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Bacharel e licenciado em Filosofia / Departamento de Filosofia – UFRJ. Mestre em
Literatura Portuguesa / Programa de Pós-Graduação em Letras – UERJ e
Doutorando em Literatura Comparada / Programa de Pós-Graduação em Letras –
UERJ.
portanto, uma justiça caritativa1. Não interessa, ao filósofo, as
aparências, pelo motivo da certeza objetiva de seu perecimento, de
sua permanência limitada, enquanto o poeta, justamente pelo motivo
pelo qual o filósofo as repugna, se apega a elas de forma irrefreável,
por perceber-se também, assim como as coisas, no movimento
mesmo deste fluxo. Para melhor exemplificar o ofício do poeta,
Zambrano relembra um conto de um imperador da China que
ordenou que tocassem uma terna melodia para acompanhar o
desabrochar das flores. A atenção ao que é singular em cada
instante, o apego ao que é fugaz, resulta diretamente de uma
inserção profunda no devir, que faz com que o poeta se perca diante
dos processos que se sobrepõe em meio às mudanças da vida, e que
também evidenciam seu perecimento e renovação. O poeta não
atribui ao ser apenas uma função copulativa que admitiria predicados
específicos, mas percebe a diversidade e a virtualidade infinita das
coisas em mutação, insuflando na linguagem uma autonomia que a
garante enquanto realidade efetiva, prescindindo de qualquer juízo
que possa classificá-la.
O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente. (PESSOA, p. 100, 1998)
Bibliografia
próxima das questões levantadas por Orson Welles no filme F for Fake –
Verdades e Mentiras (1974), onde o diretor questiona a veracidade do
narrado realizando um falso documentário sobre falsários, exercendo na
própria estrutura do filme sua proposta.
8 Entendida aqui em sua acepção tradicional, visto que Fernando
Pessoa imprime sentidos bastante próprios ao termo ao longo de sua obra
publicada.
NIETZSCHE, Friedrich. A gaia ciência. Trad. Paulo César de Souza.
São Paulo: Cia das Letras, 2004.
PESSOA, Fernando. Ficções do interlúdio. São Paulo: 1998.
______. Obra em prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2005.
ZAMBRANO, María. Filosofia y poesia. México: FCE, 1996.