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EU ODEIO FILOSOFIA!

Prof. Dr. Celso de Moraes Pinheiro*


celso.mpinheiro@uol.com.br

Eu odeio filosofia! Esta frase pode ser encontrada rabiscada em


muitas carteiras escolares do ensino médio no Brasil. Qual o motivo
do ódio? Como um aluno do ensino médio pode afirmar isso sobre
algo que ele conhece tão pouco? O ódio é restrito às aulas de filosofia
ou ao conjunto das disciplinas? Questões como essas devem e
precisam ser colocadas, sob pena de conseguirmos algo inédito:
provocar ódio à filosofia.
Por definição temos que o ódio é contrário ao amor. Ora, sendo
a tradução mais legítima de Filosofia o amor à sabedoria, então
estaríamos invertendo e opondo a filosofia a ela mesma. De amor à
sabedoria, passaríamos a ódio à sabedoria. E, se Filosofia passasse a
ser ódio à sabedoria, atingiríamos o inédito: acabar com a Filosofia
através da própria filosofia. O que está em jogo aqui é algo mais
profundo e preocupante. O que provoca o ódio ao saber não é o
próprio saber, mas o modo como a educação trata desse saber. A
Filosofia não é culpada pelo ódio que provoca a si mesma. Os
culpados são os métodos, técnicas e pedagogias que se ocupam do
ensino de filosofia. Os culpados são os professores de filosofia. Os
culpados são as escolas. Os culpados são os alunos, seus pais, sua
sociedade. Enfim, não há um culpado pelo ódio à filosofia, mas
vários. Não há ódio à filosofia, mas ódio ao modo como a filosofia é
tratada e ensinada.
Discussões inúteis e banais ocupam as preocupações dos
pensadores sobre a filosofia da educação. Muitos, afastados de uma
preocupação filosófica séria, acreditam que as discussões sobre

*
Universidade Federal do Paraná – DTPEN
banalidades cotidianas, sobre políticas partidárias, sobre problemas
sociológicos e psicológicos são suficientes para dar cabo de uma
reflexão filosófica sobre a educação. Não basta, por exemplo, nos
debruçarmos sobre a relação professor-aluno para estabelecer uma
análise filosófica. Esse tipo de pseudo-problema, criado por aqueles
que não atingem a profundidade necessária do pensamento filosófico,
provoca o ódio pela filosofia. Acreditar que dar aula de filosofia para o
ensino médio é discutir, na maior parte das vezes com um perigoso
intuito ideológico, questões pessoais ou sociais a partir de um
posicionamento que o aluno pouco compreende; ou pior, acreditar
que a simples discussão de opiniões pessoais é filosofia, só pode levar
ao desprezo desse pensamento. O aluno não é um tabula rasa. Ele
sente quando está sendo doutrinado num modelo de pensamento
pré-estabelecido. E, infelizmente, a doutrinação faz parte do currículo
oculto da filosofia no ensino médio.
Se fugirmos da filosofia como doutrinação, tudo em nome de
um dito cidadão crítico, caímos em um outro currículo oculto da
filosofia: a terapia de grupo. Esse outro “facilitador” do ensino de
filosofia acredita que tratar de assuntos particulares é fazer filosofia.
Não percebem que o aluno do ensino médio fala de si o tempo todo,
sem necessitar da ajuda da filosofia. O adolescente transmite suas
angústias, seus medos, suas esperanças continuamente, sem
recorrer a um chamado pensamento filosófico. A imposição de tal
posicionamento visa, tão somente, facilitar a vida do professor que
pouco sabe de filosofia, mas é responsável pela matéria. Em resumo,
esses exemplos de posicionamentos em sala de aula causam o ódio à
filosofia. Não há conhecimento verdadeiro aí.
