinados conflitos na sala
de aula sem cair em contradições, com a idealização do discurso que
construíram, foi um componente de desgaste durante o estágio. Três
estagiarias chegaram a se questionar quanto a possibilidade de desistir do
Curso neste momento.
O tensionamento entre a cobrança de cumprir conteúdos e programas,
ter o domínio da classe, desenvolver o planejamento, escutar os alunos,
motivá-los e a convicção de que não deveriam ser autoritárias, provocou
diversas crises. A necessidade de conciliar autoridade sem exercer o
76

autoritarismo, apresentou-se como um grande nó na experiência docente das


participantes desse estudo.
O professor não tem um objetivo único dentro do seu trabalho, mas
transita entre diversos objetivos. Num determinado momento da aula, seu
objetivo é construir regras de convivência com os alunos. Noutro, pode ser
desenvolver um determinado conteúdo ou construir um conhecimento
especifico sobre algo.
Esses objetivos terão ênfases diferentes durante o trabalho do
professor, precisando ser planejados e alterados ao longo da aula. Em
determinado momento poderão priorizar algumas coisas e em outros, dar
ênfase a outras. O objetivo maior de uma aula pode ser construir relações de
solidariedade e de coletividade entre os alunos e/ou definir regras esportivas e
de condução de uma determinada modalidade esportiva.
Tardif (2002), ressalta que para ocorrer essa alternância de objetivos o
professor necessita mobilizar diferentes saberes. São saberes necessários
para viabilizar a construção do espaço da aula e para concretização do espaço
profissional de atuação do professor.
Essas construções dos professores no espaço da sala de aula, em
geral, são individuais, ainda que o processo de construção do conhecimento
seja necessariamente coletivo. Cada sujeito se apropria de diferentes formas
de um mesmo conhecimento de acordo com sua trajetória, sua história de vida,
seus referenciais, seu temperamento, suas características e os resignifica, em
relação ao contexto em que se localiza.
Essa apropriação e resignificação do conhecimento pelo professor nos
permite aprofundar a terceira característica do saber profissional. Segundo
Tardif

... os saberes profissionais são personalizados e situados. Por


isso, o estudo dos saberes profissionais não pode ser reduzido
ao estudo da cognição ou do pensamento dos professores
(teacher's thinking)... Um professor tem uma história de vida, é
um ator social, tem emoções, um corpo, poderes, uma
personalidade, uma cultura, ou mesmo culturas, e seus
pensamentos e ações carregam as marcas dos contextos nos
quais se inserem (2002, p. 264 – 265).

De fato a trajetória de vida de cada uma das professoras entrevistadas


77

definiu muitas de suas escolhas e a própria postura durante a formação inicial.


Duas delas viveram dificuldades semelhantes em relação ao trabalho
com os alunos, apesar de ambas terem uma experiência significativa com
dança fora do espaço da Faculdade, trabalhando em academias e clubes. Ao
tentarem desenvolver este conteúdo na escola perceberam que os alunos
tinham muita resistência e até preconceito em relação a dança, já que muitos
deles estavam habituados a vivenciar somente o futebol ou o voleibol como
conteúdos das aulas de Educação Física.
Segundo elas a experiência da aula de dança no clube ou na academia
onde as crianças estavam motivadas e com um objetivo comum de aprender a
dançar, tornava bem mais fácil a tarefa. Já na escola a situação era outra, o
conteúdo continuava sendo a dança, seja o Jazz ou a dança Afro, mas a
dificuldade estava no fato de que nem todos os alunos queriam dançar, e elas
precisavam então repensar a forma de encaminhar suas aulas, como
resignificá-las para que a aula obtivesse algum resultado.
Para cada uma das professoras o processo de resignificação,
aconteceu de maneira diferente, apesar de ambas reconhecerem a
necessidade de, constantemente, reorganizar o processo de ensino diante da
diversidade dos alunos, do espaço e do momento da aula.

... nunca pensei em ser professora, mas eu me lembro que


quando via na teoria tudo funcionava... A gente vai fazer as
aulas práticas dentro da ESEF e tudo funciona. A gente fica
empolgado, então qualquer brincadeirinha assim era uma festa,
a gente jurava que ia dar certo, as crianças vão adorar. Ai tu
chegas para aplicar isso e as crianças dizem “-- não quero, não
gosto, não gostei vamos jogar!” No estágio acontece muito
isso, não dá para fazer isso com as tuas crianças de 4º série,
eu acho que isso a gente aprende, a chegar na hora e ter um
plano prontinho e não fazer nada daquilo... Tem que fazer
totalmente diferente.