Independente do que dissemos até agora, é importante
salientar que o ódio à filosofia não é específico e exclusivo dela. Todo
ensino é odiado. O saber, como um todo, é desprezado e
desvalorizado. A educação passa por um momento extremamente
delicado, onde se mostra incapaz de promover aquilo que deveria ser
seu maior trunfo, formar um verdadeiro cidadão. Os grandes
culpados, como tradição, jogam as origens do problema em outros,
desviando de si a atenção. Nossa educação, compreendida aqui como
aquele “saber”, definido pela palavra Filosofia, não possui mais um
papel determinado. Em nome modelos emancipatórios, libertários,
etc., esquecemos o essencial: o homem e sua formação. O ódio à
filosofia é apenas um reflexo do ódio à educação. A filosofia carrega
nas costas o peso de ser aquela que, por definição, é amor ao saber.
Esse saber é a própria educação. Odiada pelos alunos, amada pelos
pensadores. Quanta contradição! Não à toa nos encontramos nessa
situação. A falta da educação ultrapassa os muros da escola. A
sociedade apenas reflete esse ódio ao saber. O menosprezo pela
formação de caráter, pela formação moral do cidadão é apenas
reflexo desse medo que toma conta dos responsáveis pela educação.
Medo de muita coisa: medo de propor um fim para a educação; medo
de buscar uma formação moral para o homem; medo de ver a
importância da disciplina na escola, etc. Enfim, medo provocado pela
acomodação e incompetência. Como não poderemos analisar cada
item acima descrito, a seguir iremos buscar uma análise sobre a
disciplina, ou melhor, sobre a falta de disciplina na escola atual.
Acreditamos que, através do que se segue, poderemos abrir os olhos
e desvendar uma das causas (e talvez a primeira) do ódio à filosofia.
Hoje, falar numa escola disciplinadora é quase um palavrão.
Quando tocamos no assunto, os olhares voltam-se imediatamente
para nós, como se estivéssemos propondo uma contravenção, uma
violação dos direitos de cada um. A disciplina ganhou um novo
sentido no discurso pedagógico atual: deve-se entender disciplina
como atraso, como algo reacionário, enfim, como algo ruim e
desastroso para a educação. Mas, antes de aceitarmos de modo
imediato esta idéia, devemos buscar compreender a origem de tal
concepção. A disciplina, durante anos, serviu para guiar e dirigir os
processos educacionais por todo o mundo. Após algum tempo,
sobretudo com o advento da psicologia da educação, surgem idéias
que fazem a disciplina passar a ser vista como algo que impediria o
verdadeiro despertar do homem que há em cada um de nós. Tudo
aquilo que poderíamos ser encontra-se bloqueado pela disciplina.
Uma escola voltada para a disciplina seria, segundo essa linha de
pensamento, uma escola bloqueadora do pleno desenvolvimento da
criança. Ora, será que efetivamente a disciplina é assim tão ruim? Por
que quando pensamos na educação física, por exemplo, aceitamos
sem restrições a disciplina? Por que não encontramos problemas em
ver uma atleta da ginástica olímpica passar dez horas por dia
treinando, treinando, sem descanso, seguindo uma disciplina rígida e
difícil? Por que chegamos a dizer que tal disciplina é desumana, mas
ao mesmo tempo é necessária, sobretudo quando o resultado é uma
medalha olímpica e a bandeira do Brasil hasteada no mais alto ponto
do mastro? Por que enchemos nossos olhos de lágrimas ao ver o
resultado de um trabalho árduo e disciplinado? Será que a disciplina
só vale em certos casos? Ou pior, será que os fins justificam os
meios?
Há algo de muito estranho quando falamos de disciplina hoje
em dia. Num primeiro momento, há a idéia difundida de que
disciplina e educação não se misturam, ou melhor, não devem se
misturar. Que uma educação disciplinadora é uma má educação. Mas,
por outro lado, quando falamos em educação física, que, como o
próprio nome indica, é também educação, então a disciplina é
fundamental. Poderíamos dizer que é no mínimo estranha a mudança
de orientação no sentido e finalidade da disciplina. Afinal, é boa ou
má a disciplina? Será que não precisamos aqui do rigor do
pensamento filosófico para solucionar tal impasse? Resta a dúvida.
Estudos sobre a disciplina nos fazem ver como há enormes
preconceitos com relação ao seu conceito. Na história da pedagogia,
principalmente no Brasil, podemos perceber que a disciplina foi
atacada por vários lados. No fundo, se fizéssemos uma análise
pormenorizada de cada um dos fatos que levam os diferentes grupos
a acreditar que a solução para o bom desenvolvimento da educação é
afastá-la do caráter disciplinador, encontramos, na verdade,
preconceitos, dogmas, ideologias, etc. Ou seja, vemos uma certa
simplificação nos motivos que levam esses pensadores da educação a
crerem que uma educação mais “liberal” será melhor que uma
educação disciplinadora. Com essa postura, todo o caráter positivo da
disciplina é abandonado. O que se vê é apenas a simples concepção,
na maior parte das vezes mal-fundamentada, de que a disciplina é
um mal. A explicação necessária para tal posicionamento é, na maior
parte das vezes, inadequada, superficial e preconceituosa. No fundo,
percebemos que o que existe é um medo da disciplina. E esse medo
da disciplina é oriundo de idéias mal formuladas, de posicionamentos
políticos ideologizantes, tal como as idéias que seus seguidores
acreditam estar combatendo. Isto é, ao pregar o desligamento da
educação à disciplina, esses pedagogos baseiam-se em idéias tão, ou
mais preconceituosas e ideologizantes como as que combatem.
Acreditam que acabando com a influência da disciplina na educação
afastam o mal político, moral e religioso. Mas, será que a disciplina é
assim tão mal? Será que buscar um caráter moral para a educação é
tão ruim? Por que a minha concepção de política é melhor que a
anterior? São justamente questões como estas que devem ser postas
em jogo se quisermos verificar, com a isenção requerida pela análise
filosófica séria, o papel da educação e sua finalidade.
Ora, é muito fácil constatarmos que hoje em dia um professor
entra em sua sala de aula e inicia sua aula, seguindo um plano de
ensino determinado. Se perguntarmos para esse professor, o que ele
pretende com aqueles alunos, ou melhor, o que ele pretende formar
ali, a resposta dificilmente sairá de um senso comum. Nada além de
um: “estou aqui para ensiná-los a ser melhor”; ou então, “estou aqui
para ajudá-los a passar no vestibular”; ou ainda, “estou aqui para
fazer com que consigam o diploma, para arrumar um emprego e
viver melhor”. Por outro lado, no âmbito dos pensadores da
educação, encontraremos um palavreado mais difícil, mas que na
prática resulta nas mesmas respostas dadas pelos professores em
sala de aula. Para os pedagogos, a missão da educação é formar
cidadãos críticos. Ora, pergunto: o que são cidadãos? O que
entendem eles por crítica? Se se dessem ao trabalho de me
responder, diriam: cidadão é a pessoa que tem seus direitos
respeitados, etc. E, crítica, seria uma visão reflexiva sobre o mundo
que a cerca, etc. Entretanto, quando voltamos à sala de aula,
reencontraremos o professor pensando em dar o diploma para que
seu aluno arranje emprego, ou dependendo da escola (se pública ou
particular), encontro o professor que faz de tudo, canta, dança,
representa, entre outras coisas piores, apenas para que seu aluno
passe no vestibular (de preferência no vestibular de medicina, direito
ou engenharia). Ora, tudo isso nos faz pensar: Será que a briga pelo
afastamento da disciplina resultou em alguma coisa? E podemos ir
ainda mais longe: hoje já não se fala mais “professor, o senhor
poderia me ajudar?”, não, hoje se diz: “ai ó cara, vem cá e faça isso
por mim, logo!”. E, se o “cara” não obedecer, ou sofre o risco de
levar um tiro (geralmente nas escolas públicas), ou sofre o risco se
ser demitido (escolas particulares). Chamo a atenção para estes
exemplos exagerados pelo fato de que a faceta da disciplina que
utilizo aqui é justamente aquela que serve de base para todas as
críticas.