Nos relatos foi possível perceber que as alternativas encontradas para


a construção das atividades, ou para solução de problemas na sala de aula,
foram elaboradas individualmente no cotidiano do trabalho no estágio. Em geral
78

estas dificuldades referiam-se a como envolver os alunos na aula ou como


trabalhar conteúdos que os alunos não estavam com adequada prontidão.
Entre os problemas mais freqüentes as respondentes deram significado
especial à necessidade de replanejar seu trabalho em função da motivação dos
alunos. Nesse replanejar tiveram que começar a repensar os conteúdos, a
forma de trabalhar e a própria postura como professoras, encontrando suas
alternativas.

... eu gostava de anotar e depois da aula retomar o que fiz. Isso


ajudava a refletir.

... o planejamento era uma orientação. As vezes eu insistia e a


aula não funcionava.

...eles não queriam fazer! Eu chegava lá e... a aula não


acontecia... achava que era minha proposta ai mudava... eu
não queria ser autoritária.

É interessante que para todas as professoras participantes da pesquisa


a referência da história de vida, principalmente escolar, a leitura que elas
fizeram do Curso e o conjunto de vivências e experiências que elas tiveram até
aquele momento, influenciaram fortemente a definição de uma
profissionalidade, um saber-fazer e saber-ser.

... Misturar as caixas é permitir ao meu entender que esta


escrita seja eu. Falar de como se construiu este ser professora
hoje de Educação Física... como diria Toni Garrido em
Estrada...você não sabe quanto eu caminhei para chegar até
aqui, percorri milhas e milhas... mas hoje sou Professora!

Na medida que a constituição da profissionalidade dessas professoras


está fortemente ligada a trajetória pessoal de cada uma, o saber delas é
conseqüentemente um saber personalizado. Um conhecimento autobiográfico,
como nos chama a atenção Santos, hoje sabemos ou suspeitamos que as
nossas trajetórias de vida pessoais e coletivas e os valores, as crenças e os
79

prejuízos que transportam são a prova íntima do nosso conhecimento (1995, p.


53).
Mas, assim como elas expressaram as características que cada uma
deu a sua experiência na Prática de Ensino, em função dos diferentes
contextos que encontraram, manifestaram também que este conhecimento
necessariamente foi um conhecimento situado.
Segundo elas a experiência na sala de aula possibilitou com que
superassem, de alguma forma, a critica pela critica ao trabalho do professor.
Ao invés de apenas ficarmos falando da escola, em ser professora, estivemos
presentes e envolvidas na escola durante um semestre.
Este envolvimento significou para elas a possibilidade de refletir sobre
os seus conhecimentos em função de um contexto e de uma realidade.
Além dessa percepção de que o conhecimento do professor é
personalizado e situado, pois a ação do professor se dá muito a partir da sua
história e em um determinado contexto, a experiência das professoras na
Prática de Ensino também explicitou a quarta característica apresentada por
Tardif (2002, p. 266): o objeto do trabalho docente é o ser humano, e por
conseguinte o trabalho docente carrega as marcas do ser humano.
As dificuldades encontradas, principalmente por três participantes do
estudo, estavam relacionadas diretamente com esta característica. Se o
trabalho docente carrega as marcas do ser humano, ou seja, se o professor é
um sujeito histórico com conceitos e pré-conceitos, encharcado de cultura, ou
culturas, de informações e conhecimentos que compõem a sua prática,
também os alunos, que igualmente são sujeitos dessa prática, têm uma
história, valores, cultura(s), sentimentos e vontades.
O professor para efetivar o seu trabalho necessita estabelecer uma
relação com os alunos. Por isso o saber profissional do professor carrega
sempre

um componente ético e emocional, primeiro porque, como


explica Denzin (1984, in HARGREAVES, 1998), o ensino é uma
prática profissional que produz mudanças emocionais
inesperadas na trama experiencial da pessoa docente. As
práticas profissionais que envolvem emoções suscitam
questionamentos e surpresa na pessoa, levando-a, muitas
vezes de maneira involuntária, a questionar suas intenções,
80

seus valores e suas maneiras de fazer... Em seguida, porque


os estudantes, os alunos são seres humanos cujo
assentimento e cooperação devem ser obtidos para que
aprendam e para que o clima da sala de aula seja impregnado
de tolerância e de respeito pelos outros. Embora seja possível
manter os alunos fisicamente presos numa sala de aula, não se
pode forçá-los a aprender (TARDIF, 2002, p. 268).

Ao chegar a escola, durante o estágio, as professoras procuraram


estabelecer a necessária relação com os alunos. Como resultado desse
processo relataram como construíram laços afetivos e de amizade com os
alunos. Entretanto três professoras tiveram muita dificuldade de construir uma
relação de educador-educando, não conseguiam estabelecer certos limites
com os alunos, encontrando problemas para motivá-los com suas propostas.

... aquela realidade me assustou, tinha dificuldade de lidar com


a resistência dos alunos... eles estavam acostumados somente
ao futebol e ao vôlei, eu tinha medo de colocar eles contra a
professora da turma.

... tinham aulas que eu não conseguia fazer nada! [...] os


alunos não queriam trabalhar outros conteúdos. [...] Havia um
choque entre a minha concepção de EF e a concepção que os
alunos tinham.

A experiência do estágio parece ter sido muito marcante para essas


professoras porque tiveram que lidar com esta contradição, entre o que
acreditavam que deveriam trabalhar e o que os alunos esperavam da aula de
Educação Física. Essa dificuldade tocou não só em uma questão conceitual do
campo da Educação Física, mas também os valores que estas professoras
possuiam. Segundo elas, todo o tempo do estágio o que esteve mais presente
foi a questão da autoridade, tentando encontrar caminhos para ser um
professor que consegue trabalhar sem ser autoritário.
Lidar com as sensações e emoções que a experiência da sala de aula
suscitava não foi nada fácil. Nossas interlocutoras afirmaram vivenciar várias
situações de fracasso e de frustração. O sentimento de impotência diante da
estrutura da escola fez com que se questionassem se era realmente aquilo que
81

queriam, chegando a pensar em desistir do Curso.


Ao final do estágio havia ainda muitas dúvidas sobre essas e outras
questões que surgiram durante este período, mas ainda que tenha sido uma
experiência bastante difícil para todas, houve um consenso de que foi também
edificante e muito valido o estágio para a formação profissional.
82

6. CONCLUSÕES... AINDA QUE PROVISÓRIAS

Gosto de ser homem, de ser gente, porque sei que minha


passagem pelo mundo não é predeterminada, preestabelecida.
Que o meu “destino” não é um dado mas algo que precisa ser
feito e de cuja responsabilidade não posso me eximir. Gosto de
ser gente porque a história em que me faço com os outros e de
cuja feitura tomo parte é um tempo de possibilidades e não de
determinismo. Daí que insista tanto na problematização do
futuro e recuse sua inexorabilidade. (FREIRE, 1996, p. 58-59)

Este trabalho, ainda que fruto de uma certa caminhada, possui diversos
pontos que merecem ser aprofundados, qualificados, estudados,
principalmente as questões pertinentes ao universo da formação profissional
docente, mais especificamente sobre a formação dos professores de Educação
Física.
As conclusões que aqui apresento são significativas para confirmar
algumas questões já conhecidas sobre a formação de professores, trazer a
tona novos questionamentos e para descrever elementos que podem contribuir
na reflexão e qualificação dos cursos de formação, em especial os de
Educação Física.
Essas conclusões, construídas, a partir das repetidas leituras e
resignificações do que desenvolvi até aqui, estão organizadas em três tópicos:
a formação inicial; as experiências e vivências significativas; e a importância
dessas vivências na formação de professores.