Mas, se este exemplo apresenta uma faceta, então podemos
dizer que existem mais modos de ver a disciplina? Diríamos que sim,
que a disciplina possui, antes de toda essa descaracterização de seu
conceito, vários lados, e em sua maioria, positivos, que infelizmente
são esquecidos por aqueles que defendem seu fim. Vamos retornar
um pouco à afirmação dos pedagogos de que a educação dever
formar o cidadão crítico. Se compreendemos que crítica é reflexão,
então temos de admitir que é necessária uma certa ordenação no
pensamento. Não é qualquer pensamento que pode ser dito crítico,
senão a educação seria uma repetição do mundo. Ou seja, se
qualquer pensamento é já uma crítica, por que necessito de uma
escola para formar cidadão crítico? Ora, desde sempre já seria crítico.
Restando para a escola formar o cidadão. Mas, por sua vez, se
cidadão é a pessoa que possui seus direitos respeitados, então basta
que o governo seja minimamente justo para a realização deste fim.
E, se todo pensamento é crítica, então o cidadão já conhece seus
direitos, não necessitando da escola. Bem, se seguirmos essa via, a
educação não serve para nada, e isso não podemos admitir. Então,
continuando na idéia de que devemos formar cidadãos críticos,
precisamos postular que a criança não está pronta, acabada. Que,
mesmo quando crescer, não possuirá a plena capacidade de ser
crítica do mundo que a cerca. Que, para tornar-se cidadão, o homem
precisa aprender quais são seus direitos e deveres. Enfim, que existe
sim uma importante tarefa e missão na educação, ensinar o homem a
pensar de maneira crítica, e aprender e compreender seus direitos e
deveres, a fim de que possa ser considerado cidadão.
Tendo em vista que a missão da educação será a de formar
esse cidadão crítico, partindo da idéia de que ele não pode alcançá-la,
a não ser via educação, então já estamos vislumbrando uma das
principais características da educação: ser um caminho. Abrimos um
parêntese para lembrarmo-nos do que ensinava Platão: que a
educação é um caminho em direção à luz, tal como a saída da
caverna. E, sem esquecer outro famoso filósofo, Sócrates, a arte da
educação é dar a luz às idéias, ao conhecimento. Mas, se a educação
é um caminho, como saber qual caminho é este? Como definir o
melhor caminho? Ou ainda, como escolher o caminho certo?
Devemos deixar clara a idéia de que sem uma finalidade a educação
é como um andar perdido pela selva. Sem a determinação exata
daquilo que se pretende com a educação, seu sentido perde-se no
emaranhado da própria vida. Não há sentido para uma educação sem
direção. Educar pelo educar é impossível. E, se refletirmos um pouco
sobre nossa escola no Brasil de hoje, será que não veremos
justamente isso? Um educar pelo educar. Uma escola que, no papel,
possui uma finalidade bem determinada, bonita, justa, mas que na
prática, apenas repete o que está na apostila. Não força o surgimento
do pensamento crítico. É uma escola tão preocupada em liberar o
aluno de um pensamento disciplinador, que esquece o resto. A
liberdade é tão consagrada, que as maiores das liberdades, a
liberdade do pensamento e a liberdade do conhecimento, são
aprisionadas em nome de métodos que se dizem libertadores.
Com isso, vemos que é fundamental a determinação segura do
caminho a ser trilhado pela educação. E essa determinação necessita
que os alunos sejam capazes de seguir corretamente o caminho. Para
isso, é necessário que compreendam que regras e leis são colocadas
não para tolir, antes, para facilitar a caminhada. Podemos citar um
exemplo que já há muito tempo serve para ilustrar análises sobre a
disciplina: se resolvemos passar um final de semana com mais
aventura, podemos escolher fazer uma trilha na mata. Antes de
sairmos de casa, nos munimos com uma mochila, água, alimentos
leves, bota de caminhada, bússola, mapas, e de preferência, com um
guia. Devemos traçar o caminho a ser percorrido e prever um tempo
para a conclusão do passeio. Verificamos se choverá, a que horas
anoitecerá, etc. Chegando no local, é da maior importância que
tomemos especial cuidado com suas regras. Devemos saber se
podemos entrar em tal propriedade, se o dono não estará nos
esperando com uma espingarda, se não soltará os cães atrás de nós,
etc. Após todos esses cuidados, partimos para nosso passeio, que, se
quisermos que seja perfeito, deve ser feito dentro das determinações
que estabelecemos antes da partida. Nosso plano de atividade deve
ser seguido o mais de perto possível, a fim de que não tenhamos
contratempos e imprevistos. Ora, essa obediência à regra requer toda
a anterior preparação como o mostrado no exemplo. Não podemos
sair caminhando por qualquer lugar, despreparado para tudo, sem
saber para onde vou, quanto tempo ficarei, etc. A chance de nos
darmos mal é muito grande. Apenas com sorte poderemos concluir
bem o passeio. E, tal como no exemplo, a última coisa que a
educação precisa, ou pode contar, é com sorte. Na educação, o
preparo, a determinação da finalidade, os meios adequados, tudo
deve ser levado em consideração. E, para tanto, é necessário que se
compreenda que as regras de preparo e de execução devem ser
seguidas. Mas, como seguir regras se não aprendo a seguí-las? Como
posso fazer algo que não sei como fazer? E, lembrem-se, não
podemos contar com a sorte.