6.1 A formação inicial

Ao analisar a trajetória das professoras que participaram desse estudo,


durante o Curso de graduação, pude constatar que a formação inicial
apresenta, ainda de forma bastante forte, uma lógica bancária de
conhecimento, fragmentado e disciplinado, com fronteiras rígidas entre suas
áreas e campos. Explicita, também, uma dicotomia entre o conhecimento
teórico e o prático, hierarquizando e priorizando o acúmulo teórico, entendido
como pré-requisito para a prática.
83

No caso específico estudado, algumas mudanças que ocorreram ao


longo da história do Curso, e a sua proposta no momento em que as
respondentes o cursaram, buscavam de alguma forma superar esses
elementos, a presença dos Pré-estágios, as disciplinas que propunham
observações de campo, a experiência do Programa Especial de Treinamento –
PET/CAPES, para os alunos que estavam no programa e também para os
demais, que se beneficiaram das atividades promovidas por ele. Todas estas
oportunidades e atividades ofereciam momentos privilegiados de vivências
práticas, espaços de experimentação.
Ainda assim, o Curso não tinha como centralidade estas propostas, a
graduação priorizava as disciplinas, entendidas como espaços de acumulação
do conhecimento e preparação para prática. O que demonstrou as falas das
respondentes é que os espaços significativos para a formação do saber-fazer,
em geral, não eram considerados como importantes, ou eram pouco
articulados com os conteúdos e com as aulas da graduação, havendo pouca
relação entre o que era estudado e a realidade da prática profissional da
Educação Física.
O que percebi é que a proposta do Curso de graduação apresenta uma
distância da realidade, seus conhecimentos buscam compreendê-la do ponto
de vista teórico sem assentar-se na prática como elemento mobilizador dessa
teoria. As experiências das entrevistadas destacam essa desarticulação entre o
teórico e a realidade. Como lembra Cunha (1998, p. 30), só a prática e a
realidade são as fontes capazes de gerar a dúvida intelectual, que por sua vez,
mobiliza a pesquisa. Essa necessidade da prática e da leitura da realidade
como elementos fundantes da teoria é constantemente destacado pelas
professoras da pesquisa, demonstrando a falta desse movimento na formação
inicial que vivenciaram, e dessa forma, a pouca contribuição do Curso para
construção de um saber da experiência.
Nesse aspecto cabe resgatar o que afirma Nóvoa:

a formação deve estimular uma perspectiva crítico-reflexiva,


que forneça aos professores os meios de um pensamento
autônomo e que facilite as dinâmicas de autoformação
participativa. Estar em formação implica um investimento
pessoal, um trabalho livre e criativo sobre os percursos e os
projetos próprios, com vistas à construção de uma identidade,
84

que é também uma identidade profissional. [...] Urge, por isso,


(re)encontrar espaços de interação entre as dimensões
pessoais e profissionais, permitindo aos professores apropriar-
se dos seus processos de formação e dar-lhes um sentido no
quadro das suas histórias de vida.
A formação não se constrói por acumulação (de cursos, de
conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um
trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de
(re)construção permanente de uma identidade pessoal. Por
isso é tão importante investir na pessoa e dar um estatuto ao
saber da experiência (1992a, p. 25).

A formação inicial que encontrei na experiência desse estudo explicita


em muitos momentos uma concepção de transmissão de conhecimentos,
reforçando a idéia do professor como um repassador de conteúdos já
existentes, não como um construtor de um conhecimento, de um saber que lhe
é próprio, dificultando aos professores a possibilidade de se sentirem sujeitos
das suas práticas, responsáveis pela sua formação contínua, restando ao
professor iniciante aplicar aquilo que lhe foi repassado na graduação e
buscando alternativas individuais para a solução dos seus problemas.
Além disso, o Curso pouco reconhece, ou tenta trabalhar, as
dimensões do desenvolvimento pessoal e organizacional, acabando por
privilegiar, quase que exclusivamente, a dimensão do desenvolvimento
profissional (NÓVOA, 1992a), esquecendo-se da inter-relação entre essas
dimensões.

6.2 Experiências e vivências significativas

Através do estudo, busquei identificar os elementos importantes na


formação dos saberes docentes. Nesse caminho localizei muitas influências,
entre elas, a da família, da escolarização, das relações afetivas, dos
componentes curriculares. Mas, acredito que os elementos mais significativos
presentes nos relatos das professoras participantes da pesquisa foram aquelas
experiências ou vivências ligadas à realidade, às atividades práticas, ao fazer
concreto individual ou coletivo. Essas foram as experiências que efetivamente
marcaram a construção do saber-ser e saber-fazer das alunas-professoras.
85

Não retomarei aquilo que já está descrito anteriormente, mas entendo


ser importante salientar o quão significativo foram as experiências práticas, as
observações de campo, vividas nas contradições da realidade, no cotidiano da
relação entre professor e aluno, em diferentes espaços, na escola, na
academia, na rua ou no clube, todas elas contribuíram significativamente para
a formação dessas professoras.
A experiência da Prática de Ensino, talvez pelo seu grau de
intensidade, de contato com a realidade, caracterizou-se como um espaço
privilegiado na construção dos saberes docentes, ou ao menos de reflexão
sobre a prática. Esse foi um momento decisivo na resignificação de muitas das
expectativas e certezas das respondentes, ainda que de forma traumática para
algumas, pela maneira e pelo momento em que está colocada no currículo do
Curso ou pelo imaginário construído sobre sua função.
A situação de aluna-professora, a exigência da ação, a mobilização de
conhecimentos e conteúdos em uma realidade não dada, dinâmica, com
diferentes sujeitos e subjetividades constituiu um dos momentos marcantes da
formação dessas professoras, inclusive na construção de alguns traços da
profissionalização.
Infelizmente essa experiência da Prática de Ensino é, até certo ponto,
pouco explorada na formação inicial, em geral deficitária de discussões e
localizada em um momento difícil do curso. Momento onde emergem, a partir
da vivência concreta da escola, nas alunas-professoras, um universo de
dúvidas e ansiedades que quase sempre não poderão ser aprofundadas e
discutidas, pois os componentes do currículo já foram concluídos.
É preciso incorporar na formação inicial, nos Curso de graduação, a
importância dos saberes da experiência, o caráter dinâmico e contingente da
prática do professor e a impossibilidade de reduzir a realidade e a situação de
ensino-aprendizagem a esquemas e técnicas previamente definidos. Os
Cursos de formação inicial de professores precisam reformular sua forma de
organização considerando esses elementos e repensando a definição dos
conhecimentos necessários à prática docente, que devem ser trabalhados no
currículo.
86

6.3 Importância dessas vivências na formação de professores

A identificação das experiências e vivências significativas na trajetória


de alunos do Curso de Licenciatura Plena em Educação Física foi o ponto de
partida para esse trabalho, mas o aspecto mais significativo foi justamente
tentar entender como a formação e essas experiências e vivências destacadas
pelas participantes contribuíram efetivamente para construção dos saberes e
da profissionalidade das professoras.
O fundamental tornou-se não mais "quais foram?", mas sim, "como
influenciaram?" na formação das professoras. Como contribuíram para a
superação de algumas necessidades que Popkevitz destaca, como por
exemplo a aquisição de maiores competências em relação ao desenvolvimento
e implementação do currículo, o pensamento crítico, a flexibilidade e a
capacidade de questionar padrões sociais (1992a, p. 40), entre outras
necessidades no caminho da profissionalização docente.
Essa necessidade de refletir sobre a prática, de construir alternativas,
improvisações, adquirindo responsabilidades diante dos alunos, durante o
estágio, mobilizou muito as professoras que participaram do estudo, e sem
dúvida aquelas experiências e vivências que fomos identificando como
significativas estavam relacionadas com essa procura de respostas e
alternativas às questões do cotidiano da prática profissional.
Constatação que leva a concluir que é fundamental aos Cursos de
formação de professores, através de sua ação cotidiana, buscar
constantemente realizar observações e pesquisas sobre a sala de aula, sobre a
prática cotidiana dos professores, sobre o seu saber experiencial,
transformando-o em um saber da ação pedagógica.
Através da pesquisa comprovei que o Curso e os seus professores, em
geral, pouco valorizavam esse saber da experiência ou experiencial. Em alguns
casos as experiências significativas identificadas pelas professoras estavam
ligadas, justamente, a situações ou práticas que tentavam reconhecer e
vivenciar, seja através de observações, ou atividades práticas, a realidade do
exercício profissional. As exceções à regra buscavam, ao que parece, partir da
87

prática como fonte problematizadora da teoria, ao contrário dos restantes.