O mesmo acontece com a educação. Sem saber obedecer a
regras, sem compreender que regras e leis são feitas para serem
cumpridas, com certeza nos perderemos no caminho. E agora, o
essencial: como ensinar regras para uma criança? Desde quando
nascemos achamos que podemos tudo, que nossos desejos devem
ser realizados prontamente. A descoberta do choro como objeto de
chantagem é uma das provas disso que afirmo aqui. Se no início o
choro é por necessidade, com o tempo a criança vai percebendo que
pode fazer uso dele para obter a realização de seus desejos. Então,
como domar essa tendência? Como fazer para ensinar uma criança
que existem limites? Sem dúvidas, sem o uso da disciplina não há
chance. E percebam que a disciplina não pode ser confundida com
castigo físico. Há disciplina até na corrente que prega, por exemplo,
que o melhor método para não virar refém do choro da criança é
deixá-la chorar até que canse. Ora, nada mais liberal do que isso:
chorar até cansar, sem castigo físico, sem restrições, etc. Apesar dos
possíveis outros problemas oriundos dessa ação, os pais impõem uma
disciplina. Qual seja, o não obedecer imediatamente os choros de
manha das crianças. Podemos afirmar que a disciplina não é apenas
castigo, negatividade. Disciplina é, antes, um aprender, ou melhor,
uma preparação para o aprendizado, principalmente do aprendizado
de regras. Sem disciplina, a educação é um tatear no vazio. É a saída
para o passeio sem o mapa, sem o guia, sem a bússola, sem a
mochila, etc. É graças à disciplina que podemos aprender o caminho
certo; que podemos descobrir que obedecer a regras é fundamental
para o futuro estabelecimento e luta por leis justas. É graças à
disciplina que nosso caráter pode ser desenvolvido.
O método da disciplina não pode, como já pudemos reparar
acima, se restringir ao castigo, à negatividade da ação. O caráter
positivo da disciplina sabe descobrir nela o caminho para o pleno
desenvolvimento do homem. É devido à disciplina que podemos
almejar um futuro melhor, com leis justas, com reflexões exatas
sobre os problemas, enfim, com um cidadão crítico. É porque a
criança aprende, desde cedo, que leis existem para serem cumpridas,
que pode vir a se tornar um cidadão crítico. Desde aquele primeiro
dia de aula, onde o professor pede que cada aluno ocupe uma
carteira, a disciplina faz parte de todo o processo. O que não
podemos admitir é um distanciamento ainda maior entre a teoria e a
prática. Se o discurso pedagógico não se torna prático na sala da aula
(sobretudo naquilo que diz respeito à finalidade da educação)
também não podemos permitir que na teoria seja feita uma objeção à
disciplina, enquanto na prática da sala de aula, ela aparece sob sua
pior forma: puramente restritiva, como castigo ou vingança. Se
afastarmos o medo da disciplina, se pusermos de lado todos nossos
preconceitos, acabaremos por ver que não existe educação, ao
menos a verdadeira educação, formadora de homens, sem disciplina.
Só a disciplina, como primeiro momento fundamental para a
educação, pode oferecer a segurança do caminho a ser trilhado.