Outro elemento fundamental que comprovei é a necessidade do Curso
de formação se debruçar mais sobre a história de vida dos futuros professores,
considerando a importância que as participantes da pesquisa deram as suas
vivências anteriores à graduação na definição do saber-ser e saber-fazer.
A história familiar, os professores que tiveram ao longo da vida escolar,
as experiências positivas e também as negativas e a visão de mundo que os
alunos trazem ao chegar na faculdade são elementos importantes no quadro
da formação inicial e devem ser observados de maneira sistemática e
planejada, articulando o desenvolvimento pessoal, discutindo, problematizando
os pré-conceitos, as crenças, o senso comum que carregamos, com o
desenvolvimento profissional, os diferentes saberes necessários à prática
profissional. Reconhecendo a importância da caracterização temporal dos
saberes docentes.
Ao mesmo tempo em que se torna explícita a importância do saber da
experiência na formação docente, principalmente, na pouquíssima vivência que
o estágio curricular - Prática de Ensino - possibilitou às professoras do estudo,
percebo que esse Estágio, esse espaço de experiência, precisa ser repensado
pela academia, ser (re)discutido, quanto ao seu papel na formação, quanto ao
momento em que é realizado, em como ele pode viabilizar a vivência e
construção efetiva do saber curricular por parte dos alunos, como espaço
gerador da dúvida epistemológica, fundamental à construção do conhecimento.
O Estágio não deveria ser entendido como momento final da formação
do professor; primeiro porque a formação acadêmica é um dos estágios da
formação e não o único; e segundo porque ele é um espaço privilegiado para a
problematização da realidade e mobilizador da reflexão na busca de
explicações para essa realidade. O Estágio curricular apresenta-se, ainda que
com muitas limitações, como uma oportunidade dos alunos vivenciarem a
realidade concreta da atividade docente com suas contradições, decepções,
conflitos e dificuldades e também com todos os seus aspectos positivos, de
elaboração de estratégias, de superações individuais e coletivas e de
constituição de laços afetivos fundamentais à formação da profissionalidade.
Por fim, em relação ao estágio, é importante ressaltar que o
entendimento de que ele é o momento de avaliação das habilidades,
88

conhecimentos e competências do futuro professor é, ao meu ver,


extremamente equivocado pois considera uma experiência, muitas vezes
isolada, como parâmetro para julgar as condições de um aluno em concluir ou
não o curso, desconsiderando a sua caminhada até aquele momento e,
principalmente, qual é a sua capacidade de buscar, com autonomia, formas de
qualificação constante que possibilitem a superação das situações contigentes
do dia-a-dia profissional.
Outra conclusão, baseado nas experiências das participantes, é a da
importância do planejamento. A prática pedagógica não acontece de forma
espontânea, o pensar previamente e planejar a ação é essencial a quem
almeja realizar um trabalho sério e comprometido com a formação dos alunos.
Cabe destacar que esse planejamento não é um ente autônomo, não
tem vida própria, ele nasce da observação e leitura da realidade pelo professor
em conjunto com seus alunos e é constantemente alterado, modificado,
transformado de forma dinâmica, assim como a realidade. A esse respeito
Freire chama a atenção para não cairmos em um equivoco,

em um mau hábito de pensar um pensar estático, não


dinâmico, não dialético, em que a gente separa quase
milagrosamente (porque, na verdade, não se pode separar),
mas em que a gente dicotomiza, por exemplo, a prática
pedagógica, a prática educativa da preparação da ação
mesma, em que a gente separa os métodos dos conteúdos e
os métodos e os conteúdos dos objetivos (1986, p. 91).

Ainda que a delimitação do estudo tenha sido o período do Estágio


Curricular - Prática de Ensino - das professoras, ficou claro que esse
planejamento não se restringe ao professor iniciante, como em geral é o caso
do aluno estagiário, mas para todo professor e em diferentes âmbitos. O
planejamento das ações tem de ocorrer na faculdade e entre a faculdade e a
escola onde é realizado o estágio, na escola e entre os professores da escola
em conjunto com os estagiários.
A falta de preocupação com o desenvolvimento organizacional da
profissão docente ficou clara na experiência das professoras respondentes. O
Curso, quando trabalha os aspectos da organização da vida escolar, e também
de outros espaços profissionais, novamente assume uma postura livresca,
89

teórica, não conseguindo articular as experiências que o Estágio poderia


possibilitar nesse aspecto, e as contribuições necessárias a profissionalização
da atividade docente.
O Estágio parece acontecer dentro de uma redoma que impede o
contato do estagiário com o restante da escola. O espaço de vivência restringe-
se a uma turma de alunos, algumas poucas reuniões, independentes da
proposta e do projeto da escola, o que impossibilita a vivência do aspecto
coletivo entre os alunos/estagiários e os demais professores, dificultando a
experiência de uma identidade profissional.

6.4 Ainda há muito por onde se aventurar

...nem sempre o óbvio é tão óbvio quanto a gente pensa que


ele é. E, às vezes, quando a gente se aproxima da obviedade e
toma a obviedade para vê-la desde dentro e de dentro e por
dentro (isto é, ver o óbvio de dentro e de dentro dele olhar para
fora), é que a gente vê mesmo que nem sempre o óbvio é tão
óbvio (FREIRE, 1986, p. 92) [Grifos do autor]

Com certeza muitas constatações apresentadas até aqui não são


inéditas, ainda assim, são elementos novos na medida em que apresentam-se
como constatações encontradas em uma realidade singular, em seu tempo e
espaço. São resultado de um esforço reflexivo, fruto da teorização e do diálogo
entre o que observei na experiência das alunas-professoras do estudo e a
produção teórica de diferentes autores.
Ainda que, o Curso, no momento em que as respondentes viveram sua
formação, tenha apresentado muitos aspectos que precisam ser qualificados, é
importante destacar que qualquer leitura da realidade nunca será absoluta,
portanto, no conjunto do quadro da formação inicial muitas eram as iniciativas
de transformação do curso. Muitos professores, mesmo de forma isolada,
apresentavam na sua prática, ou em suas propostas, elementos
problematizadores da realidade.
Com certeza é necessário destacar a existência de iniciativas voltadas
para a reflexão da prática, que buscam superar uma formação centrada na
reprodução de métodos e técnicas de ensino.
Essas iniciativas, e o conjunto de experiências e vivências que as
90

professoras participantes do estudo tiveram além dos componentes


curriculares do curso - no exercício profissional concomitante à faculdade, no
movimento estudantil, através da família e da vida escolar anterior à graduação
- contribuíram para a formação dos saberes docentes e da profissionalidade
dessas professoras. Enfim, contribuíram para que elas se aventurassem pelo
universo pedagógico, vivendo a realidade.
Deixo, ao final desse trabalho, o desejo de que provoque outras
aventuras e desventuras pelo campo da formação de professores, em especial,
professores de Educação Física, pois é o meu "chão", é o espaço que vivi, e
por isso, me leva a escrever, pois, assim como Freire, se há uma coisa difícil
para mim, é escrever sobre o que eu não faço. As vezes, eu tenho dificuldade
até para escrever um pequeno trecho sobre o que eu não fiz [ou vivi] (1986, p.
98).
Para finalizar, entendo que o fundamental na formação inicial e
continuada dos professores é que sempre se preserve uma atitude reflexiva
diante da realidade. É nessa dimensão que esse trabalho pretende se inserir.
91

Anexo I

Universidade Federal de Pelotas


Faculdade de Educação
Curso de Mestrado em Educação
Marcelo S. da Silva

PESQUISA: As Aventuras e Desventuras dos Alunos da ESEF/UFPel: Um olhar


sobre a formação do professor de Educação Física.

Um exercício de memória...

Ela e Outra...

Ela e Outra nasceram juntas, mas sem saber. Isto nunca foi dito a elas.
Sua instrução começou cedo. Ela, às vezes, ensinava à Outra; a Outra
regalava a Ela com versos. Sempre conversavam, tagarelavam, compunham
pequenos poemas, líricas semelhanças, alegres e travessas como o ar se
deixavam assombrar com os perfis do céu. Desenhavam, então, seus corpos
na areia confessando-se às ondas do mar.
A Voz chegou um dia e disse: à Escola! Qual duas mariposas em vôo
lunar, a rede conseguiu alcançar Ela. A Outra, mais leve, mais fugaz (nasceu
por último), não foi aprisionada e lhe nasceram as asas da palavra.
Ela aprendeu coisas: a sentar-se, a fazer ruído, a acostumar-se, a
obedecer, a esperar a Voz, a repetir, a dizer sim, a copiar, a calar.
Agora,
A Outra recortava palavras dos diários, palavras de todos os tamanhos e
as guarda em caixas. Na caixa azul, as neutras. Na caixa amarela, as tristes. E,
na caixa transparente, guarda as palavras que tem magia.
As vezes, a Outra abre as caixas e as põem de boca para baixo sobre a
mesa, para que as palavras se misturem da forma que desejaram.
Então as palavras lhe contam o que ocorre e anunciam o que ocorrerá.
“Poema de Eduardo Galeano Ventana sobre a palavra, adaptado por
Virgínia Ferrer no texto La crítica como narrativa de las crises de
formación.”
Em geral, apanhados que fomos pela rede da Voz, só conseguimos fazer
narrativas (quando conseguimos!), com os mesmos limites de Ela. Certamente
92