Que a educação seja um desenvolvimento, um caminho, isso
parece certo. O que é precisamos agora é admitir o papel da
disciplina nesse processo. Tentemos esquecer que a disciplina foi
utilizada por certas correntes políticas ideológicas de uma maneira
nociva. Não é porque alguém, um dia, assinou um tratado de guerra
com uma caneta, que devemos acabar com todas as canetas do
mundo. Não devemos ficar na superfície da questão e encontrar no
primeiro possível culpado por uma série de erros, o único culpado,
esquecendo que existem muitos outros por trás. A disciplina se
prestou para um mau uso, mas isso não faz dela a culpada. Culpados,
verdadeiros, foram aqueles que assim agiram. E não agiram apenas
por ela e para ela. A disciplina foi apenas o instrumento.
O que pretendemos é fundamentar a necessidade da disciplina
na educação, ou melhor, re-aproximar a disciplina da educação, sem
medos, sem receios, sem preconceitos. Através da disciplina,
instituída como primeiro momento do processo de educação,
poderemos desenvolver o caminho para a finalidade. E, neste ponto é
importante ressaltar, também não devemos ter medo de fixar essa
finalidade como uma finalidade moral. Não moral no sentido chulo, no
sentido de moralista. Mas moral no sentido de formação de caráter,
no sentido de dar ao homem a possibilidade de compreender-se e de
ver os outros como iguais, dignos de respeito e merecedores de
justiça. Através dessa idéia a disciplina empresta ao homem a
possibilidade de seguir firme por seu caminho. As tentações do
mundo (corrupção, crimes, drogas, etc.) são mais facilmente
deixadas de lado quando seguimos o caminho de maneira
disciplinada. Se traçarmos no mapa nossa intenção, se soubermos o
que enfrentaremos pelo caminho, as dificuldades que teremos, as
situações que se apresentarão diante de nós, então mais segura será
nossa viagem.
Através da instituição da disciplina na escola, sem medos,
aprendemos a aprender. A disciplina não é um mero obedecer
ordens, antes, é um saber porquê devo obedecer. Sabendo que devo
obedecer, fica mais simples o convívio social. Por exemplo: Sabendo
que não devo estacionar em fila dupla, e respeitando essa lei, o
trânsito anda melhor. Esse tipo de consideração só é aprendido por
aquele que é disciplinado, que conhece as regras e sabe que boas
regras foram feitas para serem cumpridas. Na escola, melhor
socializável é aquele que respeita aos outros. E esse respeitar implica
a disciplina de não fazer tudo aquilo que tem vontade no momento. O
convívio com o outro nos disciplina, fazendo com que respeitemos
certas regras. É porque as crianças aprendem e respeitam seus
colegas, que no futuro poderão ser chamadas de cidadãos. O título
não cai do céu. Os caminhos para atingi-lo são árduos e penosos. E
esse caminho é a própria educação. É a educação, através dos
métodos, técnicas, modelos, que indica a trilha a ser seguida. Mas,
como já dissemos acima, não é um caminho às cegas. A luz do
conhecimento anterior ilumina todo o desenvolvimento. Quanto mais
detalhado for o mapa, mais fácil será segui-lo. Esta é a idéia da
educação: Ser clara e precisa. Não tendo medo de determinar sua
finalidade. Não se prendendo a preconceitos e dogmas, buscando
fugir de sua responsabilidade.
Lembremos o que nos ensina Kant em seu texto intitulado
Sobre a Pedagogia. Afirma o filósofo que a disciplina “é o que impede
ao homem de desviar-se do seu destino, de desviar-se da
humanidade, através das suas inclinações animais” (KANT, 1996,
p.12). Estas inclinações animais, que Kant afirma serem as
responsáveis pelo afastamento do homem de sua humanidade
comprovam que, para o filósofo, a natureza humana não é algo de
pronto e acabado. Há de ser construída, pois ela não nos é
simplesmente dada. Tal construção acontece via educação, ou seja, o
homem necessita da educação, visto que não é um ser pronto e
acabado. E, por educação compreende Kant o cuidado de sua infância
(a conservação, o trato), a disciplina e a instrução com a formação.