escolheríamos - se tivéssemos acesso às caixas da Outra - as palavras da


caixa azul.
O poema de Eduardo Galeano tem a intenção de nos estimular a
narrativas compostas depois que as “caixas forem misturadas”.
Esta é uma pequena provocação para que você faça a sua própria
narrativa contando a sua história, usando todas as caixas que quiser.
Abaixo estão algumas perguntas/provocações que podem servir de
referência para estimular a nossa memória. Vamos trabalhar nelas?
Usando as palavras de Jorge Larosa, que podemos fazer, cada um de
nós, senão transformar nossa inquietude em uma história?
a) Nasci em uma família que...
b) Minha experiência escolar/acadêmica foi interessante. Fui um aluno
que...
c) As escolas/universidade que freqüentei eram...
d) A idéia de professor que construí veio de onde? Dos professores que
tive, do que se comentava em casa, da mídia, dos livros que li, das aulas
que tive na faculdade, da experiência que tive como professor na Prática
de Ensino, ou veio de algum outro lugar? Penso, hoje, que o professor é
um sujeito que...
e) Mas depois de tudo isso, o que eu queria mesmo é contar que...
f) E agora quero explicar porque a caixa de palavras que mais abro é a de
cor...
93

Anexo II

Universidade Federal de Pelotas


Faculdade de Educação
Curso de Mestrado em Educação
Marcelo S. da Silva
PESQUISA: As Aventuras e Desventuras dos Alunos da ESEF/UFPel: Um olhar
sobre a formação do professor de Educação Física.

Roteiro de Entrevista
Legenda: ⌦ Pergunta Central (todas serão feitas.)
Pergunta Provocativa (poderão ou não serem feitas
entre as Perguntas Centrais. Tem caráter de orientar a entrevista
para que possamos estimular o entrevistado e também para
aprofundar as respostas. As perguntas necessariamente não
serão feitas da forma e na ordem em que estão descritas.)

Nome da entrevistada:___________________________________
Data da entrevista:____________

Essa entrevista tem o objetivo de reforçar o exercício de Memória que já


fizemos e também aprofundar algumas questões sobre a tua formação inicial
no Curso de Educação Física da ESEF/UFPel. Sendo assim:

1- Fale sobre as experiências e vivências por você consideradas


significativas durante o Curso de Educação Física. Como elas influenciaram na
tua formação como professora?

Qual a natureza dessas experiências?

Qual a sua origem?

Envolve conteúdos específicos?

Se relacionam com os processos metodológicos?

Tem bases nas relações afetivas com os professores?

Referem-se a experiências incluídas no currículo formal?

Tem a ver com pesquisa ou com extensão?

Relacionam-se com outras experiências vividas fora do ambiente


acadêmico?

2- Porque consideras estas experiências importantes para ti?

3- Que aprendizagens principais fizestes com elas?


94

4- Ela marcou o desempenho docente que construíste? Inspirou o teu


trabalho? Em que sentido?

5- Durante o seu estágio (Prática de Ensino) quais eram as principais


referências na hora de planejar e dar as suas aulas?

6- Como essas aulas aconteciam?

7- O planejamento de ensino ajudava a organizar a aula?

8- Como você solucionava os problemas encontrados?

9- De que natureza eram estes problemas?

10- Como era sua relação com a estrutura da escola e com os outros
professores e direção?

11- E com os alunos?

12- Depois da experiência com a Prática de Ensino como ficou a tua visão
sobre o Curso de Educação Física?

13- Quais os seus acertos e equívocos?

14- Se fosses começar agora o Curso o que mais você gostaria de


encontrar diferente? O que poderia continuar igual? Por que?

15- Além do que já conversamos até aqui o que mais você gostaria de
dizer sobre o seu Curso?
95

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