O papel fundamental da disciplina é, portanto, conciliar e
possibilitar ao homem a convivência com os impulsos imediatos e
prazeirosos do mundo empírico com a obediência racional do mundo
moral. Ou seja, a disciplina afasta o mais possível a influência das
tendências exteriores (heterônomas) em nossos atos. Tudo aquilo
que se mostra mais fácil, que é mais rápido de ser atingido, ou numa
linguagem popular, é mais gostoso, geralmente provém de situações
que não são justas para todos. É inegável que existe uma tensão que
contribui para uma dificuldade na consecução da lei, seja ela uma lei
moral ou uma lei jurídica. E essa dificuldade impediria a moralidade
mesma, o que implica que a possibilidade de uma sociedade legal de
direito e, portanto livre, também enfrenta problemas devido a essa
tensão. A disciplina visa justamente a superação, ou ao menos a
diminuição dessa tensão. É apenas graças à disciplina que pode vir a
ser forjado o caráter moral do homem. Caráter esse necessário para
o desenvolvimento de um estado de paz perpétua. Em outras
palavras, podemos afirmar que a disciplina nos oferece a
oportunidade de domarmos nossos impulsos mais animais. Através
da disciplina nos afastamos da tendência natural de preguiça, típica
dos homens, e nos aproximamos de uma situação de maior
esclarecimento. Com isso, caminhamos rumo a uma sociedade justa,
formada, finalmente, pelos tão festejados cidadãos críticos.
A disciplina, entendida como o primeiro momento da educação,
mas, que apesar de ser primeiro, não se acaba de imediato, devendo
permanecer em todo processo de educação, é, desta forma,
fundamento de possibilidade do bom desenvolvimento do homem. O
caráter positivo da educação encontra aqui toda sua força, isto é o
mesmo que afirmar que sem disciplina, dificilmente teremos como
formar o verdadeiro cidadão, e muito menos o homem crítico.
Esquecer da disciplina no processo de educação é problema tão
grande quanto não permitir a liberdade do pensamento filosófico.
Sem disciplina não aprendemos a obedecer às ordens. Não apenas
ordens externas, heterônomas, mas nossas próprias ordens internas.
Se não aprendermos a obedecer, o conceito de liberdade confunde-se
com o de libertinagem, e tudo em nome de uma crença, seja ela
religiosa, política ou pedagógica. A disciplina, quando corretamente
utilizada, não é um mal, pelo contrário, é graças a ela que a
educação pode seguir seguramente seu rumo. Não há porque ter
medo da disciplina. Nossa tarefa é desmitificar o caráter negativo da
disciplina. Devemos pensar profundamente em seu conceito, naquilo
que ela realmente é, em qual seu verdadeiro papel. E, a partir disso,
fazer valer nossa capacidade de reflexão e crítica, verificando sob
quais condições uma educação pode ser considerada uma boa
educação. Volto ao exemplo do início, onde perguntávamos sobre o
porquê da disciplina ser vista com bons olhos na educação física, na
educação do corpo, mas, na educação intelectual, na educação do
caráter, da virtude, ser considerada nociva. Pensemos sobre isso, e
tenhamos a coragem de admitir que evitamos a disciplina por
preconceitos e dogmas. O medo de sermos taxados de tradicionais,
moralistas, disciplinadores, fecha nossos olhos para uma análise
isenta de preconceitos. É momento da educação brasileira fazer o
contrário, ou seja, é hora de abrir os olhos para a necessidade da
disciplina na educação. É hora de pensarmos o que realmente
esperamos de nossa educação, o que desejamos para nossos alunos,
o que almejamos como futuro para nossa nação. Através dessa
tomada de posição, não mais medrosa e corroída por ideologias
pedagógicas e políticas, poderemos pressupor, pouco a pouco, um
abandono do ódio ao saber. Um posicionamento firme em direção às
soluções para os problemas da educação não pode se esconder sob
falsos preceitos e dogmas. Educar é um ato de coragem. Coragem de
admitir que erramos, que devemos mudar o rumo das coisas.
Coragem de buscar nas carteiras escolares a frase contundente: eu
odeio filosofia!

Bibliografia

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